Reagindo à acusação do CDS de que a discriminação do IVA relativamente às touradas é uma "ditadura do gosto", a nova Ministra da Cultura retorquiu certeiramente que não é uma questão de gosto, mas sim uma "questão de de civilização".
Nem mais, como tenho vindo a denunciar ao longo dos anos, incluindo aqui no Causa Nossa, na série de posts sobre a "barbárie tauromáquica"! É uma das minhas causas civilizacionais.
Todavia, sendo uma questão de civilização, convenhamos que, embora sendo uma medida positiva, o fim da isenção de IVA nos espectáculos tauromáquicos é bem pouco. Mesmo aquém da sua interdição como espetáculo publico, que há de vir um dia, não podem deixar de ser descontinuadas outras cumplicidades públicas com a tauromaquia, como os apoios financeiros municipais, a transmissão de touradas na RPT, etc. O mínimo que se exige é a demarcação oficial do poder público em relação ao infame espétaculo.
Adenda
O lóbi oficial da indústria da tortura-de-toiros-na-arena-para-gáudio-público veio logo pedir a "demissão imediata" da Ministra da Cultura, o que mostra como a declaração de Graça Fonseca - a primeira vez que um governante entre nós tem essa coragem - foi direta ao alvo. Que o ânimo não lhe falte!
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
quarta-feira, 31 de outubro de 2018
Stars & Stripes (1): Trump contra a Constituição
[Fonte: Wikipedia]
1. Na sua obcecada luta contra a imigração, o Presidente Trump investe agora contra a tradicional regra da nacionalidade que atribui a cidadania dos EUA a todas as crianças nascidas nos Estados Unidos, independentemente da nacionalidade dos progenitores (birthplace right), propondo-se alterá-la por decreto presidencial (executive order).Para justificar a sua decisão, Trump alega que os EUA são o "único país" onde isso se verifica, mas trata-se de um erro grosseiro, pois o mesmo se passa em muitos países das Américas, desde o Canadá à Argentina (ver mapa junto. Acresce que tal regra consta da Constituição norte-americana (XIV Emenda), pelo que, em princípio, tal mudança só poderia ser alcançada mediante revisão constitucional.
2. É certo que alguns países, como a Irlanda, abandonaram a regra do ius soli, para impedir os abusos "turismo de nacionalidade", passado a exigir pelo menos que um dos progenitores estrangeiros tenha residência há um certo tempo no país, à data do nascimento.
No caso dos Estados Unidos, porém, não se vê como contornar a referida norma constitucional.
Adenda
Quanto a Portugal, onde a regra tradicional era o ius sanguinis (são portugueses os filhos de progenitor português, onde quer que nasçam), foi adotando nas últimas décadas o ius soli em relação aos filhos de estrangeiros nascidos em Portugal - o que defendo há muito -, mas continua a exigir que um dos progenitores tenha nascido em Portugal ou tenha um certo tempo de residência no país (2 anos) à data dos nascimento.
domingo, 28 de outubro de 2018
Não dá para entender (6): "Não há licenciaturas grátis!"
No rescaldo do debate político sobre a redução das propinas, que consta da proposta de orçamento para o ano que vem, o Ministro do Ensino Superior veio, precipitadamente, defender o fim das taxas de frequência no ensino superior no futuro, no respeitante às licenciaturas, no que foi logo aplaudido pelo Bloco de Esquerda, que desde há muito defende essa posição.
Não vale a pena repetir as razões por que discordo fundamentalmente desta solução - bem como da simples redução -, e não somente pelas suas implicações orçamentais nem pela contestação das universidades. Mas não deixa de causar alguma perplexidade que ela seja defendida pelo Ministro de um governo socialista, quando tal proposta não consta do programa do PS, nem do programa do Governo (nem dos acordos que fundam a "Geringonça"). E há obviamente boas razões para duvidar que ela possa ser sufragada pelo Ministro das Finanças e pelo Primeiro-Ministro, deste ou de futuro Governo...
Em qualquer caso, penso que os ministros deviam abster-se de defender posições políticas pessoais, mesmo que somente para o futuro, à margem do programa do Governo que integram e do programa do Partido que o sustenta. Solidariedade governativa e partidária oblige.
Adenda 1
De resto, tendo-se o Governo oposto, e bem, à redução das propinas nos três primeiros orçamentos, rejeitando as propostas do Bloco nesse sentido, não se percebe porque é que mudou de posição no orçamento para 2019. É óbvio que não tem a ver com uma súbita descoberta do seu mérito...
Adenda 2
Embora criticando fundadamente a eliminação das propinas ("As propinas e o mito dos almoços grátis"), o editorial do Público de sábado passado conclui, porém, que a redução das propinas e a proposta do Ministro suscitam "uma discussão que vale a pena fazer". Pois vale, embora importe lembrar que esse debate foi travado longa e intensamente há duas décadas, em resposta ao movimento "Não pagamos", e que nessa altura o PS e o seu Governo não alinharam com os borlistas. Também participei ativamente nesse debate - e não mudei de opinião contra a "borla geral" dos beneficiários à custa de todos os contribuintes!
Livres e Iguais (8): 140 anos depois da abolição da escravatura
1. Há 140 anos, em 1878, como recorda recente número da revista Visão História, foi finalmente abolida a escravatura em Portugal e nas suas colónias, mercê sobretudo dos esforços de Sá da Bandeira, o líder da luta pelo abolicionismo em Portugal.
Foi a conclusão de um processo historicamente longo, mais de um século, que se iniciou com a proibição da importação de novos escravos na "metrópole" e na Índia pelo Marquês de Pombal (1761) e passou pela abolição geral do tráfico de escravos em 1836 e pela"lei do ventre livre" de 1856, concedendo a liberdade aos filhos de escravas, ao perfazerem 20 anos.
Não tendo sido pioneiro da abolição da escravatura, longe disso (Inglaterra, 1834, França, 1848, EUA, 1865), Portugal também não foi o último país a fazê-lo, tendo-o feito antes da Espanha/ Cuba (1886) e do Brasil (1888), por exemplo.
2. Nos 70 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos, que Portugal celebra oficialmente juntamente com muitos outros países e com as Nações Unidas, importa registar este decisivo processo histórico de libertação humana de uma das maiores indignidades da história da humanidade e uma violação maciça do mais elementar dos direitos humanos, o direito à liberdade e à identidade pessoal.
Só é pena que em Portugal mal se tenha assinalado essa data de 1878, uma consequência do défice de conhecimento e de reconhecimento da nossa responsabilidade histórica na escravatura africana durante mais de quatro séculos.
sábado, 27 de outubro de 2018
Brasil: a roleta russa da democracia
1. É evidente que não basta a eleição de um autocrata para liquidar uma democracia, desde que a Constituição não seja espezinhada, a oposição política não seja reprimida e a liberdade de imprensa não seja asfixiada. Mas dificilmente um assumido autocrata desiste de levar a cabo os seus projetos autoritários por causa desses obstáculos. A própria legitimidade eleitoral serve de pretexto para contornar ou derrubar essas barreiras.
A democracia liberal não consiste somente na eleição dos titulares do poder político, exigindo também o respeito das liberdades e do Estado de direito. Sem esses limites ao poder político absoluto - que os autocratas pouco apreciam, prevalecendo-se da sua legitimidade eleitoral -, as eleições podem redundar em democracia iliberal ou autoritária.
As autocracias que nascem de eleições são as mais difíceis de contrariar e combater.
2. Nas vésperas da eleição do Presidente do Brasil - um regime presidencialista, em que o Presidente acumula a chefia do Estado com a chefia do Governo e não é responsável politicamente perante o Congresso -, parece óbvio que a maior parte dos brasileiros, fustigados e desesperados pela insegurança, a corrupção política e a crise económica e social, vão levar ao Palácio do Planalto, um Presidente que não esconde o seu projeto de extrema-direita autoritária. O Brasil aposta assim, deliberadamente, numa "roleta russa" política, em que a vítima pode ser a democracia constitucional brasileira, com a agravante de, tudo o indica, o tambor do revólver ter mais do que um cartucho.
Trinta anos depois da consumação constitucional da transição democrática brasileira, a celebração da Constituição de 1988 ameaça terminar num horizonte carregado de nuvens sobre o seu próximo futuro. Quo vadis, Terra brasilis?
A democracia liberal não consiste somente na eleição dos titulares do poder político, exigindo também o respeito das liberdades e do Estado de direito. Sem esses limites ao poder político absoluto - que os autocratas pouco apreciam, prevalecendo-se da sua legitimidade eleitoral -, as eleições podem redundar em democracia iliberal ou autoritária.
As autocracias que nascem de eleições são as mais difíceis de contrariar e combater.
2. Nas vésperas da eleição do Presidente do Brasil - um regime presidencialista, em que o Presidente acumula a chefia do Estado com a chefia do Governo e não é responsável politicamente perante o Congresso -, parece óbvio que a maior parte dos brasileiros, fustigados e desesperados pela insegurança, a corrupção política e a crise económica e social, vão levar ao Palácio do Planalto, um Presidente que não esconde o seu projeto de extrema-direita autoritária. O Brasil aposta assim, deliberadamente, numa "roleta russa" política, em que a vítima pode ser a democracia constitucional brasileira, com a agravante de, tudo o indica, o tambor do revólver ter mais do que um cartucho.
Trinta anos depois da consumação constitucional da transição democrática brasileira, a celebração da Constituição de 1988 ameaça terminar num horizonte carregado de nuvens sobre o seu próximo futuro. Quo vadis, Terra brasilis?
sexta-feira, 26 de outubro de 2018
"Livres e iguais" (7): Direitos humanos na Polícia Judiciária
Decorre hoje na sede da instituição em Lisboa uma conferência sobre "A Polícia Judiciária e os Direitos Humanos" (programa AQUI). É de saudar esta iniciativa, que partiu do próprio diretor da instituição, no contexto dos 63 anos desta.
Um dos traços bem-vindos destas comemorações é que elas não se limitam às habituais iniciativas universitárias e das ONGs de direitos humanos, tendo desta vez uma grande participação governamental, assim como das instituições judiciárias. De facto, num Estado de Direito, os primeiros destinatários dos direitos humanos são as instituições judiciárias, já que protagonizam a dupla obrigação do Estado em relação aos direitos humanos: (i) a obrigação de os respeitar, não os lesando, e (ii) a obrigação de os defender, punindo a sua lesão por terceiros, nomeadamente por via do direito penal.
Um dos traços bem-vindos destas comemorações é que elas não se limitam às habituais iniciativas universitárias e das ONGs de direitos humanos, tendo desta vez uma grande participação governamental, assim como das instituições judiciárias. De facto, num Estado de Direito, os primeiros destinatários dos direitos humanos são as instituições judiciárias, já que protagonizam a dupla obrigação do Estado em relação aos direitos humanos: (i) a obrigação de os respeitar, não os lesando, e (ii) a obrigação de os defender, punindo a sua lesão por terceiros, nomeadamente por via do direito penal.
segunda-feira, 22 de outubro de 2018
"Livres e iguais" (6): Um tema "picante"
1. Vai ter lugar amanhã na Universidade Lusíada Norte (Porto) um colóquio, organizado em parceria com a Ordem dos Advogados, sobre a "colaboração premiada" em processo penal, ou seja, a possibilidade de conceder leniência penal a quem denuncie a prática de crimes em que tenha intervindo.
Trata-se da primeira de muitas iniciativas universitárias no âmbito do programa de comemorações dos 70 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) (1948) e dos 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH) (1978), das quais sou comissário.
2. Não podia tratar-se de um tema mais "picante" entre nós, visto que a "colaboração premiada" (no Brasil: "delação premiada") divide fortemente as opiniões dos especialistas e dos políticos, tendo já sido objeto de um recente debate televisivo.
O tema tornou-se conhecido tanto pela utilização da delação premiada no Brasil como por a introdução desta em Portugal ter recentemente sido apoiada por algumas personalidades públicas, como, por exemplo, a presidente da juventude social-democrata (sem ter sido contrariada pelo SG) e pela ex-PGR, Joana Marques Vidal.
Debatamos, pois!
Trata-se da primeira de muitas iniciativas universitárias no âmbito do programa de comemorações dos 70 anos da Declaração Universal de Direitos Humanos (DUDH) (1948) e dos 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH) (1978), das quais sou comissário.
2. Não podia tratar-se de um tema mais "picante" entre nós, visto que a "colaboração premiada" (no Brasil: "delação premiada") divide fortemente as opiniões dos especialistas e dos políticos, tendo já sido objeto de um recente debate televisivo.
O tema tornou-se conhecido tanto pela utilização da delação premiada no Brasil como por a introdução desta em Portugal ter recentemente sido apoiada por algumas personalidades públicas, como, por exemplo, a presidente da juventude social-democrata (sem ter sido contrariada pelo SG) e pela ex-PGR, Joana Marques Vidal.
Debatamos, pois!
sábado, 20 de outubro de 2018
Discordo (7): No interesse próprio
1. Um das mais eleiçoeiras medidas da proposta do orçamento para 2019 é a descida substancial (cerca de 20%) das propinas do ensino superior público, que vai ao encontro da tradicional reivindicação da importante base eleitoral dos respetivos estudantes. Mas é também uma medida caracteristicamente reacionária, como já aleguei várias vezes ao longo dos anos.
Provinda naturalmente da esquerda radical, o que admira é que o PS, cedendo ao oportunismo eleitoral, a tenha perfilhado, apesar de serem tantos os argumentos contra, e sobretudo por se tratar de uma medida que vai beneficiar quem menos precisa à custa dos que de mais ajuda carecem para chegar ao ensino superior. A elite política, cujos filhos frequentam obviamente o ensino superior, faz valer politicamente os seus interesses privativos, à custa do interesse geral.
2. Antes de mais, a redução das propinas - que são recurso próprio das instituições de ensino superior público - aumenta a sua dependência em relação ao orçamento do Estado, reduzindo a sua autonomia financeira (menos 50 milhões de euros), e tornando-as mais vulneráveis à discricionariedade orçamental de cada Governo.
Em segundo lugar, e sobretudo, a redução das propinas é socialmente iníqua, pois vai aumentar o custo orçamental dos estudantes do ensino superior, que pertencem em geral à metade mais abonada da população, sendo subsidiados por toda a gente na sua qualificação académica, incluindo por aqueles que não têm nenhuma possibilidade de enviar os seus filhos à universidade.
Em terceiro lugar, obrigando o Estado a compensar as IES pela perda de receitas próprias, vai haver menos dinheiro para outros fins mais virtuosos no âmbito do ensino superior, como a grave carência de habitação dos estudantes deslocados e as bolsas de estudo, prejudicando assim o acesso de alunos com menores rendimentos ao ensino superior.
Por último, a redução das propinas vai aprofundar a diferença de custos entre o ensino superior público e o privado, quando é certo que este é maioritariamente frequentado por quem não teve acesso àquele, sabendo-se que se trata maioritariamente de estudantes oriundos de estratos sociais com menores rendimentos do que os do ensino público.
Adenda
O CDS contrapropõe mais bolsas para estudantes, em vez da redução das propinas. Merece apoio!
Provinda naturalmente da esquerda radical, o que admira é que o PS, cedendo ao oportunismo eleitoral, a tenha perfilhado, apesar de serem tantos os argumentos contra, e sobretudo por se tratar de uma medida que vai beneficiar quem menos precisa à custa dos que de mais ajuda carecem para chegar ao ensino superior. A elite política, cujos filhos frequentam obviamente o ensino superior, faz valer politicamente os seus interesses privativos, à custa do interesse geral.
2. Antes de mais, a redução das propinas - que são recurso próprio das instituições de ensino superior público - aumenta a sua dependência em relação ao orçamento do Estado, reduzindo a sua autonomia financeira (menos 50 milhões de euros), e tornando-as mais vulneráveis à discricionariedade orçamental de cada Governo.
Em segundo lugar, e sobretudo, a redução das propinas é socialmente iníqua, pois vai aumentar o custo orçamental dos estudantes do ensino superior, que pertencem em geral à metade mais abonada da população, sendo subsidiados por toda a gente na sua qualificação académica, incluindo por aqueles que não têm nenhuma possibilidade de enviar os seus filhos à universidade.
Em terceiro lugar, obrigando o Estado a compensar as IES pela perda de receitas próprias, vai haver menos dinheiro para outros fins mais virtuosos no âmbito do ensino superior, como a grave carência de habitação dos estudantes deslocados e as bolsas de estudo, prejudicando assim o acesso de alunos com menores rendimentos ao ensino superior.
Por último, a redução das propinas vai aprofundar a diferença de custos entre o ensino superior público e o privado, quando é certo que este é maioritariamente frequentado por quem não teve acesso àquele, sabendo-se que se trata maioritariamente de estudantes oriundos de estratos sociais com menores rendimentos do que os do ensino público.
Adenda
O CDS contrapropõe mais bolsas para estudantes, em vez da redução das propinas. Merece apoio!
quinta-feira, 18 de outubro de 2018
Eu diria, um contrassenso
O Ministro das Finanças admitiu ser "discutível" ter descido o IVA dos restaurantes (13%) e não reduzir o da energia. Eu diria mesmo tratar-se de um contrassenso, nunca tendo concordado com a primeira medida, muito menos compreendendo o IVA ainda mais reduzido na hotelaria (6%), mesmo nos hotéis de luxo!
Mas, decididamente, consistência é coisa que em Portugal não caracteriza o sistema fiscal, demasiado ao saber do poder dos lóbis empresariais e da sua influência política...
Mas, decididamente, consistência é coisa que em Portugal não caracteriza o sistema fiscal, demasiado ao saber do poder dos lóbis empresariais e da sua influência política...
quarta-feira, 17 de outubro de 2018
Não basta melhorar
Embora melhorando em vários indicadores, Portugal baixou no ranking da competitividade das economias. Tal como no crescimento económico, não basta melhorar o desempenho, sendo preciso não sermos ultrapassados por países que melhoram mais do que nós - como está a acontecer.
Ora, na economia globalizada de hoje e integrando a UE, a produtividade e a competitividade externa da economia é o principal desafio da economia portuguesa - que não estamos a ganhar...
Ora, na economia globalizada de hoje e integrando a UE, a produtividade e a competitividade externa da economia é o principal desafio da economia portuguesa - que não estamos a ganhar...
Responsabilidade política
O Chefe do Estado-Maior do Exército apresentou demissão na sequência da substituição do Ministro da Defesa.
É caso para dizer que o sentido da responsabilidade pública no exercício de cargos de chefia chegou onde devia ter chegado há muito no lamentável e comprometedor folhetim de Tancos. O que surpreende é que o anterior Ministro não tenha feito valer desde o início a responsabilidade dos militares encarregados da segurança dos paióis de Tancos e, em última instância, da chefia do Exército.
Mas mais vale tarde do que nunca!
É caso para dizer que o sentido da responsabilidade pública no exercício de cargos de chefia chegou onde devia ter chegado há muito no lamentável e comprometedor folhetim de Tancos. O que surpreende é que o anterior Ministro não tenha feito valer desde o início a responsabilidade dos militares encarregados da segurança dos paióis de Tancos e, em última instância, da chefia do Exército.
Mas mais vale tarde do que nunca!
segunda-feira, 15 de outubro de 2018
Ai, a dívida (16): O "fetiche do défice zero"
1. A "esquerda da esquerda", que sempre achou que o Estado pode gastar à tripa forra recorrendo a dinheiro emprestado, acha que o objetivo do défice zero é um "fetiche" austeritário.
Ora, eu até penso que, como defendi aqui várias vezes, com a montanha de dívida pública que tem - a terceira mais elevada na UE -, o País já devia estar em excedente orçamental desde pelo menos que a economia está a crescer acima dos 2%, aproveitando o verdadeiro paraíso orçamental que é a conjugação do crescimento abundante da receita pública (impostos, taxas e contribuições) e a baixa da taxa de juros, que poupa centenas de milhões de euros em encargos da dívida pública.
Por isso, nestas circunstâncias o défice zero não é nenhum fetiche doutrinário, nem sequer um objetivo ambicioso, sendo o limiar mínimo em que o Estado deixa de continuar a acumular dívida pública. De facto, por pequeno que seja, défice orçamental significa sempre mais dívida.
2. Não falta também na Geringonça governativa quem se vanglorie de que nunca um governo de direita foi tão longe na redução do défice das contas públicas. Mas eu duvido que nas condições excecionalmente favoráveis prevalecentes algum Governo responsável pudesse fazer pior, pelo contrário.
3. O que é mérito do Governo é a determinação política de, apesar do pródigo aumento da despesa pública por pressão dos parceiros da Geringonça - como se nota mais uma vez no orçamento para 2019 -, não ter cedido demais, de modo a cumprir os principais objetivos de consolidação orçamental requeridos pela UE. Não é um pequeno feito, mas as condições existentes justificavam bem mais, no sentido da redução do peso da dívida pública, de modo a minorar os riscos de uma provável inversão do ciclo económico e do aumento da taxa de juro.
Ora, eu até penso que, como defendi aqui várias vezes, com a montanha de dívida pública que tem - a terceira mais elevada na UE -, o País já devia estar em excedente orçamental desde pelo menos que a economia está a crescer acima dos 2%, aproveitando o verdadeiro paraíso orçamental que é a conjugação do crescimento abundante da receita pública (impostos, taxas e contribuições) e a baixa da taxa de juros, que poupa centenas de milhões de euros em encargos da dívida pública.
Por isso, nestas circunstâncias o défice zero não é nenhum fetiche doutrinário, nem sequer um objetivo ambicioso, sendo o limiar mínimo em que o Estado deixa de continuar a acumular dívida pública. De facto, por pequeno que seja, défice orçamental significa sempre mais dívida.
2. Não falta também na Geringonça governativa quem se vanglorie de que nunca um governo de direita foi tão longe na redução do défice das contas públicas. Mas eu duvido que nas condições excecionalmente favoráveis prevalecentes algum Governo responsável pudesse fazer pior, pelo contrário.
Primeiro, com o crescimento económico a "bombar" uma cornucópia de impostos, contribuições e taxas sem precedente, com um nível elevado de tributação fiscal, com uma nutrida poupança de encargos da dívida pública e com a restrição excecional do investimento público, o que admira é que ainda continuemos a recorrer à dívida para financiar a despesa pública.
De facto, tirando o último dos fatores referidos, os demais não dependem propriamente de decisão ou da vontade politica do Governo em funções, porque vindos de trás (como o crescimento ou a "enorme subida de impostos" do Governo anterior) ou por serem devidos a terceiros (por exemplo, a baixa taxa de juros como resultado da política monetária do BCE).
De facto, tirando o último dos fatores referidos, os demais não dependem propriamente de decisão ou da vontade politica do Governo em funções, porque vindos de trás (como o crescimento ou a "enorme subida de impostos" do Governo anterior) ou por serem devidos a terceiros (por exemplo, a baixa taxa de juros como resultado da política monetária do BCE).
3. O que é mérito do Governo é a determinação política de, apesar do pródigo aumento da despesa pública por pressão dos parceiros da Geringonça - como se nota mais uma vez no orçamento para 2019 -, não ter cedido demais, de modo a cumprir os principais objetivos de consolidação orçamental requeridos pela UE. Não é um pequeno feito, mas as condições existentes justificavam bem mais, no sentido da redução do peso da dívida pública, de modo a minorar os riscos de uma provável inversão do ciclo económico e do aumento da taxa de juro.
De facto, sendo a receita pública muito sensível a uma eventual contração da economia e do emprego, o mesmo não sucede com a despesa pública com salários, pensões e transferências sociais, que é muito mais rígida. Nesse caso, não devia ser ignorado o perigo de regresso a défices orçamentais elevados e de novo aumento da dívida pública.
domingo, 14 de outubro de 2018
III Congresso Internacional de Direitos Humanos
Amanhã vou inaugurar este III Congresso de Direitos Humanos de Coimbra, um colóquio internacional de três dias, tendo por base uma cooperação luso-brasileira, com dezenas de simpósios temáticos e mais de duas centenas de contribuições escritas e mais de 500 inscrições.
Um caso pouco comum no nossa paisagem académica.
Um caso pouco comum no nossa paisagem académica.
sexta-feira, 12 de outubro de 2018
"Livres e iguais" (6): O site das comemorações
1. Eis o website das Comemorações dos 70 anos da DUDH e dos 40 anos da Adesão de Portugal à CEDH , onde pode conhecer o programa e acompanhar todos os eventos.
Beneficiando ao alto patrocínio do Presidente da República, as comemorações incluem iniciativas de numerosas instituições, incluindo o Governo e a AR, universidades, tribunais, entidades públicas independentes (como a Provedoria de Justiça e a Comissão da Liberdade Religiosa), ONGs, FCG, etc.
Algumas iniciativas específicas gozam do apoio financeiro externo, nomeadamente da CGD e da Sportzone.
2. Como Comissário das Comemorações, julgo que estamos a celebrar condignamente esses dois grandes instrumentos da proteção internacional de Direitos Humanos, a que Portugal só aderiu há 40 anos, na sequência da revolução de 1974 e da CRP de 1976.
Depois de se ter tornado, com a Constituição, em Estado de direitos fundamentais, Portugal tornou-se desde então também num "Estado de direitos humanos". Algo de que nos devemos orgulhar.
Beneficiando ao alto patrocínio do Presidente da República, as comemorações incluem iniciativas de numerosas instituições, incluindo o Governo e a AR, universidades, tribunais, entidades públicas independentes (como a Provedoria de Justiça e a Comissão da Liberdade Religiosa), ONGs, FCG, etc.
Algumas iniciativas específicas gozam do apoio financeiro externo, nomeadamente da CGD e da Sportzone.
2. Como Comissário das Comemorações, julgo que estamos a celebrar condignamente esses dois grandes instrumentos da proteção internacional de Direitos Humanos, a que Portugal só aderiu há 40 anos, na sequência da revolução de 1974 e da CRP de 1976.
Depois de se ter tornado, com a Constituição, em Estado de direitos fundamentais, Portugal tornou-se desde então também num "Estado de direitos humanos". Algo de que nos devemos orgulhar.
quarta-feira, 3 de outubro de 2018
Livres e iguais (5): O papel dos tribunais
Amanhã vou estar numa sessão organizada pelo tribunal de comarca de Santarém, no quadro das comemorações dos 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) e dos 40 anos da adesão de Portugal à Convenção Europeia de Direitos Humanos (CEDH), das quais sou comissário.
É a primeira de uma série de iniciativas judiciais no âmbito das referidas comemorações, testemunhando a crescente consciencialização dos operadores judiciais para a importância decisiva da proteção internacional dos direitos humanos, em paralelo com a proteção constitucional interna.
É a primeira de uma série de iniciativas judiciais no âmbito das referidas comemorações, testemunhando a crescente consciencialização dos operadores judiciais para a importância decisiva da proteção internacional dos direitos humanos, em paralelo com a proteção constitucional interna.
terça-feira, 2 de outubro de 2018
Geringonça (11) - Cedências políticas
1. Numa entrevista ao Público, o dirigente portuense do PS, Manuel Pizarro, afirma que não deve haver mais parcerias público-privadas (PPPs) na montagem e/ou gestão de hospitais do SNS e que as quatro situações existentes - Cascais, Loures, V. F. de Xira e Braga (na imagem) - não devem ser aumentadas.
Não se compreende bem este posição. De duas uma: ou as PPPs resultam bem, em termos de resultados e de custos, e então não há nenhuma razão para não haver mais; ou não provam bem, e então devem ser descontinuadas quando chegar o seu termo. Ora, todos os estudos existentes, incluindo relatórios do Tribunal de Contas, revelam que as PPPs na saúde estão a ter bom desempenho, quando comparado com a gestão pública, pelo que nada justifica não serem ampliadas.
2. Seguramente que o PS não compartilha do ponto de vista ideológico dos partidos da "esquerda da esquerda", segundo o qual as PPPs são por definição más, pelo que devem ser resgatadas as que existem.
Antes de mais, os hospitais em regime de PPP continuam a ser hospitais públicos e a integrar o SNS, revertendo para o Estado no final do contrato de gestão (ou de construção e gestão). Sob o ponto de vista dos utentes só importa saber se são mais bem ou mal servidos.
Na verdade, foi um governo PS que lançou a primeira experiência de PPP no Hospital Amadora-Sintra (1996), tendo o partido mantido desde então abertura a essa solução. O que sucede agora é que, não podendo sufragar o radicalismo da BE e do PCP e rejeitando o cancelamento das PPPs existentes, o PS acaba, porém, por recusar a instituição de novas parcerias para agradar aos referidos parceiros. Já foi anunciado que a proposta governamental da Lei de Bases da Saúde cortou a menção às PPPs que constava do anteprojeto. Geringonça oblige...
Assim se sacrificam inconsequentemente os interesses dos contribuintes e dos utentes de cuidados de saúde aos dogmas ideológicos da esquerda radical. Depois admiremo-nos com as sucessivas derrapagens orçamentais do SNS...
Não se compreende bem este posição. De duas uma: ou as PPPs resultam bem, em termos de resultados e de custos, e então não há nenhuma razão para não haver mais; ou não provam bem, e então devem ser descontinuadas quando chegar o seu termo. Ora, todos os estudos existentes, incluindo relatórios do Tribunal de Contas, revelam que as PPPs na saúde estão a ter bom desempenho, quando comparado com a gestão pública, pelo que nada justifica não serem ampliadas.
2. Seguramente que o PS não compartilha do ponto de vista ideológico dos partidos da "esquerda da esquerda", segundo o qual as PPPs são por definição más, pelo que devem ser resgatadas as que existem.
Antes de mais, os hospitais em regime de PPP continuam a ser hospitais públicos e a integrar o SNS, revertendo para o Estado no final do contrato de gestão (ou de construção e gestão). Sob o ponto de vista dos utentes só importa saber se são mais bem ou mal servidos.
Na verdade, foi um governo PS que lançou a primeira experiência de PPP no Hospital Amadora-Sintra (1996), tendo o partido mantido desde então abertura a essa solução. O que sucede agora é que, não podendo sufragar o radicalismo da BE e do PCP e rejeitando o cancelamento das PPPs existentes, o PS acaba, porém, por recusar a instituição de novas parcerias para agradar aos referidos parceiros. Já foi anunciado que a proposta governamental da Lei de Bases da Saúde cortou a menção às PPPs que constava do anteprojeto. Geringonça oblige...
Assim se sacrificam inconsequentemente os interesses dos contribuintes e dos utentes de cuidados de saúde aos dogmas ideológicos da esquerda radical. Depois admiremo-nos com as sucessivas derrapagens orçamentais do SNS...
segunda-feira, 1 de outubro de 2018
Privilégios judiciários
1. Como explica o Jornal de Notícias de hoje, os juízes e agentes do Ministério Público jubilados recebem uma pensão superior à remuneração dos magistrados no ativo, dado que além do extraordinário privilégio de a pensão ter o valor da remuneração (incluindo o subsídio de residência!), gozam da vantagem adicional de não descontarem a contribuição para a Caixa Geral de Aposentações, por já não estarem no ativo, recebendo portanto esse valor de 11% da remuneração.
Parece que, finalmente, esta segunda benesse (não a primeira!) vai ser removida. mas como é que ela pôde manter-se durante décadas sem escândalo público revela não somente o défice de informação e de revolta pública mas também a capacidade de perpetuação dos privilégios entre nós.
2. Em nota à margem a esta peça, o Jornal de Notícias observa que também os professores universitários podem ser "jubilados", dando a entender que gozam dos mesmos privilégios.
Mas trata-se de misturar alhos com bugalhos, pois não há nada em comum. Por um lado, no caso dos professores, a jubilação só se atinge aos 70 anos, excluindo quem se aposente antes dessa idade, o que não sucede no caso dos juízes e agentes do MP, que jubilam automaticamente quando se aposentam. Por outro lado, as pensões dos professores são calculadas ao abrigo do regime geral, como deve ser, pelo que a "taxa de substituição" (rácio entre a pensão e a remuneração) não é 111% (nem 100%), como no caso daqueles, mas sim os cerca de 70% de todos os funcionários públicos (com tendência para decrescer para menos de 60%).