sábado, 25 de setembro de 2004

Carta de demissão de militante do PS

Através deste meio divulgo o texto integral da carta que entreguei ao Presidente do Partido Socialista no passado dia 23 de Setembro, informando-o das razões da minha demissão de militante do PS.
Vicente Jorge Silva

Exmo. Sr.
Presidente do Partido Socialista
Largo do Rato
Lisboa

Caro Dr. Almeida Santos:

Com os meus melhores cumprimentos, venho anunciar-lhe que tomei a decisão de, a partir do dia 25 de Setembro próximo, deixar de ser militante do Partido Socialista (estou inscrito na secção do Limoeiro, Federação da Área Urbana de Lisboa, com o nº 59125). É uma decisão que desde há algum tempo venho ponderando, mas não quis consumá-la antes de participar na votação do novo secretário-geral do partido, enquanto último acto simbólico da minha vinculação formal ao PS e direito cívico a que entendi não dever renunciar.

Os motivos da minha decisão são pessoais e políticos.

Inscrevi-me no PS na sequência das últimas eleições legislativas, às quais concorri como candidato a deputado pelo círculo eleitoral de Lisboa. Considerava então e continuo a considerar o PS como o partido que, em princípio, melhor se identifica com o espaço político onde desde sempre me reconheci: a esquerda democrática. No entanto, a minha vivência como militante cedo se revelou um equívoco. Quer por temperamento, quer por modo de vida anterior à filiação partidária ? nomeadamente pela actividade de jornalista ao longo de mais de três décadas ?, concluí que esta minha nova condição representava um constrangimento e um fardo para a minha consciência de pessoa fundamentalmente avessa aos códigos e normas que enquadram a pertença formal a um partido.

Cheguei a pensar que era possível conciliar a minha natureza estranha ao espírito partidário com uma nova forma de militância. Enganei-me e assumo esse engano. Não quero prolongá-lo com prejuízo para o partido e para mim mesmo. Tenho demasiado respeito pelos princípios que norteiam (ou deveriam nortear) a vinculação a um partido político para continuar a representar um papel em que me sinto deslocado, exterior e, finalmente, inútil.

Dito isto, quero confessar-lhe também a minha incomodidade política no que se refere ao futuro do PS. Embora não esconda a minha preferência por um dos actuais candidatos à liderança, também não sou capaz de ocultar a minha frustração com o facto de nenhum dos projectos apresentados aos militantes representar, quanto a mim, uma alternativa verdadeiramente consistente na representação do espaço da esquerda democrática. É uma constatação que só a mim compromete e que não pretendo, de forma alguma, generalizar com intuitos políticos ou moralistas. Sou apenas responsável pelas minhas reflexões, pelos meus actos e pela minha consciência. E é nessa medida que me sinto pessoalmente mais livre para continuar a dar o meu contributo ao debate político na qualidade de deputado independente, enquanto esse contributo ainda fizer sentido.

Em conformidade, peço-lhe, caro dr. Almeida Santos, que comunique às instâncias competentes da organização do PS esta minha decisão, sem prejuízo das diligências que eu próprio oportunamente farei e da divulgação pública que julgo imprescindível à clarificação da minha posição.

Subscrevo-me cordialmente e com toda a estima pessoal.

Lisboa, 23 de Setembro de 2004

Vicente Jorge Silva
(militante 59.125)