Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017
Sem oposição
1. Uma das implicações óbvias da presente solução governativa - um Governo do PS apoiado por uma aliança parlamentar com os partidos à sua esquerda - tem a ver com a oposição ao Governo.
Até agora, os governos do PS, além da oposição à sua direita, estavam sempre sob o fogo aguerrido da extrema-esquerda (alavancada pela força sindical da CGTP). Com esta nova configuração governativa o PS transformou os seus irredutíveis adversários de sempre em improváveis aliados.
Pela primeira vez em 40 anos, há um governo sem oposição de princípio da extrema-esquerda. Os partidos antissistema "viraram" parte dele. É obra!
2. Não menos inédito nem menos surpreendente é a ausência de oposição efetiva por parte da direita, que ainda não se recompôs do choque da perda do poder em 2015.
Pela primeira vez, o PSD não procedeu à mudança de liderança e de orientação política ao passar do poder para a oposição, o que o tem acantonado na intratável defesa política do anterior Governo, sob a barragem conjugada do PS e dos seus aliados (como mostrou o recente caso das offshores). Sem linha de orientação nem programa alternativo de governo, a oposição de direita tem-se limitado a ser "do contra". Para mais, a significativa melhoria da situação económica e laboral do País, bem como da situação orçamental (incluindo a próxima saída do Procedimento por Défice Excessivo da UE), colocam a direita em muito má condição.
Se a "Geringonça" não for vitima de nenhum acidente político endógeno ou exógeno, a oposição de direita arrisca-se a continuar desamparadamente perdida à procura de si mesma. A provável derrota do PSD nas eleições locais do próximo outono só pode agravar a situação, tornando problemática a sustentabilidade da atual liderança.
3. Igualmente insólito na nossa história constitucional é o explícito, empenhado e permanente apoio do Presidente da República ao Governo, de tal modo que ele aparece por vezes como se fora uma espécie de arauto, procurador ou coach do executivo.
Enquanto os anteriores inquilinos de Belém, mesmo quando não deixaram entender claramente a sua discordância nem criaram obstáculos aos governos em funções, mantiveram pelo menos um prudente distanciamento em relação a S. Bento, inclusive no caso de afinidades políticas, o atual titular mudou deliberadamente o registo da relação presidencial com o Governo.