A caminho de casa, guiando com cuidado pela noite chuvosa, ouvi no carro o debate. Sem esforçar o sentido de objectividade, chegados ao fim, naturalmente conclui: o Manuel venceu. Vieram logo a seguir os comentadores de serviço à TSF: uma daqui, outra dali, toma lá, dá cá, o Cavaco é que é, embora isto e aquilo.
"Olha, se queres ber!" como dizia a outra... Estarei biruta ou estão estes a puxar, mais ou menos despudoradamente, a brasa ao carapau deles?
Chego a casa. E o meu marido, que é muito mais cerebral e distanciado que eu, diz-me: "O Manuel ganhou isto claramente, limpinho".
Começamos a ouvir pares comentantes, zapando de canal para canal: com mais ou menos nuances e descontando as desconversas, todos concluem que o Professor pediu meças ao Alegre.
Olha, se queres ber!
E não há nada como ver mesmo.
Acabei de ver, pela segunda vez, o debate, repetido nas TVs.
E quanto mais vejo, mais se avantaja o Manuel Alegre. É que faz mesmo diferença ouvir na rádio ou ver na TV - e a cada esgar azedo do actual PR, o Manuel ganha aos pontos. E ganha, obviamente, na substância do que propõe, do que critica.
Claro que o incumbente ia devidamente industriado para procurar vitimizar-se (acusando o opositor de insinuar, quando confrontado com factos desconfortáveis) e para chutar para canto sempre que o tema fosse... melindroso. E chutou que se fartou:
- no BPN, o canto levou-o para a duvidosa gestão nacionalizada; mas a baliza ficava nas acções que teve na dona SLN (do BPN, antes da nacionalização) que se valorizaram extraordinariamente, por mágicas artes; e compreendia a gestão criminosa que perdurou desde que o Banco abriu portas até que passou os ossos tóxicos para o controlo do Estado (ficando a SLN, entretanto transmudada em Galilei, a chupar a carninha dos activos), já o Professor-economista presidia e persistia em não apontar a porta ao seu estatal e bêpêenal conselheiro Dias Loureiro... A declaração de rendimentos e património no TC para esclarecer isto não adianta mesmo nada.
- nas escutas - o canto foi o site da Presidência da República. Ora, pesquisando em escutas, chega-se aqui, a este patético comunicado, que vale bem a pena recordar, porque não esclarece nada, só obscurece tudo ainda mais, penosamente... E sobretudo não obnubila que, apesar das "alterações" que o PR comunica ter feito na sua Casa Civil, o dito membro da mesma Casa Civil que protagonizara a inventona das escutas na imprensa não foi arredado do Palácio. Pesquise-se q.b. e decerto o vamos achar nalguma fresta belenense, afernandado a limar arestas ao incumbente candidato...
- na politica europeia, contra a crise - onde a mensagem belenense não tem, apenas, primado pela invisibilidade, mas bradado em tom apologético e resignado "não insultem os mercados, não nos amofinem os credores, estendam os chapéus, curvem a cerviz..."... Ora, não é preciso apanhar nenhum avião e plantar-se de megafone às portas de Brandeburgo a explicar à D. Merkel que convem que explique aos alemães que a Alemanha só se unificou à conta da Europa e só há Europa se as palavras "coesão", "convergência","solidariedade", "crescimento" e "emprego" forem levadas a sério nesta crise e a valer para todos: basta acompanhar, discretamente, o democrata-cristão Juncker e soprar à Angela que anda a ser assaltada por demónios anti-europeus e isso, em paragens germânicas, acaba sempre por dar pró devastadoramente torto.
Enfim, este debatezinho foi eficaz. A mim deu-me para arregaçar as mangas e escrever este post.
À campanha! Por uma campanha alegre, contra os azedos! Por Manuel Alegre à Presidência!
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
quinta-feira, 30 de dezembro de 2010
Solução definitiva para o BPN
Pode ouvir-se o que eu anteontem disse, na rúbrica "Conselho Superior" da ANTENA UM, sobre a necessidade de explicações e de solução definitiva para o buracão BPN.
O remédio é a transparência
Pode ler-se na ABA DA CAUSA o artigo sobre as revelações do WikiLeaks que escrevi para o JORNAL DE LEIRIA e que foi publicado na edição de 16.12.2010.
segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
O diabo está nos títulos
«Austeridade gera recessão e obriga a medidas adicionais de mil milhões» - diz o Público.
Todos os jornais gostam de títulos rotundos e peremptórios, mesmo quando as respectivas peças os não suportam. No caso, o título mais fiel ao conteúdo da notícia seria «Austeridade pode gerar recessão e obrigar a medidas adicionais de mil milhões».
A previsão de recessão assenta num efeito automático da redução do consumo interno, em consequência das medidas de austeridade. Mas se isso for compensado no todo ou em parte pelo aumento do consumo externo, ou seja, pelas exportações? E se o orçamento já incorporar uma almofada para uma queda da receita maior do que o esperado?
Todos os jornais gostam de títulos rotundos e peremptórios, mesmo quando as respectivas peças os não suportam. No caso, o título mais fiel ao conteúdo da notícia seria «Austeridade pode gerar recessão e obrigar a medidas adicionais de mil milhões».
A previsão de recessão assenta num efeito automático da redução do consumo interno, em consequência das medidas de austeridade. Mas se isso for compensado no todo ou em parte pelo aumento do consumo externo, ou seja, pelas exportações? E se o orçamento já incorporar uma almofada para uma queda da receita maior do que o esperado?
segunda-feira, 20 de dezembro de 2010
Submarinos e contrapartidas - queixa à Comissão Europeia
Pode ser lido aqui, na ABA DA CAUSA, o texto da Queixa que hoje apresentei à Comissão Europeia sobre os Contratos de Aquisição dos Submarinos e respectivas Contrapartidas.
domingo, 19 de dezembro de 2010
Populismo de direita no seu melhor
«Nobre defende redução de deputados para 100».
Dez seria ainda mais económico, e zero, a perfeição!...
Dez seria ainda mais económico, e zero, a perfeição!...
terça-feira, 14 de dezembro de 2010
Saber ou ... não querer saber
A WikiLeaks trouxe de novo para a agenda política a questão dos voos operados através de Portugal para transporte ilegal de prisioneiros - em voos civis ao serviço da CIA, mas também em voos militares, americanos e não só....
O MENE, reagindo à primeira revelação WikiLeaks (telegrama da embaixada americana em Lisboa de 20.10.2006) voltou a negar no passado dia 8, perante a AR, que Portugal tivesse autorizado o transporte de presos para Guantanamo, afirmando que nem sequer o repatriamento de ex-prisioneiros de Guantánamo para outros destinos chegara a realizar-se, apenas fora objecto de "diligências" por parte dos EUA.
Dias depois, a 12 deDezembro, o El PAIS escreveu "los diplomáticos agradecen a Sócrates haber "permitido a EE UU usar la base de Lajes en las Azores para repatriar a detenidos de Guantánamo", "una decisión difícil que nunca se hizo pública", señala un despacho de septiembre de 2007. Convirá ler o texto integral do telegrama americano, que ainda não encontro publicado em lado nenhum.
Numa conmunicação mais recente já disponível, de 25.09.2009, a embaixada americana escreve "The Portuguese government provides liberal access to Portuguese air and seaports for U.S. military operations in support of our efforts in Iraq and Afghanistan. This year 2,557 U.S. military aircraft have flown over Portuguese-controlled airspace and 1,103 have transited through Lajes Air Base in the Azores".
Como é óbvio, nenhum voo militar americano passaria por espaço aéreo nacional ou aterraria em aeroportos ou bases militares portugueses, sem a necessária autorização diplomática, com consulta ao MDN, emitida pelo MNE (ainda que muitas autorizações sejam dadas "liberalmente", ou seja "por grosso", no esquema designado de "blanket clearance authorization").
Trata-se de autorizações portuguesas porventura semelhantes às dadas a voos militares e alguns classificados "de Estado" que, a par de outro vooscivis operados por companhias testas-de ferro da CIA, transportaram prisioneiros para Guantanamo desde o dia 11 de Janeiro de 2002 - ou o MNE autorizou todos esses voos militares e "de Estado" e não sabe o que transportavam e ao que iam? Porque não permite então a consulta aos arquivos sobre os respectivos pedidos de autorização e e condições da sua concessão? Aqui estão elencados, na lista de voos de e para Guantanamo, entre 11.1.2002 e 24.6.2006, elaborada pela NAV, lista que o MENE não forneceu à AR nem ao PE, mas que eu obtive e tornei pública.
E a questão fundamental é a de saber se Portugal sabia o que levavam aqueles aviões ou ... não quis saber!
Quanto aos voos com prisioneiros de Guantanamo a que alude a telegrafia americana como objecto de pedidos de autorização para repatriamento, não devem ser confundidos com os efectuados para reinstalar detidos em países terceiros (incluindo o nosso): estes últimos são posteriores a Luis Amado, em Dezembro de 2008, ter tomado a iniciativa (que eu louvei e louvo) de oferecer o nosso país, e de incitar outros países europeus, a aceitar pessoas libertadas de Guantanamo, para ajudar Obama a encerrar Guantanamo; e realizaram-se, obviamente, depois da posse de Obama, em Janeiro de 2009, envolvendo justamente pessoas que os EUA queriam libertar de Guantanamo mas não podiam repatriar, porque nas pátrias respectivas poderiam ser mortos ou ainda mais torturados.... Há quem esteja agora a procurar criar a confusão entre esses dois tipos de autorização, para obnubilar responsabilidades das autoridades portuguesas com voos de transferência ilegal de presos para Guantanamo e de Guantanamo para outras prisões e para os respectivos países de origem (aí sim, de repatriamento), em anos anteriores, incluidos na lista acima referenciada.
E não foram só aviões americanos que foram autorizados por Portugal a ir a Guantanamo. Há até um voo militar saudita (a 24.6.2006, curiosamente) e outros dois kuwaitis, (a 3.11.2005 e a 7/3/2005) que vão de Guantanamo para Casablanca/Marrocos e que, obviamente, só podiam passar no nosso espaço aéreo com autorização diplomatica portuguesa.
No quadro da investigação do Parlamento Europeu em 2006/2007, já se havia apurado que tinham passado por espaco aereo portugues voos para repatriar prisioneiros. Através das diligências de duas parlamentares - a britânica Sarah Ludford e a belga Frieda Broeppels - junto das suas respectivas autoridades, apurou-se que um avião militar britânico (voos RRR6868 e RRR6869) foi autorizado por Portugal a seguir pela nosso espaço aéreo para Guantanamo em 8/3/2004 e regressar no dia seguinte, com o objectivo de repatriar prisioneiros. E em 25/4/05, um avião militar belga (BAF 699A) partiu de Guantanamo para Melbroek (Belgica), com autorização de sobrevoo de Portugal, também para repatriar prisioneiros.
Enfim, resta aguardar que mais telegrafia americana confirme aquilo que o Ministro Luis Amado vem desmentindo…
O MENE, reagindo à primeira revelação WikiLeaks (telegrama da embaixada americana em Lisboa de 20.10.2006) voltou a negar no passado dia 8, perante a AR, que Portugal tivesse autorizado o transporte de presos para Guantanamo, afirmando que nem sequer o repatriamento de ex-prisioneiros de Guantánamo para outros destinos chegara a realizar-se, apenas fora objecto de "diligências" por parte dos EUA.
Dias depois, a 12 deDezembro, o El PAIS escreveu "los diplomáticos agradecen a Sócrates haber "permitido a EE UU usar la base de Lajes en las Azores para repatriar a detenidos de Guantánamo", "una decisión difícil que nunca se hizo pública", señala un despacho de septiembre de 2007. Convirá ler o texto integral do telegrama americano, que ainda não encontro publicado em lado nenhum.
Numa conmunicação mais recente já disponível, de 25.09.2009, a embaixada americana escreve "The Portuguese government provides liberal access to Portuguese air and seaports for U.S. military operations in support of our efforts in Iraq and Afghanistan. This year 2,557 U.S. military aircraft have flown over Portuguese-controlled airspace and 1,103 have transited through Lajes Air Base in the Azores".
Como é óbvio, nenhum voo militar americano passaria por espaço aéreo nacional ou aterraria em aeroportos ou bases militares portugueses, sem a necessária autorização diplomática, com consulta ao MDN, emitida pelo MNE (ainda que muitas autorizações sejam dadas "liberalmente", ou seja "por grosso", no esquema designado de "blanket clearance authorization").
Trata-se de autorizações portuguesas porventura semelhantes às dadas a voos militares e alguns classificados "de Estado" que, a par de outro vooscivis operados por companhias testas-de ferro da CIA, transportaram prisioneiros para Guantanamo desde o dia 11 de Janeiro de 2002 - ou o MNE autorizou todos esses voos militares e "de Estado" e não sabe o que transportavam e ao que iam? Porque não permite então a consulta aos arquivos sobre os respectivos pedidos de autorização e e condições da sua concessão? Aqui estão elencados, na lista de voos de e para Guantanamo, entre 11.1.2002 e 24.6.2006, elaborada pela NAV, lista que o MENE não forneceu à AR nem ao PE, mas que eu obtive e tornei pública.
E a questão fundamental é a de saber se Portugal sabia o que levavam aqueles aviões ou ... não quis saber!
Quanto aos voos com prisioneiros de Guantanamo a que alude a telegrafia americana como objecto de pedidos de autorização para repatriamento, não devem ser confundidos com os efectuados para reinstalar detidos em países terceiros (incluindo o nosso): estes últimos são posteriores a Luis Amado, em Dezembro de 2008, ter tomado a iniciativa (que eu louvei e louvo) de oferecer o nosso país, e de incitar outros países europeus, a aceitar pessoas libertadas de Guantanamo, para ajudar Obama a encerrar Guantanamo; e realizaram-se, obviamente, depois da posse de Obama, em Janeiro de 2009, envolvendo justamente pessoas que os EUA queriam libertar de Guantanamo mas não podiam repatriar, porque nas pátrias respectivas poderiam ser mortos ou ainda mais torturados.... Há quem esteja agora a procurar criar a confusão entre esses dois tipos de autorização, para obnubilar responsabilidades das autoridades portuguesas com voos de transferência ilegal de presos para Guantanamo e de Guantanamo para outras prisões e para os respectivos países de origem (aí sim, de repatriamento), em anos anteriores, incluidos na lista acima referenciada.
E não foram só aviões americanos que foram autorizados por Portugal a ir a Guantanamo. Há até um voo militar saudita (a 24.6.2006, curiosamente) e outros dois kuwaitis, (a 3.11.2005 e a 7/3/2005) que vão de Guantanamo para Casablanca/Marrocos e que, obviamente, só podiam passar no nosso espaço aéreo com autorização diplomatica portuguesa.
No quadro da investigação do Parlamento Europeu em 2006/2007, já se havia apurado que tinham passado por espaco aereo portugues voos para repatriar prisioneiros. Através das diligências de duas parlamentares - a britânica Sarah Ludford e a belga Frieda Broeppels - junto das suas respectivas autoridades, apurou-se que um avião militar britânico (voos RRR6868 e RRR6869) foi autorizado por Portugal a seguir pela nosso espaço aéreo para Guantanamo em 8/3/2004 e regressar no dia seguinte, com o objectivo de repatriar prisioneiros. E em 25/4/05, um avião militar belga (BAF 699A) partiu de Guantanamo para Melbroek (Belgica), com autorização de sobrevoo de Portugal, também para repatriar prisioneiros.
Enfim, resta aguardar que mais telegrafia americana confirme aquilo que o Ministro Luis Amado vem desmentindo…
Espionar ou não espionar ...
As mais recentes revelações da WikiLeaks respeitantes a Portugal são preocupantes.
A possibilidade de um banco nacional procurar fazer negócios num Irão sob sanções das Nações Unidas e da UE, à conta de um expediente chico-espertista, é grave. E não só por poder ter falhado e sido ignominiosamente exposta, mas porque relevaria da mais alarmante falta de escrúpulos – quem se prestasse a espionar o regime iraniano para ganhar dinheiro à sua conta, também poderia trabalhar para cartéis de droga, a pretexto de os fazer supervisionar pelas policias… .
O Millenium BCP desmentiu já ontem, na manhã seguinte à publicação no diário espanhol El País, o conteúdo dos telegramas da embaixada americana em Lisboa. Mas o dano à sua credibilidade internacional persiste. Não basta, por isso, que o banco desminta. É preciso que as autoridades políticas e judiciais não assobiem para o ar, é vital que esclareçam completamente o que se terá passado, o que propôs o Banco ao Irão e o que propunha o Irão ao Banco, quais as responsabilidades do Millenium BCP, do Banco de Portugal e de quem quer que eventualmente estivesse ao corrente no Governo, no MNE, ou em qualquer outro departamento da Administração Pública.
A possibilidade de um banco nacional procurar fazer negócios num Irão sob sanções das Nações Unidas e da UE, à conta de um expediente chico-espertista, é grave. E não só por poder ter falhado e sido ignominiosamente exposta, mas porque relevaria da mais alarmante falta de escrúpulos – quem se prestasse a espionar o regime iraniano para ganhar dinheiro à sua conta, também poderia trabalhar para cartéis de droga, a pretexto de os fazer supervisionar pelas policias… .
O Millenium BCP desmentiu já ontem, na manhã seguinte à publicação no diário espanhol El País, o conteúdo dos telegramas da embaixada americana em Lisboa. Mas o dano à sua credibilidade internacional persiste. Não basta, por isso, que o banco desminta. É preciso que as autoridades políticas e judiciais não assobiem para o ar, é vital que esclareçam completamente o que se terá passado, o que propôs o Banco ao Irão e o que propunha o Irão ao Banco, quais as responsabilidades do Millenium BCP, do Banco de Portugal e de quem quer que eventualmente estivesse ao corrente no Governo, no MNE, ou em qualquer outro departamento da Administração Pública.
segunda-feira, 13 de dezembro de 2010
Círculo virtuoso
Como já aqui disse outras vezes, o problema mais grave de Portugal não é o défice orçamental - que se resolve com dois ou três anos de austeridade -- mas sim o défice das contas externas, devido à falta de competividade da economia (que não promove as exportações e incentiva as importações) e à reduzida rentabilidade média dos investimentos (que não fomenta o investimento interno nem externo). Consumimos sistematicamente mais do que produzimos, à custa do endividamento externo.
Trata-se de uma situação insustentável. Torna-se necessário aumentar a produtividade, travar o aumento dos custos de produção (incluindo os rendimentos), conter o consumo interno, manter a inflação abaixo da média europeia. Só assim se recupera competitividade, se estimula o investimento, se aumentam as exportações, se diminui o défice externo e o endividamento externo da economia e se garante sustentadamente o crescimento da economia e do emprego.
Sucede que há uma dialéctica reciprocamente vantajosa entre as duas coisas. Por um lado, a necessidade imperiosa de consolidação orçamental, para equilibrar aas contas públicas e estancar o endividamento público, pode ser uma excelente oportunidade para ajudar a resolver também o problema da competividade externa da economia. Por outro lado, a criação de condições de crescimento sustentável constitui um elemento essencial para a recuperação sustentada das finanças públicas.
Trata-se de uma situação insustentável. Torna-se necessário aumentar a produtividade, travar o aumento dos custos de produção (incluindo os rendimentos), conter o consumo interno, manter a inflação abaixo da média europeia. Só assim se recupera competitividade, se estimula o investimento, se aumentam as exportações, se diminui o défice externo e o endividamento externo da economia e se garante sustentadamente o crescimento da economia e do emprego.
Sucede que há uma dialéctica reciprocamente vantajosa entre as duas coisas. Por um lado, a necessidade imperiosa de consolidação orçamental, para equilibrar aas contas públicas e estancar o endividamento público, pode ser uma excelente oportunidade para ajudar a resolver também o problema da competividade externa da economia. Por outro lado, a criação de condições de crescimento sustentável constitui um elemento essencial para a recuperação sustentada das finanças públicas.
Democratização da Constituição
No imprensa não faltam jornalistas e comentadores que tratam a Constituição por "tu". No Público, por exemplo, há dias uma jornalista que se dedica à análise política decretava ser "ridículo" considerar inconstitucional a derrogação açoriana às medidas de austeridade na redução da remuneração dos funcionários públicos. E um comentador considerava "cristalino" que a Constituição obriga o Estado a confiar às escolas privadas o serviço público de ensino.
Decididamente, o comentário político cedeu o passo aos juízos de (in)constitucionalidade. Com tal "democratização da Constituição", os constitucionalistas encartaDOS estão ameaçados de desemprego e o Tribunal Constitucional fica em risco de extinção por redundância...
Decididamente, o comentário político cedeu o passo aos juízos de (in)constitucionalidade. Com tal "democratização da Constituição", os constitucionalistas encartaDOS estão ameaçados de desemprego e o Tribunal Constitucional fica em risco de extinção por redundância...
sábado, 11 de dezembro de 2010
Diferença
O PSD tentou explorar em seu favor a decisão de Carlos César de derrogar nos Açores as regras de austeridade orçamental nacionais.
Todavia, enquanto essa decisão mereceu uma crítica generalizada dentro do próprio Partido Socialista, incluindo Sócrates, quantas vozes se levantariam do lado do PSD, se se tratasse de uma decisão de Alberto João Jardim? Pelos exmplos passados, nem uma!
Há uma diferença entre a consistência e o oportunismo político...
Todavia, enquanto essa decisão mereceu uma crítica generalizada dentro do próprio Partido Socialista, incluindo Sócrates, quantas vozes se levantariam do lado do PSD, se se tratasse de uma decisão de Alberto João Jardim? Pelos exmplos passados, nem uma!
Há uma diferença entre a consistência e o oportunismo político...
"Privilégios regionais"
"A decisão do Governo Regional dos Açores - confirmada pela assembleia regional - de compensar uma parte dos funcionários públicos da região, mediante um subsídio regional, do corte na remuneração do pessoal de todo o sector público determinado pelo Orçamento do Estado para 2011 é politicamente inaceitável. (...)"
(Do meu artigo desta semana no Público. O resto aqui.)
(Do meu artigo desta semana no Público. O resto aqui.)
"Garras artificiais"
No novo plano de superausteridade da Irlanda, destinado a preparar a ajuda da UE e do FMI à sua dramática situação financeira, há de tudo, desde um corte drástico nos funcionários públicos até à redução do salário mínimo, desde a redução de remunerações até ao aumento dos principais impostos. Tudo menos uma coisa: nenhum aumento do imposto sobre os lucros das empresas, apesar de ser um dos mais baixos da UE. Porquê esta incongruência?
(Do meu artigo no Público do dia 30 de Novembro. O resto aqui.)
(Do meu artigo no Público do dia 30 de Novembro. O resto aqui.)
quarta-feira, 8 de dezembro de 2010
Wikileaks salerosos
Leitura obrigatória para qualquer diplomata português (incluindo reformados e aspirantes): a da abundante e bem condimentada telegrafia expedida pela Embaixada americana em Madrid, ontem tornada publica.
Um verdadeiro "treat" para as tão necessitadas Necessidades!
Um verdadeiro "treat" para as tão necessitadas Necessidades!
terça-feira, 7 de dezembro de 2010
Wikileaks - transparência é o remédio
No "Conselho Superior" da ANTENA 1, esta manhã, a partir de S. Francisco, falei sobre as implicações da divulgação de telegramas diplomáticos americanos classificados pela Wikileaks.
Procurei reflectir os debates acalorados (a par do voyeurismo deliciado) que o assunto está a suscitar nos EUA. E abordar os problemas suscitados:
- do zelo excessivo na classificação da telegrafia diplomática,`ao alargamento excessivo da sua circulação, extremamente imprudente face à generalização das novas tecnologias de informação;
- e da revelação que se justifica para expôr comportamentos governamentais imorais e violadores da lei, à que é irrelevante e pode até ser perigosa por oferecer pretextos e informações a quem tenha designios anti-democráticos ou terroristas.
Fundamental é reagir democraticamente. Ou seja, não à chinesa, com repressão e obstrução da difusão da informação. Percebendo que, com a globalização e as tecnologias da informação, cada vez menos é possível manter secreto o que respeita à governação ou à diplomacia. Integridade, coerência e transparência, são o remédio.
PS - Julian Assange entregou-se à policia britânica, entretanto. Fez bem - face aos apelos ao seu assassinato ouvidos em diversas latitudes, é prudente confiar a sua vida a protecção policial.
Procurei reflectir os debates acalorados (a par do voyeurismo deliciado) que o assunto está a suscitar nos EUA. E abordar os problemas suscitados:
- do zelo excessivo na classificação da telegrafia diplomática,`ao alargamento excessivo da sua circulação, extremamente imprudente face à generalização das novas tecnologias de informação;
- e da revelação que se justifica para expôr comportamentos governamentais imorais e violadores da lei, à que é irrelevante e pode até ser perigosa por oferecer pretextos e informações a quem tenha designios anti-democráticos ou terroristas.
Fundamental é reagir democraticamente. Ou seja, não à chinesa, com repressão e obstrução da difusão da informação. Percebendo que, com a globalização e as tecnologias da informação, cada vez menos é possível manter secreto o que respeita à governação ou à diplomacia. Integridade, coerência e transparência, são o remédio.
PS - Julian Assange entregou-se à policia britânica, entretanto. Fez bem - face aos apelos ao seu assassinato ouvidos em diversas latitudes, é prudente confiar a sua vida a protecção policial.
segunda-feira, 6 de dezembro de 2010
Wikileaks
Há quem ache que nada de oficial merece resguardo nem segredo (também há entre nós quem ache o mesmo das coisas privadas...).
Todavia, por mais latitudinário que possa ser, o direito à informação não desculpa pelo menos o furto de dados nem a infidelidade dos servidores públicos (que continuam a ser crimes ).
PS - A divulgação dos "lugares sensíveis" para a segurança dos Estados Unidos constitui uma excelente ajuda ao terrorismo internacional...
Todavia, por mais latitudinário que possa ser, o direito à informação não desculpa pelo menos o furto de dados nem a infidelidade dos servidores públicos (que continuam a ser crimes ).
PS - A divulgação dos "lugares sensíveis" para a segurança dos Estados Unidos constitui uma excelente ajuda ao terrorismo internacional...
Um pouco mais de rigor sff
«UE contra alargamento licença maternidade para 20 semanas».
Título errado. Como resulta da própria notícia, não é a «UE» que está contra, mas sim o Conselho da UE, que representa os governos dos Estados-membros, ao passo que o Parlamento Europeu, único órgão directamente eleito da União, votou a favor.
Título errado. Como resulta da própria notícia, não é a «UE» que está contra, mas sim o Conselho da UE, que representa os governos dos Estados-membros, ao passo que o Parlamento Europeu, único órgão directamente eleito da União, votou a favor.
Medo de governar
"Mesmo com maioria absoluta vamos buscar o CDS".
Decididamente, o PSD tem medo de governar. Não há melhor do que uma coligação para diluir responsabilidades. E é evidente que apontar antecipadamente para uma coligação é a melhor via para não ter maioria absoluta e portanto para tornar a coligação mais provável.
Decididamente, o PSD tem medo de governar. Não há melhor do que uma coligação para diluir responsabilidades. E é evidente que apontar antecipadamente para uma coligação é a melhor via para não ter maioria absoluta e portanto para tornar a coligação mais provável.
domingo, 5 de dezembro de 2010
Redimensionamento das autarquias
Quando há uns meses lancei a ideia redimensionamento das autarquias locais, reduzindo o seu número, a reacção do Governo foi a de que isso não estava na agenda.
Ainda bem que passou a estar.
Ainda bem que passou a estar.
sexta-feira, 3 de dezembro de 2010
Chamam-lhe estação
No verdadeiro apeadeiro ferroviário de Coimbra da linha do Norte, a que chamam estação de Coimbra B, entra-se e sai-se por uma abertura num muro e atravessando a própria linha férrea.
Para que tudo continue como no século XIX, sucede também que quem chega do Sul pode ter de esperar durante largos minutos, à chuva e ao frio, até que a outra linha fique desimpedida de algum comboio que simultaneamente tenha chegado do Norte. É que a passagem para a saída também exige mais este atravessamento de linhas férreas.
Assim vai a principal linha ferroviária do País no século XXI...
Para que tudo continue como no século XIX, sucede também que quem chega do Sul pode ter de esperar durante largos minutos, à chuva e ao frio, até que a outra linha fique desimpedida de algum comboio que simultaneamente tenha chegado do Norte. É que a passagem para a saída também exige mais este atravessamento de linhas férreas.
Assim vai a principal linha ferroviária do País no século XXI...
A austeridade não depende do território
A ideia do governo regional dos Açores de neutralizar, mediante um subsídio, o corte de remunerações de uma parte dos funcionários regionais é altamente reprovável, porque gera uma inadmissível desigualdade na repartição dos sacrifícios da austeridade orçamental.
De resto, se o orçamento dos Açores revela tal folga, ao contrário do orçamento da República, é caso para perguntar se não será de cortar nas generosas transferências financeiras do Continente para as regiões autónomas.
De resto, se o orçamento dos Açores revela tal folga, ao contrário do orçamento da República, é caso para perguntar se não será de cortar nas generosas transferências financeiras do Continente para as regiões autónomas.
quarta-feira, 1 de dezembro de 2010
Voos da tortura - Portugal autorizou
A propósito do telegrama da Embaixada americana hoje divulgado pelo site WIKILEAKS, reproduzo passagens do Requerimento que apresentei à PGR em 8/7/2009, reclamando do Despacho de Arquivamento (DA) da investigação sobre os voos da tortura autorizados a passar por Portugal.
Os textos do DA e do meu requerimento podem ser integralmente lidos aqui.
Ofereço o merecimento dos autos.
"2.b.2.
Importa, portanto, estabelecer, perante a informação - publicamente disponível, pelo menos desde 2003 - sobre a natureza da prisão de Guantanamo, e para investigação dos crimes dos autos, em que informação e em que considerações políticas e/ou jurídicas se basearam as autoridades portuguesas para conceder autorizações diplomáticas para aterrarem em Portugal aos voos militares e de Estado, provenientes ou destinados a Guantanamo.
Esta exigência resulta particularmente reforçada pelo conteúdo do Anexo II da carta de resposta do MNE (datada de 10 de Março de 2009) aos pedidos de informação do DCIAP. Este Anexo II, intitulado “Utilização do Espaço Aéreo Nacional e sob Jurisdição Nacional por Aeronaves Estrangeiras, Civis e de Estado” explica, no capítulo II (“Aeronaves Militares e de Estado Estrangeiras”):
“A) AUTORIZAÇÕES PERMANENTES ANUAIS: Trata-se de uma Blanket Diplomatic Clearance cobrindo diversas categorias de missões pré-definidas...
As autorizações permanentes anuais concedidas por Portugal aos outros Estados caracterizam-se, em princípio, por não permitirem o transporte de material contencioso.” [ênfase dos autores]
B) AUTORIZAÇÕES ESPECIAIS: Também na modalidade Blanket Diplomatic Clearance, estão actualmente em curso duas autorizações genéricas de sobrevoo do espaço aéreo nacional e utilização da Base das Lajes por aeronaves americanas...: São as Operações “Enduring Freedom” e “Iraqi Freedom”. (ênfase dos autores]
Estas duas autorizações são concedidas a título absolutamente excepcional aos EUA. Portugal não concede autorizações deste tipo a nenhum outro Estado. Elas permitem o transporte de material contencioso e de pessoas...”[ênfase dos autores]
Em primeiro lugar, e perante esta informação, o MP não pode deixar de indagar junto do MNE sobre a natureza concreta do “material contencioso” que estas autorizações permitem transportar.
Longe de pôr em causa a particular estreiteza dos laços bilaterais entre Portugal e os EUA, é imperativo esclarecer se esses laços, neste caso particular, implicavam autorização das autoridades portuguesas para serem levadas a cabo, em território nacional, actividades incompatíveis com o Direito Internacional, com a ordem constitucional da República Portuguesa e com o Tratado da União Europeia.
Segundo, tendo em conta a banalidade do transporte de pessoas em voos militares – especialmente no que diz respeito ao transporte de militares americanos entre os teatros de guerra do Iraque e do Afeganistão – importa esclarecer se a referência a uma permissão especial, por parte do Estado português, para o “transporte de material contencioso E PESSOAS” contempla – explícita ou implicitamente – a transferência de prisioneiros de, ou para, estabelecimentos prisionais fora da legalidade internacional. E, assim, se o Estado português participou durante vários anos, activa e conscientemente, em violações sistemáticas do Direito Internacional e do Tratado da União Europeia.
(...)
11.12.
Não deixa também de ser surpreendente esta conclusão do MP perante a extraordinária admissão do MNE de que o voo militar PAT653 [TUZLA-LAJES-GUANTÁNAMO] “não consta [dos] arquivos”, bem como a negligência do mesmo Ministério em exigir às autoridades americanas informações mínimas sobre a natureza, conteúdo, passageiros e função dos voos que têm Guantánamo como origem ou destino, e que recebem uma autorização genérica de aterragem nas Lajes no contexto da Operação Enduring Freedom [ver o Ponto 2 b) sobre os voos militares].
(...)
2.b.3.2.
Já no caso do voo RCH900Y, o DA, por omissão ou esquecimento, não menciona que este voo é feito no contexto da Operação Enduring Freedom e que, de acordo com o pedido de autorização americano, “this mission will move security forces and medical personnel... approx 95 PAX”.
Ora, esta última informação é determinante, porque revela a prática de troca de informação entre as autoridades militares americanas e o MNE português. Isto é, os EUA por vezes justificavam a razão operacional para – e o conteúdo dos – voos em causa, mesmo quando estes se inscreviam na “blanket diplomatic clearance” da Operação Enduring Freedom. E também é significativa – num voo militar proveniente de Guantanamo que aterrou nas Lajes, as autoridades portuguesas escolheram não se interessar pela identidade dos 95 passageiros(...)
2.b.6.
Neste quadro, é particularmente surpreendente a ausência de informação alegada pelos MNE e MDN sobre a natureza, missão e passageiros, da esmagadora maioria dos voos militares que têm Guantánamo como destino ou origem , nomeadamente sobre o seu contexto operacional específico.
O que revela ou uma selecção cuidadosa da informação a disponibilizar às autoridades portuguesas por parte das autoridades americanas e/ou um manifesto desinteresse por parte do MNE e MDN em garantir que o território nacional não fosse utilizado para actividades incompatíveis com o Direito Internacional, o Tratado da União e a Constituição da República Portuguesa.
Este facto é tão mais significativo quanto, como já se viu em 2.b.2. supra, em termos genéricos, as autorizações a todas estas aeronaves incluem permissão para o "transporte de material contencioso e pessoas”- o que aponta, no mínimo, para dolo eventual de quem autoriza.
(...)
2.b.7.
É particularmente significativo e suspeito, face ao objectivo desta investigação, que tal como decorre dos dados fornecidos pelo DA relativamente às 6 escalas de 5 aeronaves civis mencionadas, que tiveram autorização das autoridades portuguesas para aterrar na Base das Lajes (pag. 105 a 112 do DA), que os respectivos Formulários de Tráfego sejam totalmente omissos em relação à especificação do número dos tripulantes e passageiros.
Estamos numa Base Militar, operada conjuntamente pelas autoridades portuguesas e americanas: esperar-se-ia que o controlo de quem chega e parte fosse ainda mais rigoroso do que num aeroporto civil. Não é o caso, relativamente a estes voos civis privados!
(...)
2.b.8.
Quanto aos voos militares estrangeiros autorizados a aterrar na Base das Lajes, não há dúvidas: as autoridades portuguesas não cuidam minimamente de se assegurar de que tais voos não são utilizados para transportar presos em violação das obrigações internacionais do Estado português em matéria de direitos humanos fundamentais! Mesmo depois de terem sido lançados, em finais de 2005, diversos inquéritos internacionais – incluindo do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa – relativamente às “extraordinary renditions” e à cumplicidade nelas de autoridades europeias.
É isso que resulta, claramente, das declarações feitas pelo actual Comandante português da Base das Lajes/Base Aérea nº 4 (desde Setembro de 2008), Tenente-Coronel Manuel Maria Mories Dionísio, declarações constantes do processo a fls. 2733:
“Quanto às aeronaves enunciadas, não existe qualquer de número e nomes de militares transportados, bem como de carga, pois aqueles não são, em princípio, fornecidos à FAP. Só quando se trata de carga perigosa é que é obrigatório dar conhecimento prévio à FAP do seu transporte”.
(...)
2.b.9
É particularmente significativo das falhas da investigação que a PGR se tenha abstido de aprofundar, junto das autoridades portuguesas e americanas, as questões relativas ao conteúdo de voos militares americanos referenciados como podendo estar envolvidos nas “extraordinary renditions” e que Portugal autorizou a aterrar na Base das Lajes. Tal significado resulta não apenas da admissão supra referida do desinteresse das autoridades militares portuguesas pelas pessoas transportadas em quaisquer aviões militares americanos.
(...)
6. Regista-se a conclusão do DA, segundo a qual “No entanto, há que referi-lo, esta investigação permitiu confirmar a passagem pelo território nacional das aeronaves mencionadas pelas assistente [Ana Gomes] e na identificação de 148 tripulantes, ou passageiros". Significa esta passagem que os dados em relação aos voos avançados pela Assistente Ana Gomes se confirmam, incluindo uma lista da NAV de 94 voos, na maioria militares, de e para Guantánamo, escalando aeroportos portugueses, autorizados por Portugal entre 12 de Janeiro de 2002 e 24 de Junho de 2006, lista que o governo português não disponibilizou ao Parlamento Europeu e à Assembleia da República, apesar das insistências da Assistente e do CTPE".
Os textos do DA e do meu requerimento podem ser integralmente lidos aqui.
Ofereço o merecimento dos autos.
"2.b.2.
Importa, portanto, estabelecer, perante a informação - publicamente disponível, pelo menos desde 2003 - sobre a natureza da prisão de Guantanamo, e para investigação dos crimes dos autos, em que informação e em que considerações políticas e/ou jurídicas se basearam as autoridades portuguesas para conceder autorizações diplomáticas para aterrarem em Portugal aos voos militares e de Estado, provenientes ou destinados a Guantanamo.
Esta exigência resulta particularmente reforçada pelo conteúdo do Anexo II da carta de resposta do MNE (datada de 10 de Março de 2009) aos pedidos de informação do DCIAP. Este Anexo II, intitulado “Utilização do Espaço Aéreo Nacional e sob Jurisdição Nacional por Aeronaves Estrangeiras, Civis e de Estado” explica, no capítulo II (“Aeronaves Militares e de Estado Estrangeiras”):
“A) AUTORIZAÇÕES PERMANENTES ANUAIS: Trata-se de uma Blanket Diplomatic Clearance cobrindo diversas categorias de missões pré-definidas...
As autorizações permanentes anuais concedidas por Portugal aos outros Estados caracterizam-se, em princípio, por não permitirem o transporte de material contencioso.” [ênfase dos autores]
B) AUTORIZAÇÕES ESPECIAIS: Também na modalidade Blanket Diplomatic Clearance, estão actualmente em curso duas autorizações genéricas de sobrevoo do espaço aéreo nacional e utilização da Base das Lajes por aeronaves americanas...: São as Operações “Enduring Freedom” e “Iraqi Freedom”. (ênfase dos autores]
Estas duas autorizações são concedidas a título absolutamente excepcional aos EUA. Portugal não concede autorizações deste tipo a nenhum outro Estado. Elas permitem o transporte de material contencioso e de pessoas...”[ênfase dos autores]
Em primeiro lugar, e perante esta informação, o MP não pode deixar de indagar junto do MNE sobre a natureza concreta do “material contencioso” que estas autorizações permitem transportar.
Longe de pôr em causa a particular estreiteza dos laços bilaterais entre Portugal e os EUA, é imperativo esclarecer se esses laços, neste caso particular, implicavam autorização das autoridades portuguesas para serem levadas a cabo, em território nacional, actividades incompatíveis com o Direito Internacional, com a ordem constitucional da República Portuguesa e com o Tratado da União Europeia.
Segundo, tendo em conta a banalidade do transporte de pessoas em voos militares – especialmente no que diz respeito ao transporte de militares americanos entre os teatros de guerra do Iraque e do Afeganistão – importa esclarecer se a referência a uma permissão especial, por parte do Estado português, para o “transporte de material contencioso E PESSOAS” contempla – explícita ou implicitamente – a transferência de prisioneiros de, ou para, estabelecimentos prisionais fora da legalidade internacional. E, assim, se o Estado português participou durante vários anos, activa e conscientemente, em violações sistemáticas do Direito Internacional e do Tratado da União Europeia.
(...)
11.12.
Não deixa também de ser surpreendente esta conclusão do MP perante a extraordinária admissão do MNE de que o voo militar PAT653 [TUZLA-LAJES-GUANTÁNAMO] “não consta [dos] arquivos”, bem como a negligência do mesmo Ministério em exigir às autoridades americanas informações mínimas sobre a natureza, conteúdo, passageiros e função dos voos que têm Guantánamo como origem ou destino, e que recebem uma autorização genérica de aterragem nas Lajes no contexto da Operação Enduring Freedom [ver o Ponto 2 b) sobre os voos militares].
(...)
2.b.3.2.
Já no caso do voo RCH900Y, o DA, por omissão ou esquecimento, não menciona que este voo é feito no contexto da Operação Enduring Freedom e que, de acordo com o pedido de autorização americano, “this mission will move security forces and medical personnel... approx 95 PAX”.
Ora, esta última informação é determinante, porque revela a prática de troca de informação entre as autoridades militares americanas e o MNE português. Isto é, os EUA por vezes justificavam a razão operacional para – e o conteúdo dos – voos em causa, mesmo quando estes se inscreviam na “blanket diplomatic clearance” da Operação Enduring Freedom. E também é significativa – num voo militar proveniente de Guantanamo que aterrou nas Lajes, as autoridades portuguesas escolheram não se interessar pela identidade dos 95 passageiros(...)
2.b.6.
Neste quadro, é particularmente surpreendente a ausência de informação alegada pelos MNE e MDN sobre a natureza, missão e passageiros, da esmagadora maioria dos voos militares que têm Guantánamo como destino ou origem , nomeadamente sobre o seu contexto operacional específico.
O que revela ou uma selecção cuidadosa da informação a disponibilizar às autoridades portuguesas por parte das autoridades americanas e/ou um manifesto desinteresse por parte do MNE e MDN em garantir que o território nacional não fosse utilizado para actividades incompatíveis com o Direito Internacional, o Tratado da União e a Constituição da República Portuguesa.
Este facto é tão mais significativo quanto, como já se viu em 2.b.2. supra, em termos genéricos, as autorizações a todas estas aeronaves incluem permissão para o "transporte de material contencioso e pessoas”- o que aponta, no mínimo, para dolo eventual de quem autoriza.
(...)
2.b.7.
É particularmente significativo e suspeito, face ao objectivo desta investigação, que tal como decorre dos dados fornecidos pelo DA relativamente às 6 escalas de 5 aeronaves civis mencionadas, que tiveram autorização das autoridades portuguesas para aterrar na Base das Lajes (pag. 105 a 112 do DA), que os respectivos Formulários de Tráfego sejam totalmente omissos em relação à especificação do número dos tripulantes e passageiros.
Estamos numa Base Militar, operada conjuntamente pelas autoridades portuguesas e americanas: esperar-se-ia que o controlo de quem chega e parte fosse ainda mais rigoroso do que num aeroporto civil. Não é o caso, relativamente a estes voos civis privados!
(...)
2.b.8.
Quanto aos voos militares estrangeiros autorizados a aterrar na Base das Lajes, não há dúvidas: as autoridades portuguesas não cuidam minimamente de se assegurar de que tais voos não são utilizados para transportar presos em violação das obrigações internacionais do Estado português em matéria de direitos humanos fundamentais! Mesmo depois de terem sido lançados, em finais de 2005, diversos inquéritos internacionais – incluindo do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa – relativamente às “extraordinary renditions” e à cumplicidade nelas de autoridades europeias.
É isso que resulta, claramente, das declarações feitas pelo actual Comandante português da Base das Lajes/Base Aérea nº 4 (desde Setembro de 2008), Tenente-Coronel Manuel Maria Mories Dionísio, declarações constantes do processo a fls. 2733:
“Quanto às aeronaves enunciadas, não existe qualquer de número e nomes de militares transportados, bem como de carga, pois aqueles não são, em princípio, fornecidos à FAP. Só quando se trata de carga perigosa é que é obrigatório dar conhecimento prévio à FAP do seu transporte”.
(...)
2.b.9
É particularmente significativo das falhas da investigação que a PGR se tenha abstido de aprofundar, junto das autoridades portuguesas e americanas, as questões relativas ao conteúdo de voos militares americanos referenciados como podendo estar envolvidos nas “extraordinary renditions” e que Portugal autorizou a aterrar na Base das Lajes. Tal significado resulta não apenas da admissão supra referida do desinteresse das autoridades militares portuguesas pelas pessoas transportadas em quaisquer aviões militares americanos.
(...)
6. Regista-se a conclusão do DA, segundo a qual “No entanto, há que referi-lo, esta investigação permitiu confirmar a passagem pelo território nacional das aeronaves mencionadas pelas assistente [Ana Gomes] e na identificação de 148 tripulantes, ou passageiros". Significa esta passagem que os dados em relação aos voos avançados pela Assistente Ana Gomes se confirmam, incluindo uma lista da NAV de 94 voos, na maioria militares, de e para Guantánamo, escalando aeroportos portugueses, autorizados por Portugal entre 12 de Janeiro de 2002 e 24 de Junho de 2006, lista que o governo português não disponibilizou ao Parlamento Europeu e à Assembleia da República, apesar das insistências da Assistente e do CTPE".
terça-feira, 30 de novembro de 2010
Salsicharia europeia
Na semana passada, na rúbrica “Conselho Superior” da Antena Um, sublinhei que o Governo deveria usar os eurodeputados portugueses para concertar em Bruxelas uma estratégia europeia contra a crise.
No “Conselho Superior” de hoje lamentei que Portugal não tenha neste momento política externa e muito menos política europeia.
Devíamos meter ombros à prioridade de promover uma frente de países ditos periféricos, em situação de ataque e aperto semelhante à nossa, para fazer compreender à Sra. D. Merkel que esta Europa, assim, sem solidariedade e sem visão estratégica, entrincheirada na defesa do graal/Euro não vai a parte nenhuma – e, que com o Euro, vai acabar por enterrar também a UE. E, mais prosaicamente para alcance merkeliano, que, quando o fogo pegar em Espanha, os bancos alemães também vão começar a arder....
É desesperante que tenhamos a Europa entregue à gestão quadrada dos ministros das Finanças e do BCE - uma espécie de raposas velhas e relhas, a tentar tomar conta de uma capoeeira esburacada, que repetidamente deixaram assaltar...
É enfurecedor que tenhamos uma Comissão Europeia com a consistência barrosa da plasticina e um comissário da Economia e Finanças afoito apenas a calcar quem faz por se levantar do chão.
É trágico que não haja hoje na Europa um só Chefe de Estado ou de Governo com sentido estratégico, determinação europeista e capacidade de liderança para fazer a UE tirar finalmente as lições da crise e tomar as medidas que se impõem ( e várias o PE tem sugerido) para corrigir os desequilibrios estruturais, retomar o crescimento e a criação de emprego.
A demissão é colectiva - a quem restar honestidade, não sobra rasgo para ir além do rasteiro "sound-bite".
Precisavamos de mais Europa - a da convergência, da coesão, da solidariedade, pré-federal.
Sai-nos uma salsichada franco-alemã, mistela de sabor rançoso e digestão funesta.
No “Conselho Superior” de hoje lamentei que Portugal não tenha neste momento política externa e muito menos política europeia.
Devíamos meter ombros à prioridade de promover uma frente de países ditos periféricos, em situação de ataque e aperto semelhante à nossa, para fazer compreender à Sra. D. Merkel que esta Europa, assim, sem solidariedade e sem visão estratégica, entrincheirada na defesa do graal/Euro não vai a parte nenhuma – e, que com o Euro, vai acabar por enterrar também a UE. E, mais prosaicamente para alcance merkeliano, que, quando o fogo pegar em Espanha, os bancos alemães também vão começar a arder....
É desesperante que tenhamos a Europa entregue à gestão quadrada dos ministros das Finanças e do BCE - uma espécie de raposas velhas e relhas, a tentar tomar conta de uma capoeeira esburacada, que repetidamente deixaram assaltar...
É enfurecedor que tenhamos uma Comissão Europeia com a consistência barrosa da plasticina e um comissário da Economia e Finanças afoito apenas a calcar quem faz por se levantar do chão.
É trágico que não haja hoje na Europa um só Chefe de Estado ou de Governo com sentido estratégico, determinação europeista e capacidade de liderança para fazer a UE tirar finalmente as lições da crise e tomar as medidas que se impõem ( e várias o PE tem sugerido) para corrigir os desequilibrios estruturais, retomar o crescimento e a criação de emprego.
A demissão é colectiva - a quem restar honestidade, não sobra rasgo para ir além do rasteiro "sound-bite".
Precisavamos de mais Europa - a da convergência, da coesão, da solidariedade, pré-federal.
Sai-nos uma salsichada franco-alemã, mistela de sabor rançoso e digestão funesta.
segunda-feira, 29 de novembro de 2010
sábado, 27 de novembro de 2010
"Economia social de mercado"
«O Tratado de Lisboa não mudou somente a estrutura institucional da União Europeia. Mexeu também nos objetivos e nas políticas. Neste aspeto, uma das alterações mais significativas foi a introdução da noção de "economia social de mercado", para caracterizar a ordem económica da União. Ora, as mudanças conceptuais podem ser mais importantes do que as alterações institucionais.»
(Do meu artigo desta semana no Público, agora no Aba da Causa)
(Do meu artigo desta semana no Público, agora no Aba da Causa)
quinta-feira, 25 de novembro de 2010
Escutas - reagir ou ignorar?
Fernanda Câncio replicou ao meu post "Bonomia e poderes ocultos" de 21/11.
1. FC questiona a legitimidade de determinadas escutas estarem num determinado processo judicial - questão a que nem eu, nem ela, poderemos responder sem ter acesso ao processo, e que, em última análise, só poderá ser esclarecida e derimida em sede judicial.
Sustenta FC que eu devia ralar-me "em saber como é que o jornalista teve acesso as ditas conversas, e, estando gravadas, quem as teria e com que legitimidade gravado e transcrito e colocado num sitio em que estivessem acessíveis a jornalistas". Para FC o essencial é, portanto, se o jornalista praticou um crime ao aceder ou divulgar conversas gravadas no âmbito de um processo judicial (logo, judicialmente validadas). Se sim, segundo FC, a reacção adequada será... não reagir. E sobretudo não rir.
Havendo crime no acesso e divulgação de escutas legalmente operadas e mantidas num processo, cabe ao MP e aos escutados processar em justiça os criminosos. Mas essa actuação, necessariamente a posteriori, não impede a produção de efeitos da divulgação das escutas: e o seu conteúdo pode ser relevante, ou não, do ponto de vista do interesse público, além dos interesses pessoais eventualmente afectados.
É por isso que os escutados podem/devem reagir, desde logo desmentindo a transcrição, se a conversa não existiu ou foi reproduzida com distorções.
E porque deverão terceiros eventualmente afectados, de algum modo, pelas escutas publicadas, ficar mudos e quedos? Será que se forem publicadas ilegalmente transcrições de conversas escutadas no âmbito de um processo judicial onde, por hipótese, alguém maldosamente atribua a FC ignomínias diversas, poderemos esperar dela o mais olímpico silêncio?
Eu, perante um conversa escutada no âmbito do processo "Face Oculta" e publicada, optei por desvalorizar o seu teor, rindo. Ri do conteúdo de uma conversa que não foi desmentida. E não estava desprevenida quando disse a jornalistas que reagira à gargalhada. Nem os questionei sobre como tinham obtido a transcrição, pois presumi que sabiam dela tal como eu - fora publicada num jornal.
Rir do teor da conversa não significa, sublinho, que eu menospreze a ilegalidade da publicação.
2. Pergunta FC: "O que é que tanto a revoltou na utilização das escutas contra a direcção Ferro Rodrigues? o principio da coisa, a violação do estado de direito, o crime, a compressão dos direitos fundamentais, o jornalismo de sarjeta?"
Tudo isso, mais o facto dos acusados na praça pública não poderem defender-se, por nem sequer conhecerem que eventuais acusações a justiça tinha contra eles - e, afinal, não tinha.
No caso concreto das escutas do processo Casa Pia publicadas em 2003 e 2004, foi orquestrada uma manobra para difamar dirigentes do PS - e o PS - implicando magistrados e agentes da justiça, incluindo um director da PJ, que passavam a jornalistas informação em segredo de justiça que, veio a verificar-se, não ter relevância para efeitos criminais.
Independentemente da revolta (que partilhei) com ilegalidade da publicação de escutas de conversas, os visados não se escusaram a desmentir as fabricações e as interpretações tendenciosas e malévolas que os media veiculavam, protestando repetidamente a sua inocência. O facto de o acesso às escutas e a sua reprodução pública ser ilegal não os demoveu de se pronunciarem sobre o seu conteúdo.
3. FC incita-me a identificar os protagonistas das escutas a que me refiro no final do meu post: são Rui Pereira, Ministro da Administração Interna, e Abel Pinheiro, arguido no processo "Portucale". (Curioso que, depois de tantos anos, o processo "Portucale" ainda não tenha sequer chegado a julgamento, não é?....)
Diz, a propósito, FC que eu procurei justificar "ter legitimado publicamente a devassa de uma conversa sem qualquer interesse criminal ou informativo". Não, eu não justifiquei, nem legitimo nenhuma devassa. Mas isso não me impede de apreciar o impacto da mesma, se o resultado é tornado público, legal ou ilegalmente.
E no caso concreto, a publicação das escutas de conversas entre aqueles dois personagens que tratavam de se aproveitar do Estado para engendrar nomeações e traficar favores políticos ou pessoais (que podiam até frustrar o curso da justiça), elucidou os portugueses sobre a sua ética e as relações ocultas que mantinham.
Os ditos personagens não contestaram publicamente a veracidade das conversas transcritas. Do meu ponto de vista, o interesse público acabou por ser servido pela publicação, ainda que à partida esta tenha violado a letra da lei. Tanto mais que um dos intervenientes se tornara entretanto ministro (e mantém-se...).
4. Eu não defendo que "em certas circunstâncias, o jornalismo pode e deve infringir a lei e divulgar escutas", como me imputa FC.
Mas é inegável que o interesse público pode ser causa de exclusão da ilicitude da divulgação de conversas privadas. Se um interesse público maior que a defesa da privacidade estiver em causa - por exemplo, para desmascarar um corrupto, um traficante de influências, um ladrão - ainda que os factos expostos só por si não constituam crime. E não é esse o B-A-BA do jornalismo, a equação deontológica que os jornalistas têm que fazer quase diariamente, pergunto eu a FC que é jornalista?
5. É grotesco o paralelismo que FC faz com a justificação da tortura: a publicação de escutas pode envolver crime, mas nem sempre; e pode ter justificação no interesse público. A segunda constitui sempre crime e nunca é justificável por qualquer interesse publico ou privado, até por não ser eficaz - quem é torturado pode "confessar" o que for preciso, mesmo sem nenhuma sustentação. As transcrições de conversas gravadas no âmbito de uma investigação judicial, ainda que legal ou ilegalmente mantidas no processo ou divulgadas, têm de ter suporte da sua fidedignidade.
Em conclusão: porque se incomoda tanto FC com uma gargalhada, vinda de uma das pessoas que é afectada pela divulgação duma escuta em particular?
1. FC questiona a legitimidade de determinadas escutas estarem num determinado processo judicial - questão a que nem eu, nem ela, poderemos responder sem ter acesso ao processo, e que, em última análise, só poderá ser esclarecida e derimida em sede judicial.
Sustenta FC que eu devia ralar-me "em saber como é que o jornalista teve acesso as ditas conversas, e, estando gravadas, quem as teria e com que legitimidade gravado e transcrito e colocado num sitio em que estivessem acessíveis a jornalistas". Para FC o essencial é, portanto, se o jornalista praticou um crime ao aceder ou divulgar conversas gravadas no âmbito de um processo judicial (logo, judicialmente validadas). Se sim, segundo FC, a reacção adequada será... não reagir. E sobretudo não rir.
Havendo crime no acesso e divulgação de escutas legalmente operadas e mantidas num processo, cabe ao MP e aos escutados processar em justiça os criminosos. Mas essa actuação, necessariamente a posteriori, não impede a produção de efeitos da divulgação das escutas: e o seu conteúdo pode ser relevante, ou não, do ponto de vista do interesse público, além dos interesses pessoais eventualmente afectados.
É por isso que os escutados podem/devem reagir, desde logo desmentindo a transcrição, se a conversa não existiu ou foi reproduzida com distorções.
E porque deverão terceiros eventualmente afectados, de algum modo, pelas escutas publicadas, ficar mudos e quedos? Será que se forem publicadas ilegalmente transcrições de conversas escutadas no âmbito de um processo judicial onde, por hipótese, alguém maldosamente atribua a FC ignomínias diversas, poderemos esperar dela o mais olímpico silêncio?
Eu, perante um conversa escutada no âmbito do processo "Face Oculta" e publicada, optei por desvalorizar o seu teor, rindo. Ri do conteúdo de uma conversa que não foi desmentida. E não estava desprevenida quando disse a jornalistas que reagira à gargalhada. Nem os questionei sobre como tinham obtido a transcrição, pois presumi que sabiam dela tal como eu - fora publicada num jornal.
Rir do teor da conversa não significa, sublinho, que eu menospreze a ilegalidade da publicação.
2. Pergunta FC: "O que é que tanto a revoltou na utilização das escutas contra a direcção Ferro Rodrigues? o principio da coisa, a violação do estado de direito, o crime, a compressão dos direitos fundamentais, o jornalismo de sarjeta?"
Tudo isso, mais o facto dos acusados na praça pública não poderem defender-se, por nem sequer conhecerem que eventuais acusações a justiça tinha contra eles - e, afinal, não tinha.
No caso concreto das escutas do processo Casa Pia publicadas em 2003 e 2004, foi orquestrada uma manobra para difamar dirigentes do PS - e o PS - implicando magistrados e agentes da justiça, incluindo um director da PJ, que passavam a jornalistas informação em segredo de justiça que, veio a verificar-se, não ter relevância para efeitos criminais.
Independentemente da revolta (que partilhei) com ilegalidade da publicação de escutas de conversas, os visados não se escusaram a desmentir as fabricações e as interpretações tendenciosas e malévolas que os media veiculavam, protestando repetidamente a sua inocência. O facto de o acesso às escutas e a sua reprodução pública ser ilegal não os demoveu de se pronunciarem sobre o seu conteúdo.
3. FC incita-me a identificar os protagonistas das escutas a que me refiro no final do meu post: são Rui Pereira, Ministro da Administração Interna, e Abel Pinheiro, arguido no processo "Portucale". (Curioso que, depois de tantos anos, o processo "Portucale" ainda não tenha sequer chegado a julgamento, não é?....)
Diz, a propósito, FC que eu procurei justificar "ter legitimado publicamente a devassa de uma conversa sem qualquer interesse criminal ou informativo". Não, eu não justifiquei, nem legitimo nenhuma devassa. Mas isso não me impede de apreciar o impacto da mesma, se o resultado é tornado público, legal ou ilegalmente.
E no caso concreto, a publicação das escutas de conversas entre aqueles dois personagens que tratavam de se aproveitar do Estado para engendrar nomeações e traficar favores políticos ou pessoais (que podiam até frustrar o curso da justiça), elucidou os portugueses sobre a sua ética e as relações ocultas que mantinham.
Os ditos personagens não contestaram publicamente a veracidade das conversas transcritas. Do meu ponto de vista, o interesse público acabou por ser servido pela publicação, ainda que à partida esta tenha violado a letra da lei. Tanto mais que um dos intervenientes se tornara entretanto ministro (e mantém-se...).
4. Eu não defendo que "em certas circunstâncias, o jornalismo pode e deve infringir a lei e divulgar escutas", como me imputa FC.
Mas é inegável que o interesse público pode ser causa de exclusão da ilicitude da divulgação de conversas privadas. Se um interesse público maior que a defesa da privacidade estiver em causa - por exemplo, para desmascarar um corrupto, um traficante de influências, um ladrão - ainda que os factos expostos só por si não constituam crime. E não é esse o B-A-BA do jornalismo, a equação deontológica que os jornalistas têm que fazer quase diariamente, pergunto eu a FC que é jornalista?
5. É grotesco o paralelismo que FC faz com a justificação da tortura: a publicação de escutas pode envolver crime, mas nem sempre; e pode ter justificação no interesse público. A segunda constitui sempre crime e nunca é justificável por qualquer interesse publico ou privado, até por não ser eficaz - quem é torturado pode "confessar" o que for preciso, mesmo sem nenhuma sustentação. As transcrições de conversas gravadas no âmbito de uma investigação judicial, ainda que legal ou ilegalmente mantidas no processo ou divulgadas, têm de ter suporte da sua fidedignidade.
Em conclusão: porque se incomoda tanto FC com uma gargalhada, vinda de uma das pessoas que é afectada pela divulgação duma escuta em particular?
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
Jornalismo sectário
O que é que leva o diretor do Expresso a apontar-me na sua coluna como alvo selectivo da sua ira contra os que contestam uma coligação de governo entre o PS e o PSD no quadro da atual legislatura, quando tantos outros comentadores tomaram a mesma posição, incluindo vários dos colunistas daquele semanário na mesma edição de sábado passado?
Sucede que defendi essa opinião com vários argumentos que, mal ou bem, deviam ser contestados antes da condenação daquela. Pelos vistos, há quem pense que opiniões "más" nunca podem ser sustentadas com bons argumentos.
Desconsiderando o tom pessoalmente ofensivo (não ofende quem quer…), o diretor do Expresso parece entender que quem, como eu, perdeu as eleições europeias há dois anos, deixa de ter legitimidade ou autoridade para emitir opiniões políticas. Não sei se pensa o mesmo de todos os políticos que perderam eleições por números expressivos, como por exemplo, Mario Soares há cinco anos.
Seja como for, pertenço a uma escola que pensa que os argumentos devem ser avaliados, não em função de quem os produz mas em função do seu mérito ou demérito próprio. Há quem entenda, porém, que o que deve valer são os argumentos “ad hominem”…
Sucede que defendi essa opinião com vários argumentos que, mal ou bem, deviam ser contestados antes da condenação daquela. Pelos vistos, há quem pense que opiniões "más" nunca podem ser sustentadas com bons argumentos.
Desconsiderando o tom pessoalmente ofensivo (não ofende quem quer…), o diretor do Expresso parece entender que quem, como eu, perdeu as eleições europeias há dois anos, deixa de ter legitimidade ou autoridade para emitir opiniões políticas. Não sei se pensa o mesmo de todos os políticos que perderam eleições por números expressivos, como por exemplo, Mario Soares há cinco anos.
Seja como for, pertenço a uma escola que pensa que os argumentos devem ser avaliados, não em função de quem os produz mas em função do seu mérito ou demérito próprio. Há quem entenda, porém, que o que deve valer são os argumentos “ad hominem”…
domingo, 21 de novembro de 2010
Gostaria de ter dito isto
«A mim, o que me choca, é que representa da parte da Assembleia da República uma grande irresponsabilidade, na perspectiva da solidariedade nacional”, disse o constitucionalista, referindo-se ao facto de as alterações à lei que regula o financiamento partidário incluírem uma norma interpretativa e com efeitos retroactivos. Devido à existência dessa norma, os cerca de 24 milhões de euros que a Assembleia Legislativa madeirense deveria devolver ao Estado português serão esquecidos.»
(Jorge Miranda, aqui)
(Jorge Miranda, aqui)
Amado ...ma non troppo
Estou enternecida com tanto encómio da direita ao MENE Luis Amado, que muito se tem esfalfado pela projecção internacional do país - na semana passada, na reunião do Grupo Socialista do PE em Budapeste, não sei quanta gente me veio perguntar que história era essa de Portugal ir sair do Euro, invocando declarações do Ministro...
Só não compreendo é que haja quem empreste a Luis Amado o desígnio de vir a chefiar a tal grande coligação de salvação nacional que ele preconiza. No MNE sabe-se como se especializou em tomar aviões para não ter de tomar decisões. E o próprio confessa estar "saturado" e disponível para ceder o seu lugar no Governo. Só por maldade, alguém o quererá empurrar para as rédeas do poder em S. Bento.
Só não compreendo é que haja quem empreste a Luis Amado o desígnio de vir a chefiar a tal grande coligação de salvação nacional que ele preconiza. No MNE sabe-se como se especializou em tomar aviões para não ter de tomar decisões. E o próprio confessa estar "saturado" e disponível para ceder o seu lugar no Governo. Só por maldade, alguém o quererá empurrar para as rédeas do poder em S. Bento.
Cimeira da NATO - blindagem organizativa
A Cimeira da NATO correu impecavelmente.
O país mostrou, mais uma vez, que sabe organizar. Como alguém disse, falta mostrar que se sabe organizar.
Fez bem o Primeiro Ministro em correr a agradecer à PSP o esforço organizativo que garantiu a segurança da Cimeira. Ainda mais notável quanto falharam os esperados blindados - que afinal não fizeram falta nenhuma.
Mostrar que o país se sabe organizar implica agora não passar uma esponja pelo que falhou.
Convem que se apure quem foi responsável pelo falhanço dos blindados: quem decidiu encomendar, quando, como, porquê, havendo a possibilidade de os pedir emprestados à GNR. Como os vamos pagar e a quem, através de que engenharia financeira?
Mostrar que o país se sabe organizar implica que alguém assuma responsabilidades no MAI.
Implica não continuarmos a blindar a irresponsabilidade.
O país mostrou, mais uma vez, que sabe organizar. Como alguém disse, falta mostrar que se sabe organizar.
Fez bem o Primeiro Ministro em correr a agradecer à PSP o esforço organizativo que garantiu a segurança da Cimeira. Ainda mais notável quanto falharam os esperados blindados - que afinal não fizeram falta nenhuma.
Mostrar que o país se sabe organizar implica agora não passar uma esponja pelo que falhou.
Convem que se apure quem foi responsável pelo falhanço dos blindados: quem decidiu encomendar, quando, como, porquê, havendo a possibilidade de os pedir emprestados à GNR. Como os vamos pagar e a quem, através de que engenharia financeira?
Mostrar que o país se sabe organizar implica que alguém assuma responsabilidades no MAI.
Implica não continuarmos a blindar a irresponsabilidade.
Bonomia e poderes ocultos
No DN e no “Jugular” de anteontem, a jornalista Fernanda Câncio acusa-me de “bonomia” assistindo à edificação de um “totalitarismo que estabelece o sistema judicial como centro do poder - um poder insindicado e insindicável, que recusa qualquer questionamento como "interferência" e "pressão" - e o jornalismo como o seu braço armado” a propósito de uma “escuta sem critério e a reprodução mercantil de conversas privadas”.
Isto porque respondi a jornalistas ter reagido “à gargalhada” à transcrição de uma conversa telefónica entre Edite Estrela e Armando Vara que se encontrará no processo «Face Oculta» e que o “CM” divulgou.
Não sei porque Fernanda Câncio toma a nuvem por Juno: eu não ri da transcrição da escuta – não tive acesso ao processo, não sei se a escuta se justifica no quadro da investigação, não sei se estamos perante uma “reprodução mercantil” e sobretudo não julgo que a divulgação daquela conversa tenha interesse informativo para o público – pelo menos eu não fiquei a saber nada de novo. Eu ri, evidentemente, do conteúdo da transcrição - que, em parte, me dizia respeito.
Fernanda Câncio não tem razão quando me acusa de “bonomia” face à aliança de poderes judiciais com jornalistas para intrumentalizar a transcrição de conversas privadas registadas em escutas judiciais. Esquece que eu pertenci à direcção do PS - a de Ferro Rodrigues - que foi miseravelmente atacada pela orquestração perversa de instâncias judiciais com jornalismo de sarjeta (e não era só nos tabloides). E que protestei o mais que pude – quando muitos e muitas, cautelosa e calculisticamente, calaram...
Não me calei então, nem me calo hoje. Mas sei distinguir entre o que é fabricação caluniosa – e deve ser desmentido e desmascarado como tal. E o que, sendo abusivo e porventura até criminososo na divulgação, não é desmentido ... porque não é desmentível.
Lembra-me a revelação de outras escutas num outro processo judicial, sobre as diligências empreendidas por um próximo do PS, em 2005, junto de responsáveis do CDS-PP, para conseguir trepar a uma magistratura de topo, e dos favores de vasculhagem policial que se prestava a fazer em troca. Afirmei publicamente a minha incredulidade, pedi que tão graves acusações fossem desmentidas. Qual quê? Até hoje... e o homem lá está, em magistratura de topo, ao lado. Não sei se a escuta judicial foi feita com critério, nem se o processo já estava fora do segredo de justiça quando as conversas foram divulgadas, nem se a transcrição na imprensa poderia ser sindicada como violadora da privacidade. Sei que nunca foi desmentida. E que, graças à publicação, ficamos elucidados sobre o carácter do político e seus ocultos concluios. E de quem lhos apara. O jornalismo, neste caso, cumpriu a sua função.
Isto porque respondi a jornalistas ter reagido “à gargalhada” à transcrição de uma conversa telefónica entre Edite Estrela e Armando Vara que se encontrará no processo «Face Oculta» e que o “CM” divulgou.
Não sei porque Fernanda Câncio toma a nuvem por Juno: eu não ri da transcrição da escuta – não tive acesso ao processo, não sei se a escuta se justifica no quadro da investigação, não sei se estamos perante uma “reprodução mercantil” e sobretudo não julgo que a divulgação daquela conversa tenha interesse informativo para o público – pelo menos eu não fiquei a saber nada de novo. Eu ri, evidentemente, do conteúdo da transcrição - que, em parte, me dizia respeito.
Fernanda Câncio não tem razão quando me acusa de “bonomia” face à aliança de poderes judiciais com jornalistas para intrumentalizar a transcrição de conversas privadas registadas em escutas judiciais. Esquece que eu pertenci à direcção do PS - a de Ferro Rodrigues - que foi miseravelmente atacada pela orquestração perversa de instâncias judiciais com jornalismo de sarjeta (e não era só nos tabloides). E que protestei o mais que pude – quando muitos e muitas, cautelosa e calculisticamente, calaram...
Não me calei então, nem me calo hoje. Mas sei distinguir entre o que é fabricação caluniosa – e deve ser desmentido e desmascarado como tal. E o que, sendo abusivo e porventura até criminososo na divulgação, não é desmentido ... porque não é desmentível.
Lembra-me a revelação de outras escutas num outro processo judicial, sobre as diligências empreendidas por um próximo do PS, em 2005, junto de responsáveis do CDS-PP, para conseguir trepar a uma magistratura de topo, e dos favores de vasculhagem policial que se prestava a fazer em troca. Afirmei publicamente a minha incredulidade, pedi que tão graves acusações fossem desmentidas. Qual quê? Até hoje... e o homem lá está, em magistratura de topo, ao lado. Não sei se a escuta judicial foi feita com critério, nem se o processo já estava fora do segredo de justiça quando as conversas foram divulgadas, nem se a transcrição na imprensa poderia ser sindicada como violadora da privacidade. Sei que nunca foi desmentida. E que, graças à publicação, ficamos elucidados sobre o carácter do político e seus ocultos concluios. E de quem lhos apara. O jornalismo, neste caso, cumpriu a sua função.
quarta-feira, 17 de novembro de 2010
Lucubrações funestas
Depois de o PSD ter anunciado repetidamente a sua intenção de abrir uma crise política algures no próximo ano, com o objectivo de derrubar o governo do PS e interromper a actual legislatura, não têm faltado as mais imaginosas ideias por parte de outros quadrantes políticos, incluindo dentro do PS, para alterar a actual fórmula governativa, sem recurso a eleições antecipadas e sem afastar o PS do Governo. Sendo todas manifestamente irrealistas ou descabidas no actual quadro político, todas contribuem porém para alimentar um clima de incerteza e instabilidade política, que só pode perturbar a consolidação orçamental em curso e os interesses financeiros do país.
[Continua aqui]
[Continua aqui]
Estão a mangar connosco
«Madeira reclama mais 44 milhões de euros do OE 2011)».
Tendo já um rendimento per capita superior à média nacional, a Madeira deveria ser contribuinte líquido do orçamento nacional. Pelo contrário, além de nem sequer contribuir para as despesas gerais da República -- que correm exclusivamente à conta dos contribuintes do Continente -, ainda beneficia de chorudas transferências do orçamento do Estado, a vários títulos. Agora, apesar das dificuldades orçamentais do País, continua a querer mais e mais dinheiro.
Uma verdadeira provocação!
Tendo já um rendimento per capita superior à média nacional, a Madeira deveria ser contribuinte líquido do orçamento nacional. Pelo contrário, além de nem sequer contribuir para as despesas gerais da República -- que correm exclusivamente à conta dos contribuintes do Continente -, ainda beneficia de chorudas transferências do orçamento do Estado, a vários títulos. Agora, apesar das dificuldades orçamentais do País, continua a querer mais e mais dinheiro.
Uma verdadeira provocação!
terça-feira, 16 de novembro de 2010
O diabo está nos títulos
O Público titula que «Um quarto dos consumidores espera estar pior em 2011 do que 2010».
Isso que dizer que três quartos dos consumidores portugueses não têm essa opinião. Então, não seria mais curial titular a peça da seguinte forma: «Só um quarto dos consumidores espera estar pior em 2011 do que 2010»?
Imagine-se que o resultado do inquérito era o inverso. Alguém duvida de que o título da notícia não seria «Um quarto dos consumidores não espera estar pior em 2011 do que em 2010»?
Isso que dizer que três quartos dos consumidores portugueses não têm essa opinião. Então, não seria mais curial titular a peça da seguinte forma: «Só um quarto dos consumidores espera estar pior em 2011 do que 2010»?
Imagine-se que o resultado do inquérito era o inverso. Alguém duvida de que o título da notícia não seria «Um quarto dos consumidores não espera estar pior em 2011 do que em 2010»?
segunda-feira, 15 de novembro de 2010
Externalidades positivas
O fim das auto-estradas SCUT não trouxe somente o fim de um privilégio territorial, bem como a sustentabilidade financeira do sistema rodoviário nacional. Pelos vistos, trouxe também um desvio de utentes para os transportes públicos, como o metro do Porto -- que bem precisa de mais procura para minorar o seu grave défice financeiro --, com a inerente diminuição da pressão automóvel nos acessos urbanos. Embora possa ser um efeito passageiro, não é desprezível.
Corrigenda
A imprensa continua imputar-me eu ter defendido a saída de Teixeira dos Santos. Mas não é bem assim. Defendi, sim (primeiro aqui, depois aqui), uma mexida no Governo, logo depois da aprovação do orçamento, por razões essencialmente políticas. Não mencionei, porém, nenhum ministro nem nenhum departamento ministerial.
Houve quem entendesse ver aí alvos precisos (aliás diferentes, consoante a especulação), mas por sua conta e risco. Tenho obviamente uma ideia sobre o que deveria ser tal remodelação, mas não tive a estultícia de a exprimir publicamente. Cabe ao primeiro-ministro escolher a sua equipa...
Houve quem entendesse ver aí alvos precisos (aliás diferentes, consoante a especulação), mas por sua conta e risco. Tenho obviamente uma ideia sobre o que deveria ser tal remodelação, mas não tive a estultícia de a exprimir publicamente. Cabe ao primeiro-ministro escolher a sua equipa...
Do "milagre" à humilhação
Pode estar iminente o recurso da Irlanda ao mecanismo de resgate financeiro da UE.
Sendo, de longe (depois a Grécia), o país da UE em maiores dificuldades orçamentais, a Irlanda tem ainda um gravíssimo problema com a debilidade do sistema bancário nacional, que o Estado teve de apoiar maciçamente agravando o défice orçamental.
De modelo que era para os economistas neoliberais -- que incensavam o milagre económico irlandês, baseado no investimento estrangeiro e em baixos impostos sobre os negócios --, a Irlanda vê-se à beira da humilhação de pedir ajuda financeira externa.
Sendo, de longe (depois a Grécia), o país da UE em maiores dificuldades orçamentais, a Irlanda tem ainda um gravíssimo problema com a debilidade do sistema bancário nacional, que o Estado teve de apoiar maciçamente agravando o défice orçamental.
De modelo que era para os economistas neoliberais -- que incensavam o milagre económico irlandês, baseado no investimento estrangeiro e em baixos impostos sobre os negócios --, a Irlanda vê-se à beira da humilhação de pedir ajuda financeira externa.
Mega-imposturas
«No passado dia 6, uma multidão de manifestantes convocados pela Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública desfilou em Lisboa, entre o Marquês de Pombal e os Restauradores, em protesto contra os cortes salariais e outras medidas de austeridade anunciadas pelo Governo e apoiadas pelo principal partido da oposição. E que multidão foi essa? 100.000 pessoas, disseram os organizadores, e repetiu grande parte da comunicação social, participaram na marcha, descrita como uma espécie de ensaio de mobilização para a greve geral marcada para o próximo dia 24.
Ao contrário do que aconteceu em ocasiões semelhantes, desta vez não se conheceram estimativas da polícia. Em contrapartida, uma equipa dirigida por Steve Doig, professor da Universidade do Arizona actualmente a leccionar um mestrado de Jornalismo na Universidade Nova de Lisboa, saiu para o terreno para fazer o que nenhum jornal fizera antes: contar os manifestantes. Não mobilizou para isso grandes meios: alguns dos seus alunos fizeram contagens ao longo do percurso da marcha, algumas fotografias foram feitas a partir de um ponto elevado na zona dos Restauradores e foi medido o espaço em que decorreu o comício final. Resultado: uma estimativa de 8000 a 10.000 participantes no desfile, e cerca de 5000 concentrados nos Restauradores.»
(Da crónica do Provedor do Leitor do Público, de ontem)Já se sabia que os números de manifestantes fornecidos pelos próprios são sempre empolados, Só não se sabia que não tinham nada a ver com a realidade. Agora ficamos a saber que temos de dividir os números por 10 ou 20 para alcançar os números reais.
Afinal, as "megamanifestações" não passam de mega-imposturas. Quase sempre com a cumplicidade da imprensa...
sábado, 13 de novembro de 2010
Outras paragens
Como habitualmente, coligi na Aba da Causa os meus artigos das últimas semanas no Público, incluindo o desta semana sobre a "ameaça da crise", que inclui a defesa de uma remodelação governamntal logo após a aprovação do orçamento, sendo todavia de sublinhar que eu não mencionei nenhum ministério em especial, sendo a especulação sobre isso da exclusiva responsabilidade dos comentadores.
Coligação
O Ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, veio defender a solução de um governo de coligação -- que na nossa geografia política só poderia ser entre o PS e o PSD --, de modo a enfrentar os graves problemas orçamentais e económicos que a crise internacional trouxe ao País. Não há surpresa nesta posição, tendo em conta as posições do autor a este respeito desde há muito. Todavia, uma coligação de governo entre o PS e o PSD é tão improvável e tão problemática hoje como era antes da crise.
Primeiro, a deriva neoliberal do PSD de Passos Coelho dificulta enormemente qualquer entendimento sobre o modo como resolver as dificuldades orçamentais e económicas do País. Segundo, uma coligação de governo entre os dois partidos centrais do espectro partidário só alimentaria a contestação social e política das medidas de austeridade por parte da esquerda radical. Terceiro, não se vê como poderia haver uma tal coligação sem novas eleições e sem mudança de liderança num dos partidos em causa (ou em ambos). Quarto, como mostrou a experiência de governo de bloco central de 1983-85, quem depois paga politicamente o seu preço político é o PS...
Primeiro, a deriva neoliberal do PSD de Passos Coelho dificulta enormemente qualquer entendimento sobre o modo como resolver as dificuldades orçamentais e económicas do País. Segundo, uma coligação de governo entre os dois partidos centrais do espectro partidário só alimentaria a contestação social e política das medidas de austeridade por parte da esquerda radical. Terceiro, não se vê como poderia haver uma tal coligação sem novas eleições e sem mudança de liderança num dos partidos em causa (ou em ambos). Quarto, como mostrou a experiência de governo de bloco central de 1983-85, quem depois paga politicamente o seu preço político é o PS...
Tonteria
O Público de hoje diz que há quem no PS esteja a laborar num projecto de novo governo do PS sem Sócrates, que pudesse beneficiar do apoio parlamentar do PSD, numa espécie de governo de bloco central apócrifo a cargo do PS.
Se não se trata de pura invenção jornalística, a hipótese carece de um mínimo de sentido. Primeiro, seria necessário que Sócrates aceitasse ser imolado em benefício de tal elucubração "patriótica". Segundo, quem escolhe a solução governativa em caso de crise governamental é o Presidente da República e não o partido que tinha o Governo, não sendo provável que Cavaco Silva aceitasse tal "negócio". Terceiro, como mostrou o Governo Santana Lopes, um primeiro-ministro que não tenha uma legitimidade eleitoral directa padece de um défice de legitimidade e de autoridade política. Quarto, é evidente que o PSD não se conformaria com o papel de "pau de cabeleira" de um governo PS II, a não ser para fazer o "trabalho sujo" em seu proveito.
Por isso, a referida hipótese não passa de uma tonteria política. Sem novas eleições, não há alternativa PS ao actual governo do PS. Os que no PS pensam em tirar o tapete a Sócrates, "fazem a cama" ao governo do PS. O PSD agradece.
Se não se trata de pura invenção jornalística, a hipótese carece de um mínimo de sentido. Primeiro, seria necessário que Sócrates aceitasse ser imolado em benefício de tal elucubração "patriótica". Segundo, quem escolhe a solução governativa em caso de crise governamental é o Presidente da República e não o partido que tinha o Governo, não sendo provável que Cavaco Silva aceitasse tal "negócio". Terceiro, como mostrou o Governo Santana Lopes, um primeiro-ministro que não tenha uma legitimidade eleitoral directa padece de um défice de legitimidade e de autoridade política. Quarto, é evidente que o PSD não se conformaria com o papel de "pau de cabeleira" de um governo PS II, a não ser para fazer o "trabalho sujo" em seu proveito.
Por isso, a referida hipótese não passa de uma tonteria política. Sem novas eleições, não há alternativa PS ao actual governo do PS. Os que no PS pensam em tirar o tapete a Sócrates, "fazem a cama" ao governo do PS. O PSD agradece.
Um pouco mais de seriedade sff
Se os dados do crescimento económico fossem negativos, a culpa era obviamente do Governo. Como são positivos, mercê do dinamismo das exportações, o mérito é... das empresas exportadoras!
Assim vai o debate politico e jornalístico entre nós!
Assim vai o debate politico e jornalístico entre nós!
sexta-feira, 12 de novembro de 2010
Boas notícias
Os dados sobre o crescimento económico no 3º trimestre, bem acima do previsto, são indubitavelmente boas notícias, contribuindo não somente para aliviar a pressão nos mercados financeiros sobre os juros da dívida mas também para dar mais confiança sobre a execução orçamental.
Como boas notícias não são notícias, os media, que fizeram sucessivas manchetes com as más notícias, farão tudo para ignorar estas...
Como boas notícias não são notícias, os media, que fizeram sucessivas manchetes com as más notícias, farão tudo para ignorar estas...
quinta-feira, 11 de novembro de 2010
Pior a emenda...
Foi anunciado que o Governo tenciona tornar facultativo o subsistema de saúde privativo dos funcionários públicos, a ADSE, e reduzir a sua cobertura, de modo a atenuar o custo orçamental do sistema. Trata-se de uma mudança de paradigma, que todavia pode ter resultados contrários aos pretendidos.
Passando a ser facultativo, quem vai abandonar o sistema e deixar de contribuir financeiramente para ele são as pessoas jovens e saudáveis, que pouco utilizavam os serviços disponibilizados, sendo portanto "contribuintes líquidos". Ao invés, permanecerão no sistema as pessoas que esperam utilizar mais intensamente o serviço. O défice financeiro pode por isso ser mais pesado do que anteriormente...
A não ser que o montante das contribuições seja substancialmente aumentado, de modo a tornar o sistema financeiramente auto-sustentado, como sempre deveria ser, sobretudo em tempos de austeridade orçamental.
Resta obviamente sempre a questão de saber que sentido faz o Estado suportar financeiramente, ao lado do SNS, de cobertura universal, um subsistema privativo para o pessoal do sector público administrativo...
Passando a ser facultativo, quem vai abandonar o sistema e deixar de contribuir financeiramente para ele são as pessoas jovens e saudáveis, que pouco utilizavam os serviços disponibilizados, sendo portanto "contribuintes líquidos". Ao invés, permanecerão no sistema as pessoas que esperam utilizar mais intensamente o serviço. O défice financeiro pode por isso ser mais pesado do que anteriormente...
A não ser que o montante das contribuições seja substancialmente aumentado, de modo a tornar o sistema financeiramente auto-sustentado, como sempre deveria ser, sobretudo em tempos de austeridade orçamental.
Resta obviamente sempre a questão de saber que sentido faz o Estado suportar financeiramente, ao lado do SNS, de cobertura universal, um subsistema privativo para o pessoal do sector público administrativo...
Sem escrúpulos
Vejo Francisno Louçã exibir na televisão dois bilhetes de comboio, alegadamente para duas viagens de distância igual, um da CP e outro da Fertagus, mas com preços muito diferentes, sendo o da CP muito mais barato. Conclusão do líder do BE: a empresa pública leva a melhor sobre a privada, pelo que deve ser afastada a privatização do transporte ferroviário.
O que Louça não disse foi que os preços da CP ficam longe de pagar os custos e são suportados pelo enorme endividamento da empresa. E também não referiu quanto custam os encargos dessa dívida, que acabarão por recair sobre o orçamento do Estado. Decididamente, não há limites nem escrúpulos no discurso demogógico do BE.
O que Louça não disse foi que os preços da CP ficam longe de pagar os custos e são suportados pelo enorme endividamento da empresa. E também não referiu quanto custam os encargos dessa dívida, que acabarão por recair sobre o orçamento do Estado. Decididamente, não há limites nem escrúpulos no discurso demogógico do BE.
quarta-feira, 10 de novembro de 2010
Sahara Ocidental - lembrança de Timor Leste
19 mortos, mais de 720 feridos e mais de 150 desaparecidos - é, segundo as agências noticiosas, o resultado do mais recente brutal ataque das forças marroquinas para desmantelar o acampamento de protesto Gadaym Izik, montado há um mês na capital dos territórios ocupados do Sahara Ocidental como forma de protesto por parte dos saharauis contra as suas condições de vida.
Para além de uma campanha massiva de detenções, há relatos de que na capital El Aaiún estarão a aparecer pelas ruas corpos degolados e cadáveres baleados (incluindo de crianças) - um método bárbaro para espalhar o terror.
Este ataque é facada nas negociações sobre a disputa territorial, que estavam em curso, sob a égide da ONU, em Manhasset (NY).
Tudo lembra Timor Leste nos tempos mais duros dos anos 80 e 90: conversações em curso e ataques contra a população, frustando as negociações. E europeus hipocritamente distraídos e silenciosos...
A Espanha devia ser advogada da antiga colónia que abandonou (como Portugal fez relativamente a Timor Leste, assinalou em Lisboa a activista saharaui Aminetou Haidar). Mas não é: põe cara condoída e espera que passe a onda, para não comprometer os negócios e outras relações com Marrocos. Diz a imprensa espanhola que Madrid foi avisada do ataque... Da negligência à cumplicidade, é um pulinho.
Em França, que tem particulares responsabilidades no respaldo político e no incentivo a Marrocos para que prossiga a ocupação, parece que se ouviu hoje a voz da má consciência do MNE Kouchner, porventura incomodado com a brutalidade marroquina. Mas da Sarkofrance só há a esperar que continue a fazer de Austrália relativamente ao Sahara (como Camberra, Paris só pulará para o comboio de qualquer entendimento quando ele já tiver partido da estação...)
E da Europa, desta Europa desnorteada, desmemoriada e de rasteira liderança? Faz de UE, pois claro: até ao ano passado Solana lavava as mãos do Sahara, invocando que o problema estava entregue à ONU; Ferrero-Waldner, candidamente, explicava que a UE estava bloqueada pela divisão entre Estados Membros - França, Espanha e mais uns poucos irredutíveis no apoio a Marrocos. O Tratado de Lisboa não fez ainda diferença nenhuma para a Europa se projectar no plano externo: ao mais alto nível da diplomacia europeia,a Alta Representante Catherine Ashton está conspicuamente muda e queda: nem sequer a mera declaração da praxe.
E de Portugal, o que dizer? Nem sequer faz de Vanuatu (que apoiava Timor dentro das suas possibilidades). Relativamente ao Sahara hoje escondemo-nos por detrás do silêncio da UE, fazendo jogo duplo com Marrocos e a Argélia. Os saharauis que não macem, pensará quem ainda pensar no andar ministerial nas Necessidades... Já esquecemos tudo o que aprendemos com Timor Leste. Solidariedade virou palavrão. Voltamos à "real politik" merceeira - decência e vistas largas são coisas de que já cá não gastamos. Para quem, como eu, continua socialista, custa ver abastardar assim a herança PS. Porque foi sobretudo a governação PS que, nos momentos-chave, fez a diferença por Timor Leste.
segunda-feira, 8 de novembro de 2010
Sindicalismo
Se os magistrados do Minuistário Público decidem comportar-se como qualquer outro grupo assalariado, juntando-se a greves gerais, como poderão protestar se o poder público resolver equipará-los aos trabalhadores da função pública em geral, procedendo à abolição do seu estatuto especial, incluindo no plano remuneratório?
Há profissões que não se dão conta que as suas prerrogativas e vantagens profissionais têm uma contrapartida...
Há profissões que não se dão conta que as suas prerrogativas e vantagens profissionais têm uma contrapartida...
Actos profissionais
Não percebo por que é que o branqueameno de dentes há-de ser vonsiderado um "acto médico", reservado a médicos.
Trata-se de corporativismo no seu melhor. Qualquer dia ainda hão-de considerar acto médico os actos de manicure e de pedicure!...
Trata-se de corporativismo no seu melhor. Qualquer dia ainda hão-de considerar acto médico os actos de manicure e de pedicure!...
sábado, 6 de novembro de 2010
Clericalismo
«Papa critica sentimento «agressivo» anticlerical em Espanha».
Mas a única agressividade verificada nas relações Igreja-Estado em Espanha nos últimos anos foi a da hierarquia reaccionária da igreja católica espanhola contra as leis aprovadas democraticamente com vista a ampliar a esfera de liberdade pessoal em matéria de matrimónio, divórcio e aborto. Deste modo, o Papa dá a sua bênção às posições "constatinianas" que defendem que os Estados têm de pautar o direito civil e penal pelos cânones católicos.
Definitivamente, apesar do "lip service" prestado ultimamente ao princípio da laicidade, o Vaticano continua a rejeitar a separação entre a esfera religiosa e a esfera secular e a autonomia do poder político face ao poder religioso.
Mas a única agressividade verificada nas relações Igreja-Estado em Espanha nos últimos anos foi a da hierarquia reaccionária da igreja católica espanhola contra as leis aprovadas democraticamente com vista a ampliar a esfera de liberdade pessoal em matéria de matrimónio, divórcio e aborto. Deste modo, o Papa dá a sua bênção às posições "constatinianas" que defendem que os Estados têm de pautar o direito civil e penal pelos cânones católicos.
Definitivamente, apesar do "lip service" prestado ultimamente ao princípio da laicidade, o Vaticano continua a rejeitar a separação entre a esfera religiosa e a esfera secular e a autonomia do poder político face ao poder religioso.
Visita do Presidente Hu Jintao a Portugal
Se eu tivesse assento na Assembleia da República, hoje não faltava.
Estava lá para receber o Presidente Hu Jintau, da República Popular da China.
Ordeiramente, civicamente, democraticamente.
Com estas duas fotografias em cima da mesa, bem visíveis por ele e por todos que o acompanham:
as de HU JIA, Prémio Sakharov em 2008;
e de LIU XIAOBO, Prémio Nobel da Paz em 2010;
ambos na prisão em Beijing.
Para homenagear a grande nação chinesa através de todos os seus cidadãos que se batem corajosamente contra a opressão, pelos direitos humanos e liberdades básicas.
E para recordar a todas as autoridades portuguesas que não há contratos e negócios que as possam fazer esquecer que esses direitos e liberdades, sendo universais e inerentes a qualquer ser humano, também são dos chineses e para os chineses.
Crise (2)
Ao prosseguir na sua obsessão por abrir uma crise política (ver post anterior) -- que vem desde o discurso de Passos Coelho no Verão passado --, o PSD continua apostado em afundar a confiança dos mercados financeiros externos no cumprimento das metas do saneamento orçamental por parte de Portugal. Quem é que pode dar por seguro esse cumprimento, se houver desconfiança fundada quando à estabilidade governativa do País nos próximos meses?
O PSD persiste em jogar tudo no incumprimento do orçamento (que ele próprio tornou quase impossível de cumprir...) e na abertura de uma crise orçamental a sério, que obrigue ao recurso ao FMI, como alavanca para chegar ao poder e para justificar a implementação do seu programa neoliberal de desmantelamento do Estado social, que por agora se viu forçado a amaciar...
[emendado]
O PSD persiste em jogar tudo no incumprimento do orçamento (que ele próprio tornou quase impossível de cumprir...) e na abertura de uma crise orçamental a sério, que obrigue ao recurso ao FMI, como alavanca para chegar ao poder e para justificar a implementação do seu programa neoliberal de desmantelamento do Estado social, que por agora se viu forçado a amaciar...
[emendado]
Crise (1)
Interpretando declarações da direcção laranja, o Sol assegura que «PSD abrirá crise depois das presidenciais».
Como se sabe, porém, para abrir uma crise politica não basta apresentar uma moção de censura, é preciso ganhá-la, com maioria absoluta, o que necessitaria dos votos dos partidos da extrema-esquerda (PCP e BE). Mas será que estes, por mais que hostilizem o PS, estarão na disposição de fazer o jogo da direita, sobretudo tendo em conta que muito provavelmente perderiam posições em eleições antecipadas?
O semanário não se dá ao trabalho de considerar este pequeno problema. Para alguns média a simples hipótese de uma crise política faz salivar. Nada melhor do que a bagunça política para vender papel...
Como se sabe, porém, para abrir uma crise politica não basta apresentar uma moção de censura, é preciso ganhá-la, com maioria absoluta, o que necessitaria dos votos dos partidos da extrema-esquerda (PCP e BE). Mas será que estes, por mais que hostilizem o PS, estarão na disposição de fazer o jogo da direita, sobretudo tendo em conta que muito provavelmente perderiam posições em eleições antecipadas?
O semanário não se dá ao trabalho de considerar este pequeno problema. Para alguns média a simples hipótese de uma crise política faz salivar. Nada melhor do que a bagunça política para vender papel...
Jornalismo assimétrico
Ontem o Público ocupava quase toda a primeira página com um chamativo gráfico da subida de juros da dívida pública portuguesa. Será que, quando os juros descerem (como se espera com a implementação das medidas de austeridade orçamental), o Público vai exibir na primeira página o respectivo gráfico com a mesma exuberância?!
Jornalismo sectário
Numa manchete delirante, porque inventada, o I de ontem titulava que o "FMI lamenta falência quase certa de Portugal". Ora, o que o FMI disse é que não há razões para a "aposta" dos mercados no incumprimento português.
Será que na manchete de hoje o tablóide vai corrigir a óbvia manipulação jornalística?
Adenda
Como se pode ver pela primeira página de hoje, nem sequer uma referência à contestação da manchete ontem mesmo feita pelo FMI. Assim vão a objectividade e a imparcialidade da imprensa entre nós...
Será que na manchete de hoje o tablóide vai corrigir a óbvia manipulação jornalística?
Adenda
Como se pode ver pela primeira página de hoje, nem sequer uma referência à contestação da manchete ontem mesmo feita pelo FMI. Assim vão a objectividade e a imparcialidade da imprensa entre nós...
sexta-feira, 5 de novembro de 2010
Mexer na equipa
Antes do Verão, contra as precipitadas sugestões da época, defendi que uma remodelação governamental nessa altura não se justificava e que o momento mais oportuno para isso se afigurava ser depois das eleições presidenciais, no próximo ano.
Dadas as novas circunstâncias, nomeadamente o agravamento da situação orçamental do Pais, modifico neste ponto a minha opinião. Face à necessidade absoluta de assegurar o cumprimento das duras metas do défice orçamental no próximo ano (ao contrário do que se passou este ano), penso que se justifica uma mexida a sério no governo imediatamente após a aprovação do orçamento, abrangendo os ministérios mais desgastados e financeiramente mais arriscados. Sócrates não pode permitir-se partir para o novo ciclo orçamental, muito mais exigente do que o do corrente ano, com a mesma equipa que ficou aquém das metas orçamentais deste ano (quando se exigia excedê-las...). E o País, também não.
É uma questão de credibilidade financeira interna e externa. Os mercados financeiros não perdoam.
Dadas as novas circunstâncias, nomeadamente o agravamento da situação orçamental do Pais, modifico neste ponto a minha opinião. Face à necessidade absoluta de assegurar o cumprimento das duras metas do défice orçamental no próximo ano (ao contrário do que se passou este ano), penso que se justifica uma mexida a sério no governo imediatamente após a aprovação do orçamento, abrangendo os ministérios mais desgastados e financeiramente mais arriscados. Sócrates não pode permitir-se partir para o novo ciclo orçamental, muito mais exigente do que o do corrente ano, com a mesma equipa que ficou aquém das metas orçamentais deste ano (quando se exigia excedê-las...). E o País, também não.
É uma questão de credibilidade financeira interna e externa. Os mercados financeiros não perdoam.
SNS
As notícias sobre a derrapagem financeira do SNS vêm infelizmente confirmar os alertas que sucessivamente fui fazendo ao longo dos últimos dois anos (logo desde o verão de 2008) acerca do abandono do discurso e da prática do rigor financeiro e dos ganhos de eficiência, que Correia de Campos fez valer no Ministério da Saúde (perante a condenação oportunista dos que agora, à direita, denunciam hipocritamente o défice em nome da redução da despesa pública).
Pior do que isso, face ao crescimento dos gastos (acima do aumento da despesa pública em geral) e ao aperto orçamental (que não vai desaparecer num ano ou dois), voltam a avolumar-se as dúvidas sobre a sustentabilidade do actual modelo de financiamento do SNS.
Os conhecidos inimigos jurados do SNS (o sector privado da saúde e os partidos da direita) rejubilam!
Pior do que isso, face ao crescimento dos gastos (acima do aumento da despesa pública em geral) e ao aperto orçamental (que não vai desaparecer num ano ou dois), voltam a avolumar-se as dúvidas sobre a sustentabilidade do actual modelo de financiamento do SNS.
Os conhecidos inimigos jurados do SNS (o sector privado da saúde e os partidos da direita) rejubilam!
Endividamento insustentável
O meu post de há dias sobre a irracionalidade financeira do metro do Porto suscitou muitas críticas locais (e alguns insultos).
Convido-os a lerem o artigo de hoje no Público sobre o assunto (jornal que não pode ser acusado de preconceito "mouro" contra o Porto), que mostra como a situação financeira da empresa é puramente insustentável. Independentemente de saber como se chegou aqui (para exigir as correspondentes responsabilidades politicas e financeiras), o que é evidente é que na actual situação de aperto orçamental do País, enterrar mais dinheiro do Estado na empresa seria demencial...
Convido-os a lerem o artigo de hoje no Público sobre o assunto (jornal que não pode ser acusado de preconceito "mouro" contra o Porto), que mostra como a situação financeira da empresa é puramente insustentável. Independentemente de saber como se chegou aqui (para exigir as correspondentes responsabilidades politicas e financeiras), o que é evidente é que na actual situação de aperto orçamental do País, enterrar mais dinheiro do Estado na empresa seria demencial...
Portugal positivo
Portugal melhorou a sua posição no índice do desenvolvimento humano das Nações Unidas (que mede não somente os PIB per capita mas também as condições sociais) e subiu espectacularmente no índice do ambiente favorável aos negócios do Banco Mundial. O que prova que as políticas certas -- entre elas as políticas sociais e as reformas da administração pública, nomeadamente o Simplex -- surtem efeitos.
Estes progressos contrastam com o atávico pessimismo e bota-abaixismo nacional, que os media alimentam e amplificam. Sem surpresa, aliás, os media deram pouco importância a essas notícias e os comentadores de serviço ignoraram-nas em geral. Fossem elas de sentido contrário, e não faltariam manchetes sobre elas e nutridas elaborações sobre a desgraça nacional...
Estes progressos contrastam com o atávico pessimismo e bota-abaixismo nacional, que os media alimentam e amplificam. Sem surpresa, aliás, os media deram pouco importância a essas notícias e os comentadores de serviço ignoraram-nas em geral. Fossem elas de sentido contrário, e não faltariam manchetes sobre elas e nutridas elaborações sobre a desgraça nacional...
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
Antologia do dislate político
Valendo-se da falta de maioria parlamentar do governo, o PSD não tem hesitado em aliar-se aos demais partidos da oposição, incluindo o PCP e o BE, para derrotar o PS, apesar de este ter ganho as eleições. Nunca ninguém os acusou de "ditadura das oposições", ou algo quejando. Agora que foi derrotado na questão do calendário da revisão constitucional -- que precipitadamente resolveu desencadear, contra todos os demais partidos --, o PSD acha que se trata de uma "ditadura da democracia".
Como se sabe, o pensamento antidemocrático sempre acusou a democracia por ser uma "ditadura da maioria".
Como se sabe, o pensamento antidemocrático sempre acusou a democracia por ser uma "ditadura da maioria".
Consistência
O Governo avançou com o fim da acumulação de pensões do sistema público com remunerações no sector público.
Muito bem. Só não se percebe nessa lógica por que é que se mantém a possibilidade de acumulação de duas pensões do sistema público (a não ser que ambas tenham base contributiva própria). Ao fim e ao cabo, a remuneração ainda corresponde a um trabalho prestado. E não faz muito sentido deixar de receber uma pensão porque se está empregado e passar a recebê-la depois de aposentado, passando a receber duas...
Muito bem. Só não se percebe nessa lógica por que é que se mantém a possibilidade de acumulação de duas pensões do sistema público (a não ser que ambas tenham base contributiva própria). Ao fim e ao cabo, a remuneração ainda corresponde a um trabalho prestado. E não faz muito sentido deixar de receber uma pensão porque se está empregado e passar a recebê-la depois de aposentado, passando a receber duas...
Não desperdiçar uma boa crise
O Governo vai finalmente rever o sistema de "associação" de escolas privadas, mediante o qual o Estado suporta as propinas aos alunos destas, como se de escolas públicas se tratasse.
O esquema foi inicialmente justificado como solução de recurso para suprir os défices de cobertura do sistema público. Só que em breve se verificou um enorme abuso desse esquema, como forma de sustentar escolas privadas à custa das públicas, tanto mais que a cobertura do sistema público é hoje tendencialmente de 100%.
Por isso, há que pôr fim a este meio de subvenção de escolas privadas pelo orçamento do Estado, quando este é bem necessário para melhorar as escolas públicas, que, essas sim, constituem uma obrigação do Estado.
Só foi pena ter sido necessário uma crise para pôr fim à captura do Estado pelo poderoso lobby do ensino privado.
Aditamento
É evidente que o PSD não pode deixar de apoiar esta virtuosa medida de redução da despesa pública, ainda por cima despesa de todo em todo injustificada...
O esquema foi inicialmente justificado como solução de recurso para suprir os défices de cobertura do sistema público. Só que em breve se verificou um enorme abuso desse esquema, como forma de sustentar escolas privadas à custa das públicas, tanto mais que a cobertura do sistema público é hoje tendencialmente de 100%.
Por isso, há que pôr fim a este meio de subvenção de escolas privadas pelo orçamento do Estado, quando este é bem necessário para melhorar as escolas públicas, que, essas sim, constituem uma obrigação do Estado.
Só foi pena ter sido necessário uma crise para pôr fim à captura do Estado pelo poderoso lobby do ensino privado.
Aditamento
É evidente que o PSD não pode deixar de apoiar esta virtuosa medida de redução da despesa pública, ainda por cima despesa de todo em todo injustificada...
quarta-feira, 3 de novembro de 2010
Eleições nos Estados Unidos
Tendo há dois anos beneficiado da crise para ganharem o Congresso e fazerem eleger Obama, os Democratas foram agora vítimas das sequelas da mesma crise (desemprego, défice etc.), perdendo para os Republicanos a maioria na Câmara dos Representantes. Em período de crise, quem "paga as favas" é quem governa, mesmo que faça tudo bem para a enfrentar. E os que geraram a crise há três anos votam agora triunfantes cavalgando as dificuldades que ela deixou!
Obama terá agora muitas dificuldades para fazer passar o seu programa de reformas ou até para preservar as que conseguiu na primeira parte do seu mandato (sistema de saúde, regulação financeira, etc.), tanto mais que os Republicanos estão agora claramente radicalizados à direita, sob pressão do Tea Party. Porém, essa mesma radicalização Republicana pode ser um poderoso argumento para Obama reconquistar o centro político e fazer-se reeleger dentro de dois anos.
Obama terá agora muitas dificuldades para fazer passar o seu programa de reformas ou até para preservar as que conseguiu na primeira parte do seu mandato (sistema de saúde, regulação financeira, etc.), tanto mais que os Republicanos estão agora claramente radicalizados à direita, sob pressão do Tea Party. Porém, essa mesma radicalização Republicana pode ser um poderoso argumento para Obama reconquistar o centro político e fazer-se reeleger dentro de dois anos.
terça-feira, 2 de novembro de 2010
Estão a mangar connosco
A junta metropolitana do Porto veio defender que as verbas libertadas pela suspensão do projecto do TGV sejam aplicadas... no metro do Porto.
Ora, sendo o metro do Porto o mais irresponsável e ruinoso investimento público das últimas décadas em Portugal, só por loucura é que se poderia defender enterrar ali mais dinheiro do orçamento do Estado ou das verbas da UE. O que há fazer é suspender a expansão da rede, elevar as tarifas de modo a diminuir o insustentável défice de exploração e entregar a responsabilidade financeira dos transportes urbanos aos municípios por eles servidos. É um escândalo que os contribuintes do resto do País, que pagam já os transportes colectivos dos seus municípios (onde existem), ainda tenham de suportar os encargos financeiros da megalomania e do descalabro financeiro dos transportes colectivos do Porto.
Ora, sendo o metro do Porto o mais irresponsável e ruinoso investimento público das últimas décadas em Portugal, só por loucura é que se poderia defender enterrar ali mais dinheiro do orçamento do Estado ou das verbas da UE. O que há fazer é suspender a expansão da rede, elevar as tarifas de modo a diminuir o insustentável défice de exploração e entregar a responsabilidade financeira dos transportes urbanos aos municípios por eles servidos. É um escândalo que os contribuintes do resto do País, que pagam já os transportes colectivos dos seus municípios (onde existem), ainda tenham de suportar os encargos financeiros da megalomania e do descalabro financeiro dos transportes colectivos do Porto.
segunda-feira, 1 de novembro de 2010
O desafio chinês
Estamos a assistir rapidamente ao fim do mito de que o milagre económico chinês não punha em causa a liderança tecnológica das potências económicas tradicionais (Europa, Estados Unidos, Japão), que assim manteriam vantagem na economia do conhecimento e da inovação.
Sucede que a China acaba de anunciar o mais rápido supercomputador do mundo. Segundo um comentador, «the announcement highlighted how China is leveraging rapid economic growth and sharp increases in research spending to join the United States, Europe and Japan in the global technology elite».
Sucede que a China acaba de anunciar o mais rápido supercomputador do mundo. Segundo um comentador, «the announcement highlighted how China is leveraging rapid economic growth and sharp increases in research spending to join the United States, Europe and Japan in the global technology elite».
Bons sinais
Dois dados recentes testemunham que a retoma económica no conjunto da zona euro ganhou ritmo: o aumento da procura de crédito por parte das empresas (o que significa aumento do investimento) e aumento da confiança dos agentes económicos, retomando os níveis de antes da crise, há três anos.
Embora alguns países europeus, como Grécia, Espanha, Portugal e Irlanda, continuem a enfrentar dificuldades graves orçamentais - com efeitos depressivos sobre a economia --, é de admitir que um crescimento maior da zona euro possa aliviar o impacto sobre a situação económica (via exportações e procura de trabalho).
Embora alguns países europeus, como Grécia, Espanha, Portugal e Irlanda, continuem a enfrentar dificuldades graves orçamentais - com efeitos depressivos sobre a economia --, é de admitir que um crescimento maior da zona euro possa aliviar o impacto sobre a situação económica (via exportações e procura de trabalho).