domingo, 28 de abril de 2013

Outros consensos

É evidente que Cavaco Silva se pôs a jeito da ira do PS, tomando ostensivamente o partido do Governo. Mas, por mais razões que tenha, o PS não deve esquecer que o seu adversário é mesmo o Governo do PSD/CDS e não o Presidente. O PR não faz parte da equação governativa em Portugal. Em vez de consolidar a colagem de Cavaco ao Governo, o PS deve desafiá-lo a  "descolar" dele.
Se a coligação governamental se esboroar antes do fim da legislatura, como parece cada vez mais possível, e forem inevitáveis eleições antecipadas, o PS ainda vai precisar de um Presidente capaz de arbitrar outros consensos.

sábado, 27 de abril de 2013

Intervenção no XIX Congresso do PS

Caras e caros Camaradas

Está dito: o PS só volta ao Governo com eleições!
Mas pode voltar mais cedo do que o Presidente da Republica deseja. Presidente a quem eu só desejo que termine com dignidade o seu mandato.

O PS pode, de facto, ser chamado a governar porque este Governo não só desgoverna, como está em decomposição acelerada, por submarinas amarras que mantenham o líder do CDS/PP preso à sobrevivência do Primeiro Ministro do PSD.

Sabemos que há alternativas às políticas ruinosas da Troika e deste desGoverno. Mas elas supõem reformas de fundo que a coligação da direita não fez, nem podia fazer, porque o seu objectivo é desmantelar o Estado e privatizar o que lhe dê sustentabilidade económica.

A primeira reforma tem de incidir sobre o sistema de Justiça e as forças de segurança, para recuperarem a confiança dos cidadãos, dos agentes económicos, dos investidores nacionais e estrangeiros. Contra a impunidade dos corruptos e da criminalidade organizada, com banca na Banca, que enriquecem à custa de capturar agentes políticos e do Estado para espoliar os cofres públicos, ou seja os contribuintes que pagam impostos.

A segunda reforma tem de se centrar no Estado - não o queremos mais gordo, mas mais musculado. Com funcionários capacitados para apoiar o poder político na identificação e defesa dos interesses nacionais.
Cabe ao PS emendar a mão e travar a espiral de "outsourcing" que os seus governos no passado ajudaram a avolumar, desnatando o serviço público, para engordar escritórios de advogados e empresas de consultadoria, montando esquemas ruinosos como o BPN, o BPP, as PPP, os swaps, e em obras e aquisições públicas.

A terceira reforma respeita ao sistema fiscal, hoje clamorosamente iníquo e desincentivador da poupança e do investimento na economia real. É preciso simplificá-lo, desbaratar a floresta de isenções fiscais, alargar a base tributária e combater a evasão e fraude fiscais.

É evidente que uma reforma fiscal eficaz não depende só de nós - precisamos de acabar com a selva fiscal na Europa, que domicilia na Holanda e outros paraísos fiscais 19 das 20 empresas do PSI-20. Precisamos de construir a Europa da harmonização fiscal que combata os paraísos fiscais no continente europeu e globalmente, como aqui disse Martin Schultz.

Essa Europa tem de avançar para a União Bancária para controlar a especulação financeira. E tem de ter recursos próprios adequados para investir estrategicamente no crescimento inteligente e no pleno emprego. Não pode contentar-se com o pífio orçamento de menos de 1% do PIB europeu, que é o que o coitado do Presidente Durão arranjou para fazer cantar a União.

Esta Europa tem de abandonar as políticas austericidas impostas pela direita com quartel-general na chancelaria Merkel.

Esta Europa tem de salvar e reforçar o Euro, para que não continue a agravar as divergências macro-económicas entre Norte e Sul, avançando para a restruturação da divida soberana de todos os Estados Membros através de um Fundo de Amortização comum.

Sim, é por uma Europa Federal que todos nos podemos salvar, mas ela tem que significar mais controlo e participação democrática dos cidadãos.

Para isso, em Maio do próximo ano, eles não vão apenas eleger eurodeputados, vão pela primeira vez escolher o Presidente da Comissão Europeia. Precisamos aí de um europeista com visão, ganas e garras para salvar a Europa do veneno ultra-liberal da direita, que transformou a economia europeia num casino.

É por uma União que acabe com a crise e dê resposta aos anseios dos cidadãos que o PS, sob a direcção do nosso Secretário-Geral, António José Seguro, se tem batido na Europa. A principio sozinho, perseverou - e por isso hoje estamos bem acompanhados por todos aqueles que, finalmente, compreenderam que é preciso juntar forças e falar grosso na Europa, para travar a direita que enterra a Europa social, que enterra a Europa da Paz.

Se investe em alianças no plano externo, o PS tem também de encorajar entendimentos que concitem o máximo apoio a um programa patriótico de reforma e recuperação nacional. O que implica renegociar com credores e parceiros europeus.
O que implica também abertura e busca de entendimento com forças e agentes políticos responsáveis, à direita e à esquerda, e também com os parceiros sociais.

É ao admiravel e rijo povo português que o PS vai buscar forças e iluminação.

Do alto dos nossos quase 900 anos como Nação, sabemos que Portugal tem futuro e vai sair mais forte desta crise.

Entre a Troika e a vida, escolhemos Portugal e a Europa. Porque escolhemos as portuguesas e os portugueses.

VIVA o PS!


(Santa Maria da Feira, 27 de Abril, 2013)

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Artigos sobre offshores e Coreia do Norte



Deixo aqui os artigos publicados este mês:

"Offshores: paraísos para a criminalidade", no Público.

"A habitual bravata de Pyongyan?", no Diário de Notícias.


Visita à CAIS


Aqui fica uma foto da minha visita na sexta-feira passada à CAIS, onde pude dialogar com representantes da associação sobre a situação dos sem-abrigo em Portugal e sobre a Estratégia Europeia para a Integração de Pessoas Sem-Abrigo

quarta-feira, 17 de abril de 2013

The Euro crisis in Cyprus

Commissioner Olli Rehn,

In Cyprus the Eurogroup split the Euro: Eurodeposits may now be worth less than 60% of similar amounts deposited in Germany.

Don't tell us that all was done to fight tax evasion: botched solution 1 imploded the European deposit guarantee and fell on small depositors to, actually, allow the big money laundering business to go on. And solution 2, when it came, had given enough time to most criminals to ship away their capital.

Don't tell us that all is now being done to accelerate the banking union - why don't you, Commissioner, denounce the German government, who is actively slowing it down, to suit its own electoral calendar?

Commission, Commissioner Rehn, assume your responsibilities! stop hiding behind the Troika!

If you want to move against tax evasion and impose fiscal responsibility, why have you not lifted a finger to stop capital flight in my country, Portugal, instead of letting the Troika bless the "tax amnesty" for tax evaders and other criminals, under the bailed out State budget?

(My one minute statement at EP debate today on Cyprus, with Commissioner Olli Rehn)

domingo, 14 de abril de 2013

O "calote"

Acha Mário Soares que a solução do problema da dívida pública do País está em deixar de a pagar e refere o exemplo da Argentina que "pregou o calote" aos credores no final de 2001, «sem nada lhe ter sucedido».
O exemplo argentino não procede, porém. A Argentina ficou obvimente sem acesso aos mercados da dívida externos; as contas em dólares (que era moeda na Argentina junto com o peso) foram convertidas forçadamente em pesos, com perdas de mais de 1/3; o peso desvalorizou 80%. A Argentina pôde correr esse risco porque: (i) não faz parte de uma união monetária e por isso podia desvalorizar a moeda; (ii) não está integrada numa união económica e por isso podia controlar os movimentos externos de capitais e a importação de bens e serviços; (iii) tem recursos naturais (energia) e económicos (commodities agrícolas) que lhe permitem aguentar a balança de transacções com o exterior sem ter de pedir dinheiro ao estrangeiro.
Portugal não compartilha de nenhuma dessas condições. Um calote unilateral cortaria o acesso ao crédito externo ao Estado e às empresas, arrastando falências em série; tornaria obrigatória, tal como na Argentina, a conversão forçada dos euros na nova moeda nacional desvalorizada, com o correspondente confisco parcial; implicaria a saída do euro e quase inevitavelmente a saída da União Europeia; obrigaria a uma enorme desvalorização da nova moeda nacional, com a consequente inflação galopante e o inevitável empobrecimento generalizado. Sobretudo, tornaria Portugal um país sem nenhuma credibilidade externa e pouco digno de ser frequentado.
Não duvido que não é esse o futuro que Mário Soares deseja para Portugal...

domingo, 7 de abril de 2013

Equiparação

Se os funcionários públicos, especialmente os que dispõem de rendimentos mais altos, não podem ser chamados a contribuir mais para as finanças públicas em épocas de crise do que os que têm rendimentos privados, apesar das condições mais favoráveis de que beneficiam, então a consequência deveria ser levar a sério a equiparação para todos os efeitos, incluindo em matéria de remunerações, de tempo de trabalho semanal e, sobretudo, de despedimentos individuais e coletivos.
É essa a "moral" profunda do acórdão do TC. Não se pode pretender igualdade com o setor privado só quando isso convém.

Dois equívocos


1. Só se pode comparar o que é comparável – o que não é o caso dos rendimentos pagos pelo Estado e dos rendimentos privados. Os primeiros são em geral fixados unilateralmente pelo próprio Estado, por via de lei ou por ato ou contrato administrativo com base na lei; os segundos decorrem de relações jurídico-privadas (propriedade, heranças, contratos, etc.). Os primeiros geram despesa pública e pesam directamente no orçamento; os segundos, não.
Julgo que ninguém negará que o Estado tem o direito soberano de, pelo menos em situações excepcionais e a título transitório, reduzir os rendimentos que dele dependem – por se tratar de relações administrativas --, especialmente por razões imperativas de disciplina orçamental, desde que de forma equitativa dentro do universo do sector público. A Constituição não garante a intocabilidade do nível de remunerações públicas nem das pensões. Trata-se de um ónus de quem está ao serviço do Estado e de quem beneficia das respectivas vantagens, em comparação com o sector privado (e não são poucas, ponto essencial que o Tribunal Constitucional convenientemente descartou).
Mas defender que o Estado só o pode fazer se não causar uma “desigualdade excessiva” em relação aos rendimentos do sector privado não se limita a reduzir a nada aquele poder do Estado, é também uma petição de princípio –, é comparar coisas insusceptíveis de comparação. Parafraseando um conceito do direito da concorrência, são diferentes “mercados relevantes”. Por um lado, o Estado só pode atingir os rendimentos privados por via da receita (impostos), não por via da corte na despesa (como o Orçamento estabelecia para o setor público); por outro lado, o Estado não pode tributar separadamente o sector privado (pois, isso sim, seria violar o princípio da igualdade).
É por isto que, na minha opinião, a decisão do Tribunal Constitucional sobre o orçamento assenta num equívoco de base. Tal como a do ano passado.

2. Além disso, mesmo que se aceitasse a injustificada equiparabilidade por que o Tribunal optou, então deveria entrar em conta com todos os factores relevantes. Ora, quem é mais afectado no seu rendimento pela crise não são os funcionários e pensionistas (mesmo com os cortes de que o Tribunal resolveu generosamente isentá-los) mas sim os trabalhadores do sector privado, que pagam a pesada factura do desemprego maciço, combinado com a redução do valor e da duração do subsídio de desemprego) e com a baixa generalizada de remunerações que o mercado de trabalho impõe.
Não são só os funcionários e pensionistas que sofrem cortes no seu rendimento. Contudo, o Tribunal não deu o devido relevo a estas situações, tornando a comparação uma ficção.
Um segundo equívoco.

sábado, 6 de abril de 2013

Tribunal Constitucional (4)

Desiluda-se quem julga que ganhou com esta decisão do TC (designadamente os funcionários públicos e pensionistas que recuperaram um mês de rendimento). Os efeitos desta decisão sobre a incapacidade do País de atingir as metas de consolidação orçamental e de regresso ao mercado da dívida só vai agravar e prolongar a fase de austeridade (mais cortes de despesa, mais impostos durante mais tempo). Isto sem contar com a possilidade de uma crise politica, cujos custos financeiros podemos deduzir pelo que sucedeu na Grécia há um ano.
No final, todos os portugueses, incluindo os que agora festejam a decisão do TC, terão perdido bem mais de um mês adicional de rendimento por ano.

Tribunal Constitucional (3)

Até agora o Governo tinha um bode expiatório para as suas dificuldades -- o anterior Governo. Agora passa a ter outro: a decisão do Tribunal Constitucional.

Tribunal Constitucional (2)

O Tribunal foi do 8 ao 80 quanto aos efeitos das inconstitucionalidades que declarou. No ano passado, afastando-se da jurisprudência estabelecida, neutralizou os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, mantendo as normas em vigor até ao fim da sua vigência. Desta vez, afastando-se de novo da jurisprudência estabelecida, mas agora no sentido contrário, declarou a inconstitucionalidade com efeitos retroativos, obrigando o Estado a repor o dinheiro já cobrado!

Tribunal Constitucional

A decisão do Tribunal Constitucional sobre o orçamento não cria somente um grande problema ao Governo (o que seria o menos), mas também ao País (o que é bem mais complicado).