terça-feira, 31 de março de 2015

Contraciclo

O desemprego em Portugal voltou a aumentar em fevereiro (acima dos 14%), como mostra a figura junta, revertendo pelo terceiro mês consecutivo o ciclo de descida que vinha desde 2013.

Mais preocupante ainda, esse agravamento vem ao arrepio da consistente diminuição do desemprego na zona euro desde meados de 2013 (como mostra o quadro abaixo), em consonância com a firme retoma económica em curso na UE. Portugal fica cada vez mais distante da média da zona euro.


O Governo, que festejava ruidosamente cada redução do desemprego (e era caso para isso) como se fosse tudo mérito seu (o que era menos verdade), entrou em estrita mudez, incapaz de explicar a inversão da tendência, o que só pode ter a ver com uma inesperada perda de vigor do crescimento económico anunciado. Resta saber se se trata somente de um solavanco passageiro.

Eleições na Nigéria



"O povo votou no sábado passado, apesar de temer  a violência dos perdedores com o anúncio dos resultados (...) Ainda se contam votos nos centros de agregação - onde eu  e outros observadores vimos tentativas para adulterar os resultados - e já começaram protestos: uns dos cidadãos indignados com os truques na contagem e agregação dos votos, outros orquestrados por grupos armados ligados aos candidatos e partidos que se antecipam perdedores. (...)
Voltei convencida de que os nigerianos votaram pela mudança e de que Buhari pode vir a ser declarado o próximo presidente. Crucial é que o novo governo responda  às gravíssimas necessidades sociais e económicas e de segurança do povo, o que passa pelo combate à corrupção e à impunidade, incluindo a dos terroristas do Boko Haram - o que implica tratar dos problemas que lhe estão na base e lhe alimentam narrativa e recrutamento.
Uma observação sobre a política externa e africana que NÃO temos com este Governo em Portugal: há uma memória histórica das antigas relações com Portugal na Nigéria. É o país chave da ECOWAS, decisivo na União Africana, controla o Golfo da Guiné, mantém acesa rivalidade com Angola como vimos na Guiné Bissau. E onde há hoje mais de 150 portugueses qualificados a trabalhar. Há tremendo potencial de negócio no sector da construção e noutros na Nigéria, a primeira potência económica de África.  Mas não temos lá ninguém da AICEP, e a embaixada tem 1 único diplomata, nem sequer embaixador. Em contraste com a Irlanda que tem 12 funcionários diplomáticos. Como podemos continuar a armar-nos em grandes especialistas para explicar África na União Europeia?"


(Extractos da minha crónica de hoje no Conselho Superior, ANTENA 1. A transcrição integral pode ler-se na ABA DA CAUSA aqui http://aba-da-causa.blogspot.be/2015/03/eleicoes-na-nigeria.html)

segunda-feira, 30 de março de 2015

Ainda não foi desta...

...que o PSD foi desbancado do poder na Madeira, tendo mantido a maioria absoluta, ainda que à justa, o que não deixa de ser notável. Notável também, mas por razões inversas, é o muito fraco resultado da heteróclita coligação liderada pelo PS, quer pelo baixo score eleitoral quer por ter continuado atrás do CDS.
Decididamente, não basta ser contra a austeridade e pela reestruturação da dívida pública para ganhar eleições, sendo esta a principal lição a retirar das eleições regionais madeirenses....

Adenda
A pesada derrota do PS (com menos de 12%!) teve pelo menos o mérito de desencadear a demissão do líder socialista regional, cuja vocação para a função era manifestamente escassa.

sábado, 28 de março de 2015

"Lixo"


Contrariando as expetativas governamentais (e o seu otimismo eleitoralista), as agências internacionais de rating continuam a avaliar negativamente o risco da dívida pública portuguesa, tendo em conta a persistência de elevado défice nominal e estrutural das finanças públicas e o baixo potencial de crescimento da economia.
Com esses dois handicaps são limitadas as possibilidades de reduzir a dívida pública. E enquanto esta não entrar numa trajetória consistente (e não apenas conjuntural) de redução não é de admirar que o risco da dívida pública se mantenha alto.

Agenda
O Primeiro-Ministro veio dizer que as agências de rating mantiveram a notação negativa porque estão à espera das eleições. Mas quem ler a justificação dada pelas agências logo verá que o que está em causa são os dados e as previsões económicas e não qualquer justificação política. Todavia, se a observação de Passos Coelho faz algum sentido. ela é um enorme tiro no pé: se as agências estão à espera das eleições para subir a notação da dívida portuguesa, isso só pode querer dizer que apenas o farão se houver mudança de governo, pois o atual só pode dar mais do mesmo!

sexta-feira, 27 de março de 2015

Há limites para a infâmia

Já não surpreende que o tabloidismo militante não tenha limites nem escrúpulos na campanha de condenação preventiva de José Sócrates antes sequer de qualquer acusação, espezinhando todas as normas deontológicas do jornalismo e a integridade moral das pessoas. Já é demais, porém, que a imprensa de referência também replique e veicule histórias como a de que o livro de Sócrates sobre a tortura foi escrito por outrem.
Sobre o assunto, cumpre-me dizer o seguinte: por iniciativa minha, tive a oportunidade de acompanhar a feitura da tese de mestrado de Sócrates que veio a dar no referido livro; enviou-me sucessivamente o draft de cada capítulo, tendo eu feito algumas observações e sugestões pontuais (incluindo bibliografia), sobretudo quanto aos aspetos constitucionais e afins do tema, que o autor em geral acolheu, mas nem sempre; tive também oportunidade de conversar ocasionalmente com ele sobre alguns dos temas da tese, sendo óbvio o seu domínio e à vontade na matéria. Sei também, por me ter sido dito por ele, que submetia o seu trabalho a outras pessoas, que igualmente contribuíam com críticas e observações, a quem agradeceu depois no prefácio do livro, como é de regra.
Nada disto -- que é normal numa tese académica -- é compatível com a tese de um trabalho apócrifo. Há limites para a infâmia.

Adenda
Se, com a prestimosa cooperação da imprensa, a acusação continua a recorrer a estes golpes baixos para uma continuada operação de "assassínio de caráter" de Sócrates , é porque falta "corpo de delito" para sustentar a acusação pelos crimes que lhe são imputados, passados todos estes meses de investigação.

Corrigenda
Os agradecimentos de Sócrates aos que deram uma ajuda na tese não foram feitos no prefácio do livro mas sim no discurso de apresentação pública do livro em Lisboa. Aqui fica a correção factual.

quinta-feira, 26 de março de 2015

Privilégios


Já não é a primeira vez, pelo contrário, que considero inaceitável o regime de pensões privativo dos juízes e diplomatas, segundo o qual essas pensões são sempre equivalentes à remuneração no ativo (portanto com "taxa de substituição" de 100% permanentemente atualizável com a remuneração), sem nenhuma relação com o percurso contributivo dos beneficiários (e que no caso dos juízes inclui o próprio subsídio de residência!).
Trata-se de um privilégio que atenta contra qualquer entendimento do princípio da igualdade perante a lei e que passou incólume o "programa de ajustamento" dos últimos quatro anos, apesar do elevado montante dessas pensões. Pelo contrário, o privilégio desses pensionistas em relação aos demais pensionistas do setor público agravou-se com o corte de 10% das pensões da função pública atribuídas desde 2014, a que aqueles escapam.

Defender os clientes de serviços profissionais


Eis os primeiros parágrafos da minha coluna semanal de ontem no Diário Económico, sobre a nova figura do provedor dos clientes dos serviços profissionais.

quarta-feira, 25 de março de 2015

Tese

O que distingue um partido de governo na oposição e um partido de protesto é que nem todos os protestos merecem apoio.

terça-feira, 24 de março de 2015

Ucrânia

Denieprpetrovsk, 3a cidade da Ucrânia com cerca de 1 milhão de habitantes, na manhã de sábado passado, Avenida Karl Marx: manifestação contra o Governo, do partido de extrema direita Svoboda, reune uns 500 gatos pingados...     

Ucrânia: a Rússia de Putin é o agressor

"A leste, claramente, a Rússia de Putin é o agressor e a Ucrânia é a vítima. 
Putin viola o direito internacional ao anexar a península da Crimeia deixando em estilhaços o tratado que garantia a fronteira em troca da desnuclearização da Ucrânia. Putin está a violar os direitos humanos dos tártaros da Crimeia e de todos os ucranianos que querem viver em democracia sem a corrupção como sistema, como é típico do poder oligárquico que mantinha Yanukovitch em Kiev e mantém Putin em Moscovo. Putin instrumentaliza locais para figurarem como rebeldes na região do Donbass e dar cobertura à infiltração de milhares de soldados e tanques russos que semeiam destruição - como o abate do avião da AirMalásia, mais de 5000 civis mortos, muitos mais feridos de guerra e dois milhões de ucranianos refugiados e deslocados internos. Putin orquestra propaganda mentirosa, tentando reduzir o povo ucraniano a uma cambada de fascistas: ele, Putin, é que é o reaccionário que subsidia fascistas, como os lepenistas em França." 

(Extracto das minha crónica desta manhã no Conselho Superior, Antena 1, que pode ser lida integralmente na ABA DA CAUSA, aqui:  http://aba-da-causa.blogspot.be/2015/03/ucrania-russia-de-putin-e-o-agressor.html)

Quatro coelhos de uma cajadada


Como mostra este quadro do Financial Times, o câmbio euro-dólar aproxima-se da paridade, mercê de uma desvalorização do euro (cortesia do BCE ao inundar o mercado com euros todos os dias) e de uma simultânea revalorização do moeda norte-americana.
A desvalorização da moeda comum europeia embaratece as exportações da zona euro, o que ajuda a fazê-las crescer (incluindo o turismo), e encarece as importações, pressionado a sua redução.
Desse modo, com o seu programa de "expansão monetária" o BCE faz quatro em um: além do combate ao perigo da deflação (objetivo primordial), também ajuda a melhorar o saldo comercial externo, a estimular a atividade económica e a facilitar as metas da disciplina orçamental. Chapeau!
A UE a sair da crise económica e em especial os países a sair de duros programas de ajustamento orçamental (nomeadamente a Irlanda, Portugal e Espanha) agradecem. E as bolsas de valores também.

Asfixia antidemocrática (2)

Esta notícia, oficialmente confirmada pelo presidente da CRESAP, constitui um duplo escândalo.
Primeiro, a nova diretora-geral interina da Autoridade Tributária "reprovou" em dois concursos anteriores para o lugar, não tendo ficado entre os três nomes seleccionados por mérito. Mesmo se nomeada apenas a título provisório, trata-se de uma deliberada provocação ao mecanismo de seleção dos altos cargos da Administração que este próprio Governo instituiu.
Segundo, fica a saber-se também que estão por nomear 13 cargos de subdiretores-gerais na mesma AT, apesar de o respetivo procedimento de seleção ter decorrido, o que só pode querer dizer que o Governo não gosta dos nomes selecionados pela CRESAP, preferindo manter indefinidamente o preenchimento interino dos cargos.
Decididamente, à beira das eleições o Governo perdeu todo o escrúpulo em matéria de favoritismo político na nomeação de altos cargos da Administração.

"O PS só não chega"

A experiência de abertura institucionalizada do PS ao exterior na preparação e formulação das suas propostas políticas iniciou-se há duas décadas, com os "Estados Gerais" de António Guterres, tendo sido depois replicada em novos moldes com as "Novas Fronteiras" de  José Sócrates.
Como se nota acertadamente aqui, recordando os êxitos eleitorais de Guterres (1995) e de Sócrates (2005), «o PS só mobiliza os cidadãos quando é capaz de ir além de si próprio». É oportuno recordar essas experiências, passados vinte anos e dez anos respetivamente sobre a sua ocorrência, quando o PS é chamado novamente a protagonizar uma alternativa de governo mobilizadora.

Primeiro milho

Abriu cedo a lista de pré-inscrições para a corrida presidencial, que só terá lugar daqui a dez meses, com a anúncio da intenção de candidatura de Henrique Neto, um conhecido empresário oriundo do PS.
Mas não compartilho da preocupação com essa candidatura, atribuída a alguns militantes socialistas. Mesmo que consiga alinhar na corrida, angariando o número suficiente de assinaturas, é evidente que HN não vai conseguir mobilizar o PS em seu apoio, nem sequer ter muito apoio eleitoral. O que a alegada preocupação mostra é que dentro do PS há pessoas nervosas com a demora na definição de um candidato presidencial de peso na área do partido.

segunda-feira, 23 de março de 2015

Notícias menos más

1. Contrariamente ao que algumas sondagens antecipavam nas eleições interdepartamentais francesas,  a extrema direita da FN ficou-se pelos 25% dos votos, muito distante da coligação de direita-centro, que venceu com mais de 30%, e perdendo mesmo para a coligação de esquerda liderada pelo PS.
A suposta chegada ao poder da FN não está assim tão perto.

2. Na eleições regionais da Andaluzia, o PSOE ganhou folgadamente, com o mesmo score das eleições anteriores, não perdendo votos para o Podemos, que ficou num distante terceiro lugar, com 15%, à custa de debacle dos comunistas e do PP.
As noticias sobre a morte do bipartidismo em Espanha e da iminente vitória do Podemos a nível nacional podem no fim do dia ser ligeiramente exageradas.

Adenda
Estas eleições regionais andaluzas constituem o primeiro teste eleitoral dos dois novos partidos espanhóis, o Podemos e o Ciudadanos. Embora não se tenham saída mal (15% e 9%, respetivamente), ficaram muito aquém das previsões eleitorais a nível nacional. Resta saber se vão manter o elan até às decisivas eleições legislativas do final deste ano, com as eleições locais e regionais de  permeio.

domingo, 22 de março de 2015

Um trio dispendioso


Este estudo revela uma das mais perniciosas políticas nacionais durante décadas, ou seja, o enorme gasto do Estado no apoio à construção e aquisição de habitação própria, em desfavor das verbas dedicadas à reabilitação urbana, à habitação social e ao subsídio ao arrendamento, que são os meios mais apropriados para assegurar o direito à habitação dos famílias de menor rendimento.
Se à bonificação dos juros do crédito à construção e à habitação se somarem as deduções fiscais relativas aos encargos com juros e amortizações, as subvenções públicas ao setor atingem montantes estratosféricos. Junto com a lei do arrendamento, que impossibilitava um verdadeiro mercado de arrendamento, o apoio financeiro do Estado à habitação própria foi o principal fator na distorção do setor habitacional em Portugal.
Marcada por um claro viés social -- visto que, embora subsidiada por todos os contribuintes, a habitação própria não está ao alcance de toda a gente --, essa política errada foi alimentada pelo apoio político não somente dos beneficiários mas também do setor da construção civil, dos bancos e dos municípios (por causa das taxas de construção e habitação). Um trio bem dispendioso!

Assim vai este país

1. Mistério: por que é que os investidores em "papel comercial" do GES se atiram ao Governador do Banco de Portugal e não aos donos do mesmo GES, que forem quem lhes vendeu gato por lebre aos balcões do BES? Ou será que Carlos Costa se tornou no bode expiatório da sua própria incúria ao terem investido em produtos financeiros de risco?

2. Obviamente, neste país todos têm liberdade de manifestação, a qual, no entanto, está sujeita a regras e a limitações legais quanto ao seu exercício, incluindo a comunicação prévia às autoridades policiais. Será que as recorrentes manifestações dos referidos detentores de papel comercial do GES, qualquer que seja a razão que lhes assiste, têm respeitado essas condições legais? E a liberdade de manifestação inclui porventura o direito de invadir e de ocupar instalações alheias?

Adenda
O facto de os títulos emitidos por outras empresas serem vendidos ao balcão de um banco não torna este responsável pelo reembolso desses mesmos títulos em caso de falência daquelas, a não ser que tenha dado essa garantia. E, contrariando esta precipitada declaração, muito menos o Estado tem de assumir qualquer responsabilidade por investimentos privados pouco prudentes, que seria paga pelos contribuintes.

sábado, 21 de março de 2015

Pelotão da frente


Este quadro, com números de 2013 (fonte: European Voice), mostra que Portugal se encontra no pelotão da frente dos Estados-membros da UE quanto à produção de energia renovável, com mais de 25% (6º lugar), avançando para o 5º lugar quanto à meta de 2020 (mais de 30%).
É certo que isso tem um custo adicional para os consumidores nacionais de energia elétrica, mas além de ajudar a cumprir as metas quanto à redução de emissões de CO2 a energia renovável poupa também na conta do país na importação de energia, contribuindo para o saldo positivo das contas externas.
Este êxito é o resultado da determinada aposta nas energias renováveis (hídrica, eólica, etc) decidida pelo governo do PS (José Sócrates) há uma década.

Adenda
Recebi do Professor J. L. Pinto de Sá (IST) o seguinte esclarecimento, que agradeço:
A posição da Suécia no ranking de energias renováveis deve-se à geração hidroeléctrica e é antiga, fruto dos recursos naturais desse país na sua região norte. Nada deve a qualquer decisão política de índole ambiental, tanto mais que a Suécia complementa o seu “mix” electroprodutor com energia nuclear. De resto, a campeã europeia de energia renováveis, e que supera em grande escala relativa a Suécia, é a Noruega, pelos mesmos motivos naturais, e que só não está no ranking por não pertencer à União Europeia.
O mesmo sucede com a Suíça, devido ao aproveitamento dos degelos alpinos, que explicam também a posição da sua vizinha Áustria, esta no ranking por pertencer à UE.
E o mesmo sucedia com Portugal, que em 1970 tinha 75% da sua electro-produção de origem renovável, concretamente hidroeléctrica (atingira 80% nos anos 60). Essa percentagem caiu para para os actuais cerca de 18% não porque se produza menos hidro-electricidade, mas porque o nosso consumo per capita quintuplicou desde então.
Poderia ainda desenvolver muito mais este assunto, mas creio que esta chamada de atenção para o muito antigo papel da hidro-electricidade nos países que têm especiais recursos nesse domínio já o ajudará a contextualizar melhor as suas opiniões sobre este assunto.

quinta-feira, 19 de março de 2015

Lista VIP

1. A chamada "lista VIP", destinada a proteger especialmente o sigilo fiscal de personalidades públicas, é obviamente ilegal por dois simples motivos: não tem a necessária base legal e a composição da lista não tem nenhum critério objetivo. Nem sequer se sabe quem é responsável pela sua elaboração, sendo, portanto, filha de pais incógnitos!
Uma vez que entre nós toda a gente beneficia do sigilo fiscal, todos devem estar protegidos contra o acesso abusivo dos funcionários da Administração fiscal. A haver um filtro eletrónico de identificação de acesso não autorizado, ele deve ser universal, sem discriminações.

2. Como já escrevi várias vezes, entendo que o sigilo fiscal (e tributário em geral) não deve cobrir os titulares de cargos políticos, sendo um ónus inerente à necessária transparência e responsabilidade no exercício desses cargos. Portanto, em vez de estarem superprotegidos nesse aspeto, deveriam estar expostos ao escrutínio público.

Adenda
Não basta ao Governo dizer que não ordenou nem autorizou a lista.  A responsabilidade política não é menor se tiver sabido da lista e não tiver feito nada.

quarta-feira, 18 de março de 2015

"Governamentalismo"


A minha coluna semanal de hoje no Diário Económico comenta a proposta do PS para alterar o sistema de nomeação do governador do Banco de Portugal.

Adenda
Há um óbvio lapso nesta notícia do Observador sobre o meu artigo. Defendo exatamente o contrário do que diz o título da notícia, ou seja, que NÃO se deve mexer de de forma avulsa nos poderes do Presidente da República. [Lapso já corrigido]

Iniquidade

Este estudo confirma o que sempre tenho defendido, ou seja, que o ensino superior é um ativo altamente rendoso para os seus detentores e que por isso os beneficiários deveriam contribuir mais para o financiamento do seu próprio ensino superior, em vez de este ser no fundamental financiado por impostos, pagos também pelos que em nada beneficiam dele e que se ficam pelo ensino secundário, o que é uma iniquidade.

Paulo Portas espingardeia para fugir à verdade






Acima reproduzo a transcrição de escutas da PJ que li (não ouvi gravações) quando me foi facultado consultar a documentação apensa ao processo dos submarinos. A primeira fotografia  é de extracto do meu Requerimento de Abertura de Instrução - que não posso, por ora, divulgar na íntegra porque o processo ainda está em segredo de justiça. Mas como a conversa transcrita já foi amplamente divulgada pela imprensa, permito-me reproduzi-la: copia "ipsis verbis" a transcrição da PJ.
Porque nada tenho a esconder, vou mais longe: reproduzo também o extracto de outra página do meu Requerimento de Abertura de Instrução, em que faço uma interpretação do que li na transcrição da escuta, admitindo e sublinhando desde logo que pudesse haver má transcrição. A minha interpretação pode estar errada e ser induzida por errada transcrição da escuta - como sugeriu entretanto o "Expresso". Mas também resulta de outros elementos no processo sobre fundos de desconhecida  proveniência que o Ministro Paulo Portas e o seu tesoureiro no CDS/PP Abel Pinheiro geriam, para uso exclusivo do líder, e que não tencionavam passar à  liderança sucessora no CDP/PP: expliquei o que estava em causa no artigo "O tesouro do Delfim" que escrevi no Público http://www.publico.pt/politica/noticia/o-tesouro-do-delfim-1685929) e a que Paulo Portas até hoje, sintomaticamente, não reagiu.
Paulo Portas reagiu hoje veementemente, na Comissão de Inquérito ao BES, espingardeando contra mim em resposta a questões que o Deputado José Magalhães lhe colocou, agarrando-se ao erro de transcrição e à interpretação errónea que o dito erro induziu  - e por que assumo a responsabilidade. 
Paulo Portas reagiu assim não para me intimidar ou fazer desistir - ele sabe que eu não desistirei, que esgotarei todos os meios judiciais e outros para trazer a verdade a público sobre o negócio dos submarinos, que está na base de condenações na Alemanha por corrupção em Portugal.
Paulo Portas reagiu assim não para defender a sua honra  ou para se defender da "fraude" que estridentemente me imputa: ele sabe que fraude é com ele e por isso até hoje nunca recorreu aos tribunais para me acusar de difamação. Tratou aliás de antecipar por que não me demandaria em justiça, recorrendo ao argumento de que me refugio atrás da imunidade parlamentar (argumento que Aguiar Branco lhe fornece, usando e abusando falaciosamente da recusa do PE me levantar a imunidade para responder no processo que contra mim accionou: falaciosamente porque passa por cima do facto de que, mais de um mês antes de o Ministro me processar, ter eu entregue à própria Senhora Procuradora Geral da República uma queixa detalhada sobre a actuação do Governo no processo de subconcessão dos ENVC - nunca me furtei a discutir o assunto em justiça, pelo contrário, tomei a iniciativa de lho levar!)
Paulo Portas reagiu hoje espingardeando sobre mim para desviar atenções e não dar respostas a questões pertinentes que o Deputado José Magalhaes lhe colocou sobre a relação promíscua e servidora dos interesses do GES/BES/ESCOM que o processo dos submarinos, tal como o processo Portucale, demonstram abundantemente que cultivou enquanto Ministro entre 2002/2005, com colossal prejuízo para os interesses do Estado.


terça-feira, 17 de março de 2015

Quem fez e quem está na Bolsa VIP?

"Perante o crescendo do clamor público e a exigência de esclarecimento feita pelo líder do PS, António Costa, fomos ontem brindados com novo desmentido do Secretário de Estado - que não via necessidade de se investigar o que não existia. Logo depois contraditado pela própria Ministra das Finanças, que ordenou investigação pela Inspecção Geral de Finanças.
É estranho que a Inspecção Geral de Finanças não tivesse tomado a iniciativa de agir mais cedo. E era preferível que a investigação fosse da competência de entidade externa ao Ministério das Finanças. Aguardemos, porém, pelos resultados. 
Pelo meu lado, não me interessa só saber se há ou não Bolsa VIP, mas quem a ordenou, quem a pôs em prática e quem são os suspeitos privilegiados que dela constam - designadamente se estão nela algumas das 200 pessoas que devem mais de 1 milhão de euros ao fisco e das 117 empresas que devem mais do que isso, segundo hoje noticia a imprensa.
Uma Bolsa VIP é uma aberração inconcebível num Estado de direito: põe em causa o princípio da igualdade, a justiça tributária e constitui crime de abuso de poder."

(Extracto das notas para a minha crónica de hoje no Conselho Superior, ANTENA 1, que podem ser lidas na íntegra na ABA DA CAUSA http://aba-da-causa.blogspot.be/2015/03/quem-fez-e-quem-esta-na-bolsa-vip-do.html )

Crise grega (3)


Este argumento de racionalidade política (colhido aqui) valeria para um governo responsável normal. Mas duvido que funcione no caso do aventureirismo irresponsável do Governo Syriza. Com os cofres vazios e já a recorrer a "empréstimos" dos fundos de segurança social, o Governo grego continua a "marimbar-se" para os compromissos que assumiu para receber a fatia do empréstimo da troika que ainda lhe cabe. Entre perder a face política e arrastar o pais para a saída do euro, o Syriza opta por caminhar maquinalmente para o abismo.
É de admitir que a visita de Tzipras a Berlim na próxima semana, a convite de Merkl, seja a última tentativa de chamar o governo grego às suas responsabilidades e obrigações na manutenção do país no euro. Mas nada indica que a razão de Estado prevaleça sobre o fanatismo doutrinário...

Adenda
O Syriza prossegue metodicamente na sua agenda de provocação política, desta vez desencadeando uma suposta "auditoria" sobre a divida pública  «para saber que parte desta dívida foi utilizada para o bem comum e, como tal, é legal e deve ser paga, e que parte foi mal gasta e, portanto, é ilegal». Portanto, a legitimidade dos empréstimos depende do uso que a própria Grécia lhes deu, na opinião dos "avaliadores" escolhidos pelo Syriza! Ou seja: quem pediu dinheiro é que agora vai decidir se os os créditos dos emprestadores são "legais"?!...

Duas questões controversas

O facto de serem imputados a um ex-primeiro-ministro supostos crimes praticados no exercício de funções suscita duas questões jurídicas controversas quando a pessoa em causa já não exerce essas funções, pelo facto de a lei penal e processual penal não preverem explicitamente essa hipótese.
A primeira questão consiste em saber a que tribunal (STJ ou tribunal penal de 1ª instância) compete o eventual julgamento desses alegados crimes, bem como a supervisão da instrução, incluindo a decisão sobre a prisão preventiva. Foi essa a questão sobre que versou a decisão de ontem do STJ, tendo o tribunal decidido que a questão não é suficientemente clara para justificar a libertação em sede de habeas corpus, devendo por isso ser apreciada em sede de recurso ordinário da prisão preventiva (que está pendente).
A segunda questão consiste em saber se tais eventuais crimes devem ser qualificados como "crimes de responsabilidade" (por terem sido alegadamente praticados por titulares de cargos políticos no exercício de funções), para efeitos do regime penal especial destes, incluindo por exemplo o agravamento das penas e os efeitos das penas. Essa questão só virá a ser definida aquando da eventual acusação, se vier a existir.

segunda-feira, 16 de março de 2015

Asfixia antidemocratica


Há meia dúzia de anos, na fase final do primeiro Governo Sócrates, a direita inventou a expressão "asfixia democrática", a propósito de uma alegada (mas inexistente) ocupação governamental do Estado.
O que dizer então agora, quando a direita tem a presidência da República, a maioria parlamentar e o Governo (mais a PGR...), quando o recrutamento dos altos dirigentes da Administração pública é uma coutada governamental (sendo sistematicamente rejeitados os candidatos socialistas selecionados pela CRESAP) e quando o domínio político da comunicação social vai ao ponto de o "comentário político" nas três televisões de sinal aberto (incluindo na TV pública!) ser um escandaloso monopólio de três antigos ministros do PSD, dois deles antigos líderes?
Agora, a qualificação mais apropriada da situação só pode ser a de asfixia antidemocática.

Plano B



O título desta peça pode ser especulativo, mas parece lícito admitir que o PS não descarta por ora a hipótese de vir a apoiar Sampaio da Nóvoa na corrida presidencial, caso falhe uma candidatura "da casa" (Guterres, Vitorino, etc.). Não por acaso, ele foi um dos independentes convidado a discursar no Congresso do PS que consagrou a liderança de António Costa (na foto).
Resta saber se a sua proximidade às esquerdas alternativas e a sua visão intervencionista do cargo presidencial são as melhores credenciais para um candidato vencedor a Belém e se são de molde a tranquilizar um futuro governo do PS em matéria de estabilidade governativa.

sábado, 14 de março de 2015

Os poderes do Presidente


1. Concordo com a ideia de que o governador do BP não deve ser nomeado livremente pelo Governo, tendo eu defendido publicamente que o indigitado passe previamente por uma audição parlamentar pública na comissão parlamentar competente, tal como já hoje sucede com os demais reguladores independentes, no termos da nova lei-quadro de 2013.
Penso mesmo que o PS deveria ter feito deste ponto uma "linha vermelha" aquando da aprovação da lei. Nesse ponto a nova proposta do PS é bem-vinda.

2. Quanto à ideia de nomeação pelo Presidente da República, mesmo que fosse politicamente defensável (o que está por provar...), ela tem o "pequeno" problema de não ser viável sem revisão constitucional, visto que os poderes do PR são os definidos na Constituição (e assim tem de ser num Estado de direito constitucional). Ai de nós se admitíssemos o alargamento dos poderes do PR por qualquer maioria parlamentar ad hoc à margem da Constituição.
Além disso, a admitir dar ao PR esse importante poder numa próxima revisão constitucional, isso não deveria ser feito de forma avulsa, mas sim a troco da moderação de outros poderes presidenciais, por exemplo, o poder de dissolução parlamentar (atualmente discricionário).

Adenda
Recordo que quando estava na oposição o PSD também defendia a nomeação dos presidentes de todas as autoridades reguladoras (incluindo o governador do BP) pelo Presidente da República, ideia que sempre combati e que o PSD assisadamente abandonou quando chegou ao Governo. É sempre prudente os partidos de governo não avançarem na oposição com ideias precipitadas, que depois se têm de "meter na gaveta" quando no Governo.

Doping

O programa de "expansão monetária" do Banco Central Europeu, através da compra maciça de dívida pública aos investidores (nomeadamente os bancos), já está a produzir os efeitos pretendidos na descida das taxas de juro e na desvalorização do euro, em consequência da inundação do mercado com euros frescos.
Com isso matam-se dois coelhos de uma cajadada: com a redução dos juros diminui-se a despesa com os encargos da dívida pública, aliviando o défice orçamental; com a desvalorização do euro estimulam-se as exportações e encarecem-se as importações, melhorando o saldo comercial externo. Tanto a redução dos juros como o fomento das exportações vão dinamizar a retoma económica e a criação de emprego. Em Portugal, portanto, o próximo Governo vai beneficiar de condições económicas e orçamentais mais favoráveis.
O único problema com este doping monetário é que ele é por natureza transitório, devendo cessar logo que a inflação de aproxime dos 2%. Importa por isso não relaxar os esforços (agora menos penosos por efeito da prodigalidade do BCE) de consolidação orçamental sustentável e de aumento da competitividade estrutural da economia, para que o fim do programa de estímulo vindo de Frankfurt não faça renascer os velhos problemas orçamentais e das contas externas. A crise por que passámos não pode ser desperdiçada.

Adenda
Com este quadro, cortesia do BCE, as metas oficiais de crescimento económico, de saldo orçamental e de saldo das contas externas para este ano em Portugal devem ser atingidas (se não ultrapassadas) com relativa facilidade. Mais uma vez, o Governo prepara-se para colher os louros de obra alheia.

quinta-feira, 12 de março de 2015

Notícias que nascem velhas

A notícia de que Carvalho da Silva está disponível para ser candidato à presidência da República é daquelas que antes de o serem já o eram, neste caso desde que ele deixou o PCP sem se conhecer nenhuma divergência séria com o partido.
Resta saber que forças políticas à esquerda do PS podem vir a apoiá-lo (sendo improvável o do PCP e problemático o do BE). O facto de tomar a dianteira (sendo o primeiro candidato-a-candidato assumido) não lhe garante nenhuma vantagem. A inscrição para a grelha de partida das eleições presidenciais ainda não está aberta.

Antologia da demagogia tabloidística


E depois? O que é que justifica uma manchete destas? Há algo de ilícito ou de censurável nessa contratação? Não é óbvio que Costa tinha qualificações para o serviço para que foi contratado? A generalidade dos funcionários dos partidos não são militantes dos respetivos partidos? Um ex-governante, que não tenha emprego cativo à espera dele (como tantas vezes acontece), é obrigado a ficar sem rendimentos ou a ir precipitadamente para a atividade privada, mesmo que queira continuar uma carreira política?

quarta-feira, 11 de março de 2015

Escrutínio político


Assim começa -- com uma declaração apócrifa de Cavaco Silva -- a minha coluna semanal de hoje no Diário Económico, sobre o escrutínio parlamentar do cumprimento das obrigações tributárias de Passos Coelho

terça-feira, 10 de março de 2015

Crise grega (2)

O parlamento grego tem 300 deputados, 50% mais do que o parlamento português, para uma população similar. Não consta que o Syriza vá votar a redução do número de deputados (que estava na agenda do governo anterior).
Entre as regalias dos deputados gregos inclui-se, além de segurança pessoal, o direito de requisitar um carro pago pelo Parlamento, direito que o Syriza não revogou e a que renunciaram menos de 50 deputados, de vários partidos. A verba orçamental para esta despesa atinge 3.2 milhões de euros...
regalias em que a esquerda radical não mexe quando delas beneficia, mesmo quando invoca a existência de uma catástrofe humanitária no País...

Adenda
Quando um partido de extrema-esquerda faz governo com um partido de direita nacionalista, o resultado pode ser tóxico. O desbocado ministro da defesa de Atenas acaba de ameaçar que, se a UE não socorrer a Grécia, haverá uma "inundação de milhões de imigrantes económicos" na Europa, incluindo "alguns jihadistas do Estado Islâmico"!
Já não basta ao Governo esquerdista-nacionalista querer ignorar as regras da moeda única; há quem pretenda pisar também as regras da União.

Adenda (2)
«A Grécia está a ficar sem tempo, sem dinheiro e sem amigos».

Deontologia bancária


Sim. Faria de Oliveira tem razão quando reclama um compromisso de deontologia profissional para os banqueiros. Não ando a exigir menos desde este texto de 2009 sobre "ética bancária".
O problema é que, a cada escândalo bancário nos últimos anos (BCP, BPN, BPP e BES), não ouvimos uma firme condenação deontológica da Associação de Bancos Portugueses, a associação profissional do setor.
No site da APB há um código de conduta das instituições de crédito enquanto funcionam como entidades de mediadoras de valores mobiliários. Mas mesmo nessa vertente não tenho notícia de nenhum processo nem de nenhuma sanção disciplinar...

Basta, Senhor Presidente!

"Podia aqui gastar esta e mais crónicas a desmontar a efabulação que o Presidente Cavaco Silva dá à estampa no último dos seus "Roteiros": a de que contribuiu decisivamente para a afirmação da política externa portuguesa durante os seus mandatos presidenciais. Mas não vale a pena recordar tristes episódios nas relações com Angola ou a entrada da ditadura Obiang na CPLP: bastará dizer que o Presidente não fez mais pela política externa porque nos últimos dez anos Portugal realmente não teve política externa, desinvestiu em capacidades de promoção dos seus interesses geo-políticos e económicos, incluindo as básicas de defesa e de segurança, e nem sequer política europeia teve: apurou-se quando muito na diplomacia costeira sob bússola barrosã, especializada em estranhos negócios de estrangeiros, das privatizações aos vistos dourados...
Há, todavia, limites para tudo. E as mais recentes intervenções públicas do Presidente Cavaco Silva suscitam-nos. Quer por tomar parte manhosa, mais uma vez respaldando o Primeiro Ministro em vez de o instar a assumir responsabilidades cívicas e políticas, procurando reduzir as exigências legítimas da oposição e do país indignado a mera controvérsia politico-partidária. Quer, por outro lado, a inaceitável tentativa de definir, com interesseiros propósitos de politica intra- e extra-partidária, o perfil do seu sucessor. 
Ambos os pronunciamentos levam-me a ter de dizer: Basta, Senhor Presidente! Poupe-nos e poupe-se! Reconduza-se, no já curto tempo de magistério que lhe resta, à máxima que um dia nos enunciou de que o "silêncio de um PR é de ouro".

(Transcrição de extracto da minha crónica desta manhã no Conselho Superior, ANTENA UM. Versão integral pode ser lida na ABA DA CAUSA, aqui http://aba-da-causa.blogspot.fr/2015/03/basta-senhor-presidente.html)

segunda-feira, 9 de março de 2015

Ridículo

Que Cavaco Silva tenha tornado público o seu perfil ideal de Presidente da República é matéria que cabe na sua liberdade de opinião, concorde-se ou não com o dito modelo. Que vários protocandidatos da direita se tenham apressado a proclamar que cabem no referido perfil (mesmo quando é óbvio o contrário...) é simplesmente ridículo.

A crise grega

A crise grega continua sem solução à vista, com o Governa Syriza a brincar com a sua situação periclitante na zona euro. Desafiando o acordo alcançado há duas semanas no conselho de ministros das finanças do euro, o governo grego tomou decisões que o contrariam e enviou agora para Bruxelas uma proposta de medidas que, embora positivas em si mesmas, fica muito aquém dos compromissos que assumiu em matéria orçamental.
Para agravar as coisas, o loquaz ministro das finanças do Syriza ameaçou com um referendo às medidas requeridas pela UE, o que só pode aprofundar a perda de confiança de Bruxelas no Governo grego. Entretanto, a situação orçamental do país vai-se degradando, por causa da quebra substancial da receita fiscal e da paralisação do programa de privatizações. O risco de a Grécia deixar de cumprir as suas obrigações financeiras internacionais vai-se adensando.
Como diz insuspeitadamente um dos membros proeminentes do comité central do Syriza, o governo grego entrou em modo de "desobediência controlada". Resta saber se os demais membros da zona euro vão aceitar complacentemente a ostensiva renegação de obrigações. Como nota um comentador em Atenas, aproxima-se o momento em que Tzipras vai ter de optar entre permanecer no euro e regressar ao drachma.

sábado, 7 de março de 2015

Um mau serviço à República

O Presidente da Republica poderia ter várias boas razões para não se pronunciar publicamente sobre o incumprimento das obrigações contributivas de Passos Coelho para a segurança social --, menos justamente a que utilizou publicamente, ou seja, a de não desejar intervir em "lutas político-partidárias".
Ao desqualificar assim uma questão importante, o Presidente da República não fez somente um "frete" indiscreto ao Governo; desqualificou também a luta pela responsabilidade e pela transparência dos titulares de cargos públicos no cumprimento das suas obrigações tributárias. Um mau serviço à República.

Adenda
Imagine-se que o primeiro-ministro em causa era José Sócrates: será que Cavaco Silva descartaria com o mesmo falso argumento a eventual recusa em tomar posição pública?

sexta-feira, 6 de março de 2015

Banditagem financeira

O relatório da "auditoria forense" à gestão do BES na sua fase terminal revela uma escandalosa sucessão de atos ilícitos dolosos, uns de natureza contraordenacional outros de natureza criminal, que se julgariam impensáveis.
Decididamente, depois dos casos do BPN e do BPP, o BES parece revelar uma maldição do país na sua exposição à banditagem financeira.

quinta-feira, 5 de março de 2015

Assim vai este país

Recebi um aviso de pagamento de uma taxa moderadora referente a um dos hospitais do SNS de Coimbra. Qual não foi a minha surpresa quando verifiquei que o pagamento só podia ser feito nos próprios serviços ou por cheque ou vale de correio!
Pelos vistos, o pagamento por via eletrónica (multibanco ou transferência bancária) ainda não chegou a um dos principais hospitais do país. Continua a haver ilhas resistentes à simplificação administrativa e ao respeito pelos interesses dos utentes.

quarta-feira, 4 de março de 2015

Ortofonia


Eis o cabeçalho da minha coluna semanal de hoje no Diário Económico, em defesa do respeito da norma fonética culta da língua portuguesa na comunicação e no discurso público.

Adenda
Há na televisão dois anúncios que exibem essa corrupção fonética da pronúncia lisboeta. Num deles o anunciante de uma lotaria europeia diz que ela faz criar "chêntricos" todos os dias (ele quer dizer "excêntricos"); noutro anúncio gaba-se a capacidade de uma mezinha de emagrecimento de eliminar os "chessos" de gordura (ela quer dizer "excessos"). 
Assim vai a língua portuguesa...

Adenda 2
Perguntam-me qual é a norma fonética culta da língua portuguesa. Para o Português europeu, que é o caso que importa para nós, a fonte mais autorizada é o Dicionário Contemporâneo da Língua portuguesa da Academia de Ciências de Lisboa (Lisboa, Verbo, 2001), que tem transcrição fonética das palavras.

Um pouco mais de rigor sff


Esta notícia (extraída do Diário Digital), além de inverosímil, é um disparate impróprio de qualquer publicação séria. De facto, como se diz na notícia originária, esse pseudo-ranking de "países miseráveis" respeita somente a 51 países (num total mundial de 195!) e utiliza como variáveis apenas a taxa de desemprego e a de inflação, e não, como é habitual, o rendimento ou a capacidade de aquisição das pessoas.
É fácil saber que Portugal figura em 42º lugar no ranking mundial de rendimento per capita harmonizado em "paridade de poder de compra" (PPC), o que não é propriamente "miserável" (há 150 países mais pobres).

terça-feira, 3 de março de 2015

Os mistérios do dinheiro desaparecido e do dinheiro aparecido

...Não quero terminar este rol deprimente sobre a injustiça fiscal e a realidade financeira em Portugal sem chamar a atenção dos ouvintes para um estranho mistério criado por este Governo: "o mistério do dinheiro aparecido", como escrevia há dias o Diario Económico.  Sim, ouviram bem, aparecido. Apareceram subitamente cerca de dois mil milhões de euros, investidos em certificados de aforro emitidos pelo Estado em Janeiro, após o anúncio pelo Governo de que a remuneração iria descer para as aplicações feitas em Fevereiro.  Ora, não se sabe de onde vieram esses dois mil milhões de euros! Como escreve o referido jornal: "Não vieram dos depósitos, que não sofreram tamanha fuga; não vieram dos fundos de investimento; não vieram sequer da bolsa" É claro que vieram de fora do no sistema. A questão é "se estavam em gigantescos colchões em casa dos subscritores", ou se vieram de proveniência mais exótica e ilícita, em mais um gigantesco esquema de branqueamento de capitais em que este Governo aparentemente nos está a especializar.
Esta é uma questão que o Governo vai ter de esclarecer, sobretudo agora que no recente relatório sobre o Semestre Europeu, a Comissão Europeia reconhece a injustiça no sistema fiscal em Portugal, instando o Governo a fazer mais contra a evasão fiscal. Porque não vejo este assunto a merecer a atenção que deve ter em Portugal, escreverei hoje mesmo ao BCE e à Comissão Europeia, alertando-os para a necessidade de pressionar o Governo a esclarecer este "mistério do dinheiro aparecido".

(Transcrição da minha crónica no "Conselho Superior" da ANTENA UM ontem. A versão  integral pode ser lida na ABA DA CAUSA aqui http://aba-da-causa.blogspot.be/2015/03/os-misterios-do-dinheiro-desaparecido-e.html)

Mais obrigações (2)

Ao contrário do que foi dito publicamente por alguns, a prescrição não extingue a obrigação para o devedor, apenas a torna não exigível pelo credor. Como é evidente, um governante não pode invocar a prescrição de obrigações públicas. Seria um escândalo.
O primeiro-ministro cometeu uma falta grave ao não pagar imediatamente a dívida logo que teve conhecimento dela, fazendo-se esquecido e só efetuando o pagamento anos depois, quando foi confrontado por um jornal com a questão. É claro que por si nunca pagaria a dívida! Uma falta dessa gravidade não pode passar politicamente impune.

Adenda
Ao contrário do que se defende aqui, o incumprimento de obrigações públicas não integra a "esfera da vida privada" e a falta de pagamento da dívida das contribuições em atraso por Passos Coelho a partir de 2012, quando teve conhecimento dela, já ocorreu com ele como primeiro-ministro. Por isso, a responsabilidade política é incontornável.

Adenda 2
A defesa de Passos Coelho no encerramento das jornadas parlamentares do PSD, dizendo que ao contrário de outros não utiliza o cargo para enriquecer (insinuando que outros, não nomeados, o terão feito) não foi feito com a cabeça mais sim com as vísceras e o que revela da falta de escrúpulos políticos do primeiro-ministro não é bom de ver.

segunda-feira, 2 de março de 2015

Mais obrigações

1. A falha de Passos Coelho na questão das contribuições para a segurança social é grave não pode ser politicamente desvalorizada, muito menos desculpada.
Primeiro, não é aceitável a desculpa de não se ter dado conta do incumprimento da obrigação. Um político e deputado como ele não pode invocar desconhecimento nem esquecimento de uma obrigação que ninguém ignora.
Segundo, depois de ter sido detetada a falta, entretanto legalmente prescrita, Passos Coelho, já como primeiro-ministro, absteve-se de cumprir o dever moral e republicano de saldar imediatamente a dívida, só o tendo feito quando o assunto estava na iminência de vir ao conhecimento público.

2. Os titulares de cargos políticos têm uma obrigação reforçada de cumprir zelosamente as obrigações tributárias, especialmente no caso das contribuições para a segurança social (que são contrapartida dos correspondentes benefícios), e de se apressarem a corrigir as falhas logo que detetadas. Vários ministros perderam outrora o lugar por falhas fiscais (ou por simples suspeita delas).
Costumo dizer que os membros do Governo deveriam fazer prova antecipada de terem cumprido todas as obrigações tributárias antes de tomarem posse e que o único modo de o fazerem é disponibilizarem o acesso aos seus registos fiscais e da segurança social.
Cada vez mais, a transparência tributária e financeira vai-se tornar um ónus dos titulares de cargos políticos. Um primeiro-ministro não devia poder invocar o sigilo tributário.

domingo, 1 de março de 2015

Assim vai este país


De visita a Santarém, este sábado de manhã, começo por dirigir-me ao posto municipal de turismo: fechado aos sábados e domingos! O mesmo sucede com os principais monumentos da cidade, sucessivamente: Igreja do Seminário, fechada; Convento de São Francisco, fechado, Igreja da Graça, fechada; igreja de S. João de Alporão, fechada. Tenho de contentar-me com o aspeto exterior dos monumentos e com a vista das Portas do Sol sobre o Tejo e os campos ribeirinhos (na imagem).
Fico a pensar que há cidades que não querem ser visitadas.

"Radicalização do centro"

Tenho ouvido recorrentemente a tese de que, com a austeridade e a crise social que ela criou, o centro político se radicalizou à esquerda, pelo que a esquerda governante tradicional, representada pelos partidos socialistas, deve acompanhar essa deslocação, sob pena de perder espaço para os partidos da esquerda radical (os antigos ou os novos).
Parecendo que essa tese é confirmada pelos factos políticos na Grécia e em Espanha (onde os partidos socialistas são considerados corresponsáveis pelas políticas de austeridade), tal parece não ser, porém, o caso entre nós, onde o PS esteve na oposição durante todo o "programa de ajustamento". Apesar do aparecimento de novos partidos à esquerda do PS, aumentando a fragmentação da esquerda política, as sondagens eleitorais não revelam nenhuma subida substancial desses partidos no seu conjunto.
E, sendo assim, uma eventual tentação do PS para seguir a alegada "radicalização política" corre o risco de alienar esse mesmo centro, o qual, dados os custos sociais do "ajustamento" orçamental e económico, pode estar mais recetivo a uma alternativa governativa de esquerda moderada, mas que continua a ser, como sempre foi, hostil ao radicalismo político. O previsível insucesso governativo do Syriza, cuja vitória tanto entusiasmou a esquerda radical europeia, pode ser uma bom teste político.

Dor de cabeça


Se os resultados das eleições legislativas deste ano correspondessem a esta previsão (sondagem publicada pelo Expresso), a próxima equação governativa seria uma dor de cabeça.
Além de revelar que a direita coligada pode ainda disputar o resultado final e que a fragmentação partidária à esquerda do PS só ajuda à direita, a sondagem mostra que continua a não existir uma dinâmica para uma maioria absoluta do PS (muito menos da coligação de direita).
Ora, por um lado, excluindo o PCP e o BE, que se excluem de qualquer solução governativa compatível com a UE, não há margem para uma coligação maioritária do PS com os novos partidos.
Por outro lado, o facto de o PSD e o CDS irem em coligação às eleições dificulta alianças governativas com o PS. Se este ganhar, não quererá entrar num menage à trois com ambos, o que exigiria a dissolução da coligação. Se o PS perder, muito menos estará disponível para ser "pau de cabeleira" de um governo a três, sobretudo se a aritmética eleitoral mostrar que, descontado o efeito da coligação à direita, o PS terá sido o partido mais votado.
O atual Presidente da República, que ainda presidirá à formação do próximo governo, já disse que o este tem de ter apoio parlamentar maioritário, para assegurar a governabilidade e a estabilidade governativa. Porém, se o quadro parlamentar pós-eleitoral fosse este, isso não se afigura fácil.