sexta-feira, 30 de junho de 2006

Guantanamo embucha Bush

Estou em Nova Iorque. As televisões americanas estão a destacar que o Supremo Tribunal dos EUA, num voto de 5-3, declarou hoje que a Administração Bush, ao pretender levar a tribunais especiais os suspeitos de terrorismo, viola as Convenções de Genebra e as leis militares americanas.
As televisões dizem que o Tribunal recordou decisões precedentes relevantes, como a que considerou ilegal a política do Presidente Truman de internar os japoneses-americanos na II Guerra. Lembram como as Convenções de Genebra serviram para julgar e condenar os criminosos nazis e, portanto, como também devem servir para julgar os criminosos da Al Qaeda. E sublinham como violar as Convenções de Genebra não está a dar resultados na "guerra contra o terrorismo".
O Supremo Tribunal americano veio confirmar a justeza do que na Europa muitos sempre defendemos - contra as teses de uns tantos políticos e comentadores invertebrados, sempre prontos a servir e salivar, que tentaram justificar o injustificável.
Tony Snow, o novo porta-voz de Bush, embucha a procurar explicar como o advogado Neal Katyal, de Hamdam, alegadamente um condutor de Ossama Bin Laden, conseguiu de desferir mais um pesado golpe a esta já tão desacreditada Administração. Embucha, incapaz de antecipar o que se vai passar com os detidos em Guantanamo e nas outras prisões de regimes nada recomendáveis para onde a Administração tem deslocalizado a tortura e onde mantem, sequestrados, indivíduos que não julgou nem inculpou.
Não é só por Nova Iorque que eu gosto da América. É por esta capacidade de regeneração que têm as instituições democráticas americanas.

Deus e César

Pode ler-se agora na Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título "A separação inacabada", a propósito da exclusão dos representantes da Igreja católica do protocolo do Estado. Em defesa da laicidade do Estado.

Lugares de encanto

Águas de São Pedro, interior do Estado de São Paulo, Brasil.

Lugares de encanto

Grande Hotel, Águas de São Pedro, interior do Estado de São Paulo, Brasil.

quinta-feira, 29 de junho de 2006

Ramalho Eanes, por Luís Osório

As entrevistas de Luís Osório no RCP são do melhor que há no género, explorando com inteligência e sensibilidade o carácter e a autenticidade de cada entrevistado. A entrevista de hoje com Ramalho Eanes não ficou atrás, revelando uma personalidade sensível e humanista, longe do estereótipo ligado à sua carreira de militar disciplinado e de Presidente da República austero.
Com Luís Osório as pessoas revelam-se sempre menos simples e mais ricas do que parecem. Ainda bem.

Qua admiração!

«Jardim solidário com Ruas». O arruaceiro político "profissional" saúda o "amador". Nenhuma surpresa.
Nisto tudo há, porém, um silêncio comprometedor: o do presidente do PSD, Marques Mendes. Acha, porventura, a questão irrelevante?

Lugares de encanto

Rio de Janeiro, Arcos de Santa Teresa.

Lugares de encanto

Copacabana ao amanhecer.

Retractação

O Presidente da Câmara Municipal de Viseu recusa pedir desculpa pela disparatada e grave declaração que fez contra os fiscais do Ministério da Ambiente. Mas o mínimo que se lhe pode exigir, para mais sendo ele presidente da ANMP, é uma retractação formal do incitamento ao desacato contra agentes públicos no exerício das suas funções.

A reeleição de Lula

De uma recente estada no Brasil colhi a convição de que o Presidente Lula da Silva tem fortíssimas possibilidades de de ser reeleito para novo mandato presidencial, nas eleições presidenciais de Outubro deste ano. Para isso contribuem os seguintes factores:
- os escândalos de corrupção no seu governo e no PT não o atingiram seriamente;
- a situação económica e financeira do País esté boa (bom crescimento, descida da inflação e da taxa de juro, superavit no comércio externo, aumento do poder de compra, etc.):
- os programas sociais do governo (bolsa família, fome zero, etc.) tiveram implementação suficiente para melhorar a situação de milhões de brasileiros pobres;
- Lula colocou o Brasil no mapa das relações internacionais, ao liderar as posições das potências emergentes;
- o principal adversário na corrida presidencial (Geraldo Alckmin, do PSDB) não parece em condições de disputar o cargo com sucesso, embora possa levar a melhor no seu próprio Estado (São Paulo).

Guerra dos tribunais (2)

Dois amigos meus (J. Vasconcelos Costa e Carlos Esperança) propuseram, separadamente, uma solução alternativa para a questão da precedência protocolar dos tribunais (ver post precedente). Os três tribunais superiores ficariam equiparados, dando precedência em cada momento àquele cujo presidente fosse mais antigo no cargo.
Parece-me uma boa solução, ainda que mais aleatória do que a que eu propus.

terça-feira, 27 de junho de 2006

Guerra de tribunais

A revisão da lei do protocolo de Estado voltou a suscitar a questão da precedência cerimonial dos tribunais, suscitada pela criação do Tribunal Cosntitucional em 1982 e na altura resolvida "oportunisticamente" a favor do STJ, mantendo a tradição anterior à existência do TC. O problema existe porque, ao contrário dos países com sistema judicial unificado, Portugal apresenta várias ordens de tribunais, inclundio o TC, os tribunais judiciais (tendo no topo o STJ), os tribunais administrativos e fiscais (tendo no topo o STA) e ainda o Tribunal de Contas (que, porém, não tem somente funções judiciais).
A verdade é que, constitucionalmente, não pode haver dúvida sobre a primazia do Tribunal Constitucional na ordenação dos diversos tipos de tribunais: é o único tribunal transversal a todo o sistema judicial, podendo cassar decisões de todos os demais tribunais em matéria constitucinal (e eleitoral). Não sendo, porém, provável que o poder político esteja disponível para travar essa guerra com os tribunais judiciais (sobretudo nas circunstâncias correntes...), talvez se justificasse uma solução salomónica, a saber, a rotação da precedência protocolar entre os três tribunais (TC, STJ e STA), numa base anual ou outra.
(Declaração de interesses: fui juiz do Tribunal Constitucional imediatamente a seguir à sua criação e defendi na altura a precedência protocolar desse tribunal.)

domingo, 25 de junho de 2006

Presidente - não se demita. Demita-o!

É o teor de um sms que acabo de enviar ao Presidente Xanana!
Interferência nos assuntos internos, acusar-me-ão.
Eu não sou governo, sou deputada, cidadã portuguesa e amiga de Timor Leste. Trabalhei muito por ver o povo de Timor Leste livre e independente e não vou assistir impávida a que um punhado de casmurros de matriz totalitária precipitem de novo o país no caos.
"Interferi" muito, antes, por Timor Leste e não me arrependo.
É preciso que em Portugal se entenda que Mari Alkatiri até hoje não juntou os milhares de manifestantes da FRETILIN, que diz estar a reter para não provocar mais perturbações, pura e simplesmente porque não os tem.
Os militantes de base da FRETILIN são quem está mais desapontado com os falhanços deste governo. Alguns membros do governo também o sabem - e por isso se estão a demitir.
Vejam o que disse a Micató, Domingas Alves, uma militante da FRETILIN que se destacou na resistência no interior durante a opressão indonésia, quando se demitiu ontem do cargo de conselheira do PM para a igualdade das mulheres.
Os militantes da FRETILIN que estão próximos do povo sabem bem que o povo - por justas e injustas razões - odeia Mari Alkatiri e outros membros do seu governo. Sabem bem que muitos e graves erros foram cometidos, que inviabilizam que Mari Alkatiri continue à frente da governação. Eles não podem deixar que a obstinação de um punhado de gente arrogante e desligada da realidade arraste mais o país para o caos.

sábado, 24 de junho de 2006

PGR de Dili - atacada porquê? por quem?

Vejo muita gente em Portugal intrigada com o papel político dos rebeldes e civis armados e desafectos das FTDL ou da Polícia que se tornaram em actores favoritos dos media na crise timorense. Apesarem de serem todos, claramente, actores menores - os Reinado, Tara e até o recente Railos, que aparece a denunciar Rogério Lobato e, aparentemente, a querer comprometer também o PM .
Sobre Rogério Lobato e o que andou a fazer nos últimos anos, porém, poucos prestam atenção.
E no entanto há uma pista que valia a pena investigar: relaciona-se com o ataque cirurgico à PGR de Dili, ocorrido nos finais de Maio, no meio da violência generalizada.
Em Portugal, todos atribuiram tal acção aos processos pela violência de 99 - a tentação revanchista torna a conexão indonésia sempre apetível... (Houve até quem dissesse que tudo teria desaparecido.. calma, que a ONU em Nova Iorque tem cópia! Se ainda não se fez justiça não foi por falta de documentação, mas sim por falta de vontade política nas capitais dos P5 do Conselho de Segurança, e da Austrália e da Indonésia, obviamente; mais do que em Timor Leste...)
Mas porque é que o tal ataque cirúrgico à PGR não haveria de ter por objectivo fazer desaparecer não esses, mas antes outros incómodos processos?
Como os que foram abertos na PGR timorense, com a ajuda de magistrados portugueses ao serviço da ONU, sobre redes de prostituição, contrabando de sândalo, contrabando de armas e outras actividades ilegais a que o nome do ex-Ministro Rogério Lobato anda ligado na percepção de muito boa gente em Timor Leste.
Também é curioso que ninguém se lembre já que foi o perturbador Rogério Lobato que, em 13 de Abril último, numa cerimónia pública em Dili enxovalhou os magistrados portugueses, chamando-lhes até "colonialistas". Porquê, afinal de contas?
Lá que valia a pena investigar, valia....

Quém controla quem?

Ontem escrevi aqui a propósito da sustentação que o PM timorense deu a Rogério Lobato
"Mari Alkatiri julgaria porventura que, tendo-o por perto, melhor o controlaria. Como eu repetidamente avisei, acabaria antes refém dele".
Elementos de confirmação não tardaram: a ABC, a 23 de Junho, noticia "Lobato implicates Alkatiri in hit squads" a propósito das declarações que o ex-Ministro do Interior terá já prestado aos investigadores judiciais.
Ou será especulação mal intencionada da ABC?
Os jornalistas portugueses em Timor Leste não ouviram nem noticiam nada?

sexta-feira, 23 de junho de 2006

" A liga dos bastonários"

Como habitualmente, o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, está também publicado na Aba da Causa.

quinta-feira, 22 de junho de 2006

Timor Leste: à beira do abismo

A crise em Timor-Leste é grave, muito grave. Timor Leste pode estar à beira de ver a sua independência comprometida, e desta vez irreversivelmente, se o Presidente da República cumpre a ameaça de se demitir por o Primeiro Ministro teimar em agarrar-se ao cargo e não assumir pessoalmente as pesadas responsabilidades que lhe cabem nesta crise.
A FRETILIN, partido maioritário e vanguarda incontornável em Timor Leste, não pode mais tolerar este impasse: deve parar de acenar com compromissos que sabe insustentáveis e que só aumentarão os tremendos custos já impostos ao povo e mais fazem perigar a soberania e independência por que tantos timorenses pagaram com a vida. Os militantes de base da FRETILIN sabem, melhor que ninguém, que só o Presidente Xanana Gusmao, democraticamente eleito, mantem ainda autoridade e a confiança do povo. Só ele pode ser garante da salvação e unidade nacionais.
Não, não se trata de Timor Leste ser um Estado falhado, como sustentam certos sectores australianos, americanos e outros que sempre tentaram controlar Timor, por considerações estratégicas e outras relativas ao domínio dos seus importantes recursos de gás e petróleo. Sem dúvida, o acordo petrolífero que o Primeiro Ministro Mari Alkatiri negociou com a Austrália, com êxito, instigou esses sectores a retaliar, recorrendo a todos os expedientes e pretextos para fazer Timor Leste aparecer como condenado à falência. Assim como já tinham incentivado a Indonésia a invadir em 1975, estes sectores nunca deixaram de contar com as dissensões entre os timorenses e nunca deixaram, portanto, de as alimentar. Mas a triste verdade é que esta crise, decerto estimulada e aproveitada por actores externos, é sobretudo da responsabilidades dos governantes timorenses que cometeram sérios erros - e ao cometê-los fizeram o jogo de quem sempre souberam querer inviabilizar a independência do seu país.
Eu estou convencida de que Mari Alkatiri é sério. E de que em muitos e fundamentais aspectos foi um bom governante de Timor Leste (desenganem-se os que pensam que ele ainda governa ou poderá voltar a governar...). Mas noutros e também fundamentais aspectos Mari Alkatiri errou clamorosamente. Esses seus erros geraram a actual crise.
O maior dos erros do Primeiro Ministro Alkatiri foi ter incluído no seu governo Rogério Lobato, um homem perigoso, com conhecido passado criminal, que acirrou fricções, desconfianças e clivagens e tornou as relações com o Presidente e a Igreja ainda mais difíceis, sobretudo desde que em 2005 ordenou à Polícia que carregasse a tiro sobre homens, mulheres e crianças que aos milhares se concentravam junto à residência episcopal em Dili, em triste enfrentamento a pretexto das aulas de religião e moral (felizmente que o Comandante Paulo Martins se recusou a cumprir a ordem que teria resultado num banho de sangue). Há muito que se sabia que Rogério Lobato estava a aproveitar-se da supervisão da Polícia e dos contratos de equipamento da Polícia para armar milícias privadas e fomentar a divisão "lorosae -loromunu" (ele poderia tornar-se o braço armado dos loromunus, explicaram-me membros do Governo em Dili recentemente). Todos os Ministros o sabiam. E o Primeiro-Ministro também: conversamos várias vezes sobre aquele inquietante personagem, a última ainda há semanas, já a crise estava instalada.. Mari Alkatiri julgaria porventura que, tendo-o por perto, melhor o controlaria. Como eu repetidamente avisei, acabaria antes refém dele.
É isto que Mari Alkatiri, como verdadeiro patriota e homem de Estado, não pode deixar de reconhecer, demitindo-se sem tardar mais. Para viabilizar uma solução pacífica e política da crise, que a sua obstinação tem prolongado, pondo o país à beira do abismo. Para não ficar com a responsabilidade histórica de enterrar a independência de Timor Leste ou de, no mínimo expôr o seu sofredor povo a mais um doloroso e prolongado conflito.

Ana Gomes
Amiga do povo de Timor Leste

Abuso de poder sindical

É evidente que a liberdade sindical exige que os dirigentes sindicais gozem de um adequado tempo de dispensa de serviço para as suas actividades. É direito que a lei sindical de 1975 instituiu na nossa ordem jurídica. Mas o manifesto excesso de dirigentes sindicais dos professores com dispensa revela um claro abuso de poder sindical e um escandaloso laxismo dos ministros da educação que consentiram nesse regime.

Mola Dudle no Santiago Alquimista

Estou prestes a realizar um sonho de adolescente. Os meus companheiros de aventura são o Miguel, bateria; Diogo, contrabaixo; Nanu, vocalista e sampler; Matze, teclado, e Fernando Guiomar, lead guitar. Temos andado fechados num estúdio, daqueles românticos, à antiga, uma cave onde não chega a rede telemóvel e os sons se confundem todos naquele espaço claustrofófico mas, paradoxalmente, libertador.
Vou finalmente cantar com uma banda a sério. Um dueto com o Nanu, umas brincadeiras com a Carla Bolito (outra convidada especial) que resultaram de jam sessions, e uma versão inédita de "World in my Eyes", dos Depeche Mode. Tema preparado pelo Matze e que está - julgo que o termo técnico é este - "do catano, man!".
Ando de sorriso infantil estampado nas ventas. Sim, eu que nunca aprendi a tocar ferrinhos sequer, vou ter durante 90 minutos a ilusão de estar a viver o sonho pelo qual trocava tudo (mesmo o que levo de fantástico) na vida: ser o vocalista de uma banda. Suar em bica no palco, não pensar em nada, fechar os olhos, viajar.

É amanhã, sexta, às 22h30, no belíssimo espaço Santiago Alquimista - em LX. Apareçam.
Mesmo que eu estrague tudo, os meus companheiros (os músicos a sério!) valem a pena. LFB

ps: finalizei finalmente as minhas tarefas no ressuscitado, e em breve morto de vez, DESEJO CASAR. Vou tirar o fim-de-semana e prometo aos meus companheiros de causa voltar enfim, de uma vez e regularmente, ao seu convívio - algures durante a próxima semana. De preferência, com textos menos auto-promocionais.

Malai Azul ou cor de bicho peçonhento ?

"Xanana Gusmão... o que dirá a história sobre ele?
Xanana Gusmão deu o pontapé de saída para toda esta crise, cabia-lhe a ele resolver os problemas militares e nunca o fez.Quando os outros o fizeram veio dizer que estava mal feito. Morreram pessoas, muitas pessoas.Agora, Xanana vem com base num programa de televisão da ABC exigir a demissão do primeiro-ministro. É ridículo, é o desespero de quem até deixou a sua mulher - australiana - tecer comentários e acusações graves ao Governo de Timor-Leste. (...)"

Posted no blog Malai Azul, que escreve de Timor Leste.

O que dirá a história sobre Xanana Gusmão, pergunta o/a Malai Azul.
A História de Timor Leste já diz muito. É o Presidente eleito democraticamente pelos timorenses. É um heroi da resistência timorense. É o líder que resistiu nas montanhas e que conduziu um combate diplomático extraordinário a partir da cadeia indonésia pela independência de Timor Leste.
Foi ajudado ali em Jacarta, crucialmente, pela sua mulher Kirsty, desde meados dos anos 90. E a partir de 1999 também pela extraordinária portuguesa Paula Pinto, mulher de Roque Rodrigues. Ambas fizeram então ali o que nenhum timorense poderia fazer ou saberia fazer. Correram riscos tremendos e a sua devoção e dedicação à causa da independência de Timor Leste é inquestionável. Eu estava lá em Jacarta. Eu vi. Trabalhei de perto, intensamente, com ambas. E o que vivi com elas, e o que vi e sei, especificamente, da Kirsty, merece-me a mais rendida admiração e confiança indestrutível.
Kirsty Sword Gusmão é australiana, sim, so what?
Será que ser-se australiano é sinal de se ser vendido aos interesses mais sinistros de Camberra? O que teria então sido dos timorenses se tantos dedicados amigos australianos não tivessem sido solidários e militassem durante anos contra os seus próprios governos para ajudar Timor Leste na luta pela indepêndencia? Mais do que muitos portugueses, que só em 1999 abriram os olhos para as nossas obrigações relativamente a Timor Leste.
Não é um/a malai qualquer que, sabe-se lá quando descobriu Timor Leste no mapa, vai impunemente continuar a destilar peçonha contra o Presidente Xanana e a sua combatente mulher.
É por causa de leituras parcialíssimas e maniqueístas como as que são veiculadas pelo/a Malai Azul, valendo-se das altas (ou baixas?...) intimidades que tem em Dili, que muitos em Portugal - e alguns com a responsabilidade de perceber ou se informar melhor sobre o que se está a passar em Timor Leste - reduzem a crise em Dili a uma luta entre personalidades ou entre líderes que são a favor de Portugal ou a favor da Austrália. Essas leituras são redutoras, estúpidas e sobretudo profundamente ignorantes da realidade timorense.
Como a do/a Malai Azul - que é, além disso, mesquinha, xenófoba, preconceituada e claramente tendenciosa.
Oh Malai Azul , dá lá a cara para vermos se és mesmo azul, verde, cor de burro quando arrota ou cor de bicho peçonhento!

quarta-feira, 21 de junho de 2006

A inevitável demissão de Mari Alkatiri

Estou em Viena na Assembleia Parlamentar Conjunta ACP-UE, onde estão tambem deputados de Angola, Moçambique, Cabo Verde, S. Tomé e Principe e onde Timor Leste está representado pelo Embaixador em Bruxelas.
Amanhã debate-se aqui a situação em Timor Leste. Lamentavelmente, por compromisso inadiável em Bruxelas, não poderei estar presente. Estava, por isso, a preparar uma intervenção para ser lida em meu nome, quando me chegaram as dramáticas notícias de Timor Leste de que o Presidente Xanana Gusmão pedia a demissão do Primeiro Ministro Mari Alkatiri.
As notícias nada me surpreenderam, como se deduz de tudo o que escrevi e disse sobre esta crise, com a preocupação de não a agravar mais, nem precipitar acontecimentos inevitáveis. Mas há uma altura em que não se pode mais ignorar a realidade e poupar a responsabilidades quem as tem.
Por isso, aqui deixo um extracto do que amanhã será lido em meu nome aos colegas dos países ACP e UE:

"The situation in Timor Leste, however, can be corrected. We are not facing another case of a failed State, as it would suit those - and foremost some interested sectors in Australia, in the USA and elsewhere - who have always tried to control Timor-Leste for all sorts of strategic considerations, namely dominance over its important oil and gas resources.
In the same way they pushed Indonesia to invade Timor Leste back in 1975, those same interested foreign sectors never gave up creating trouble and dissension among the East Timorese, and the latest agreement on the sharing of the oil resources that the Prime Minister of Timor Leste successfully negotiated with Australia only made them more determined to retaliate, using any pretext to make Timor Leste appear as a failed State.
But as Ian Martin, the Head of UNAMET which helped the birth by referendum of Timor Leste in 1999 and who was sent there this month by the UNSG, said last week before the Security Council "This crisis is NOT about Timor Leste being a failed state. It's about a state that is only four years old and struggling to stand on its two feet and learn to practice democratic governance."
The problems in Timor Leste that this political crisis exposed can be corrected, I said earlier. Let me be clear: this crisis is not only fueled from abroad; many East Timorese with high responsibilities committed serious mistakes, thus playing into the hands of those foreign forces who wish to see Timor Leste independence fail.
The problems exposed in this crisis are actually already being corrected. And the role played by Timorese democratic elected institutions is being decisive in that correction process.
First and foremost the independence hero and democratic elected President of the Republic, Xanana Gusmão, has been given by the Government and the Parliament extraordinary powers to sort out the crisis and ensure security and defense of the people and the country. And, on behalf of the Government, the Minister of Foreign Affairs, now also Minister of Defense, Nobel Peace Prize Ramos Horta, has been actively engaging in dialogue with all parties to disarm civilians and disaffected police and military, resolve differences, identify their root causes.
All that is being done in strict respect for the constitutional order.
Also the Timor Leste judiciary is working: two days ago, the Public Prosecutor issued an arrest warrant for the former Minister of the Home Affairs, who has admitted to the press that he armed civilians belonging to his party, the ruling FRETILIN, in clear violation of the law.
That was publicly denounced by those same armed FRETILIN militants, what is a good sign of the regeneration capacity of FRETILIN.
And finally, yesterday, the President demanded the resignation of the Prime Minister, who is at least politically responsible for keeping in the Government and later making Vice-President of the ruling party a Minister who illegally resorted to arming civilians, fanning conflict and violence and, thus, endangering the country's independence.
All this process proves that Timor Leste is not a failed State, rather it is going through a difficult crisis of democratic growth. But, despite its youth and fragility, Timor Leste democratic institutions are working, expurgating those who committed serious mistakes, violated the law or attempted to subvert democracy".

segunda-feira, 19 de junho de 2006

A crise em Timor Leste

Já podem ler-se na ABA DA CAUSA diversos textos que escrevi nas ultimas semanas sobre a crise em Timor Leste.
Entre eles está o relatório que mandei a todos os deputados do PE em 30.5.
Também lá se encontra o texto da resoluçao aprovada pelo PE em 15.6.06, que negociei em nome do Grupo Socialista Europeu e, claro, co-patrocinei.

O fim de um défice democrático

Uma estada em terras distantes com deficiente acesso à Internet explica a minha pouca assiduidade no blogue nos últimos dias. O meu artigo do Público da semana passada, com o título em epígrafe, só agora está na Aba da Causa.

sexta-feira, 16 de junho de 2006

Gisberta

O Parlamento Europeu aprovou ontem uma resolução de condenação e apelo à luta contra a impunidade dos crimes de ódio racista ou homofóbico. O segundo parágrafo enumera uma série de casos recentemente ocorridos em vários países europeus:

"2. Condena firmemente todos os ataques de natureza racista e motivados pelo ódio e insta todas as autoridades nacionais a fazerem tudo o que possam para punir os responsáveis e para combater a impunidade no que diz respeito a esses ataques; manifesta a sua solidariedade para com todas as vítimas de tais ataques e para com as suas famílias, nomeadamente:
- o assassínio premeditado de uma mulher negra de nacionalidade maliana e de uma criança belga da qual era ama, perpetrado em Antuérpia, em 12 de Maio do presente ano, por um jovem belga simpatizante da extrema-direita, o qual havia, momentos antes, ferido gravemente uma mulher de origem turca na tentativa de a matar;
- o homicídio de um jovem de 16 anos em Janeiro de 2006 e de outro de 17 anos em Abril de 2006, em Bruxelas, e exprime a sua indignação com a cobertura destes crimes efectuada por alguns órgãos de comunicação social, que, em certas ocasiões, levaram à criminalização injustificada de comunidades inteiras por parte da opinião pública;
- o rapto, tortura e assassínio de Ilan Halimi, no passado mês de Fevereiro, em França, por um "gang" de 22 pessoas de diferentes origens e expressa a sua particular preocupação face à dimensão anti-semita deste crime;
- o homicídio de Chaïb Zehaf, perpetrado em Março passado, em França, devido à sua origem étnica;
- o brutal ataque de que foi alvo um cidadão alemão de origem etíope, Kevin K., na aldeia de Poemmelte na Saxónia-Anhalt, em 9 de Janeiro de 2006, atendendo sobretudo à sua motivação racista;
- a tortura e o homicídio hediondos de Gisberta, um transsexual que vivia na cidade portuguesa do Porto, cometidos em Fevereiro de 2006 por um grupo de adolescentes e pré-adolescentes menores;
- o ataque perpetrado contra Michael Schudrich, Grande rabino da Polónia, que teve lugar em Varsóvia, bem como as declarações de um destacado membro da Liga das Famílias Polacas incitando à violência contra a comunidade LGBT no contexto da marcha em prol da tolerância e da igualdade;
- a agressão de que foi vítima em 8 de Abril de 2006 Fernando Ujiguilete, português de origem guineense, na localidade de Castellar del Vallès, Espanha; devido a esta agressão, de índole racista, Fernando Ujiguilete esteve internado vários dias num hospital;
- o aumento das agressões e das palavras de ordem e cânticos de índole racista que ocorrem nos estádios de futebol por parte de simpatizantes da ideologia neonazi".


Nessa resolução eu introduzi a referência ao assassinato de Gisberta.
Porque não desvalorizo as implicações de grave doença social que tal crime, ainda por cima cometido por crianças, demonstra.
Porque não concordo com quem sustenta que Portugal esteja numa categoria à parte, pretensamente menos grave, entre os países europeus onde se assiste a uma escalada de manifestações e organizações racistas, xenófobas e homofóbicas.
Porque não estou no PE para fingir que em Portugal não há problemas, como a reaccionária cultura machista que alimenta perversões homofóbicas, a ponto de induzir menores a matar com requintes de malvadez uma pessoa doente e muito fragilizada.
Porque estou no PE para o utilizar. Para reforçar ou forçar a mão de autoridades que devem fazer justiça e fomentar a cultura da tolerância, respeito pela diversidade e respeito pelos direitos humanos.
Porque, já lá dizia Burke no sec. XVIII,
"Para que o mal triunfe, basta que os bons não façam nada"
("All that is necessary for the triumph of evil is that good men do nothing." Edmund Burke, político e filósofo irlandês, 1729 - 1797).

segunda-feira, 12 de junho de 2006

ÀS 21H, NO AUDITÓRIO DA FEIRA DO LIVRO

"DESEJO CASAR", o livro, é lançado amanhã - último evento da 76ª edição da Feira do Livro (com apresentação de Ana Sá Lopes).

Esta obra, recorde-se, é a sequela de "Ups, 'tás grávida?!" e a prequela de "A Partir Deste Momento, é o Meu Advogado Que Fala Contigo"; e um dos tomos da trilogia "Casório - da condição humana ou se calhar não". Apareçam. Obrigados. LFB

sexta-feira, 9 de junho de 2006

Desfaçataz e cinismo

Em Julho de 2000, duas escolas secundárias de Guimarães receberam mais de 900 atestados médicos para justificar faltas a exames, naquilo que ficou conhecido sarcasticamente como a "epidemia de Guimarães". Os médicos acusados da óbvia fraude foram agora absolvidos, por falta de provas. O advogado de um dos arguidos teve a desfaçatez de comentar: "A decisão é justa, ficou salvaguardada a dignidade dos médicos".
Na circunstância, esta frase merecia ser candidata ao Guiness do cinismo...

Até nem acho muito

«Um quarto dos condecorados [pelo Presidente da República] foram da comissão de Cavaco» - Público de hoje.
Quem condecora os seus não degenera...

O reino da espertice

Não vejo razão para a gente se espantar com o facto de haver pilotos da Força Aérea que recebem "subsídio de risco" mesmo sem voarem. Não há também agricultores que recebem subsídios sem cultivarem, trabalhadores que recebem subsídio de desemprego estando empregados, professores universitários que gozam de subsídio de exclusividade apesar de terem os seus consultórios ou escritórios, contribuintes que beneficiam de deduções fiscais como deficientes sem o serem, etc.?
Se fosse de outro modo, como é que Portugal poderia continuar a ser, como é, o reino da espertice fraudulenta à custa do Orçamento?

Quousque?

Jardim compara incompatibilidades à PIDE. Até quando é que os órgãos de soberania, a começar pelo Presidente da República, aturam passivamente os destrambelhamentos desta criatura?

Queremos a nossa prisão

Governo vai extinguir 22 prisões. Onde está o movimento para a preservação das ditas?

quinta-feira, 8 de junho de 2006

Irão: negociação ou não?

Num extraordinário volte-face na telenovela à volta do programa nuclear iraniano, os EUA admitiram finalmente a possibilidade de se juntarem a negociações directas com o Irão, sob a condição de este país suspender durante tempo indeterminado o enriquecimento de urânio e permitir à Agência Internacional de Energia Atómica estabelecer, de uma vez por todas, se o programa nuclear de Teerão é para fins militares ou pacíficos. (Não que restem dúvidas, mas ainda é preciso convencer a Rússia e a China que não se trata de uma obsessão do Ocidente, mas sim de preocupação genuína com um problema real).
Mas o mais surpreendente do novo pacote negocial apresentado aos iranianos por Solana em nome da China, da Rússia, da Alemanha, da França, do Reino Unido e dos EUA, é a possibilidade crucial de os "mullahs" manterem no seu país algumas capacidades de enriquecimento de urânio em escala reduzida. É o que diz o "WASHINGTON POST" de ontem, citando diplomatas europeus e americanos(vide http://www.washingtonpost.com/wp-yn/content/article/2006/06/06/AR2006060600685.html).
A confirmar-se esta notícia, trata-se de uma proposta que permitiria ao regime de Teerão manter a face nesta disputa, ao mesmo tempo que se impediria o Irão de produzir urânio enriquecido em escala industrial - e, assim, de produzir bombas atómicas.
Num artigo que escrevi e foi publicado no "EXPRESSO" em de Outubro de 2005 (e que está reproduzido na ABA DA CAUSA), eu dizia que eram precisas "soluções criativas para o programa nuclear do Irão (soluções que também se poderão aplicar a outros países que possuem ou venham possuir a tecnologia, como o Brasil): em vez de insistir com os "mullahs" para que abandonem todas as capacidades de enriquecimento de urânio, a Europa podia seguir o conselho do International Crisis Group: Teerão manteria um programa de enriquecimento de dimensões reduzidas e rigidamente controladas pela AIEA, ou alternativamente, todas as centrais nucleares iranianas seriam administradas conjuntamente pelo Irão e pela ONU, por exemplo."
Não sei se o Irão vai aceitar esta nova proposta, que inclui a possibilidade - pela primeira vez desde a crise dos reféns que se seguiu à revolução iraniana de 1979 - de negociações directas entre os EUA e Teerão, num contexto multilateral.
Mas uma coisa é certa: a proposta parece séria e bem concebida. E manda a bola para o campo de Teerão. Ao rejeitá-la, o Irão estaria a rejeitar uma posição comum de todas os P5 e confirmaria, perante os cépticos, os propósitos bélicos do seu programa nuclear.
Claro que há quem deva estar, a esta hora, de monco caído - os adeptos da atitude pueril "bombardeia-se o Irão, como fez Israel no Iraque em 1981 e já está!", que a escudavam na intransigência dos EUA em relação ao enriquecimento doméstico de urânio e quanto ao diálogo entre EUA e Irão. Há-os de ambos os lados do Atlântico. Incluindo, claro, em Portugal, onde abundam os pró-americanos mais pró-americanos do que os próprios americanos...

Sem surpresa

Entre os interesses da Brisa e os interesses dos consumidores, o Governo deu preferência aos primeiros, contra a Autoridade da Concorrência. O pior está em que já era de esperar...

terça-feira, 6 de junho de 2006

Quem veta a paridade, veta a democracia - II

Há ainda uma outra citação do comunicado da Presidência que me deixa pessoalmente ofendida:

"a dignificação dos direitos políticos das mulheres constitui uma prioridade constitucional indiscutível que deve ser assegurada por meio adequados, progressivos e proporcionais, e não por mecanismos proibicionistas que concedam às mulheres que assim acedam a cargos públicos um inadmissível estatuto de menoridade" .

Alguém tem dúvidas de que eu - caída de paraquedas na política em 2002 - alguma vez teria sido integrada na lista europeia do PS, em 2004, se não fosse a determinação do então Secretário-Geral Ferro Rodrigues de me incluir e de se valer do sistema de quotas que, pela primeira vez, fez aplicar no Partido para me colocar no lugar elegível na lista em que fui apresentada ao voto do eleitorado?
Alguém tem dúvidas que aos eventuais méritos e competências que alguns poderiam alegar em meu abono, muitos mais nas estruturas dirigentes e no aparelho do PS só contraporiam deméritos e inadequações?
Pois aqui estou eu hoje, deputada portuguesa eleita pelo PS ao Parlamento Europeu. No quadro e graças ao sistema de quotas já em vigor no PS. Em nada me sentindo diminuida, menorizada ou tolhida em relação a qualquer colega parlamentar ou partidário, nacional ou estrangeiro.
E por isso não me coíbo de criticar o Presidente Cavaco Silva e de denunciar a visão bota-de-elástico e realmente menorizante da democracia portuguesa subjacente ao veto que impôs à Lei da Paridade.

Quem veta a paridade, veta a democracia - I

Recebi com indignação a notícia do veto imposto pelo Presidente da República Cavaco Silva à lei da paridade.
Por razões políticas e de princípio: defendo que esta lei é necessária. Só peca por tardia e por defeito (devia exigir um mínimo de 40% e um máximo de 60% de qualquer género em listas partidárias, como já é prática noutros países europeus). Não pode continuar a invisibilidade das mulheres na política - é uma questão de democracia. De qualidade da democracia portuguesa.
Não, não podemos esperar que 'as coisas' avancem "naturalmente": o progresso também se faz pela via legislativa - sempre se fez. O aperfeiçoamento da nossa democracia exige que se combata a vergonhosa falta de mulheres em altos cargos políticos - se necessário, através de legislação.
O argumento do mérito individual é falacioso: ninguém pede quotas para a entrada de mulheres nas ordens dos médicos, dos advogados ou nas carreiras das magistraturas e da diplomacia (onde o acesso a mulheres estava vedado apenas há trinta anos atrás) porque nesses contextos existem claros critérios de mérito, testados e testáveis, iguais para todos. E por isso mulheres não faltam nessas profissões. Quem lá chega, chega por mérito. A política, pelo contrário, é uma área onde redes de contactos informais, amizades, fidelidades a lideranças jogam um papel determinante. Esta informalidade determina opacidade nos processos de escolha de indivíduos, sobretudo na elaboração de listas eleitorais. Opacidade que neutraliza o princípio do mérito. E que deixa tradicionalmente de fora as mulheres - não é por acaso que se fala nas 'old boys networks' e nos 'jobs for the boys'.
Ou será que os arautos do 'mérito' querem insinuar que não há mulheres competentes no país? Ou que só há duas mulheres suficientemente competentes para poderem ser ministras no presente governo socialista? ... Ainda por cima quando se sabe que por detrás, ao lado e quantas vezes adiante de todos os homens que são ministros, secretários de Estado, autarcas e parlamentares, mais ou menos competentes, estão, invisíveis mas muito actuantes e capazes batalhões de secretárias, assistentes, adjuntas, consultoras, conselheiras, administradoras, etc...
É evidente que uma lei da paridade precisa de um regime sancionatório rigoroso, de forma a garantir que seja cumprida. Poderá convir, por razões tácticas, ao Governo e ao Grupo Parlamentar do PS sustentar que o Presidente vetou a lei por considerar excessivo o regime previsto. Mas o Presidente não escondeu que a sua é, de facto, uma objecção de princípio, de substância, e não de forma. Basta ler o comunicado da Presidência. E por isso provavelmente um novo regime sancionatório mais "leve" não vai chegar. Porque Cavaco Silva se afirma realmente contra a paridade.
No comunicado à imprensa, o Presidente sustenta que, a ser aprovada a Lei da Paridade, "a liberdade de escolha do eleitorado relativamente às listas de cidadãos seria restringida, sem fundamento razoável, mediante a inclusão artificial e forçada em lugares elegíveis de candidaturas desconhecidas ou não desejadas, de um ou outro sexo". Para quem ainda tinha dúvidas, Cavaco Silva demonstra partilhar das teses mais retrógradas e obscurantistas nesta matéria.
Não é, de facto, a Lei da Paridade que restringe a liberdade de escolha do eleitorado; é a discriminação sistemática das mulheres na actividade política que o faz, pondo o eleitorado perante uma multidão de homens candidatos e apenas umas poucas mulheres. A Lei limitar-se-ia a restabelecer o equilíbrio e a justiça através de uma representação mais aproximada da realidade social e demográfica.
Por outro lado, o 'fundamento razoável' desta lei (que Cavaco Silva não vê) e do esforço que ela representa em introduzir uma medida de igualdade de género nas listas partidárias, encontra-se na Constituição da República Portuguesa - Artigo 109 - e nos princípios que a sustentam, nomeadamente o da igualdade entre homens e mulheres na participação na vida política. Será tal artigo também, na óptica presidencial, 'artificial' e 'forçado'?...
Cavaco Silva exibe tacanhez política quando considera "a inclusão" de mulheres nas listas partidárias "artificial e forçada". Se a inclusão obrigatória de mulheres em listas partidária é artificial e forçada, então o que é que é 'natural' e 'harmonioso'?
E que tipo de argumentos subjectivos, vagos e ideológicos são estes para bloquear legislação aprovada pelo Parlamento? O país que se cuide - preparemo-nos para ver o Presidente doravante afastar outras leis votadas pelos representantes democraticamente eleitos da República Portuguesa, a pretexto de elementos vitais delas serem 'artificiais e forçados'...

segunda-feira, 5 de junho de 2006

O Presidente bloqueador

Nos seus tempos de Primeiro-Ministro, Cavaco Silva ficou célebre por acusar as instituições que morigeravam os seus ímpetos governativos como "forças de bloqueio". Entre elas incluía o Tribunal Constitucional. É evidente, porém, que deixou de confiar nos dotes de bloqueio do Palácio Ratton, pois não enviou para lá o diploma da paridade eleitoral, apesar de o ter vetado com fundamentos de índole essencialmente constitucional.
Pelos vistos, em matéria de leitura da Constituição, a assessoria de Belém é mais confiável do que o Tribunal Constitucional.

Derivações linguísticas

«Foi recepcionada nestes serviços a informação (...)» - leio numa comunicação de um organismo oficial. Já havia o "intervencionar", a duplicar "intervir"; agora vulgariza-se o "recepcionar", a duplicar "receber". Qualquer dia -- quem sabe? --, teremos outras pérolas linguísticas como "comunicacionar", "educacionar", "inundacionar", "restauracionar", etc.

Correio dos leitores: Preços de serviços médicos

«Em Bruxelas, onde vivo, uma consulta num médico especialista (pediatra, oftalmologista, dermatologista, etc.) custa 30 ou 35 euros, quanto custa em Portugal? Acabo de fazer cá um tratamento que me custou 83 euros, pelo qual paguei 570 em Portugal - não, não há engano, foi mesmo cerca de sete vezes mais e posso provar que foi o mesmo tratamento -, tudo preços antes de qualquer tipo de comparticipação.
Isto tem alguma coisa que ver com o problema das vagas de medicina? Tem tudo. Há anos que os senhores doutores, depois de saírem dos seus consultórios, se vão sentar nas suas cátedras universitárias e decidem que só entra em medicina quem tiver vinte valores.
Fica assim garantido que muito poucos chegam à qualidade de especialistas e está assim garantida a sobrevivência do cartel. A Ordem dos médicos aplaude, os Governos - excepto o [ante]penúltimo [Amtónio Guterres] que criou duas novas faculdades de medicina - assobiam para o lado e quem paga é o mexilhão que, ou espera e desespera, ou paga e não refila.»

Feliz Santos

Abaixo de cão


Não compreendo nem acompanho a onda de ridicularização da proposta de deputados do PSD para a instituição de um "dia nacional do cão". Alguns comentários é que ficaram muito abaixo de cão...
Já há "dias nacionais" para tudo e mais alguma coisa, incluindo dias feriados por motivos que não dizem nada a muita gente. Ao menos este diria muita coisa a muita gente, e a muito bicho. O «Piccolo» (na imagem) e todos os outros canídeos deste país ficariam contentes, se soubessem.

domingo, 4 de junho de 2006

Paralelo

As greves da Fenprof são assim como as manifestações da CAP: criam uma irrestível predisposição para apoiar as políticas contra as quais eles protestam!

Pergunta de leigo

Desculpem a pergunta: é com o futebol incipiente e desinspirado dos encontros com Cabo Verde e com o Luxemburgo que Portugal pensa botar figura no Mundial? Valha-nos a Sra. de Caravaggio!

Para onde foi o dinheiro?

Palavras de uma entrevista da Ministra da Educação (hoje no Público):
«O problema é este: em dez anos, o número de alunos decresceu dois por cento e o número de professores aumentou 1,2 por cento. Depois olhamos para os recursos financeiros - em educação parece haver uma espécie de vergonha em falar dos meios financeiros, mas o país paga isto - e vemos que o orçamento do Ministério da Educação duplicou.»
Aumento de 100% das despesas, com menos alunos e poucos mais professores, e sem nenhuma melhoria dos indicadores do ensino. Para onde foi essa imensa quantidade de dinheiro? Quem é que está a "assaltar" o orçamento do Estado? Não vale adivinhar à primeira, mas aqui fica uma dica: quanto cresceu a massa salarial dos professores nesses dez anos?
Depois disto, o mínimo que se pode exigir é toda a informação sobre as finanças da educação. E, já agora, uma comparação entre as remunerações dos nossos professores com os de outros países da UE, em termos de paridade de poder de compra.

Saída espanhola

«Foi ontem prestar provas de selecção às universidades espanholas, em Lisboa, engrossando o número cada vez maior de alunos interessados em estudar no país vizinho. São 810 candidatos, quase todos ao curso de Medicina.» (Público de hoje).
É assim, todos os anos. Em Portugal faltam médicos e o preço dos serviços médicos privados é dos mais caros da Europa (desde logo por défice de médicos e falta de concorrência). Mas as faculdades não proporcionam lugares para os candidatos a frequentá-las. Nas universidades públicas, as vagas aumentaram, mas continuam muito aquém da procura. E uma política demasiado restritiva continua a vedar a criação de cursos de medicina em universidades privadas. Ora, se o Estado não garante vagas a todos os interessados, pelo menos deve autorizar alternativas no ensino privado. Assim, resta a saída espanhola, para os que podem arcar com as despesas inerentes à deslocação.

Excesso

A propósito do sistema de avaliação dos professores do ensino básico e secundário, a centralidade que tem sido dada à questão da opinião dos pais é manifestamente excessiva. Na verdade, tal opinião só entra em conta, entre oito "indicadores", na avaliação efectuada pela direcção executiva da escola, a quem compete a ponderação de todos esses itens.
Diz o preceito em causa:
«Artigo 46º
Itens de classificação
1 - A avaliação efectuada pelo coordenador do departamento curricular ou conselho de docentes pondera o envolvimento e a qualidade científico-pedagógica do docente, com base na apreciação dos seguintes parâmetros classificativos:
a) Preparação e organização das actividades lectivas;
b) Realização das actividades lectivas (cumprimento dos programas curriculares);
c) Processo de avaliação das aprendizagens dos alunos.
2 - Na avaliação efectuada pela direcção executiva são ponderados, em função de dados estatísticos disponíveis, os seguintes indicadores de classificação:
a) Nível de assiduidade;
b) Resultados escolares dos alunos;
c) Taxas de abandono escolar;
d)Participação dos docentes no agrupamento/escola e apreciação do seu trabalho colaborativo;
e) Acções de formação contínua frequentadas;
f) Exercício de outros cargos ou funções de natureza pedagógica;
g) Dinamização de projectos de investigação, desenvolvimento e inovação.
h) Apreciação realizada pelos pais e encarregados dos alunos que integram a turma leccionada, em relação à actividade lectiva do docentes»
.
Não vejo nenhum motivo para censurar esta solução.

Correio dos leitores: Ordens profissionais e concorrência

«Tarde se fazia -- face à sua importância que é, sobretudo, e muito mais do que jurídica, económica -- passar da mera discussão para a plena e devida aplicação das normas da concorrência. É nesta senda que se chega, agora ao sector das ordens profissionais.
(...) Foram já apontadas justificações para a proibição de preços mínimos, podendo afirmar-se, sem margem para dúvidas, que estes são limitativos da autonomia das empresas, impedindo os operadores económicos de praticar preços mais baixos e, assim, concorrerem entre si. Isto, enquanto privam os consumidores da aquisição, ao melhor preço, de um bem ou serviço, ao que acresce a agravante de reforçarem, artificialmente, os obstáculos ao acesso de novos concorrentes. Naturalmente impedidos, em função do preço, de concorrer.
Mas se é fácil perceber os inconvenientes da proibição de fixação de preços mínimos, já não é tão perceptível a proibição dos preços máximos. E, no entanto, estes limitam, igualmente, a concorrência. Na verdade, a fixação de preços máximos potencia o alinhamento dos preços, de modo que o "preço máximo estabelecido" pode tornar-se a regra. Tal fixação é ainda restritiva, ao proporcionar a previsão do preço máximo dos concorrentes, funcionando como desincentivo à inovação e ao oferecimento de bens ou serviços de qualidade superior. (...) Não concordo, portanto, com a posição que defende a abolição dos preços mínimos, com a manutenção, contudo, de um tecto, de uma fixação de máximos. Um entendimento deste tipo contraria o princípio que subjaz a esta precisa questão, ou seja, e em última instância, o direito da livre concorrência. É, quanto a mim, uma manifesta contradição, apenas explicável numa perspectiva conciliadora, de "agradar a gregos e a troianos".»

Marta Ávila,

Correio dos leitores: Farmácias

«Foi surpreendente o acordo entre o Governo e a ANF. (...) E lembrar-me eu do "bota abaixo" inacreditável manifestado pela ANF perante aquela proposta [das farmácias sociais] de Ferro Rodrigues! Agora sim, compreendo a pacificação.
Quanto à abertura de 300 novas farmácias, ou muito me engano, ou elas vão ter quase inteiramente às mãos dos que já são proprietários. Não esqueçamos que agora, com o novo regime, os actuais detentores podem possuir até quatro estabelecimentos. Pois não são eles que têm mais facilidade de as constituir por já estarem dentro dos "segredos" e dos meandros das secretarias? Que têm contacto com os fornecedores, etc?
Na verdade, parece-me que a ANF ganhou em toda a linha.»

Fernando Barros

Comentário
Na verdade, o acordo entre o Governo e a ANF mantém o concurso para as novas farmácias, tendo prioridade quem não tiver farmácias, ou quem tiver menos. E também não confere prioridade aos farmacêuticos, se bem que eles têm uma vantagem à partida, visto que um dos critérios de selecção é a composição do quadro técnico previsto.
Já quanto à possibilidade de acumulação de 4 farmácias, sem liberalização da instalação de farmácias, isso vai reduzir o número de proprietários, com a inerente diminuição da concorrência, o que me parece contraditório com os propósitos anunciados pelo Governo.

Correio dos leitores: Farmácias

«(...) A ANF, mais uma vez venceu e tem tudo o que quer do governo:
1º - Liberalizar apenas a PROPRIEDADE: só beneficia os actuais proprietários, e legaliza as falsas propriedades existentes.
2º - Os valores dos trespasses ainda vai inflacionar mais: porque vai haver menos farmácias à venda e vai haver maior procura.
3º - As ditas farmácias nos hospitais, serão para as farmácias já existêntes nos arredores dos mesmos (...).
4º - A alteração da capitação de 4000 hab para 3500 é ridícula (em 1999 Eng Gueterres alterou a capitação de 6000 hab para 4000 hab e abriram pouco mais de 200 farmácias).
Conclusão - infelizmente, na opiniao pública dá a ideia que a ANF foi combatida, mas na realidade ela sai fortalecida, pois moldou o acordo tal como queria.
O governo perdeu a oportunidade de repor a justica nas farmácias, por isso concordamos, quando diz que as medidas são insuficientes.
O Sr. Primeiro ministro diz, e bem, que um jornal não tem de ser de um jornalista, uma clinica do médico, um cinema de um cineasta, só não explica o seguinte: um médico pode abrir um consultório; um cineasta, um cinema; um jornalista, um jornal. Mas, um farmacêutico não pode abrir a sua farmácia. Porquê?
A liberalizar, deve ser tudo - propriedade e abertura das farmácias. Só assim as populações beneficiam e há concorrência. Os farmacêuticos querem a LIBERALIZAÇÃO DA ABERTURA DE FARMÁCIAS, que é o que a ANF não quer e conseguiu.»

Mov. Farmácia Livre

sexta-feira, 2 de junho de 2006

O primeiro veto (3)

«Paridade: PS só pode apresentar novo diploma a 15 de Setembro» - lê-se numa publicação digital. Erro grosseiro: na verdade, a AR pode proceder, acto contínuo, à modificação do diploma vetado pelo Presidente, no ponto por ele questionado, e reenviá-lo para Belém. E obviamente a maioria necessária para aprovar as modificações é a mesma que serviu para aprovar o diploma, e não uma maioria de 2/3, como defendeu inadvertidamente um deputado oposto à lei.
Só não seria assim, se o PS tentasse e falhasse (como seguramente sucederia) a confirmação do diploma, para forçar o Presidente a promulgá-lo tal como está, o que exigiria uma maioria de 2/3, que obviamente o PS não está em condições de reunir. Então, sim, perdida a confirmação, ficaria encerrado o procedimento legislativo, o qual só poderia ser repetido na próxima sessão legislativa.

O primeiro veto (2)

Não está evidentemente em causa a legitimidade constitucional do veto presidencial, sobretudo tratando-se de legislação eleitoral, ou seja, das regras do jogo democrático, cujo cumprimento incumbe ao Presidente vigiar e cuja alteração carece sempre de especiais cuidados.
Mas o tema do diploma vetado e as razões do veto mostram uma evidente clivagem entre Belém e a maioria parlamentar num tema politica e ideologicamente muito sensível. Só os distraídos é que podiam pressupor candidamente uma convergência entre as posições de Cavaco Silva e as do PS nesta e em várias outras áreas. Afinal, não basta a "boa fé e a inteligência" para apagar conflitos entre Belém e São Bento, que têm a ver com diferentes valores e que estão inscritos no cerne da disputa política.
Este foi somente "o primeiro veto". Parafraseando António Vitorino, habituemo-nos!

O primeiro veto

O Presidente da República vetou a chamada "lei da paridade", que obriga os partidos a compor as listas eleitorais com pelo menos 1/3 de candidatos de cada sexo, de modo a promover a igualdade de género nos órgãos representativos.
Na sua justificação, Cavaco Silva não impugna o objectivo nem a solução da lei, mas somente a sanção prevista para o não cumprimento das referidas quotas, que era a rejeição das listas. Fica assim aberta a possiblidade de manter a lei, optando por outro tipo de meios para levar os partidos a cumprir aquela exigência. Não se vê que outra alternativa reste, senão as sanções pecuniárias.
Sucede, porém, que as sanções têm de ser suficientemente pesadas para dissuadirem efectivamente os partidos de as ignorarem, sob pena de assistirmos à situação francesa, em que a lei da paridade é ridicularizada pela sua generalizada violação, a troco do pagamento de multas pouco significativas.
Pior do que não haver lei, seria uma lei "sem dentes".

O triunfo da ANF

Decorrido os dois dias de embargo estabelecido pelo Público para a difusão pela Internet dos artigos nele publicados, já está na Aba da Causa o meu artigo desta semana, intitulado "As farmácias e o poder".
Há no acordo entre o Governo e a ANF mais um ponto importante (que não mencionei no artigo por falta de espaço) em que a segunda levou a melhor. É que, se ficou estabelecido, e bem, que a liberalização da propriedade das farmácias não beneficiará os laboratórios farmacêuticos, que ficam proibidos de ter farmácias, sucede porém que esta proibição de "integração vertical" não ficou estabelecida, e mal, no sentido inverso, podendo a ANF manter as suas empresas de produção de medicamentos (o que pensarão os laboratórios farmacêuticos desta desigualdade de tratamento?).
Também aqui o Governo não seguiu as recomedações da Autoridade da Concorrência, que explicitamente propunha:
«Definição de normas que proíbam o acesso à propriedade de empresas produtoras de medicamentos por parte de empresas detentoras de farmácias, bem como das respectivas associações sectoriais, excluindo investimentos de natureza financeiras»
(Recomendação A7.
Trata-se de mais um grande triunfo da ANF neste acordo, porventura o mais importante. É estranho que ninguém ainda tivesse dado conta dele!

Correio dos leitores: Honorários médicos

«(...) Mas, afinal, não seria útil manter limites máximos para os honorários dos médicos, como defende a Ordem? Sem isso os consumidores podem ser surpreendidos com preços incomportáveis. Além disso, sendo poucos os médicos em várias especialidades na maior parte do País, a falta de limites máximos e a ausência de concorrência vão tornar as consultas e tratamentos ainda mais caros do que já são».
João Reis

Comentário
Primeiro, se houver uma obrigação de afixação dos honorários em cada consultório ou uma obrigação de ajuste prévio da remuneração, ninguém pode ser surpreendido pelo preço, podendo procurar alternativas mais baratas. Segundo, as leis da concorrência não proíbem preços máximos, desde que não sejam estabelecidos pelas associações profissionais, mas sim pelo próprio Estado. Basta haver uma lei que tal imponha ou que autorize o Governo a fazê-lo.
Concordo que pode fazer todo o sentido manter limites máximos para os serviços profissionais, lá onde a concorrência seja escassa. É o que sucede justamente no caso dos médicos entre nós, visto que um deliberado malthusianismo profissional restringiu artificialmente o acesso à profissão desde há muito tempo, através das restrições à entrada nos cursos de Medicina. Situação que, embora muito atenuada, continua a existir, pois a entrada nas faculdades de Medicina continua sujeita a "numerus clausus" e o Estado não tem autorizado cursos de Medicina em universidades privadas.
O melhor antídoto contra os preços altos é mesmo aumentar a oferta. Mas como esta não pode aumentar do pé para a mão...

Jornalistas e empresas de comunicação

Com o seu livro e as suas acusações, M. M. Carrilho pode ter concitado contra si a animosidade de muita gente no meio jornalístico. Mas estas duas propostas que ele apresenta -- declaração de interesses (ou melhor, de conflito de interesses) por parte dos jornalistas e código de conduta das empresas de comunicação -- podem fazer muito sentido, pelo que deviam ser bem acolhidas pelos próprios visados.

quinta-feira, 1 de junho de 2006

O massacre de Haditha (2)

«As in My Lai [massacre no Vietname em 1968], the army's first response was to cover up. The marines gave money to the victims' families, perhaps to buy silence. The official story was that 15 Iraqi civilians were killed by the same bomb that killed the marine, and that another eight victims were ?gunmen?. Courageous reporting by Time magazine has exposed that account as a lie. Most of the dead were killed in their homes; most and maybe all were unarmed; and they may have been killed in cold blood, not in the heat of battle. Only after Time gave the army its findings did the Pentagon launch an investigation of its own.»
The Economist, ed. 1 de Junho de 2006.

Quem está farto de quem

Como era de esperar e aqui se antecipou, a Fenprof anunciou mais uma greve nacional de professores (agora é assim todos os verões, se calhar para preparar as férias...).
Segundo a federação sindical, «os professores e educadores estão fartos dos descontrolados impulsos persecutórios da ministra da Educação». É pena não se darem conta de que a generalidade dos portugueses pode estar a ficar farta do extremismo sindical da Fenprof e dos prejuízos que os seus impulsos descontrolados causam aos alunos e à escola pública.

O massacre de Haditha

Depois do episódio das torturas na prisão de Abu Graib, era de esperar que a ocupação militar do Iraque não trouxesse a público mais histórias sórdidas de violência gratuita. Porém, é agora indesmentível o massacre de Haditha, em que um grupo de militares norte-americanos matou a sangue frio muitos civis iraquianos indefesos, incluindo mulheres e crianças, em pura retaliação pela morte de um soldado norte-americano. Já que os danos causados à lógica da ocupação são irreversíveis, o mínimo que se pode esperar é a severa punição dos culpados. Como diz um editorial do Guardian, "um crime de guerra é um crime de guerra".
E quantos mais "abu graibs" e "hadithas" serão necessários, para além das dezenas de milhares de outras vítimas, para que os defensores da ocupação reconheçam que ela foi um erro?

A Dinamarca e a Índia

Há uns dias atrás, os media fizeram grande alarido com o "dia da libertação dos impostos", para sublinhar os muitos dias (137) em que os portugueses "trabalham para o Estado". A mensagem era dupla: primeiro, que em Portugal a carga fiscal é anormalmente pesada; segundo, que os impostos são consumidos por uma máquina anónima e improdutiva chamada "Estado", sem retorno social.
Ora, a verdade é que -- mais ineficiência, menos ineficiência --, a carga fiscal corresponde em geral ao volume e qualidade dos serviços públicos que são exigidos ao Estado. Basta comparar a Dinamarca (205 dias) ou a Bélgica (194) com a Índioa (74 dias) ou o México (91). Afinal, o "Estado social" custa dinheiro: basta pensar no custo de um serviço nacional de saúde, como o Portugês.
Mais importante é o facto de que -- como se lê numa artigo de J. Albano Santos ontem publicado no Jornal de Negócios (indisponível online) -- a carga fiscal em Portugal, medida pelo número de dias de rendimento absorvidos pelos impostos, é bem menos pesada do que e média da OCDE (137 dias contra 146) e ainda menos do que a média da UE (137 dias contra 173), contrariando as ideias que por aí correm. Claro, também não dispomos do nível de serviços públicos de que outros países dispõem.
Mas uma coisa é certa: menos impostos significariam menos (ou piores) serviços públicos. Do que se trata é de saber se queremos ser como a Índia ou como a Dinamarca!

Cartas dos leitores: Professores

«(...) O senhor também é daqueles que acredita que o insucesso é culpa dos professores dos ditos níveis de ensino, só, pura e simplesmente? Penso que não! Então as Universidades e as ESE's formaram/formam mal os professores? Porque é que o Ensino Superior tem de ficar sempre de fora da polémica da educação em Portugal? Eu andei na sua Universidade, já há alguns anos (quando o senhor aí dava os seus primeiros passos como docente) e também vi lá muita coisa... tive muitos assistentes, agregados, catedráticos..., como professores e também os poderia avaliar... pois todos podemos avaliar tudo, até santos, pecadores e demónios, mas adiante... pois tudo é relativo. Imagino como será hoje, com os valores antigos (...), já há muito desaparecidos, mas que no meu tempo, apesar de tudo e de outras coisas, ainda lá havia alguns desses valores...
Porque é que o senhor não fala/escreve sobre a indisciplina dos alunos que grassa nas escolas e refere, pelo menos e como exemplo, as medidas que recentemente foram tomadas na Inglaterra, exactamente para, nesse contexto, se tentarem resolver muitos problemas na educação? Gostaria de o ver a ministrar aulas no ensino básico e secundário, em certas escolas, e iria ver como saía de lá exausto e às vezes desiludido, pelo motivo de que o senhor queria fazer o seu trabalho sério e não o poderia fazer, muitas vezes eficazmente, porque os alunos não lhe reconheciam autoridade, ou porque pura e simplesmente não acreditam no futuro deste país e, por tal, já se encontram à partida muito desmotivados. Isto é um problema social, se calhar também um problema de cultura da sociedade portuguesa de hoje que, cada vez mais, se generaliza e nada, neste campo, é feito em Portugal. É preciso actuar em várias frentes neste combate... e não só referindo os docentes (mas só alguns) como os causadores de todos os males da educação em Portugal. A demagogia é fácil e é sempre uma bom jogo populista...
(...) Porque é que também nada diz (peço desculpa se não estou correcto, ou seja, se já disse ou escreveu) quanto ao ensino que é ministrado nas Universidades e nas ESE's, que formaram e estão ainda a formar os docentes do básico e do secundário? Se há certos males, há origens... (...)»

David A. C.