Como é que é possível que, com todo o seu discurso de partido moderado, contrário ao despesismo do Estado e favorável ao equilíbrio orçamental, o PSD tenha caído na tentação de alinhar com a extrema-esquerda, que despreza todos esses valores, na aprovação de uma medida política e financeiramente insustentável, só para tentar dividir com esses partidos nas próximas eleições os despojos de uns milhares de votos de uma categoria profissional privilegiada?
E como é que é possível que Rio não tenha antecipado que a reação de Costa poderia mesmo ser a que foi, forte e firme (como aqui se tinha defendido já ontem), lançando sobre o PSD, com toda a credibilidade pública, o principal ónus da crise política, por ter querido ignorar que há alianças espúrias que comprometem a coerência política sem apelo nem agravo?
Não dá simplesmente para entender!
Adenda
Um leitor sugere que Rio só tem uma saída para a alhada em que se meteu: não impor disciplina de voto na votação final no plenário e deixar que uma parte dos deputados do PSD se abstenham e deixem chumbar a lei...
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
sexta-feira, 3 de maio de 2019
Geringonça (19): O fim
Publicado por
Vital Moreira
Se o PS fez tudo para aguentar a Geringonça até ao fim, concessão após concessão, apesar dos seus custos orçamentais e das golpadas dos parceiros da pseudoaliança parlamentar (sobretudo do BE), desta vez as coisas ultrapassaram todas as linhas vermelhas, quando os ditos aceitam o apoio eleitoralmente oportunista da direita para impor uma medida que, além de não constar deliberadamente do programa do Governo nem dos acordos interpartidários e de se traduzir numa enorme injustiça distributiva na função pública - o que é indigno da esquerda -, inflige ao Governo a maior derrota política da legislatura, numa das suas mais essenciais orientações políticas (a consolidação orçamental, a redução do peso da dívida pública e a contenção do aumento da despesa pública permanente).
Se na política não há lugar para gratidão, resta sempre a exigência de um módico de leadade política entre as partes num parceria política contratualizada.
Adenda
Penso que o melhor modo de lidar com o maximalismo político dos seus "parceiros" (!?) de esquerda é mesmo confrontá-los com uma moção de confiança baseada na importância decisiva da consolidação orçamental e com o desafio de apoiarem o Governo ou juntarem-se à direita para o derrubar.
Adenda 2
António Costa preferiu jogar pelo seguro e clarificar desde já as águas, anunciando a demissão do Governo, caso a lei seja definitivamente aprovada, jogando toda a responsabilidade sobre a leviandade e o oportunismo das oposições. Conversa acabada, portanto!
Se na política não há lugar para gratidão, resta sempre a exigência de um módico de leadade política entre as partes num parceria política contratualizada.
Adenda
Penso que o melhor modo de lidar com o maximalismo político dos seus "parceiros" (!?) de esquerda é mesmo confrontá-los com uma moção de confiança baseada na importância decisiva da consolidação orçamental e com o desafio de apoiarem o Governo ou juntarem-se à direita para o derrubar.
Adenda 2
António Costa preferiu jogar pelo seguro e clarificar desde já as águas, anunciando a demissão do Governo, caso a lei seja definitivamente aprovada, jogando toda a responsabilidade sobre a leviandade e o oportunismo das oposições. Conversa acabada, portanto!
SNS, 40 anos (17): Fetichismo ideológico
Publicado por
Vital Moreira
1. É estranha a fixação da esquerda na questão das PPPs - que continuam a ser excecionais -, quando é indesmentível que a verdadeira "privatização" do SNS está noutro lado, a saber:
- no volume crescente de cuidados de saúde subcontratados pelo próprio SNS a prestadores privados, por défice de capacidade daquele;
- no volume crescente de cuidados de saúde prestados à margem do SNS, quer através de seguros privados de saúde, quer através da ADSE (gerida pelo próprio Estado!).
O fetichismo ideológico quanto às PPPs obscurece o emagrecimento progressivo da quota do SNS na prestação global de cuidados de saúde entre nós. Ora, os hospitais PPP, esses continuam integrados no SNS, não à margem dele!
2. Há quem se preocupe apenas em saber onde é que o dinheiro público destinado à saúde é gasto, querendo significar que deve ser sempre gasto na gestão pública e nunca na gestão delegada a privados.
Penso, mais uma vez, que se trata de uma perspetiva desfocada: o que deve preocupar é saber onde é que o dinheiro público rende mais, em termos de cuidados de saúde prestados e de utentes servidos. Como contribuinte, desejo que o dinheiro público seja utilizado da forma mais eficiente possível também no SNS, em termos de value for money.
Ora, se, em virtude de uma maior eficiência, se demonstrar que a gestão privada delegada pode produzir mais com o mesmo dinheiro, sem perdas de qualidade (como mostram os indicadores disponíveis sobre as PPPs), não vejo porque é que se há-de preferir sempre a gestão pública, com menores resultados. Só por sectarismo doutrinário ou por masoquismo tributário!
- no volume crescente de cuidados de saúde subcontratados pelo próprio SNS a prestadores privados, por défice de capacidade daquele;
- no volume crescente de cuidados de saúde prestados à margem do SNS, quer através de seguros privados de saúde, quer através da ADSE (gerida pelo próprio Estado!).
O fetichismo ideológico quanto às PPPs obscurece o emagrecimento progressivo da quota do SNS na prestação global de cuidados de saúde entre nós. Ora, os hospitais PPP, esses continuam integrados no SNS, não à margem dele!
2. Há quem se preocupe apenas em saber onde é que o dinheiro público destinado à saúde é gasto, querendo significar que deve ser sempre gasto na gestão pública e nunca na gestão delegada a privados.
Penso, mais uma vez, que se trata de uma perspetiva desfocada: o que deve preocupar é saber onde é que o dinheiro público rende mais, em termos de cuidados de saúde prestados e de utentes servidos. Como contribuinte, desejo que o dinheiro público seja utilizado da forma mais eficiente possível também no SNS, em termos de value for money.
Ora, se, em virtude de uma maior eficiência, se demonstrar que a gestão privada delegada pode produzir mais com o mesmo dinheiro, sem perdas de qualidade (como mostram os indicadores disponíveis sobre as PPPs), não vejo porque é que se há-de preferir sempre a gestão pública, com menores resultados. Só por sectarismo doutrinário ou por masoquismo tributário!
quinta-feira, 2 de maio de 2019
Eleições no horizonte (6): Para grandes males...
Publicado por
Vital Moreira
Além do injusto privilégio que confere aos beneficiários, o oportunista acordo entre o PSD (!?) e os partidos à esquerda do PS para a recuperação retroativa integral do tempo de progressão congelado aos professores durante a crise é de uma gravidade sem paralelo na gestão financeira desta legislatura, arruinando os laboriosos esforços para a consolidação orçamental, além do efeito de arrastamento que vai ter sobre outras carreiras afins.
Entendo que, apesar de ter deixado arrastar indevidamente este dossiê sem provocar atempadamente a sua clarificação definitiva, o Governo não pode aceitar passivamente este triunfo do mais pedestre eleitoralismo das oposições coligadas, que lesa irremediavelmente a credibilidade orçamental externa do País e a justiça distributiva na função pública. Não pode valer tudo em vésperas de eleições.
Eu, se fosse chefe do Governo, dramatizaria a leviandade das oposições e apresentaria a demissão, pedindo ao PR a convocação de eleições antecipadas e solicitando a arbitragem dos contribuintes.
Adenda
Um leitor pergunta se não é melhor impugnar constitucionalmente a medida. Mas os dislates orçamentais não são necessariamente inconstitucionais e, sobretudo, trata-se de uma questão essencialmente política, que não pode aguardar o improvável desfecho de uma problemática fiscalizição da constitucionalidade. A questão essencial é a de saber se um Governo minoritário deve "engolir" um golpe eleitoralmente oportunista das oposições coligadas, que vai contra o programa e a orientação do Governo e que deixa uma pesada herança orçamental para o Governo seguinte, aumentando subtancialmente a despesa permanente do Estado, e abrindo uma "caixa de Pandora" em relação a carreiras semelhantes da função pública. Pergunto-me quem é que aceita ser ministro das finanças nestas condições...
Adenda (2)
Sob o ponto de vista constitucional, a objeção mais relevante, no meu entender, tem a ver com o princípio da igualdade, na medida em que esta solução estipula a contagem retroativa de todo o tempo de serviço prestado durante o período de congelamento geral das progressões, o que se traduz num privilégio nas carreiras como a dos professores, que é uma carreira plana e em que a progressão depende essencialmente do tempo de serviço, quando comparada com o regime geral das carreiras com vários níveis e com acesso por concurso ou equivalente, as quais, por natureza, não podem recuperar a progressão que perderam durante o congelamento.
Adenda (3)
Uma hipótese alternativa seria uma solução em duas vertentes cumulativas: (i) por um lado, apresentar uma moção de confiança à AR, como base numa declaração política focada na disciplina orçamental, confrontando o Bloco e o PCP com o desafio de apoiarem o Goveno ou juntarem-se à direita para o derrubar e abrirem uma crise política; (ii) solicitar expressmente ao PR que suscite a fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei (o que ele nunca fez...), com base designadamente na violação do princípio da igualdade, como exposto acima.
Entendo que, apesar de ter deixado arrastar indevidamente este dossiê sem provocar atempadamente a sua clarificação definitiva, o Governo não pode aceitar passivamente este triunfo do mais pedestre eleitoralismo das oposições coligadas, que lesa irremediavelmente a credibilidade orçamental externa do País e a justiça distributiva na função pública. Não pode valer tudo em vésperas de eleições.
Eu, se fosse chefe do Governo, dramatizaria a leviandade das oposições e apresentaria a demissão, pedindo ao PR a convocação de eleições antecipadas e solicitando a arbitragem dos contribuintes.
Adenda
Um leitor pergunta se não é melhor impugnar constitucionalmente a medida. Mas os dislates orçamentais não são necessariamente inconstitucionais e, sobretudo, trata-se de uma questão essencialmente política, que não pode aguardar o improvável desfecho de uma problemática fiscalizição da constitucionalidade. A questão essencial é a de saber se um Governo minoritário deve "engolir" um golpe eleitoralmente oportunista das oposições coligadas, que vai contra o programa e a orientação do Governo e que deixa uma pesada herança orçamental para o Governo seguinte, aumentando subtancialmente a despesa permanente do Estado, e abrindo uma "caixa de Pandora" em relação a carreiras semelhantes da função pública. Pergunto-me quem é que aceita ser ministro das finanças nestas condições...
Adenda (2)
Sob o ponto de vista constitucional, a objeção mais relevante, no meu entender, tem a ver com o princípio da igualdade, na medida em que esta solução estipula a contagem retroativa de todo o tempo de serviço prestado durante o período de congelamento geral das progressões, o que se traduz num privilégio nas carreiras como a dos professores, que é uma carreira plana e em que a progressão depende essencialmente do tempo de serviço, quando comparada com o regime geral das carreiras com vários níveis e com acesso por concurso ou equivalente, as quais, por natureza, não podem recuperar a progressão que perderam durante o congelamento.
Adenda (3)
Uma hipótese alternativa seria uma solução em duas vertentes cumulativas: (i) por um lado, apresentar uma moção de confiança à AR, como base numa declaração política focada na disciplina orçamental, confrontando o Bloco e o PCP com o desafio de apoiarem o Goveno ou juntarem-se à direita para o derrubar e abrirem uma crise política; (ii) solicitar expressmente ao PR que suscite a fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei (o que ele nunca fez...), com base designadamente na violação do princípio da igualdade, como exposto acima.
Ai, o défice (9): "Viver acima das possibilidades"
Publicado por
Vital Moreira
1. Em mais um dos seus estimulantes artigos no Público (acesso condicionado), Luís Aguiar-Conraria afirma ter sido um erro ter utilizado a expressão "viver acima das possibilidades", pela carga moral negativa que ela implica para tanta gente que vive com baixos rendimentos.
Mas eu penso que isso não é razão para não ser apropriado utilizá-la, justamente com essa carga moral e política, em relação ao País (Estado, empresas e particulares), quando gastava sistematicamente mais do que produzia, acumulando uma montanha de dívida externa (com o resultado conhecido), e a tantos portugueses que faziam levianamente o mesmo.
2. Também tenho defendido aqui várias vezes a necessidade de aumentar a poupança nacional, não somente como almofada para as famílias, mas também para reduzir a dependência do capital externo para efeitos de investimento.
Tendo, porém, concluído que os portugueses não são naturalmente dados ao aforro, já só desejo que não regressem ao endividamento excessivo (o que parece que muitos estão novamente a fazer, a crer nos números do crédito aos particulares...). De resto, o mesmo se passa com as empresas, que distribuem pingues dividendos (por vezes mais do que os lucros!), para depois se endividarem para investir.
Continuo a pensar que endividamento em período de vacas gordas arrisca acabar em privação severa em período de vacas magras (como sucedeu durante a crise)...
Mas eu penso que isso não é razão para não ser apropriado utilizá-la, justamente com essa carga moral e política, em relação ao País (Estado, empresas e particulares), quando gastava sistematicamente mais do que produzia, acumulando uma montanha de dívida externa (com o resultado conhecido), e a tantos portugueses que faziam levianamente o mesmo.
2. Também tenho defendido aqui várias vezes a necessidade de aumentar a poupança nacional, não somente como almofada para as famílias, mas também para reduzir a dependência do capital externo para efeitos de investimento.
Tendo, porém, concluído que os portugueses não são naturalmente dados ao aforro, já só desejo que não regressem ao endividamento excessivo (o que parece que muitos estão novamente a fazer, a crer nos números do crédito aos particulares...). De resto, o mesmo se passa com as empresas, que distribuem pingues dividendos (por vezes mais do que os lucros!), para depois se endividarem para investir.
Continuo a pensar que endividamento em período de vacas gordas arrisca acabar em privação severa em período de vacas magras (como sucedeu durante a crise)...
Não concordo (11): Lamentável censura
Publicado por
Vital Moreira
Lamento profundamente a censura imposta pelo New York Times a esta caricatura - uma "charge" ao seguidismo de Trump em relação ao Governo de direita de Israel na sua ofensiva antipalestina -, invocando que ela consubstancia um episódio de antissemitismo -, o que é um disparate.
Na verdade, o facto de Israel se autoqualificar como "Estado judaico" não o torna imune à crítica das suas opções e orientações políticas, como qualquer outro Estado, sem que isso implique qualquer sentimento antijudaico. Era o que faltava, que a natureza étnico-religiosa de que se reclama o Estado israelita o tornasse imune à crítica e condenação pela sistemática violação do direito internacional em relação aos territórios palestinos ocupados (incluindo Jerusalém) e de repressão, expropriação e deslocação maciça dos seus moradores, de segregação dos cidadãos árabes israelitas, etc.
De resto, estas críticas são compartilhadas por muitos intelectuais judeus, dentro e fora de Israel, nomeadamente nos Estados Unidos. Ao censurar a caricatura de um seu colaborador regular, o New York Times cede cinicamente ao poderoso lobby político e empresarial pró-israelita em Washington e não honra os seus pergaminhos de defesa intransigente da liberdade e independência jornalística.
Na verdade, o facto de Israel se autoqualificar como "Estado judaico" não o torna imune à crítica das suas opções e orientações políticas, como qualquer outro Estado, sem que isso implique qualquer sentimento antijudaico. Era o que faltava, que a natureza étnico-religiosa de que se reclama o Estado israelita o tornasse imune à crítica e condenação pela sistemática violação do direito internacional em relação aos territórios palestinos ocupados (incluindo Jerusalém) e de repressão, expropriação e deslocação maciça dos seus moradores, de segregação dos cidadãos árabes israelitas, etc.
De resto, estas críticas são compartilhadas por muitos intelectuais judeus, dentro e fora de Israel, nomeadamente nos Estados Unidos. Ao censurar a caricatura de um seu colaborador regular, o New York Times cede cinicamente ao poderoso lobby político e empresarial pró-israelita em Washington e não honra os seus pergaminhos de defesa intransigente da liberdade e independência jornalística.
quarta-feira, 1 de maio de 2019
Bloquices (9): Irresponsabilidade qualificada
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Vital Moreira
Não pode passar sem registo este vídeo da manifestação do 25 de abril em que uma deputada do Bloco (aparentemente secundada pela líder e pela eurodeputada do mesmo partido) desejam ao Presidente do Brasil, Bolsonaro, o mesmo destino que o de Salazar (que, ao contrário daquele, não chegou ao poder por via de eleições nem nunca se submeteu a elas na sua longa ditadura). Ora, por metafórica que tenha sido a cantilena bloquista, não há desculpa para tal irresponsabilidade política, mais própria de grupelho anarco-populista do que de dirigentes qualificados de um partido representado na AR, e que aspira a governar o País.
Tivessem sido dirigentes de outro partido, esta indesculpável leviandade política ao mais alto nível teria provocado um coro de justa reprovação nos média e na opinião pública. Tratando-se do BE, porém, o lastimável episódio foi em geral ignorado e retirado da esfera pública, mostrando mais uma vez o protecionismo de que o grupo goza na comunicação social (já escrevi uma vez que, se as eleições fossem nas redações dos média, o Bloco ganhava...).
Adenda
Um leitor objeta que o vídeo foi retirado do site do Bloco logo que se verificou a sua inconveniência, mas eu penso que o facto de ter sido aí publicado só mostra que não se tratou de uma "gaffe" imponderada na manisfestação, o que agrava as coisas. Além disso, tendo depois retirado o vídeo, pela sua "inconveniência" política, o Bloco nem se retratou do lamentável episódio nem pediu desculpa por ele.
Tivessem sido dirigentes de outro partido, esta indesculpável leviandade política ao mais alto nível teria provocado um coro de justa reprovação nos média e na opinião pública. Tratando-se do BE, porém, o lastimável episódio foi em geral ignorado e retirado da esfera pública, mostrando mais uma vez o protecionismo de que o grupo goza na comunicação social (já escrevi uma vez que, se as eleições fossem nas redações dos média, o Bloco ganhava...).
Adenda
Um leitor objeta que o vídeo foi retirado do site do Bloco logo que se verificou a sua inconveniência, mas eu penso que o facto de ter sido aí publicado só mostra que não se tratou de uma "gaffe" imponderada na manisfestação, o que agrava as coisas. Além disso, tendo depois retirado o vídeo, pela sua "inconveniência" política, o Bloco nem se retratou do lamentável episódio nem pediu desculpa por ele.
terça-feira, 30 de abril de 2019
Free & fair trade (9): Um nova era na justiça internacional sobre o investimento estrangeiro
Publicado por
Vital Moreira
1. O Tribunal de Justiça da União Europeia acaba de decidir que o tribunal internacional de litígios de investimento previsto no acordo comercial com o Canadá (conhecido pela sigla CETA) não é incompatível com o direito constitucional da União, pelo que pode avançar a sua criação.
Trata-se de um importante triunfo da Comissão Europeia, que investiu muito capital técnico e político nesta solução, e dos que, como eu, apostaram nela.
Com esta decisão fica também aberto o caminho para a ratificação dos acordos com Singapura e com o Vietname, que consagram igual solução judicial. Foi igualmente validada a opção da Comissão Europeia (e da União) para criar ulteriormente um tribunal multilateral de investimento, de jurisdição obrigatória, que abranja todos os países que o desejem.
Do que se trata, portanto, é de submeter os litígios internacionais de investimento, por alegada violação de acordos internacionais de investimento, a uma verdadeira justiça internacional.
2. Lembremos que este sistema de tribunal internacional de investimento (investment court system, ICS) foi a solução encontrada para substituir o sistema tradicional da arbitragem internacional ad hoc dos litígios entre investidores estrangeiros e os Estados de investimento (conhecida pela sigla ISDS - investor to state dispute settlement), que não resistiu à forte contestação pela opinião pública, tendo sido afastada pelo Parlamento Europeu.
Ao contrário desta - em que o investidor tem direito a nomear um dos árbitros e a acordar no terceiro árbitro -, o novo sistema consiste na criação de um tribunal permanente, constituído por juízes independentes, nomeados de comum acordo pelos Estados envolvidos, sem nenhuma intervenção dos investidores interessados. Além disso, o novo sistema prevê um tribunal de recurso, o que não existe no ISDS. Por último, a nova solução salvaguarda explicitamente o "direito a regular" (right to regulate) dos Estados (ou da União, sendo caso disso) em defesa do ambiente, da saúde, etc. - o que prevalece sobre os direitos dos investidores.
Além de inovador, trata-se também de um regime assaz equilibrado!
Trata-se de um importante triunfo da Comissão Europeia, que investiu muito capital técnico e político nesta solução, e dos que, como eu, apostaram nela.
Com esta decisão fica também aberto o caminho para a ratificação dos acordos com Singapura e com o Vietname, que consagram igual solução judicial. Foi igualmente validada a opção da Comissão Europeia (e da União) para criar ulteriormente um tribunal multilateral de investimento, de jurisdição obrigatória, que abranja todos os países que o desejem.
Do que se trata, portanto, é de submeter os litígios internacionais de investimento, por alegada violação de acordos internacionais de investimento, a uma verdadeira justiça internacional.
2. Lembremos que este sistema de tribunal internacional de investimento (investment court system, ICS) foi a solução encontrada para substituir o sistema tradicional da arbitragem internacional ad hoc dos litígios entre investidores estrangeiros e os Estados de investimento (conhecida pela sigla ISDS - investor to state dispute settlement), que não resistiu à forte contestação pela opinião pública, tendo sido afastada pelo Parlamento Europeu.
Ao contrário desta - em que o investidor tem direito a nomear um dos árbitros e a acordar no terceiro árbitro -, o novo sistema consiste na criação de um tribunal permanente, constituído por juízes independentes, nomeados de comum acordo pelos Estados envolvidos, sem nenhuma intervenção dos investidores interessados. Além disso, o novo sistema prevê um tribunal de recurso, o que não existe no ISDS. Por último, a nova solução salvaguarda explicitamente o "direito a regular" (right to regulate) dos Estados (ou da União, sendo caso disso) em defesa do ambiente, da saúde, etc. - o que prevalece sobre os direitos dos investidores.
Além de inovador, trata-se também de um regime assaz equilibrado!
"Dinheiro Vivo" (13): O "capital humano" também deve ter direito aos lucros das empresas?
Publicado por
Vital Moreira
Aqui está o cabeçalho do meu habitual artigo de sábado passado no Dinheiro Vivo (suplemento de economia do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias), desta vez sobre a prática de algumas empresas de distribuírem uma parte dos seus lucros pelos seus trabalhadores.
Sendo uma prática relativamente frequente em diversos países, ela não tem muitos exemplos entre nós, apesar dos fortes argumentos a seu favor.
Sendo uma prática relativamente frequente em diversos países, ela não tem muitos exemplos entre nós, apesar dos fortes argumentos a seu favor.
segunda-feira, 29 de abril de 2019
Terra brasilis (6): Quando o Governo "compra" os deputados
Publicado por
Vital Moreira
1. No Brasil, o Governo de Bolsonaro acaba de prometer um bónus orçamental de 10 milhões de reais por ano (2,3 milhões de euros), durante os próximos quatro anos, aos deputados que aprovem a reforma previdenciária (segurança social), a somar à verba orçamental normal de mais de 15 milhões de reais anuais a que já têm direito os parlamentares (através de "emendas" orçamentais), para investimento nos seus territórios eleitorais.
Na verdade, essas verbas orçamentais cativas a favor dos deputados e senadores constituem uma das razões para o verdadeiro "mercado parlamentar" existente em Brasília, quer para atrair partidos para o lado "governista" da câmara, quer para atrair os próprios deputados para as bancadas "governistas", mudando de partido (visto que no Brasil é admitida a mudança de partido por "justa causa", definida em termos assaz imprecisos). Pelos vistos, no Brasil o "mandato livre" dos parlamentares vai ao ponto de o transformar em mercadoria política!
2. Em Portugal ficou célebre o episódio do "orçamento limiano" (ou "orçamento do queijo limiano"), em que o segundo Governo minoritário de Guterres (1999-2002) "comprou" o voto de um deputado da oposição (CDS) para aprovar os orçamentos do Estado de 2000 e 2002, a troco de investimentos públicos no seu município (Ponte de Lima). Essa insólita experiência parlamentar conta-se, porém, como um momento menos feliz na nossa história política, não tendo voltado a ocorrer.
De resto, em Portugal o transfuguismo parlamentar é proibido pela própria Constituição (os deputados podem deixar o partido por que foram eleitos, mas não podem inscrever-se noutro partido nem juntar-se a outro grupo parlamentar, sob pena de perda do mandato) e a prática política é caracterizada pela estrita disciplina de voto na votação do orçamento (e noutras votações que possam pôr em causa a subsistência do Governo), como é norma num sistema de governo de natureza parlamentar. No caso do "orçamento limiano" o deputado em causa foi suspenso pelo CDS.
Por conseguinte, embora livre de qualquer mandato vinculado em relação aos eleitores (como é próprio de uma democracia representativa), o mandato dos deputados é essencialmente (embora não absolutamente) vinculado às orientações partidárias. De resto, ao contrário do que sucede no Brasil, em Portugal os cidadãos votam primariamente em partidos, não nos candidatos individualmente considerados.
Na verdade, essas verbas orçamentais cativas a favor dos deputados e senadores constituem uma das razões para o verdadeiro "mercado parlamentar" existente em Brasília, quer para atrair partidos para o lado "governista" da câmara, quer para atrair os próprios deputados para as bancadas "governistas", mudando de partido (visto que no Brasil é admitida a mudança de partido por "justa causa", definida em termos assaz imprecisos). Pelos vistos, no Brasil o "mandato livre" dos parlamentares vai ao ponto de o transformar em mercadoria política!
2. Em Portugal ficou célebre o episódio do "orçamento limiano" (ou "orçamento do queijo limiano"), em que o segundo Governo minoritário de Guterres (1999-2002) "comprou" o voto de um deputado da oposição (CDS) para aprovar os orçamentos do Estado de 2000 e 2002, a troco de investimentos públicos no seu município (Ponte de Lima). Essa insólita experiência parlamentar conta-se, porém, como um momento menos feliz na nossa história política, não tendo voltado a ocorrer.
De resto, em Portugal o transfuguismo parlamentar é proibido pela própria Constituição (os deputados podem deixar o partido por que foram eleitos, mas não podem inscrever-se noutro partido nem juntar-se a outro grupo parlamentar, sob pena de perda do mandato) e a prática política é caracterizada pela estrita disciplina de voto na votação do orçamento (e noutras votações que possam pôr em causa a subsistência do Governo), como é norma num sistema de governo de natureza parlamentar. No caso do "orçamento limiano" o deputado em causa foi suspenso pelo CDS.
Por conseguinte, embora livre de qualquer mandato vinculado em relação aos eleitores (como é próprio de uma democracia representativa), o mandato dos deputados é essencialmente (embora não absolutamente) vinculado às orientações partidárias. De resto, ao contrário do que sucede no Brasil, em Portugal os cidadãos votam primariamente em partidos, não nos candidatos individualmente considerados.
domingo, 28 de abril de 2019
Puerta del Sol (5): Não vai ser fácil
Publicado por
Vital Moreira
1. Marcadas pela folgada vitória eleitoral dos socialistas espanhóis e pelo desastre eleitoral do PP - como se vê neste quadro tirado do El Pais -, estas eleições parlamentares espanholas revelam também um país mais profundamente dividido, como se mostra pela surpreendente irrupção dos nacionalistas do Vox e pela vitória, pela primeira vez, das forças independentistas da Catalunha numas eleições nacionais, mercê do excelentes resultados da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), que ganhou claramente o prélio catalão.
Apesar da destacada liderança eleitoral do PSOE e da derrota da direita dividida, a cena política espanhola tornou-se mais fragmentada e mais extremada.
2. Para complicar tudo, não se afigura nada fácil para o PSOE a negociação da solução governativa.
Longe da maioria absoluta, com os seus 29% e 123 deputados em 350, e afastada uma coligação com o Ciudadanos, por causa da recusa deste em aliar-se aos socialistas, resta a Sánchez uma coligação de esquerda com o Unidas Podemos (que entra no Governo, apesar do seu revés eleitoral), o que todavia não chega para uma maioria parlamentar, necessitando por isso do apoio de outros partidos. Ora, se tiver de depender dos independentistas catalães (como sucedeu no Governo cessante), o reforço eleitoral destes vai tornar mais exigente o seu apoio.
Fácil é antecipar que pode não haver novo Governo tão depressa na Moncloa
Apesar da destacada liderança eleitoral do PSOE e da derrota da direita dividida, a cena política espanhola tornou-se mais fragmentada e mais extremada.
2. Para complicar tudo, não se afigura nada fácil para o PSOE a negociação da solução governativa.
Longe da maioria absoluta, com os seus 29% e 123 deputados em 350, e afastada uma coligação com o Ciudadanos, por causa da recusa deste em aliar-se aos socialistas, resta a Sánchez uma coligação de esquerda com o Unidas Podemos (que entra no Governo, apesar do seu revés eleitoral), o que todavia não chega para uma maioria parlamentar, necessitando por isso do apoio de outros partidos. Ora, se tiver de depender dos independentistas catalães (como sucedeu no Governo cessante), o reforço eleitoral destes vai tornar mais exigente o seu apoio.
Fácil é antecipar que pode não haver novo Governo tão depressa na Moncloa
Memórias acidentais (6): A crise académica de 1969
Publicado por
Vital Moreira
1. A foto à esquerda, já aqui evocada anteriormente, testemunha o apoio de um grupo de docentes da Faculdade de Direito, entre os quais me conto (primeiro a contar da esquerda), à luta académica de Coimbra em 1969, há meio século.
Se volto a publicá-la é porque ela e outra semelhante foram incluídas no livro de José Veloso, A Crise Académica de 1969: Uma reportagem fotográfica, que acaba de de sair (publicadas na p. 46), mas onde aparecem mal referenciadas quanto à data e à circunstância, sendo erradamente referidas a 17 de abril, dia do desencadeamento da crise, quando elas foram efetivamente tiradas cinco dias depois, quando o grupo se dirigia Assembleia Magna de 22 de abril, no ginásio da AAC, que decretou o luto académico e a greve às aulas (e onde intervieram os Professores Paulo Quintela e Orlando de Carvalho).Na verdade, apesar de tiradas ao fundo das escadas monumentais, as referidas fotos retratam a nossa curta deslocação desde a Clepsidra, situada pouco atrás (que tinha sido inaugurada pouco tempo antes, em março), até à entrada superior das instalações da AAC, por onde se acedia ao amplo ginásio.
2. Não foi esse, aliás, o primeiro passo do nosso envolvimento direto na luta académica. Logo no dia 18 de abril, havíamos aprovado uma moção coletiva de apoio à luta estudantil numa reunião de assistentes da Faculdade de Direito, tendo-me cabido anunciá-la publicamente, desde o topo das escadas centrais de acesso à Via Latina, aos muitos estudantes nessa manhã reunidos no pátio dos Gerais (em reação à prisão do Presidente da AAC nessa madrugada), no que foi a minha primeira intervenção pública na luta contra a ditadura.
Esses e outros episódios haveriam de fundamentar a minha exoneração sumária em setembro (junto com J. M. Correia Pinto) pelo Ministro da Educação, Hermano Saraiva, na ressaca da crise académica. (Voltaria a ser recontratado meio ano depois pelo novo Ministro, Veiga Simão, que viria a substituir, em janeiro de 1970, o exonerado ministro salazarista, que acabou vítima da sua intransigência "ultra" na repressão da luta de Coimbra.)
Conferências & colóquios (2): Cidadania europeia
Publicado por
Vital Moreira
No próximo dia 16 de maio, na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra, vou intervir neste colóquio sobre o que significa ser cidadão da UE (e, correspondentemente, o que singnifica deixar de o ser ...), um debate assaz oportuno, tendo em conta o Brexit e os movimentos nacionalistas em vários outros Estados-membros da União, que contestam a dimensão política da integração europeia, cujo fundamento é justamente a cidadania da União.
sábado, 27 de abril de 2019
Campos Elísios (3): As reformas democráticas de Macron
Publicado por
Vital Moreira
1. Na sua conferência de imprensa de anteontem, o Presidente Macron deu a conhecer as suas propostas de reforma política em várias áreas, incluindo das instituições democráticas francesas, sendo de salientar os seguintes pontos:
- redução do número de deputados em 20-30% (a Assembleia Nacional tem 577 deputados, a que há a acrescentar os 348 membros do Senado);
- introdução de uma quota de proporcionalidade na eleição dos deputados (cerca de 20%), instituindo, portanto um sistema eleitoral misto;
- proibição da acumulação do mandato parlamentar com outros cargos públicos;
- introdução da iniciativa popular de legislação e de referendo junto do parlamento, mediante petição de um milhão de cidadãos;
- criação de um "conselho de participação cívica", junto do Conselho Económico e Social, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, com poder de debate e de recomendação de medidas (a assumir depois em projeto de lei ou de referendo).
Em contrapartida, o Presidente rejeitou algumas reivindicações emblemáticas da agenda política do "coletes amarelos", nomeadamente as seguintes:
- o referendo de iniciativa popular vinculativa (dispensando resolução parlamentar);
- a revogação de mandatos políticos por votação popular (recall);
- o reconhecimento da relevância do voto em branco;
- o voto obrigatório.
2. Vistas de Portugal, nenhuma das propostas defendidas por Macron é especialmente inovadora, salvo a do "conselho de participação cívica" (ver o meu post anterior sobre este tema), E quanto às propostas rejeitadas, elas também não existem em Portugal (nem estão na agenda política).
Todavia, no caso da França as propostas constituem uma significativa reforma da democracia representativa - que vai implicar uma revisão cosntitucional -, tanto pela instituição do sistema eleitoral misto como pelas medidas de democracia participativa introduzidas.
A França entra assim no movimento geral de resposta aos desafios colocados hoje em dia à democracia representativa. Mas, rejeitando o referendo de iniciativa popular vinculativa e o reconhecimento do voto em branco, Macron resiste, e bem, às sereias populistas que ameaçam a democracia representativa. Uma coisa é reformar a democracia representativa para a reforçar, outra coisa é claudicar perante a vaga populista contra ela.
- redução do número de deputados em 20-30% (a Assembleia Nacional tem 577 deputados, a que há a acrescentar os 348 membros do Senado);
- introdução de uma quota de proporcionalidade na eleição dos deputados (cerca de 20%), instituindo, portanto um sistema eleitoral misto;
- proibição da acumulação do mandato parlamentar com outros cargos públicos;
- introdução da iniciativa popular de legislação e de referendo junto do parlamento, mediante petição de um milhão de cidadãos;
- criação de um "conselho de participação cívica", junto do Conselho Económico e Social, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, com poder de debate e de recomendação de medidas (a assumir depois em projeto de lei ou de referendo).
Em contrapartida, o Presidente rejeitou algumas reivindicações emblemáticas da agenda política do "coletes amarelos", nomeadamente as seguintes:
- o referendo de iniciativa popular vinculativa (dispensando resolução parlamentar);
- a revogação de mandatos políticos por votação popular (recall);
- o reconhecimento da relevância do voto em branco;
- o voto obrigatório.
2. Vistas de Portugal, nenhuma das propostas defendidas por Macron é especialmente inovadora, salvo a do "conselho de participação cívica" (ver o meu post anterior sobre este tema), E quanto às propostas rejeitadas, elas também não existem em Portugal (nem estão na agenda política).
Todavia, no caso da França as propostas constituem uma significativa reforma da democracia representativa - que vai implicar uma revisão cosntitucional -, tanto pela instituição do sistema eleitoral misto como pelas medidas de democracia participativa introduzidas.
A França entra assim no movimento geral de resposta aos desafios colocados hoje em dia à democracia representativa. Mas, rejeitando o referendo de iniciativa popular vinculativa e o reconhecimento do voto em branco, Macron resiste, e bem, às sereias populistas que ameaçam a democracia representativa. Uma coisa é reformar a democracia representativa para a reforçar, outra coisa é claudicar perante a vaga populista contra ela.
sexta-feira, 26 de abril de 2019
"Dinheiro Vivo" (12): Um acordo de conveniência?
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Vital Moreira
Eis o cabeçalho da minha habitual coluna de sábado passado no "Dinheiro Vivo" - o suplemento de economia do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias -, que versa sobre a abertura de negociações para um acordo comercial entre a União Europeia e os Estados Unidos, que em muitos aspetos foge à norma dos acordos comerciais da União, desde logo quanto ao facto de Bruxelas se dispor a negociar com Washington na pendência de tarifas aduaneiras abusivamente impostas por Trump contra a UE e contra outros países, a pretexto de razões de "segurança nacional"!
Euro-eleiçoes 2019 (12): Os portugueses e a UE
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Vital Moreira
1. É francamente animadora a atitude dos portugueses perante a União, tal como decorre dos resultados da sondagem da agência Pitagórica, hoje trazida a público pela TSF e pelo JN (de onde foi tirada a gravura junta).
Assim:
- quase 90% são favoráveis à permanência de Portugal na União, com apenas 7% a favor da saída (que corresponde essencialmente ao eleitorado do PCP na mesma sondagem);
- quase 80% são favoráveis à manutenção de Portugal no euro, com apenas 17% contra (o que corresponde ao eleitorado do PCP e do BE).
Tendo Portugal sido poupado até agora à afirmação de movimentos nacionalistas, a oposição à UE e ao euro continua confinada maioritariamente à esquerda do PS (aliás com maior expressão do que na generalidade dos países da União).
2. É também muito expressivo o apoio às posições mais integracionistas em relação à generalidade dos temas da agenda europeia, nomeadamente os seguintes:
- 90% a favor da diminuição da dívida pública;
- 80% a favor do cumprimento das metas do défice;
- 72% a favor da harmonização fiscal;
- 65% a favor de maior investimento em defesa;
- 64% a favor de um exército europeu.
Se estas posições fossem compartilhadas pelos demais cidadãos europeus, as próximas eleiçõs europeias dariam uma confortável maioria aos partidos mais europeístas e a vida da União estaria bem mais facilitada do que está.
Assim:
- quase 90% são favoráveis à permanência de Portugal na União, com apenas 7% a favor da saída (que corresponde essencialmente ao eleitorado do PCP na mesma sondagem);
- quase 80% são favoráveis à manutenção de Portugal no euro, com apenas 17% contra (o que corresponde ao eleitorado do PCP e do BE).
Tendo Portugal sido poupado até agora à afirmação de movimentos nacionalistas, a oposição à UE e ao euro continua confinada maioritariamente à esquerda do PS (aliás com maior expressão do que na generalidade dos países da União).
2. É também muito expressivo o apoio às posições mais integracionistas em relação à generalidade dos temas da agenda europeia, nomeadamente os seguintes:
- 90% a favor da diminuição da dívida pública;
- 80% a favor do cumprimento das metas do défice;
- 72% a favor da harmonização fiscal;
- 65% a favor de maior investimento em defesa;
- 64% a favor de um exército europeu.
Se estas posições fossem compartilhadas pelos demais cidadãos europeus, as próximas eleiçõs europeias dariam uma confortável maioria aos partidos mais europeístas e a vida da União estaria bem mais facilitada do que está.
Vontade popular (2): Uma inovação democrática
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Vital Moreira
1. São conhecidas várias experiências de envolvimento de "assembleias de cidadãos" convocadas ad hoc para o debate de certas questões políticas, como recentemente na Irlanda, no debate sobre a despenalização do aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
A comunidade belga de língua alemã (no Leste da Bélgica, junto à fronteira alemã) - que é dotada de autogoverno no âmbito do federalismo belga -, acaba de dar um passo em frente nesta experiência de democracia participativa, instituindo por lei uma estrutura permanente, constituída por um Conselho de Cidadãos, de 24 membros, o qual, por sua vez, convoca assembleias de cidadãos temáticas, de 50 membros. Num e noutro caso, os membros são escolhidos por sorteio, de acordo com determinadas regras de representação (território, género, grupo etário, minorias, etc.).
As recomendações das assembleias são obrigatoriamente consideradas pelo parlamento da Comunidade.
2. Quando, por toda a parte, o populismo explora a alienação política dos cidadãos e a suas desconfiança em relação às elites políticas, este experiência de institucionalização de formas não eletivas de democracia, envolvendo cidadãos comuns, selecionados por sorteio, na governação da coletividade podem ser uma parte da reposta, contornando também o risco da "seletividade ativista" da intervenção das formas inorgânicas de democracia participativa (consultas populares, petições, iniciativa legislativa popular, etc.).
Tal como a experiência do orçamento participativo, também esta nova experiência começa a institucionalizar-se a nível local, como convém.
Adenda
Entre as medidas de reforma democrática agora lançadas pelo Presidente Macron em França conta-se justamente a criação de um conselho nacional de partipação cívica, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, para funcionar junto do Conselho Económico e Social, com a missão de debater e fazer recomendações sobre as principais questões sociais, começando pela questão ambiental.
A comunidade belga de língua alemã (no Leste da Bélgica, junto à fronteira alemã) - que é dotada de autogoverno no âmbito do federalismo belga -, acaba de dar um passo em frente nesta experiência de democracia participativa, instituindo por lei uma estrutura permanente, constituída por um Conselho de Cidadãos, de 24 membros, o qual, por sua vez, convoca assembleias de cidadãos temáticas, de 50 membros. Num e noutro caso, os membros são escolhidos por sorteio, de acordo com determinadas regras de representação (território, género, grupo etário, minorias, etc.).
As recomendações das assembleias são obrigatoriamente consideradas pelo parlamento da Comunidade.
2. Quando, por toda a parte, o populismo explora a alienação política dos cidadãos e a suas desconfiança em relação às elites políticas, este experiência de institucionalização de formas não eletivas de democracia, envolvendo cidadãos comuns, selecionados por sorteio, na governação da coletividade podem ser uma parte da reposta, contornando também o risco da "seletividade ativista" da intervenção das formas inorgânicas de democracia participativa (consultas populares, petições, iniciativa legislativa popular, etc.).
Tal como a experiência do orçamento participativo, também esta nova experiência começa a institucionalizar-se a nível local, como convém.
Adenda
Entre as medidas de reforma democrática agora lançadas pelo Presidente Macron em França conta-se justamente a criação de um conselho nacional de partipação cívica, composto por 150 cidadãos tirados à sorte, para funcionar junto do Conselho Económico e Social, com a missão de debater e fazer recomendações sobre as principais questões sociais, começando pela questão ambiental.
quinta-feira, 25 de abril de 2019
Comemorando o 25 de abril, hoje como sempre
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Vital Moreira
Mexendo em velhas fotografias, encontrei esta de um desfile comemorativo do 25 de abril, descendo a Avenida da Liberdade em Lisboa, em 1981.
Das pessoas que identifico na primeira fila, conto, da esquerda para direita, Pezarat Correia, Maria de Lurdes Pintasilgo, Sá Borges, Alda Nogueira, Henrique de Barros, Jose Magalhães Godinho e Vasco Lourenço.
Das pessoas que identifico na primeira fila, conto, da esquerda para direita, Pezarat Correia, Maria de Lurdes Pintasilgo, Sá Borges, Alda Nogueira, Henrique de Barros, Jose Magalhães Godinho e Vasco Lourenço.
quarta-feira, 24 de abril de 2019
Bloquices (8): "Ir à lã..."
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Vital Moreira
1. Num golpe a que já nos habituou, o Bloco tinha-se precipitado a anunciar publicamente, em conferência de imprensa e tudo, um alegado acordo com o PS, no âmbito da lei-quadro do SNS, para a abolição da possibilidade de concessão privada da gestão de hospitais públicos (em regime de PPP), tendo o PS imediatamente desmentido qualquer acordo firme nessa questão.
Além de não confirmada, a alegada cedência do PS era acima de tudo insensata, como aqui se mostrou (e como o PR também assinalou publicamente).
Tudo se esclarece agora, quando o grupo parlamentar do PS apresentou as suas propostas de alteração à proposta de lei governamental, em que se mantém a possibilidade de recorrer a PPP em relação a estabelecimentos do SNS a título subsidiário, acrescentando somente um requisito de fundamentação caso a caso.
Resultado da operação: Sensatez política - 1, radicalismo político - 0. O Bloco foi à lã e ficou tosquiado.
2. Resta saber agora se, por causa dessa frustrada tentativa de forçar a mão do PS, o BE retira o seu apoio à lei, pondo em perigo a aprovação desta, apesar do óbvio progresso que ela trás em relação à lei-quadro existente, incluindo quanto à afirmação da natureza essencialmente pública do SNS, revogando a norma que obriga o Estado a apoiar o setor privado em concorrência com o setor público, como se aquele também integrasse o serviço público de saúde.
Sabendo-se o que a casa gasta, bem capazes disso são eles...
Adenda
O Governo nunca desmentiu a existência de um "documento de trabalho", a admitir a abolição das PPP (que agora veio a público); o que desmentiu imediatamente foi que tivesse sido firmado um acordo com o BE nessa base, derrogando a sua própria proposta de lei nesse ponto crucial. Mas é evidente agora que tal "documento de trabalho" nunca devia ter existido e que o PS devia ter-se mantido fiel à proposta de lei do Governo. A tentação de cedência à agenda bloquista só pode dar maus resultados...
Além de não confirmada, a alegada cedência do PS era acima de tudo insensata, como aqui se mostrou (e como o PR também assinalou publicamente).
Tudo se esclarece agora, quando o grupo parlamentar do PS apresentou as suas propostas de alteração à proposta de lei governamental, em que se mantém a possibilidade de recorrer a PPP em relação a estabelecimentos do SNS a título subsidiário, acrescentando somente um requisito de fundamentação caso a caso.
Resultado da operação: Sensatez política - 1, radicalismo político - 0. O Bloco foi à lã e ficou tosquiado.
2. Resta saber agora se, por causa dessa frustrada tentativa de forçar a mão do PS, o BE retira o seu apoio à lei, pondo em perigo a aprovação desta, apesar do óbvio progresso que ela trás em relação à lei-quadro existente, incluindo quanto à afirmação da natureza essencialmente pública do SNS, revogando a norma que obriga o Estado a apoiar o setor privado em concorrência com o setor público, como se aquele também integrasse o serviço público de saúde.
Sabendo-se o que a casa gasta, bem capazes disso são eles...
Adenda
O Governo nunca desmentiu a existência de um "documento de trabalho", a admitir a abolição das PPP (que agora veio a público); o que desmentiu imediatamente foi que tivesse sido firmado um acordo com o BE nessa base, derrogando a sua própria proposta de lei nesse ponto crucial. Mas é evidente agora que tal "documento de trabalho" nunca devia ter existido e que o PS devia ter-se mantido fiel à proposta de lei do Governo. A tentação de cedência à agenda bloquista só pode dar maus resultados...
Conferências & colóquios (1): O impacto do Brexit na UE
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Vital Moreira
Na próxima semana vou participar neste colóquio da Universidade Lusíada Norte (Porto) sobre o impacto do Brexit nas políticas da União Europeia. Vou abordar em especial o caso da política de comércio externo da União.
Terra brasilis (5): Condenar primeiro e julgar depois
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Vital Moreira
De visita a Portugal para um evento académico, o ministro da justiça brasileiro, Sérgio Moro, permitiu-se reagir a um comentário desprimoroso de José Sócrates, retorquindo que não responde a "criminosos". Ora, se existe algo que um antigo juiz e atual ministro da justiça não pode fazer é acoimar diretamente de "criminoso" alguém que ainda está para ser julgado, estando portanto protegido pelo princípio constitucional da presunção de inocência até condenação definitiva.
A imprensa tablóide e a opinião pública podem, mas um antigo juiz e ministro da justiça não pode dar alguém por condenado antes do julgamento (por mais fortes que possam ser os indícios). Pelo menos, em Portugal!
Adenda
A nossa Ministra da Justiça faria bem em fazer notar discretamente ao desbocado visitante que Portugal é um Estado de direito, onde um ministro da justiça NUNCA se permitiria falar assim...
Adenda (2) (26/4)
Revejo-me nesta análise de Daniel Oliveira e subscrevo este texto de Manuel Carvalho.
A imprensa tablóide e a opinião pública podem, mas um antigo juiz e ministro da justiça não pode dar alguém por condenado antes do julgamento (por mais fortes que possam ser os indícios). Pelo menos, em Portugal!
Adenda
A nossa Ministra da Justiça faria bem em fazer notar discretamente ao desbocado visitante que Portugal é um Estado de direito, onde um ministro da justiça NUNCA se permitiria falar assim...
Adenda (2) (26/4)
Revejo-me nesta análise de Daniel Oliveira e subscrevo este texto de Manuel Carvalho.
"Economia social de mercado" (2): O quinhão dos trabalhadores
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Vital Moreira
Merecem ser aplaudidas as empresas que compartilham com os seus trabalhadores uma parte do seus lucros anuais, tornando claro que eles também são parte do bom desempenho empresarial, para além de esse prémio constituir uma alavanca para reter e atrair os melhores trabalhadores.
Por essa Europa fora, a distribuição de lucros, a atribuição de ações da empresa e a própria participação laboral na gestão da empresa (como a Mitbestimung alemã) constituem outras tantas modalidades de envolvimento e de interessamento dos trabalhadores na vida das suas empresas.
Sem muita tradição entre nós - dada a prevalência de uma cultura adversarial das relações entre empresas e trabalhadores -, tais mecanismos poderiam e deveriam ser objeto de incentivos públicos.
Por essa Europa fora, a distribuição de lucros, a atribuição de ações da empresa e a própria participação laboral na gestão da empresa (como a Mitbestimung alemã) constituem outras tantas modalidades de envolvimento e de interessamento dos trabalhadores na vida das suas empresas.
Sem muita tradição entre nós - dada a prevalência de uma cultura adversarial das relações entre empresas e trabalhadores -, tais mecanismos poderiam e deveriam ser objeto de incentivos públicos.
terça-feira, 23 de abril de 2019
Ha 50 anos, em Coimbra (IV): Peço a Palavra
Publicado por
Vital Moreira
Entre os livros agora publicados a propósito dos 50 anos da luta académica de Coimbra de 1969 avulta naturalmente o de Alberto Marins, Peço a Palavra, hoje lançado na mesma sala do Departamento de Matemáticas onde tudo começou (e que há muito tem o nome de "sala 17 de abril").
Presidente da AAC na altura, AM foi naturalmente um dos principais protagonistas dessas jornadas. Além de um testemunho pessoal, o livro traz também contributos documentais inéditos, colhidos nos arquivos do Ministério da Educação e do Ministério da Defesa de então. Por isso, esta obra vai ficar com um elemento de estudo imprescindível desses entusiasmantes meses de 1969, juntando-se aos já clássicos depoimentos de Celso Cruzeiro e de Rui Namorado, que também eles os viveram por dentro.
Presidente da AAC na altura, AM foi naturalmente um dos principais protagonistas dessas jornadas. Além de um testemunho pessoal, o livro traz também contributos documentais inéditos, colhidos nos arquivos do Ministério da Educação e do Ministério da Defesa de então. Por isso, esta obra vai ficar com um elemento de estudo imprescindível desses entusiasmantes meses de 1969, juntando-se aos já clássicos depoimentos de Celso Cruzeiro e de Rui Namorado, que também eles os viveram por dentro.
"Free and fair trade" (8): Comércio internacional e direitos humanos
Publicado por
Vital Moreira
A Comissão Europeia decidiu abrir um procedimento tendente a uma possível suspensão das preferências comerciais concedidas ao Camboja, por causa da má situação dos direitos humanos naquele País.
Sendo um dos 49 países mais pobres do mundo que beneficiam dessas vantagens comerciais (entrada de todas as suas exportações no mercado da União sem pagamento de direitos aduaneiros), o Camboja está, porém, obrigado a respeitar os princípios subjacentes a um grande número de convenções internacionais de direitos humanos e de direitos dos trabalhadores, sob pena de perder aquele estatuto.
Concebido como um mecanismo de ajuda ao desenvolvimento, o sistema de preferências comerciais unilaterais da União - de uma dimensão sem paralelo noutros países desenvolvidos - é também um poderoso mecanismo de salvaguarda de um nível mínimo de respeito pelos direitos humanos.
[Nota: Esta nova rubrica, "Free and fair trade", substitui e continua a anterior rubrica "Observatório do comércio internacional"]
Sendo um dos 49 países mais pobres do mundo que beneficiam dessas vantagens comerciais (entrada de todas as suas exportações no mercado da União sem pagamento de direitos aduaneiros), o Camboja está, porém, obrigado a respeitar os princípios subjacentes a um grande número de convenções internacionais de direitos humanos e de direitos dos trabalhadores, sob pena de perder aquele estatuto.
Concebido como um mecanismo de ajuda ao desenvolvimento, o sistema de preferências comerciais unilaterais da União - de uma dimensão sem paralelo noutros países desenvolvidos - é também um poderoso mecanismo de salvaguarda de um nível mínimo de respeito pelos direitos humanos.
[Nota: Esta nova rubrica, "Free and fair trade", substitui e continua a anterior rubrica "Observatório do comércio internacional"]
segunda-feira, 22 de abril de 2019
Há 50 anos, em Coimbra (III): Apoio docente à luta académica
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Vital Moreira
22 de abril de 1969, um grupo de docentes, todos da Faculdade de Direito, dirige-se à AAC, em apoio aos estudantes suspensos; a assembleia magna subsequente decretaria a greve às aulas.
Da esquerda para a direita: eu, J. M. Correia Pinto, António Manuel Hespanha, A. J. Avelãs Nunes e Orlando de Carvalho; encoberto está Aníbal Almeida. Com exceção de Orlando de Carvalho, todos os demais eram jovens assistentes.
Adenda
O facto de sermos assistentes no início de carreira tornava-nos mais vulneráveis à repressão governamental, o que não tardou a verificar-se, quando, logo em setembro, na ressaca da crise, dois de nós (Correia Pinto e eu próprio) fomos sumariamente exonerados pelo Ministro da Educação, com base em informações da PIDE (aliás, verdadeiras) sobre o nosso envolvimento direto na luta académica. Felizmente, poucos meses depois, foi a vez de ele próprio ser demitido - uma vitória póstuma do 17 de abril.
Da esquerda para a direita: eu, J. M. Correia Pinto, António Manuel Hespanha, A. J. Avelãs Nunes e Orlando de Carvalho; encoberto está Aníbal Almeida. Com exceção de Orlando de Carvalho, todos os demais eram jovens assistentes.
Adenda
O facto de sermos assistentes no início de carreira tornava-nos mais vulneráveis à repressão governamental, o que não tardou a verificar-se, quando, logo em setembro, na ressaca da crise, dois de nós (Correia Pinto e eu próprio) fomos sumariamente exonerados pelo Ministro da Educação, com base em informações da PIDE (aliás, verdadeiras) sobre o nosso envolvimento direto na luta académica. Felizmente, poucos meses depois, foi a vez de ele próprio ser demitido - uma vitória póstuma do 17 de abril.
+Europa (17): As vantagens do mercado único europeu
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Vital Moreira
Sem surpresa, estes números sobre a maior produtividade e mais altos salários das empresas estrangeiras entre nós mostram as vantagens do mercado interno da UE para Portugal, para atrair investimento tanto de outros países da União como de fora. O mesmo se pode dizer no que respeita à capacidade exportadora dessas empresas.
Sem essa contribuição do investimento externo que a integração europeia potencia, Portugal seria em economia com menor produtividade, mais baixos salários e menos capacidade exportadora, com todas as implicações em matéria social e fiscal. E ainda há quem milite contra a integração europeia por razões de "soberania económica"!
Sem essa contribuição do investimento externo que a integração europeia potencia, Portugal seria em economia com menor produtividade, mais baixos salários e menos capacidade exportadora, com todas as implicações em matéria social e fiscal. E ainda há quem milite contra a integração europeia por razões de "soberania económica"!
SNS, 40 anos (17): Um erro político
Publicado por
Vital Moreira
1. Mais uma vez, o Bloco de Esquerda veio trazer a público um alegado acordo no campo da Geringonça no sentido da abolição das PPP na nova lei-quadro do SNS, reivindicando para si os louros dessa solução e embaraçando politicamente tanto o PS como o PCP. Independentemente de mais esta "bloquice", penso que, a confirmar-se essa cedência do PS (que não constava da proposta de lei governamental), ela não merece aplauso.
Primeiro, como já aqui escrevi várias vezes (por exemplo, AQUI), os hospitais PPP: (i) têm sido um assinalável êxito em termos de eficiência e de qualidade dos cuidados de saúde prestados; (ii) não são contrários à lógica do SNS, continuando plenamente integrados nele durante o período do contrato; (iii) introduzem um saudável elemento de competição dentro do SNS entre diferentes modelos de gestão; e, (iv) no caso das parcerias para a instalação de novos hospitais, constituem uma alternativa de financimento vantajosa em relação a um vultuoso investimento do Estado para a sua construção (com o inerente impacto orçamental).
Como já procurei mostrar anteriomente (por exemplo, AQUI), as PPP não se contam entre os motivos que justificam as atuais dificuldades do SNS. Pelo contrário!
2. Além disso, uma coisa é um governo dispensar as PPP, se assim o entender por razões políticas ou ideológicas, outra coisa é proibi-las por lei, obrigando um futuro governo que as queira restaurar a alterar a lei. Ora, uma lei-quadro, por definição, não deveria proibir soluções, que, sem serem incompatíveis com o desenho constitucional do SNS, representam alternativas políticas diferenciadas. Tal como a lei atual também as não impõe, limitando-se a permiti-las, também a nova lei as não devia proibir, deixando a cada governo a sua opção nesta matéria.
O SNS vingou estes 40 anos, apesar da oposição inicial da direita, por se ter tornado um património institucional transversal ao espetro político, justamente através de alguns ajustamentos, como as taxas moderadoras, a "empresarialização" da gestão dos hospitais públicos e as PPP, aliás todos introduzidos por governos do PS.
Uma lei-quadro não é o instrumento mais apropriado para voltar atrás e tentar reclamar o SNS como ativo político exclusivo da esquerda. Não é o SNS que vai ganhar com o seu acantonamento político-ideológico.
Primeiro, como já aqui escrevi várias vezes (por exemplo, AQUI), os hospitais PPP: (i) têm sido um assinalável êxito em termos de eficiência e de qualidade dos cuidados de saúde prestados; (ii) não são contrários à lógica do SNS, continuando plenamente integrados nele durante o período do contrato; (iii) introduzem um saudável elemento de competição dentro do SNS entre diferentes modelos de gestão; e, (iv) no caso das parcerias para a instalação de novos hospitais, constituem uma alternativa de financimento vantajosa em relação a um vultuoso investimento do Estado para a sua construção (com o inerente impacto orçamental).
Como já procurei mostrar anteriomente (por exemplo, AQUI), as PPP não se contam entre os motivos que justificam as atuais dificuldades do SNS. Pelo contrário!
2. Além disso, uma coisa é um governo dispensar as PPP, se assim o entender por razões políticas ou ideológicas, outra coisa é proibi-las por lei, obrigando um futuro governo que as queira restaurar a alterar a lei. Ora, uma lei-quadro, por definição, não deveria proibir soluções, que, sem serem incompatíveis com o desenho constitucional do SNS, representam alternativas políticas diferenciadas. Tal como a lei atual também as não impõe, limitando-se a permiti-las, também a nova lei as não devia proibir, deixando a cada governo a sua opção nesta matéria.
O SNS vingou estes 40 anos, apesar da oposição inicial da direita, por se ter tornado um património institucional transversal ao espetro político, justamente através de alguns ajustamentos, como as taxas moderadoras, a "empresarialização" da gestão dos hospitais públicos e as PPP, aliás todos introduzidos por governos do PS.
Uma lei-quadro não é o instrumento mais apropriado para voltar atrás e tentar reclamar o SNS como ativo político exclusivo da esquerda. Não é o SNS que vai ganhar com o seu acantonamento político-ideológico.
domingo, 21 de abril de 2019
+Europa (16): Desafios dos direitos fundamentais da União
Publicado por
Vital Moreira
1. Acaba de ser tornado público um importante informe do Parlamento Europeu (PE) sobre a sua atividade na legislatura que agora termina (2015-2019) em relação aos direitos fundamentais na União e nos Estados-membros.
Entre as múltiplas ações avulta a determinação do PE na denúncia das ameaças ao Estado de direito na Hungria e na Polónia, em violação do art. 2º do Tratado da União, que conduziram, pela primeira vez, a propostas de acionamento da 1ª fase do processo de advertência e de sanção do art. 7º (1) do Tratado da União contra aqueles dois países, propostas que, porém, continuam à espera de decisão do Conselho dos Estados-membros.
Entre os pontos negativos registados pelo PE conta-se o prolongado impasse quanto à adesão da União à Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH), que constitui uma obrigação constitucional desde 2009 (entrada em vigor do Tratado de Lisboa), mas que está pendente da revisão do acordo entre a União e o Conselho da Europa, rejeitado pelo TJUE.
2. É evidente que o receado reforço dos partidos soberanistas (na extrema-esquerda) e nacionalistas (na extrema-direita) nas próximas eleições europeias pode debilitar muito a capacidade do PE para prosseguir a sua tradicional ação de liderança na luta pelos direitos fundamentais na União e nos Estados-membros.
Daí, mais uma vez, a importância singular destas eleições europeias e a responsabilidade dos cidadãos europeus nas suas escolhas nestas eleições.
Entre as múltiplas ações avulta a determinação do PE na denúncia das ameaças ao Estado de direito na Hungria e na Polónia, em violação do art. 2º do Tratado da União, que conduziram, pela primeira vez, a propostas de acionamento da 1ª fase do processo de advertência e de sanção do art. 7º (1) do Tratado da União contra aqueles dois países, propostas que, porém, continuam à espera de decisão do Conselho dos Estados-membros.
Entre os pontos negativos registados pelo PE conta-se o prolongado impasse quanto à adesão da União à Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH), que constitui uma obrigação constitucional desde 2009 (entrada em vigor do Tratado de Lisboa), mas que está pendente da revisão do acordo entre a União e o Conselho da Europa, rejeitado pelo TJUE.
2. É evidente que o receado reforço dos partidos soberanistas (na extrema-esquerda) e nacionalistas (na extrema-direita) nas próximas eleições europeias pode debilitar muito a capacidade do PE para prosseguir a sua tradicional ação de liderança na luta pelos direitos fundamentais na União e nos Estados-membros.
Daí, mais uma vez, a importância singular destas eleições europeias e a responsabilidade dos cidadãos europeus nas suas escolhas nestas eleições.
sábado, 20 de abril de 2019
Dinheiro Vivo (11): A questão da Casa do Douro
Publicado por
Vital Moreira
Eis o cabeçalho da minha coluna no Dinheiro Vivo (suplemento de economia do Diário de Notícias e do Jornal de Notícias) da semana passada, desta vez sobre a controvérsia criada pela reconversão da Casa do Douro como instituição de direito público.
Neste artigo suscito duas questões: (i) Pode ser instituída uma "associação pública" (de inscrição e quotização obrigatória) sem ser para o exercício de poderes públicos? (ii) Pode uma associação pública ser dotada de poderes de representação profissional nas relações de trabalho (incluindo a negociação de convenções coletivas de trabalho)? Defendo que não.
Adenda
Num texto no suplemento "Fugas" do Público de hoje (acesso condicionado) - em que protesta contra a reatribuição de natureza pública à Casa do Douro -, Pedro Gracias, vitivinicultor do Douro, comete uma incorreção, ao escrever que a Casa do Douro, mesmo depois de transformada em entidade privada (2014), manteve o monopólio da representação da produção no Conselho Interprofissional da RDD. Não é assim, porém, pois o regime transitório adotado em 2015 só reserva à CdD 60% dos representantes no primeiro mandato, quota reduzida a 20% no segundo mandato. Os restantes representantes cabem a outras associações representativas dos vitivinicultores, de acordo com a quota de produção dos seus associados.
Adenda
Num texto no suplemento "Fugas" do Público de hoje (acesso condicionado) - em que protesta contra a reatribuição de natureza pública à Casa do Douro -, Pedro Gracias, vitivinicultor do Douro, comete uma incorreção, ao escrever que a Casa do Douro, mesmo depois de transformada em entidade privada (2014), manteve o monopólio da representação da produção no Conselho Interprofissional da RDD. Não é assim, porém, pois o regime transitório adotado em 2015 só reserva à CdD 60% dos representantes no primeiro mandato, quota reduzida a 20% no segundo mandato. Os restantes representantes cabem a outras associações representativas dos vitivinicultores, de acordo com a quota de produção dos seus associados.
quinta-feira, 18 de abril de 2019
Praça da República (20): Direito à greve
Publicado por
Vital Moreira
A greve do transporte de combustíveis, convocada por um pequeno sindicato de formação recente, vem colocar mais uma vez a necessidade de rever a lei da greve, a fim de evitar danos desproporcionados à economia e aos serviços públicos.
Estando constitucionalmente fora de causa restringir os objetivos ou os titulares do direito à greve, ressalvadas as exceções constitucionais, há porém margem para regular o modo e as condições do seu exercício, por exemplo: (i) limitar a validade da greve aos trabalhadores filiados nos sindicatos convocantes e às empresas onde os demais trabalhadores assim o decidam por maioria; (ii) excluir greves por tempo indeterminado (que não permitem às empresas e serviços públicos planear a sua atividade) e estabelecer um período máximo de greve, sem prejuízo da sua renovação; (iii) não permitir greves contra convenções coletivas de trabalho em vigor, sem proposta prévia da sua renegociação.
Adenda
Um leitor objeta que as referidas limitações à greve constituem uma violação da liberdade sindical, mas sem razão. Nos termos da Constituição, os titulares do direito à greve são os próprios trabalhadores, não diretamente os sindicatos, e estes só representam os seus filiados, não os trabalhadores da respetiva categoria, em geral.
Adenda (2)
Não faz sentido, nem constitucional nem politicamente, a ideia de Francisco George (antigo DG de Saúde) de que médicos e enfermeiros não deveriam ter direito à greve. De resto, o argumento de essas greves lesam sobretudo os utentes e não o empregador (o Estado) vale para todas as greves nos serviços públicos (escolas, trasnportes, etc.).
Estando constitucionalmente fora de causa restringir os objetivos ou os titulares do direito à greve, ressalvadas as exceções constitucionais, há porém margem para regular o modo e as condições do seu exercício, por exemplo: (i) limitar a validade da greve aos trabalhadores filiados nos sindicatos convocantes e às empresas onde os demais trabalhadores assim o decidam por maioria; (ii) excluir greves por tempo indeterminado (que não permitem às empresas e serviços públicos planear a sua atividade) e estabelecer um período máximo de greve, sem prejuízo da sua renovação; (iii) não permitir greves contra convenções coletivas de trabalho em vigor, sem proposta prévia da sua renegociação.
Adenda
Um leitor objeta que as referidas limitações à greve constituem uma violação da liberdade sindical, mas sem razão. Nos termos da Constituição, os titulares do direito à greve são os próprios trabalhadores, não diretamente os sindicatos, e estes só representam os seus filiados, não os trabalhadores da respetiva categoria, em geral.
Adenda (2)
Não faz sentido, nem constitucional nem politicamente, a ideia de Francisco George (antigo DG de Saúde) de que médicos e enfermeiros não deveriam ter direito à greve. De resto, o argumento de essas greves lesam sobretudo os utentes e não o empregador (o Estado) vale para todas as greves nos serviços públicos (escolas, trasnportes, etc.).
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