terça-feira, 2 de fevereiro de 2021

Estado social (8): Esquecer o principal

 1. Na sua coluna no Público de ontem escreve Rui Tavares:

«Se queremos evitar aproximar-nos mais ainda do abismo, a esquerda tem de quebrar com os seus hábitos e produzir, em conjunto, um compromisso histórico que devolva um rumo ao seu mandato conjunto e dê respostas nos temas em que todas as esquerdas têm mais em comum: como defender o Serviço Nacional de Saúde e o Estado social, como combater em simultâneo as desigualdades e as alterações climáticas, e como renovar a promessa do 25 de abril com um novo modelo de desenvolvimento para o país.»

Neste texto estão condensados dois dos grandes equívocos da esquerda: (i) que é possível uma visão polírtica conjunta das diferentes esquerdas sobre o Estado social (o que os últimos cinco anos provaram impossível); (ii) que pode haver um Estado social cada vez robusto sem as necessárias condições económicas e financeiras.

2. O principal problema do Estado social entre nós é o persistente mau desempenho económico, que arrasta Portugal para os últimos lugares no ranking da UE, traduzindo-se em défice de criação de empregos qualificados e em falta de meios financeiros para sustentar as crescentes despesas sociais (saúde, educação, proteção social, etc.).

Para melhorar o desempenho económico, é necessário menos despesa corrente e mais investimento público, mais eficiência e menos corporativismo no setor público, mais concorrência e menos protecionismo económico. 

Ora, não se vê como é que sobre isso pode haver o mínimo "compromisso histórico" à esquerda, entre o PS, tendencialmente liberal em matéria económica, e as "esquerdas da esquerda", tendencialmente coletivistas, estatistas e protecionistas.
[revisto]

Adenda
Comentário de um leitor: «Gostei da sua abordagem, mas acho que não seria demais chamar-lhe a atenção para a História, que é suposto ele conhecer. Chega de idealismo piedoso! As esquerdas não se fundem só porque isso parece desejável. Nem no tempo da ditadura isso aconteceu. Muito menos em democracia. O materialismo histórico é uma grande escola...».