sábado, 31 de janeiro de 2009

Freeport (3)

«Manuel Pedro, associado da Smith & Pedro, em comunicado enviado à Lusa, afirma que nunca procedeu a «pagamentos ilícitos» e que a única vez que se encontrou com Sócrates foi no Ministério do Ambiente numa reunião pedida pela autarquia de Alcochete.»
Ficam assim categoricamente desmentidas pelos próprios as suspeitas de reuniões "clandestinas" e de pagamento de "luvas" (o mesmo desmentido já tinha sido feito por Charles Smith). Será que os media que têm intoxicado a opinião pública com manchetes sobre manchetes com as mais mirabolantes revelações sobre o caso vão agora dar o mesmo destaque a esta notícia que as contradiz integralmente, ou vão remetê-la, como é costume, para um lugar secundário, como sucede, em geral, com tudo o que contrarie a opinião preconcebida?!

Estranha concepção de democracia parlamentar

O vice-presidente do PSD, António Borges, não pára de surpreender nas suas singulares opiniões. Numa entrevista dada à Rádio Renascença, hoje trasncrita no Público, disse duas coisas extraordinárias: (i) que são de longe preferíveis as maiorias absolutas, mas desde que não sejam do PS (portanto, só as do PSD é que são virtuosas); (ii) que se o PS não tiver maioria absoluta, "a solução é entregar o Governo ao PSD" (sic!) (portanto, o PSD deveria ser chamado a governar mesmo sendo menos votado do que o PS).
Lê-se, e não se pode acreditar. Será que esta é a nova teoria da democracia parlamentar vigente no PSD !?

Assistência religiosa

Se for verdadeira esta notícia sobre o projecto de lei acerca da assistência religiosa nas Forças Armadas, trata-se de um injustificável atentado à separação entre o Estado e as igrejas.
Um Estado laico que seja respeitador da liberdade religiosa, como é o nosso, pode e deve facultar e facilitar aos interessados e às igrejas a assistência religiosa nas instituições públicas (desde os hospitais às forças armadas); mas não lhe cabe assumir missões religiosas, não podendo oficializar aquela assistência, que deve ser exclusiva responsabilidade e encargo das igrejas. A nomeação oficial dos "capelães", a sua graduação em oficiais, a sua remuneração pelo Estado, como se fossem servidores públicos --, nada disso é congruente com os requisitos da laicidade.

Fixação presidencial

O Presidente da República retomou a sua cruzada contra a nova lei do divórcio. Penso que não lhe fica bem.
Como cidadão, Cavaco Silva tem todo o direito de discordar de todas as leis, qualquer que seja o seu objecto (divórcio, aborto, etc.). Mas como Presidente da República não se compreende que insista publicamente na censura política (e até técnica!) de uma lei que, depois do seu veto político, foi confirmada por ampla maioria na AR -- à qual cabe constitucionalmente o poder legislativo -- e que, além disso, não tem nada a ver com o funcionamento do sistema político (diferentemente do que sucedia com o Estatuto dos Açores), pelo que está fora do seu "core business" constitucional.

Freeport (2)

Dando por adquirido que os consultores Smith & Pedro exigiram aos promotores do Freeport elevadas quantias em dinheiro, a pretexto de terem de pagar luvas para conseguir o licenciamento do empreendimento (como se deduz dos e-mails da empresa hoje dados a público), e assumindo que o dinheiro lhes foi dado para esse efeito, não será então evidente que a chave de todo o caso está em saber se esse dinheiro foi efectivamente dado a alguém (coisa que, aliás, os referidos protagonistas posteriormente desmentiram no processo), ou se, antes, ficou "em casa", não sendo o argumento das "luvas" mais do que uma cobertura para uma extorsão em proveito próprio?
Será assim tão difícil encontrar o rasto desse dinheiro, para que passados estes anos ainda não se saiba?

Freeport (1)

A campanha mediática contra Sócrates a propósito do Freeport está a atingir os limites da ignomínia jornalística.
Hoje um tablóide dá todo o destaque à notícia de que, em 1998 (o que é que isto tem a ver com o Freeport, que se passa vários anos depois?), a mãe de Sócrates (que ainda nem sequer era ministro do Ambiente) comprou a pronto um apartamento em Lisboa, sem que se saiba de onde lhe veio o dinheiro. Sucede que, escondida dentro da própria notícia, está a resposta para o "mistério": no mesmo ano, a mesma senhora vendeu a sua moradia em Cascais. Será que o valor da venda não dava para comprar um apartamento em Lisboa?
Vale mesmo tudo!?
Aditamento
Já sem motivos para surpresas, há jornais de referência que ecoam esta espécie de "jornalismo"...

Sem vergonha

O Presidente Obama censurou severamente a auto-atribuição de chorudos prémios de gestão pelos banqueiros de Wall Street, considerando-os "vergonhosos".
A ira presidencial justifica-se plenamente. De facto, depois da irresponsabilidade da sua gestão e do recurso à ajuda pública para salvar o sistema financeiro, o mínimo que se poderia esperar dos banqueiros é que houvesse alguma autocontenção na sua remuneração e na distribuição de dividendos, enquanto a situação de crise financeira se mantiver e a ajuda do Estado se revelar necessária.
Decididamente, quando a recessão se acentua e o desemprego atinge dimensões de catástrofe social, há quem queira sublinhar no momento mais inoportuno a face imoral do capitalismo financeiro.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Gaza

Em Davos, o primeiro-ministro turco, Erdogan, foi impedido de ripostar ao presidente israelita, Shimon Peres, sobre o caso de Gaza. Pelos vistos, a versão israelita sobre a questão constitui verdade oficial, mesmo fora de Israel...

Embaraços amistosos

Há pessoas em relação às quais, independentemente das discordâncias, nos habituamos a apreciar a sensatez, a moderação e a inteligência. Entre elas conto, por exemplo, Francisco Van Zeller, o "patrão" da indústria portuguesa.
No entanto, ao ouvi-lo esta manhã opinar, numa entrevista à rádio (em geral muito equilibrada), que o Presidente da República gostaria neste momento de "ser primeiro-ministro", tenho de concluir que mesmo as pessoas sensatas podem ser assaz imprudentes. É evidente que uma tal especulação, vinda de alguém que é amigo pessoal do Presidente, só pode causar embaraços a este (mesmo que não tenha fundamento), levando a suspeitar que, nas suas decisões e opiniões, Cavaco Silva pode não se motivar pelo seu papel constitucional de moderação e supervisão do sistema político, mas sim como uma espécie de "primeiro-ministro sombra".
A amizade pode embaraçar...

Freeport (3)

O director de um periódico muito activo na exploração do caso Freeport dizia ontem na TV que os media se têm limitado a "reportar factos", não podendo ser acusados de nenhuma campanha contra Sócrates.
É puro farisaísmo. Por um lado, quanto aos "factos", a generalidade dos média tem-se limitado a servir de "barriga de aluguer" de alegadas informações selectivamente filtradas por alguém de dentro do processo. Por outro lado, só por desfaçatez é que se podem negar todas as suspeitas, ilações e imputações abusivamente feitas a partir dessa infromação inquinada, tendente à condenação sumária do visado, num "julgamento" populista, sem provas e sem defesa.

Freeport (2)

O Ministério Público demorou duas semanas para vir assegurar publicamente que Sócrates não é suspeito e que nem sequer está a ser investigado. Nesse tempo, o primeiro-ministro foi frito a todo o gás, com base em "factos" alegadamente saídos do processo, perante o silêncio de quem o tinha à sua guarda.
O mal causado ao visado é em porventura irreparável. Como sempre sucede, a responsabilidade não é gerada somente por acções mas também por omissões de quem tem o dever de agir...

Ética bancária

Não compreendo porque é que os banqueiros portugueses, enquanto corporação, não se demarcam das vigarices praticadas no BCP, no BPN e no BPP -- que afectam gravemente o crédito dos banqueiros em geral -- e não aproveitam para se comprometerem formalmente com um código de ética bancária e com um mecanismo de autodisciplina deontológica.
A auto-regulação deveria começar pela ética profissional. Mal das profissões que não cuidam do seu crédito e do seu prestígio profissional...

Freeport (1)

Há quem defenda a ideia de que basta que familiares do primeiro-ministro se tenham tentado aproveitar do seu nome, sem o seu conhecimento, para obterem vantagens ilícitas para que aquele deixe de ter condições para governar. Mas uma tal tese não é somente moralmente insustentável, mas também manifestamente antidemocrática.
Um responsável político não pode ser politicamente penalizado, muito menos responsabilizado, pelas reais ou alegadas tropelias dos seus familiares, mesmo se próximos (o que nem sequer é o caso...) às quais seja alheio.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Freeport (3)

Há limites para tudo, incluindo para a capacidade de um político suportar uma campanha suspeitas e acusações sem nenhuma prova, que põem em causa a sua honorabilidade política, ainda por cima quando não goza de igualdade de armas para as contraditar.
Apesar da sua conhecida tenacidade e resistência aos ataques pessoais de que tem sido alvo, Sócrates não pode continuar a suportar indefinidamente o agravamento da infame campanha contra si, sem confrontar as instituições envolvidas com as suas responsabilidades, designadamente a PGR, que tem deixado crucificar diariamente o PM com base numa maciça exploração especulativa de alegados dados de uma investigação (aliás, em sistemática violação do segredo de justiça), bem como o Presidente da República, a quem cabe velar pelo regular funcionamento das instituições.
E em última instância há o recurso para o voto dos eleitores...
Aditamento
Tomo conhecimento de que Sócrates vai fazer uma declaração pública. Ainda bem!

Freeport (2)

O Presidente da República perdeu uma excelente ocasião, no seu discurso na sessão inaugural do ano judicial, de denunciar e censurar a inaceitável demora das investigações penais (em prejuízo do bom nome dos suspeitos inocentes), a maciça e impune violação do segredo de justiça e a notória instrumentalização, por forças ocultas, de informações ou pseudo-informações não confirmadas de um inquérito penal para fins de assassínio político do governo em funções.
A jurisdição do PR como supervisor do sistema político não consiste somente em impedir os abusos do governo e da maioria parlamentar, mas também em defender as instituições contra o abuso de funções por parte de poderes não responsáveis democraticamente.
Há silêncios que comprometem ...

Freeport (1)

Como se deduz do comunicado da PGR (pontos nº 7) e nº 8), a notícia de que a polícia inglesa teria novos dados para considerar Sócrates "suspeito" -- que faz hoje manchete em alguns jornais -- é mais uma pura invenção na campanha de falsificações lançada contra o primeiro-ministro.
A imprensa, mesmo a de referência, reduziu-se ao indigno papel de megafone da manobra conspirativa com origem na investigação do caso Freeport, sob um óbvio comando oculto.
Uma vergonha!
Aditamento
É inaceitável que o Ministério Público tenha demorado tantos dias para esclarecer estes pontos, deixando desenvolver livremente a desenfreada campanha contra Sócrates. Ou há efectivas provas contra ele, e importa tirar as ilações políticas; ou não há provas, e urge ilibar o primeiro-ministro das suspeitas com que tem sido enlameado.

O plebiscito

O recente referendo em Viana do Castelo sobre a adesão do município à Comunidade Intermunicipal do Minho-Lima, em que o Presidente da Câmara jogou todo o peso do seu prestígio no referendo e fez depender a sua manutenção no cargo do resultado da votação, mostra como os referendos podem ser pervertidos em plebiscitos pessoais. Ou seja, muitos votantes podem ter-se sentido constrangidos a votar de acordo com a vontade do Presidente, para não provocar a sua demissão.
Mais um passo para a descredibilização do referendo entre nós.

Professores

Considero absolutamente justificada a existência de provas de avaliação de competências no recrutamento de professores do sistema público de ensino básico e secundário. Primeiro, por causa da enorme diferença de qualidade do ensino das escolas superiores de educação; segundo, porque importa assegurar que os candidatos possuem um nível razoável de qualificações para a profissão.
É por isso que não concordo com a redução das provas a um teste de escolha múltipla, como agora se propõe, pela simples razão que isso não permitiria verificar sequer o domínio da Língua, coisa que infelizmente não pode ser dada por adquirida em muitos candidatos hoje em dia.

Evidências

«Quem tem medo da avaliação são os maus professores».

Favorecimento

«Medicina: alunos no estrangeiro já podem acabar em Portugal».
O problema que isto levanta é que quando estes alunos foram impedidos de cursar Medicina em Portugal, por causa do "numerus clausus", muitos outros alunos, porventura com notas melhores do que estes, não puderam prosseguir o curso por não poderem suportar os encargos de frequentar uma universidade estrangeira.
Ou como se prova que ter dinheiro dá sempre vantagens sobre quem não tem...

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Correio da Causa: A "raiva"

«Entrámos no ano derradeiro duma legislatura marcada por uma agenda reformista, como nunca antes se vira. Nunca como neste período foram tomadas tantas decisões no sentido do restabelecimento da autoridade democrática do Estado, da imposição duma Ética Pública e do primado do interesse geral sobre o particular, do resgate de parcelas de Poder que haviam sido avocadas por segmentos da sociedade, desde logo no seio da Administração Pública.

Estas reformas suscitaram uma revolta e uma "raiva" (como hoje refere Freitas do Amaral), com uma virulência inusitada. Basta navegar na Blogosfera, nos sítios da Imprensa, etc., para nos apercebermos da dose maciça de veneno difundida a cada dia por aqueles que, a todo custo, pretendem obstaculizar as reformas e descredibilizar o Governo e o Estado. (...) Alguns media cavalgam a onda: é preciso enlamear - melhora as audiências e a receita e confere poder de intervenção acrescido ao jornalismo, aos fazedores de opinião e aos grupos de comunicação.

Nenhuma governação é isenta de erros e o próprio caso Freeport nos impõe perplexidades sobre a maior aquiescência do Estado quando estão em causa operações urbanísticas de vulto. Mas torna-se óbvio que a campanha de suspeição em marcha - pelo timing e pelo método (divulgação a conta-gotas de dados supostamente obtidos no próprio processo de investigação) - pretende tão-só aproveitar a lentidão da Justiça, colocando José Sócrates entre a "espada" (dos media) e a "parede" (proximidade de actos eleitorais). Neste quadro, é de saudar a intervenção de gente insuspeita de servilismo, como a Ana Gomes, que assim se distingue dos que em silêncio ficaram aquando da "decapitação" da liderança de Ferro Rodrigues. (...)»

Eduardo G.

Freeport (4)

«Freitas do Amaral disse, esta terça-feira, que do ponto de vista do direito administrativo, não há ilegalidades no licenciamento do Freeport de Alcochete. O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros considerou ainda que o eventual envolvimento de José Sócrates no caso parece envolto numa campanha de "raiva".»

Freeport (3)

Sendo hoje inequívoco que o segredo de justiça não vincula somente os agentes de investigação mas toda a gente, incluindo os jornalistas, e sendo evidente a maciça violação do dito desde o início da "cruzada Freeport", poderá saber-se quantos processos de inquérito foram já abertos para efeitos de procedimento disciplinar e penal?

Freeport (2)

Enquanto muitos participam activamente na campanha de suspeição contra o primeiro-ministro, ostensivamente comandada a partir de dentro de um processo de investigação penal, para outros parece que no pasa nada!
Infelizmente, algo de inquietante ocorre quando impunemente poderes clandestinos instrumentalizam investigações penais (com flagrante violação do segredo de justiça) para óbvios fins políticos.

Freeport (1)

«Acabei de ouvir uma coisa inconcebível. A apresentadora do "Opinião Pública" da SIC N referiu Sócrates e os outros envolvidos nas notícias deste fim de semana com "suspeitos "(sic). Vou ser provavelmente brutal e extremista, mas esta incompetência não é razão para processo disciplinar? Mais, sendo a comunicação social um poder fáctico, como é que uma coisa destas poderá ser sancionada, como devia, como abuso de poder?
A comunicação social é um guardião nosso, importante, contra os poderes formais e outros. Mas ela também é poder, o que cada vez mais me faz lembrar da velha pergunta de Juvenal: "Quis custodiet ipsos custodes?" (quem guarda os guardas?)».
Carta de João V. C.

Um pouco mais de decência, sff

O deliberado silêncio com que a generalidade da comunicação social -- incluindo a imprensa de referência -- recebeu o relatório de peritos internacionais independentes com uma apreciação muito positiva sobre a reforma do ensino básico entre nós revela uma obscena parcialidade política.
Na altura do lançamento das reformas (encerramento de escolas sem condições, escola a tempo inteiro, aulas de substituição, enriquecimento curricular, formação especial para os docentes de disciplinas críticas, etc.), a generalidade dos media deu todo o espaço do mundo à demagógica contestação política e sindical. Depois, exigiram resultados. Agora, que os resultados foram verificados por observadores independentes, e são positivos, contra as suas expectativas, o que fazem? Em vez de reconhecerem o erro, fazem de conta que nada aconteceu. Se, porém, os resultados fossem negativos, ninguém duvida que fariam manchete! Uma vergonha!
Decididamente, neste País é proibido fazer coisas bem feitas.
[corrigido]

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

O "caso Freeport", ainda

A menos que a Justiça o venha contrariar celeremente ou que alguém o infirme com consistência intransponível - e não na base de insinuações, deduções ou "construções" simplistas e avulsas - estou em crer que o modo, o sentido e a oportunidade dos ataques a José Sócrates, para além de o visarem pessoal e politicamente, visam sobremaneira o PS e o governo do PS que ele dirige.
A ser assim, como ninguém pode excluir que o seja neste ano eleitoral, cerrem-se fileiras e abatam-se divergências, certamente tão substantivas quanto menores face ao desbragamento do ataque.

O "caso Freeport"

Julgo estar ao abrigo da suspeição de "yes-woman" ao serviço de José Sócrates, tantas as ocasiões em que dele tenho publicamente discordado, quer no plano partidário, quer no da acção governativa.
A serem outras as circunstâncias e conjunturas - nacional e internacional - não teria certamente abdicado de o ver, como Secretário-Geral do PS, no próximo Congresso a ter que considerar uma moção que desse substância a diferenças de entendimento e de perspectivas, sem que isso implicasse pôr em causa a liderança do Partido. Estou, aliás, certa de que José Sócrates não alimenta dúvidas sobre isso, sabedores que lealmente somos daquilo que cada um pensa.
Vem este arrazoado a propósito da situação com que o vejo agora confrontado a pretexto do "caso Freeport", caso em muitos aspectos susceptível de perplexidades, manobras e aproveitamentos de toda a sorte.
É o preço que infelizmente se paga - todos pagamos! - por uma Justiça e uma investigação judicial com parcos meios, pouca eficácia e excessiva lentidão.
Seja como for, devo assegurar não ter quaisquer razões que me levem a duvidar da consistência das declarações que o Primeiro Ministro José Sócrates proferiu a propósito do seu envolvimento no "caso Freeport". Consistência sistematicamente obnubilada em notícias e comentários posteriores às suas declarações públicas.
Penei demasiado com as tentativas de assassinato político e de carácter de que foram objecto Eduardo Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso, perante o ensurdecedor silêncio de muitos que tinham a obrigação de não ter ficado calados. Não ficaria, assim, de bem com a minha consciência se, em oportunidade que poderá vir a revelar-se de semelhante e sinistra natureza, não testemunhar a José Sócrates, sabendo o que hoje se sabe, a solidariedade que me merece ele próprio, as declarações que proferiu e a situação com que se confronta.

Freeport (2)

O Diário de Notícias publica hoje uma declaração do já célebre Charles Smith (que já tinha garantido nunca se ter reunido com o então ministro do Ambiente), a desmentir qualquer pagamento de luvas e a dizer que tudo não passa de uma confusão, o que nega o principal factor da onda de especulação sobre o caso, desencadeada a partir de uma alegada declaração sua constante do processo. (Só fica por esclarecer o destino dos tais "4 milhões de euros"...)
Só é pena que o DN, que deu todo os destaque à versão especulativa, tenha agora optado por inserir esta declaração -- que retira fundamento àquela -- sem qualquer destaque, num lugar secundário da 2ª página, e sem sequer as inserir no sítio electrónico do jornal.
Critérios...

Freeport (1)

O Sindicato do Ministério Público veio denunciar publicamente os que alegadamente condenaram a "inoportunidade" da investigação ao caso Freeport.
Mas não conheço nenhuma posição nesse sentido. O que houve, sim, e com toda a razão foi a manifestação de estranheza, primeiro, pela inaceitável demora da investigação (que já leva 5 anos) e, segundo, pela "oportunidade política" da fuga selectiva de um alegado elemento do processo (por cujo sigilo o MP é responsável), que permitiu implicar o primeiro-ministro num suposto caso de corrupção.
O Sindicato deveria também condenar estes dois factos, que comprometem o Ministério Público, e reclamar um célere apuramento e divulgação da verdade, de modo a pôr fim ao generalizado clima de suspeição criado, em vez de tentar atirar areia para os olhos da opinião pública e tomar-nos por parvos.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

Portugal e os presos de Guantanamo

Entre dezenas de textos que tenho escrito sobre Guantanámo e as prisões secretas de Bush, a 16 de Junho e 11 de Novembro de 2008 escrevi no CAUSA NOSSA os posts "Encerrar Guantanámo e não só" e "Obama quer fechar Guantanámo. E Portugal ajuda?". Ambos sobre como era preciso a Europa chegar-se à frente para ajudar a fechar Guantanamo e as prisões secretas onde a Administração Bush ilegalmente aferrolhava suspeitos de terrorismo. Em especial os países europeus que, como Portugal, haviam sido coniventes com esse sinistro programa de deslocalização da tortura, dito das "rendições especiais" e mais conhecido como o dos "voos da CIA".
No segundo daqueles escritos faço referência a uma carta que enviara ao Governo sobre pedidos concretos que os EUA já haviam feito a Portugal relativamente à possibilidade de acolher presos de Guantanamo entretanto ilibados de suspeitas, mas irrepatriáveis.
Uma carta, datada de 11 de Abril de 2008, a que em Novembro aguardava resposta. Uma carta que anexava outra carta - aquela em que John Bellinger, o Conselheiro Juridico do Departamento de Estado, explicava à Presidente da Subcomissão dos Direitos Humanos do Parlamento Europeu o problema e pedia apoio.
Agora que já tenho resposta, a minha carta pode ler-se na ABA DA CAUSA e através dela aceder ao conteúdo da outra.
A resposta veio a 10 de Dezembro de 2008, na iniciativa do MENE Luís Amado que suscitou a discussão que o Conselho de Ministros da UE hoje está, finalmente, a ter: a de declarar Portugal disponível para receber detidos de Guantanamo, de instar outros países a fazer o mesmo e de pedir uma articulação política europeia para o efeito.

Não atrair o ladrão

«Ministério da Justiça manda retirar caixas de multibanco de vários tribunais».
E eu acho que, enquanto não se eliminar a vulnerabilidade das caixas de Multibanco (por exemplo, com um processo automático de inutilização das notas em caso de arrombamento), deveria ser ordenada a retirada das caixas móveis de todos os lugares inseguros, pelo menos durante a noite.

Freeport (4)

Uma coisa são as dúvidas (aliás pouco consistentes) sobre a legalidade da alteração nos limites da zona protegida relativamente aos terrenos onde foi implantado o empreendimento em causa -- que todavia não foi impugnada (salvo erro) por quem o poderia ter feito --, outra coisa é ter havido corrupção no processo, muito menos a nível ministerial.
Muitas vezes são os próprios municípios os primeiros interessados em "dar um jeito" nos constrangimentos ambientais, para facilitar um investimento vantajoso para o concelho (em termos de bem-estar dos munícipes e de emprego).

Freeport (3)

Afinal, pela boca do próprio Smith -- o tal intermediário que se terá queixado de lhe terem exigido o pagamento de "luvas" -- ficou a saber-se que nunca houve nenhum encontro (aliás de todo inverosímil) entre ele e o então ministro Sócrates (como, aliás, este já tinha asseverado de forma categórica).
Como toda a especulação mediática contra o Primeiro-Ministro destes últimos dias se baseou nesse fictício encontro, será que os média vão corrigir esse pseudofacto com a mesma ênfase, ou, como é hábito, vão deixar permanecer na opinião pública a impressão que deliberadamente criaram e exploraram?!

Freeport (2)

O Procurador-Geral da República tem razão quando manda esperar serenamente pelo resultado das investigações.
Mas há duas outras coisas que Pinto Monteiro deveria igualmente assegurar. Primeiro, ordenar toda a celeridade a essa investigação (que já leva 7 anos!), sobretudo para evitar que a malévola suspeita lançada sobre Sócrates atinja os propósitos políticos dos "profissionais da lama" que a puseram a circular; segundo, investigar também como é que informações constantes de processos de investigação em segredo de justiça são cirurgicamente "filtradas" nos momentos mais oportunos para atingir objectivos políticos muito evidentes.
Depois do infame assassínio político de Ferro Rodrigues, o Ministério Público não pode deixar-se novamente instrumentalizar em mais uma campanha de "assassínio de carácter" de outro líder político (por acaso também do PS).

Freeport

Nada como alimentar uma campanha suja contra o primeiro-ministro para salvar um jornal em dificuldades financeiras...

sábado, 24 de janeiro de 2009

Contra-reforma

«Forças Armadas: medicamentos a 100 por cento».
Há cidadãos mais iguais do que os outros...

Olha a novidade!

«Professores: sindicalistas acusam PCP de intromissão».
Mas não deixa de ser estranho que quem assume funções sindicais como tarefa partidária, como sucede muitas vezes com os sindicalistas que são militantes partidários, se venha depois queixar de "interferência" do respectivo partido. Nunca ouviram falar da velha teoria leninista da "correia de transmissão"?

Freeport

Para haver um caso de corrupção, não basta que alguém tenha dito a um terceiro (para justificar dinheiro supostamente gasto) que teve de pagar "luvas" para obter um licenciamento. Partindo do princípio de que não foi ele próprio que se locupletou com o dito dinheiro, é necessário saber quem foram concretamente os directos beneficiários e como se processou o alegado pagamento.
Aditamento
Independentemente de saber se houve, ou não, pagamento de luvas a alguém (e a quem), este desmentido categórico de Sócrates varre a sua testada e inverte o "ónus da prova" (mesmo admitindo a lógica perversa de que, quando se acusa um político, é ele que tem de provar a sua inocência, e não os acusadores que têm de provar a acusação...).
[revisto]

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Oportunismo

Francamente, embora não se possa esperar que o combate político se paute por estritas regras de lealdade e boa fé, mesmo assim, há comportamentos políticos que chocam.
Noticia-se hoje que o PSD apresentou na AR uma proposta de abertura da base aérea de Monte Real (Leiria) à aviação civil. É uma boa ideia. Sucede, porém, que ela tem uma história e que o PSD se apropriou partidariamente dela.
A ideia, que aliás não é nova, foi publicamente retomada em Junho do ano passado, numa iniciativa transpartidária (cujo principal dinamizador tem sido, é justo dizê-lo, Manuel Queiró), envolvendo um conjunto de personalidades, instituições e municípios da região centro litoral, de vários partidos (incluindo obviamente o PSD), iniciativa que foi oportunamente publicitada -- também aqui no Causa Nossa --, e que entretanto deu lugar à criação de uma associação para a promover. Resta dizer que o Governo foi posto a par da ideia desde o seu início, havendo luz verde para a realização dos necessários estudos de viabilidade, cujo financiamento (não governamental) está em grande parte assegurado.
Por isso mesmo, a iniciativa unilateral do PSD constitui uma pedestre apropriação oportunista de uma ideia colectiva, o que não honra os seus autores nem presta homenagem à lisura política.

Desnorte

Já importei para a Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, comentando o último disparate político do PSD, de "riscar" o projecto de rede ferroviária de alta velocidade (TGV).
Quando é que o PSD propõe fazer algo de positivo, em vez de, mais uma vez e sempre, procurar desfazer o que já está a ser bem feito?!
Aditamento
Para uma visão espanhola da questão, ver esta entrevista do Embaixador de Espanha.
Aditamento 2
A propósito, a líder do PSD ainda não a apresentou desculpas pela acusação infamante que fez ao jornalista da Lusa e à própria agência, sobre o "envio de um jornalista, a mando do Governo, para ouvir os socialistas espanhóis" (como ela ficcionou). É assim que julga obter a "credibilidade política" que prometeu ? Nem credibilidade política, nem muito menos credibilidade moral (de que um líder político não precisa menos) !...

"Salvar o ensino"

«Professores vão pedir a Cavaco que dissolva AR e "salve o ensino"» -- anuncia o Diário de Notícias.
E quem salva o ensino destes professores?!

Obama cumpre

1. Em Julho passado disse em Denver a jornalistas portugueses que cobriam a Convenção do Partido Democrático que Richard Holbrooke, Greg Craig e outros conselheiros de Obama haviam afirmado, nos debates com os convidados estrangeiros, que encerrar Guantanamo seria primeira prioridade de uma futura Administração Obama.
Houve então, e entretanto, quem desvalorizasse o meu ... "wishful thinking".
Mas a verdade é que, nas primeiras horas no cargo, Obama determinou a suspensão das comissões militares de Guantanamo, anunciou o início do encerramento da prisão e vincou a transparência e respeito pela lei que nortearia sua Administração.

2. Durante a campanha militar massacrante de Israel sobre Gaza, referi em comentários e debates em que participei, que gente próxima da equipa de Obama prometia que a nova Administração se empenharia no processo de paz do Médio Oriente desde o dia primeiro e contestei a noção primária e preconceituosa de que Obama nunca escaparia a tomar partido por Israel.
Houve quem risse e desdenhasse do meu ... "wishful thinking".
No primeiro dia no cargo, o primeiro parceiro internacional a quem o Presidente Obama telefonou foi - simbolicamente, significativamente, solidariamente - o Presidente da Autoridade Palestiniana.

Obama cumpre, está a cumprir.
E os meus "wishes" também parece que se cumprem.
Nos órfãos caseiros dos "neo-cons" (e incluo neles gente do PS, do PCP e do BE, além de muita de direita) é que, ostensivamente, o "thinking" continua a falhar.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

O discurso de Obama - a minha América

Acabei de o re-ouvir!
É o discurso de que todos precisávamos.
Aos serviçais que há uns anos me acusavam de anti-americanismo, direi "Esta é a minha América".
Esta América merece liderar, pode liderar, vai liderar - já lidera.
Aos que têm a responsabilidade do poder em Portugal e na Europa pedirei que atentem, correspondam, esforçem-se por estar à altura - urgentemente!
Yes, we can!

O fim do capitalismo laissez-faire

No seu discurso inaugural, Obama foi claro quanto à questão económica, rejeitando o fundamentalismo dos "mercados livres". Não há, disse ele, alternativa ao mercado, como instrumento de criação de riqueza e de liberdade; mas, como a actual crise mostra, o mercado não funciona sem um "olhar vigilante", que o mantenha sob controlo.
«(...) the crisis has reminded us that without a watchful eye, the market can spin out of control -- and that a nation cannot prosper long when it favors only the prosperous»
Impõe-se o "watchful eye" do Estado para controlar as falhas da "mão invisível" do mercado e corrigir as suas injustiças sociais.

A greve

Na greve dos professores de anteontem foram de novo encerradas muitas escolas (embora menos do que na greve anterior).
Ora o direito à greve, como recusa colectiva da prestação laboral, não inclui o direito de encerramento dos estabelecimentos públicos (nem aliás de empresas privadas), o que impede o pessoal que não está abrangido pela greve (pessoal auxiliar, pessoal técnico) de trabalhar e prejudica os utentes da escola (bibliotecas, refeitórios, recintos desportivos, etc.). Os conselhos directivos, e os seus membros, nessa qualidade, não gozam do direito à greve, incumbindo-lhes, pelo contrário, manter os estabelecimentos abertos e em funcionamento em tudo o que não dependa da greve.
O encerramento das escolas "à boleia" da greve constitui portanto um manifesto abuso de poderes, que os titulares de cargos públicos, como é o caso, não se deveriam permitir, nem lhes deveria ser consentido.

terça-feira, 20 de janeiro de 2009

Era Obama - já é!

As expectativas na América e no mundo são elevadissímas, o desconcerto é global e os desafios revelam uma gravidade e complexidade sem precedentes.
Mas, ao discursar na tomada de posse hoje, Barack Hussein Obama deu sopro à esperança e sentido à acção. Incentivou audácia e confiança. Prometeu justiça, abertura ao diálogo e empenhamento pela paz. E pediu mobilização de todos e sentido de responsabilidade, ancorado no respeito pelos valores essenciais que estão na base do progresso dos EUA e de todos os avanços significativos da Humanidade.
Obama foi eleito para defender os interesses americanos, sem dúvida. Mas o que ele fizer ou não fizer na América, com a América e pela América, vai repercutir-se em todos os cantos do planeta. Por isso, a inauguração formal da Era Obama, esta tarde, não disse apenas respeito aos EUA. O Presidente Barack não interpelou apenas os americanos: falou à razão e ao coração de todos os homens e mulheres que não querem deixar a filhos e netos um mundo mais perigoso, inseguro e injusto do que aquele que herdaram.

O discurso (2)

Além de tudo o mais (Estado de Direito, direitos humanos, cooperação internacional, luta contra o aquecimento climático, respeito por todos os povos e nações, etc.), o discurso de Obama é uma excepcional reafirmação dos valores do republicanismo americano -- e universal ! --, assente nos valores da liberdade e da igualdade, da responsabilidade individual e colectiva, do trabalho e da virtude, da convicção e da tolerância, do patriotismo e do universalismo, e por último (mas mais importante) da cidadania, essa palavra-chave dos discurso republicano de todos os tempos.
Este discurso merece figurar doravante em qualquer antologia do republicanismo cívico. Que diferença abissal em relação ao discurso guerreiro, sectário e intolerante da direita religiosa e do pensamento neoconservador que prevaleceu na cultura política norte-americana nas últimas décadas e que Bush entronizou oficialmente !

O discurso

Por mais que os cínicos e os ressentidos queiram desvalorizar o peso das palavras e das convicções, o discurso inaugural de Obama [aqui o texto em Português, embora com erros] é uma notável peça de oratória política -- à altura dos históricos discursos de Lincoln, de Roosevelt, de Kennedy --, conjugando uma crítica severa ao passado recente (em especial à presidência de Bush) e o anúncio de uma nova era para os Estados Unidos e para o mundo.
Começa bem o novo Presidente dos Estados Unidos. Agora é preciso transformar as nobres palavras e os grandes desígnios em decisões e em resultados; "refazer a América" e tornar o Mundo melhor.

Era Bush

Uff! Acabou finalmente!
O pesadelo. Um dos capítulos mais sórdidos da história da América e do mundo em que vivemos.
Vamos ainda sentir-lhe os desastrosos efeitos, por muito tempo - desde logo na crise económica sem precedentes que deixa em legado, a acrescer aos conflitos sangrentos que semeou ou agravou e ao descrédito moral e político em que fez atolar os EUA e não só.
O que vale é que a escolha é clara e impele a agir: entre varrer-lhe todos os dejectos ou submergir no lodaçal.

Good luck, Mr President!

Provavelmente, nunca na história um Presidente norte-americano iniciou funções com tanto apoio e tanta esperança nos Estados Unidos -- e em todo o Mundo!
Para além do feito histórico de ser o primeiro afro-americano a chegar à Casa Branca, Obama traz consigo a promessa de mudar quase tudo para melhor, incluindo na resolução dos conflitos internacionais, no respeito do Direito internacional e dos direitos humanos, na cooperação e na solidariedade internacional, na luta contra as mudanças climáticas, na regulação da globalização financeira.
A primeira grande tarefa do novo Presidente consiste em restaurar a autoridade e a credibilidade política e moral dos Estados Unidos no mundo, que o seu antecessor desbaratou no unilateralismo, na guerra do Iraque, em Guantánamo, no desprezo pelas questões ambientais, na crise financeira e mesmo, porque não dizê-lo, na irrisão.
Para além das expectativas demasiado elevadas, Obama toma posse do cargo no meio de uma gravíssima recessão económica, que limitará enormemente a realização dos seus ambiciosos objectivos de política interna, bem como de política internacional.
Por isso, o novo Presidente não vai precisar somente de fidelidade aos seus princípios, de talento e de determinação, de uma boa equipa --, mas também de muita sorte. Oxalá ela não falte.

Notícias da crise

Embora apoiante das medidas keynesianas de ataque à crise económica, tenho várias vezes sublinhado que o esforço não pode ser levado ao ponto de sacrificar demasiadamente as finanças públicas, pondo em risco a estabilidade e a credibilidade financeira do País, com os custos inerentes, em termos de disparo do endividamento público, de degradação do rating do crédito e do enorme aumento dos custos futuros da dívida, quando os juros subirem, a acompanhar a retoma económica.
Os perigos podem ser ilustrados com o caso da Espanha, que acaba de ser desgraduada por uma das agências de rating, em consequência da gravidade da recessão e de um défice previsto para este ano, de quase 6%. Depois da Grécia e da Espanha, chegará também a vez de Portugal, apesar de as previsões da recessão e do défice serem menos negativas do que as espanholas?

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Disparar sobre a segurança social

Sob o comando de Marques Mendes, o PSD propôs a eliminação do sistema público de segurança social, baseado numa lógica de contribuição-repartição, em favor de um sistema de capitalização individual das pensões. Falhado esse objectivo, o PSD de Manuela Ferreira Leite vem agora, a pretexto da recessão, propor uma redução geral das contribuições para a segurança social. Como não conseguiu destruir o sistema, há que pôr em causa a sua sustentabilidade financeira...
Sem dúvida que uma redução temporária e selectiva das contribuições para a segurança social pode constituir uma medida virtuosa para manter/criar emprego em sectores bem específicos ou para categorias específicas de trabalhadores mais expostas ao risco de desemprego (como aliás o Governo já fez, podendo essa medida ser ampliada a outras situações especiais). Mas uma redução indiscriminada da TSU é uma proposta tão demagógica e irresponsável como a proposta de baixa do IRS. Uma coisa é ajudar a debelar a recessão, outra coisa é lesar a sério o financiamento da segurança social, cuja auto-sustentação financeira deve ser mantida.

Separar as águas

Os defensores da taxa única no imposto sobre o rendimento pessoal insistem em tentar provar que ela, afinal, até é progressiva.
Mas a demonstração não procede. Com efeito, se se tiver em conta somente o rendimento efectivamente sujeito a imposto, não há progressividade nenhuma com uma taxa única, por definição, ao contrário do que sucede num verdadeiro imposto progressivo. Segundo, mesmo que se entre em conta com a parte de rendimento isenta de imposto -- o que faz com que em relação ao rendimento global a taxa do imposto aumente com a subida do rendimento --, a verdade é que essa "progressividade" decresce à medida que o rendimento sobe (e não o contrário) e à medida que a "taxa efectiva" se aproxima da taxa única. Por último, e mais importante, o valor da taxa única nominal (que aliás nunca é atingida) é por princípio muito mais baixa do que a taxa mais elevada de um imposto progressivo (que frequentemente excede os 40%).
Ou seja, comparativamente com um genuíno imposto progressivo, a taxa única (proporcional) favorece sempre os rendimentos mais elevados. Aliás, é exactamente por isso que ela é defendida pela direita liberal, e em especial pela direita ultraliberal. Coerentemente, sem dúvida. Só não se percebe a insistência em defender a sua alegada "progressividade", esse valor característico de uma fiscalidade de esquerda.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Desatino

Insistindo na sua falsa acusação à Lusa, o PSD vem argumentar agora que a questão do TGV «apenas diz respeito à política interna portuguesa» não tendo os espanhóis nada a ver com isso.
Lê-se e não se acredita! Então a rede do TGV não inclui várias linhas comuns, que foram acordadas oficialmente entre os dois países, incluindo quanto ao calendário (ainda por cima com o PSD no Governo)? E a parte espanhola das linhas Vigo-Porto e Madrid-Lisboa, que já foram lançadas, não pressupõe a construção da parte portuguesa, cumprindo a nossa parte no acordo? O que não diria o PSD se a situação fosse a inversa, recusando-se os espanhóis a avançar com essas linhas?
Em vez de se retractar pela acusação injustificada que fez à Lusa (e ao Governo), como devia, o PSD prefere fazer uma "fuga para a frente" absolutamente desatinada e irresponsável. Decididamente, o PSD persiste em se confirmar como um partido não fiável, ousando mesmo rasgar os acordos internacionais que firmou em nome do Estado português.

Deixe a verdade vir ao de cima!

I'm an economist, but I'm also an American citizen - and like many citizens, I spent the past eight years watching in horror as the Bush administration betrayed the nation's ideals. And I don't believe we can put those terrible years behind us unless we have a full accounting of what really happened. (...)
That's why this time we need a full accounting. Not a witch hunt, maybe not even prosecutions, but something like the Truth and Reconciliation Commission that helped South Africa come to terms with what happened under apartheid. We need to know how America ended up fighting a war to eliminate nonexistent weapons, how torture became a routine instrument of U.S. policy, how the Justice Department became an instrument of political persecution, how brazen corruption flourished not only in Iraq, but throughout Congress and the administration. We know that these evils were not, whatever the apologists say, the result of honest error or a few bad apples: The White House created a climate in which abuse became commonplace, and in many cases probably took the lead in instigating these abuses. But it's not enough to leave this reality in the realm of things "everybody knows" - because soon enough they'll be denied or forgotten, and the cycle of abuse will begin again. The whole sordid tale needs to be brought out into the sunlight.
(...) let the truth be told.


O economista americano que escreve isto 'e Paul Krugman. Numa carta ao proximo Presidente, Obama.
Uma carta que vale a pena nao apenas ler, mas estudar a fundo. Pelos conselhos que da para os EUA vencerem a crise, retirando os ensinamentos da historia e reconhecendo o que esta crise tem de diferente de todas as outras.
Uma carta que eu recomendo ao Primeiro Ministro e a todos os ministros e dirigentes do PS.
Uma carta que eu recomendaria a Dra Manuela Ferreira Leite e ao PSD, se tivesse a esperanca de que ainda aprendessem alguma coisa...

Desnorte

O que é que deu à presidente do PSD para condenar, falsa e injustamente, a Lusa, por esta, no exercício do mais elementar dever de informar, ter ouvido a reacção dos principais partidos espanhóis à insólita proposta de cancelamento da rede ferroviária em bitola europeia, que Portugal negociou com Espanha, nomeadamente através de governos do PSD? Não era mais do que evidente o interesse da questão para o lado espanhol, caso Portugal rompesse o acordo?!
Será esta reacção passional representativa de uma nova posição do PSD em matéria de liberdade de informação?
Aditamento
Se um ataque destes a um órgão de informação partisse do Governo, quem duvida que o PSD, aliás com toda a razão, não deixaria de fazer dele um caso político sério?!

Ignorância e preconceito (2)

O argumento da líder do PSD para anunciar a sua oposição à rede do TGV -- ela que validou o projecto TGV quando foi ministra das Finanças, num governo que acordou as ligações com Espanha!... -- revela muita ignorância e maior preconceito.
Dizer que o número de passageiros previsíveis na viagem Lisboa-Madrid, por referência ao actual tráfego aéreo, não garante a sustentabilidade financeira do investimento, esquece os seguintes dados: (i) a linha Lisboa-Madrid não servirá somente para as viagens entre as duas capitais, mas também para as viagens de Évora, de Elvas/Badajoz e mesmo de Cáceres para Lisboa, e em especial para o novo aeroporto de Lisboa; (ii) a mesma linha terá valência para transporte de mercadorias, o que constitui outra fonte de receita, ao mesmo tempo que fomenta a utilização espanhola dos portos de Lisboa, Setúbal e Sines; (iii) na equação financeira do TGV terá de entrar necessariamente a enorme vantagem ambiental, traduzida na poupança de milhões de toneladas de gases com efeito de estufa, cujo valor financeiro é cada vez mais elevado.
Aditamento
Ferreira Leite omitiu qualquer justificação para oposição à ligação Lisboa-Porto (que é obrigatória, por causa da saturação da actual linha do Norte e da deslocação do aeroporto de Lisboa para Alcochete) e à ligação Porto-Vigo (porventura a mais problemática em termos de custos e de vantagens), que também fazem parte do pacote aprovado pelo Governo Durão Barroso, de que ela fez parte.

Ignorância e preconceito

Para além da sua dimensão económica, os transportes colectivos têm desde sempre uma dimensão de serviço público, pelas suas vantagens sociais e ambientais (esta especialmente no caso dos transportes ferroviários). É por isso que os transportes colectivos beneficiam em geral de um financiamento público, a título de "indemnização de serviço público".
Essa dimensão de serviço público não pode ser ignorada no caso do transporte ferroviário, incluindo a nova rede de TGV em bitola europeia. De outro modo, se se contabilizassem somente as despesas e as receitas efectivas, teriam de ser encerradas várias das actuais ligações ferroviárias no activo, bem como os transportes colectivos de Lisboa e do Porto, que vivem em grande parte à conta do orçamento do Estado...

Notícias da crise

Eu sei que o mal dos outros não deve servir de lenitivo para o nosso, mas eu espero bem que em Portugal a recessão não atinja a dimensão catastrófica da Irlanda, o primeiro país da zona euro a entrar em recessão em 2008 e onde para 2009 se prevê uma contracção do produto de -4,5%, um défice orçamental de cerca de 9,5% (mais do triplo do limite do PEC!) e uma taxa de desemprego de 10%!
O afundamento irlandês é ainda mais calamitoso, se se tiver em conta que ainda em 2007 o "tigre celta" apresentava um robusto crescimento económico (mais de 5%), uma reduzida taxa de desemprego (à volta de 4,5%) e um superavit orçamental. O "milagre irlandês" ameaça acabar em pesadelo.
Não fora a protecção da zona euro, e a Irlanda poderia seguir o caminho da falência da Islândia...

A herança de Bush

Além das desgraças mais conhecidas, a herança de Bush inclui o maior défice orçamental nos Estados Unidos desde a II Guerra Mundial, a qual deve atingir no fim do actual ano orçamental (30 de Setembro de 2009) cerca de 8,3% do PIB (ainda sem contar com o custo do plano anti-recessão de Obama), mercê sobretudo do corte de impostos (sobretudo para os ricos) e das despesas da guerra do Iraque.
Contrariando a percepção tradicional da política financeira da Direita conservadora, Bush bem merece ficar na história como o campeão da irresponsabilidade orçamental.

"Desperdiçar dinheiro"

Num artigo justamente intitulado "Não desperdicemos os estímulos em baixa de impostos", o conhecido economista Joseph Stiglitz explica porque é que a redução de impostos não pode constituir uma instrumento do pacote de estímulo à economia contra a recessão. Ao contrário do investimento público.
Como aqui se tem defendido, desde o princípio.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

Notícias da crise (2)

Se o nosso vizinho e principal parceiro económico, a Espanha, está assim -- défice orçamental de quase 6% e previsão de desemprego nos 16% ! --, como é que nós poderíamos escapar ao desastre económico!?

O que o PSD quer recusar

«TGV: Bruxelas confirma atribuição de 383,38 milhões de euros ao projecto português».

Notícias da crise

Mais lúgubre não pode ser a previsão da Economist sobre a recessão económica em Portugal no corrente ano e em 2010. Decréscimo de 2% no produto, desemprego a disparar para perto dos 9%, défice orçamental nos 4,5%, deflação efectiva, dívida pública a atingir os 70% do PIB.
Por menos credível que seja o registo histórico das previsões do Economist em relação a Portugal, ainda assim são perspectivas muito preocupantes.
Neste contexto de encurralamento das finanças públicas, limitando a margem de manobra do Estado para apoiar a economia, falar em redução do IRS, como ontem insistiu a líder do PSD, não é politicamente sério nem, muito menos, responsável.

Welcome back UK!

Agora que a sanidade está a voltar aos Estados Unidos, também o Reino Unido demonstra que aprendeu as lições do passado recente e declara que o conceito da 'guerra contra o terror' "está errada e induz em erro". Mais vale tarde que nunca. Bem-vindos de volta!

Política fiscal de esquerda

É de aplaudir a aposta política do PS na utilização do sistema fiscal como instrumento de combate à desigualdade social. Nem outra coisa seria de esperar, apesar da erosão da função social dos impostos, por efeito da globalização económica e da competição fiscal internacional, que levou à redução geral dos impostos sobre rendimentos do capital e sobre os lucros das empresas.
Todavia, a política fiscal continua a ser um dos principais temas divisórios entre a Esquerda e a Direita. Um partido de esquerda não pode, desde logo, alinhar com as as teses da "fiscalidade mínima", que a Direita preconiza, porque isso privaria o Estado dos recursos necessários para as políticas sociais (educação, saúde, protecção social), nem ceder às modas neoliberais da "flat rate" (taxa única) no imposto sobre o rendimento, porque isso colide com um princípio essencial de uma fiscalidade justa, que é a progressividade desse imposto.

Retribuir a protecção pública

«Sarkozy pede aos banqueiros que renunciem à "parte variável" das remunerações».
De facto, se o Estado, através de dinheiro e avales públicos, assegurou a estabilidade do sistema financeiro, imunizando os bancos contra o risco de falência, é justo que estes se auto-contenham na remuneração dos seus gestores e na distribuição de dividendos -- que poderiam não existir se o Estado não tivesse intervindo --, aproveitando para os reinvestir e recorrer menos ao financiamento externo. Além do mais, seria uma boa atitude simbólica em época de recessão, tendo em conta fama de ganância da banca e dos banqueiros.
Se os destinatários não entenderem voluntariamente esta "mensagem", será de considerar um aumento do imposto sobre os valores das remunerações excessivas e sobre os dividendos distribuídos...
De resto, esta política de moderação de remunerações e de dividendos deveria ser estendida a todas as empresas beneficiárias das ajudas anti-recessivas do Estado.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Justo elogio

«Sócrates elogia papel de Correia de Campos em reforma do SNS».

Missão naval da UE na Somália: e Portugal?

Portugal não contribui nem com meios navais nem com meios aéreos para esta missão (que está longe de resolver a questão de fundo, mas que tem a sua utilidade). Ainda vamos a tempo!

Um tremendo tiro no pé

Susan Crawford, a procuradora do Pentágono encarregada pela Administração Bush (felizmente a cessar dentro de dias) de conduzir as acusações dos presos em Guantánamo no contexto das famigeradas "comissões militares" - meio-termo bizarro entre tribunais civis e militares - veio a público dizer aquilo que muitos de nós sempre temeram: a tortura de suspeitos de terrorismo inquina fatalmente qualquer tipo de processo judicial. Mais, num caso em particular, o de Muhammad al-Qahtani, em que há fortes suspeitas de que se trata de um dos elementos da equipa que levou cabo a atrocidade do 11 de Setembro, as autoridades americanas ficam sem saber o que fazer.
A tortura não é só ilegal, moralmente abjecta e inútil, por levar as pessoas a confessar tudo e mais alguma coisa para se subtraírem ao sofrimento. A tortura é também totalmente contraproducente.
Ou como dizia a senhora Susan Crawford sobre Muhammad al-Qahtani perante a herança de oito anos de um combate ao terrorismo que incluiu métodos medievais:
"Ele é um homem muito perigoso. O que é que se faz com ele agora se não o podemos acusar e julgar? Eu hesitaria em dizer 'soltem-no' ".

E agora?

O Corno de África e a miséria na Somália

Já estão disponíveis na Aba da Causa a minha intervenção de ontem em Estrasburgo sobre a situação no Corno de África e o meu último artigo no Jornal de Leiria sobre a situação catastrófica na Somália em particular.

Notícias da crise

É certo que muitos países da zona euro (para não falar fora dela!), incluindo a super-ortodoxa Alemanha, se preparam para ultrapassar o limite dos 3% de défice orçamental, o qual em alguns países (Irlanda, Espanha, etc.) disparará para o dobro, ou mais. Tudo com a complacência da Comissão Europeia.
Isso, porém, não deveria ser de grande conforto para Portugal, dado o nível de endividamento público já elevado e o historial pouco abonatório de indisciplina financeira entre nós. Mais défice significa mais endividamento, o qual implica aumento dos encargos com a dívida, que se poderão tornar bem pesados, logo que, passada a recessão, os juros tiverem de começar a subir de novo. Por isso, importa ponderar se as vantagens da crescente despesa pública no combate à recessão (indispensável, mas sempre de efeitos limitados) compensam os pesados custos num futuro próximo.
Seja como for, em termos de sustentabilidade financeira, seria verdadeiramente aventureiro juntar ao aumento da despesa pública uma redução indiscriminada de impostos, como propõe a oposição de Direita. Decididamente, por puro oportunismo político, a Direita sacrifica os mais elementares princípios da prudência orçamental.

O oportunismo do PSD

«(...) O PSD, longe de propor alternativas verdadeiramente sustentadas às políticas do actual executivo, tem-se largamente limitado a cavalgar de forma oportunista ondas de insatisfação ou de pânico irracional que, ocasionalmente, foram rebentando na sociedade portuguesa (estou a pensar, por exemplo, na «onda de violência» do Verão passado e na crise da avaliação dos professores).»
Como manifestações do actual "oportunismo sistémico" do PSD (a expressão é minha), Pedro Norton poderia ter acrescentado a sua conduta no caso do veto presidencial do Estatuto dos Açores ou a proposta de redução indiscriminada de impostos em plena recessão económica. Já só falta ver o PSD defender uma subida substancial dos salários, ao lado do PCP e do BE!...
Aditamento
Na sua entrevista de hoje à RTP (como Judite de Sousa muda de tom de acordo com os entrevistados!...), Manuela Ferreira Leite sustentou que com ela o PSD reconquistou a "credibilidade política". A ter em conta as sondagens e as opiniões correntes, deve ser a única a crer nisso...
Aditamento 2
Sobre os dados do PSD nas sondagens ver a análise informada de Pedro Magalhães.

O império do terror, em Gaza

«Gaza: agência da ONU e redacções de jornais internacionais bombardeados por Israel».
Os porta-vozes de Israel costumam elogiar "o cuidado e a precisão" dos ataques israelitas, para "minorar" as perdas civis. O problema é quando os próprios alvos são deliberadamente civis...

" A opção de Israel"

Este artigo, de um observador israelita, deveria ser lido pelos que defendem acriticamente a eterna opção bélica de Israel no conflito com os palestinianos.

"Sem piedade, em Gaza"

Já importei para a Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Notícias da crise (2)

«O Governo de Madrid está a considerar um aumento da carga fiscal sobre a gasolina, tabaco e álcool, de modo a contrabalançar a queda das receitas causada pela recessão.»
Como se vê, a recessão pode justificar a subida de impostos (e não a descida, como propõem alguns entre nós).
Aditamento
Se se concretizar a subida dos impostos sobre o consumo dos referidos bens, vai diminuir o actual diferencial entre os respectivos preços em Espanha e Portugal, nomeadamente no caso dos combustíveis. Ainda bem!

Bom exemplo

«O presidente eleito dos EUA quer que os vencimentos dos executivos e os dividendos a pagar pelas sociedades financeiras que recebem auxílios estatais sejam limitados.»
Contra o que pensavam os cépticos, com Obama há coisas que mudam...

A deriva do PSD

A demagógica irresponsabilidade com que a oposição de Direita insiste em defender uma baixa de impostos em plena recessão económica é verdadeiramente patética.
Primeiro, num contexto recessivo uma baixa geral de impostos em nada ajudaria a recuperar a economia, em termos de aumento da consumo ou do investimento privado; segundo, a consequente perda de receitas públicas reduziria a capacidade de intervenção do Estado no aumento do investimento público e no fomento do investimento privado, essenciais para atenuar o impacto da recessão; terceiro, a redução de impostos sobre o rendimento seria também socialmente iníqua, por beneficiar sobretudo os titulares de rendimentos médios e altos, que já beneficiam da redução drástica da inflação; quarto, uma baixa de impostos neste momento dificultaria a reposição do reequilíbrio orçamental e a necessária redução da dívida pública, depois do fim da crise.
O que é surpreendente é como é que uma proposta tão irresponsável pode ser defendida por um partido de vocação governamental como o PSD. Decididamente, já desistiu de pensar em governar, tendo passado a partido de contrapoder...

Notícias da crise

Apesar de ainda em 2007 ter apresentado um superavit orçamental, a Espanha já ultrapassou os 3% de défice em 2008 e caminha para atingir os 6% no corrente ano, em flagrante violação do Pacto de Estabilidade e Crescimento da UE.
Qualquer que seja a reacção da Comissão Europeia, este é um exemplo que Portugal não deve seguir, por três razões: (i) a recessão em Portugal não será provavelmente tão severa como a espanhola, desde logo ao nível do desemprego; (ii) a dívida pública já é bastante superior à espanhola (relativamente ao PIB, bem entendido), pelo que não pode ser muito mais agravada; e (iii) não podemos cair outra vez numa situação de défice excessivo, pouco depois de sair de uma prolongada experiência de indisciplina financeira.

terça-feira, 13 de janeiro de 2009

Destinatário errado

Parece que alguns movimentos de professores vão fazer uma manifestação em Belém.
Debalde se esforçam. Se houvesse uma disciplina de educação cívica nas escolas, os organizadores bem saberiam que o Presidente da República não é responsável pelo governo, nem instância de recurso das decisões do governo.

A pergunta omissa

Nas poucas ocasiões em que Mário Crespo conseguiu interromper o torrencial e obsessivo discurso do líder madeirense, ontem na SIC, faltou uma pergunta, quando Jardim se queixava da diminuição do subsídio orçamental da República para a Madeira.
E a pergunta é esta: «Mas porque é que o Continente há-de ainda continuar a subsidiar a Madeira, se a sua riqueza já está bem acima da média nacional?»
Pelo contrário, em vez de o Continente continuar a subsidiar a Madeira, que já beneficia de todas as receitas fiscais nela cobradas, deve ser esta que deve começar a pagar a sua quota-parte nas despesas gerais da República (desde as forças armadas à representação diplomática, desde a justiça às contribuições para as Nações Unidas e a União Europeia, etc.), despesas para as quais as regiões autónomas não contribuem, constituindo encargo exclusivo dos contribuintes do Continente.
Em vez de ter todos os benefícios e nenhum encargo, era bom que a Madeira começasse a comparticipar nos encargos nacionais comuns (dos quais, aliás, as regiões autónomas nunca deveriam ter sido isentas).

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Autonomia escolar

Não percebo em é que a obediência das escolas públicas à lei e às orientações da tutela legalmente previstas (designadamente em matéria de avaliação de professores) põe em causa a autonomia das escolas, por maior que esta seja.
Como é próprio de um Estado de direito, a autonomia das organizações e dos gestores públicos só existe nos termos da lei, o que exclui uma suposta liberdade de não cumprir a lei (embora obviamente se possa discordar da mesma). O gestor público que não se sinta capaz de cumprir a lei que rege a sua organização deve naturalmente isentar-se da correspondente obrigação funcional, demitindo-se.

Situações excepcionais

Justificar-se-á a dispensa transitória de concurso público para as empreitadas públicas (do Estado e dos municípios) até 5 milhões de euros, como instrumento de resposta célere à recessão económica?
Antes de mais, importa sublinhar que a dispensa de concurso público não inclui dispensa de consulta a várias empresas nem dispensa de fundamentação da escolha feita a final. Em segundo lugar, as medidas contra a recessão, além de explicitamente temporárias, devem ser efectivadas o mais rapidamente possível, para atenuar o aprofundamento da recessão e abreviar a sua duração. Não faz sentido apostar em investimentos públicos para combater o aumento do desemprego e estimular a economia, e depois demorar um ano para pôr esses investimentos no terreno, quando a crise já tiver produzido os seus piores efeitos.

Ruído comunicacional

O Presidente da República fez sair um comunicado contra as especulações correntes em matéria de calendário eleitoral.
Fez bem. Mas faria ainda melhor, se controlasse e desautorizasse as anónimas "fontes de Belém" que frequentemente introduzem ruído no meio-ambiente político com a notícia de alegadas posições ou intenções presidenciais, não confirmadas mas também não desmentidas. E para não multiplicar o recurso a comunicados escritos, porque não institucionalizar a figura do porta-voz autorizado do Presidente?

Custos da recessão

«Aumentos [salariais] no [sector] privado abaixo da função pública» -- diz o Diário Económico.
Apesar do aumento da assimetria entre as remunerações do sector público e do sector privado, em favor do primeiro, na actual situação de recessão impõe-se a contenção do aumento dos custos salariais (sem prejuízo do aumento já decretado do salário mínimo), sem a qual as empresas ficariam em pior situação para manter o emprego e a economia portuguesa agravaria o seu défice de competitividade internacional e a queda das exportações.

As perguntas da guerra

A propaganda israelita preparou uma meticulosa operação de argumentação a favor do ataque a Gaza, incluindo por exemplo esta pergunta: "Que faria qualquer outro País, se de um território vizinho lançassem repetidamente rockets contra o seu território e a sua população?"
Mas esta pergunta deve ser contrastada com outra pergunta: "Que fariam os habitantes de qualquer território, se o Estado vizinho ocupasse o seu território há dezenas de anos, lhe negasse o direito ao seu próprio Estado, expropriasse as melhores terras para as entregar a colonos seus, construísse um muro de separação bem dentro do mesmo do território, anexando boa parte dele, infligisse desumanas humilhações quotidianas aos habitantes, recorresse sistematicamente a assassínios políticos, bloqueasse retaliatoriamente o abastecimento de uma província, mesmo à ajuda humanitária das Nações Unidas, recorresse à punição colectiva da população civil sempre que há acções de resistência à ocupação, como se todos fossem terroristas?"

domingo, 11 de janeiro de 2009

A menina de Gaza


Fotografei-a em 2005.
No campo de refugiados de Jabalya.
Sentada nos escombros da casa da família, dias antes arrasada por um bombardeamento selectivo das forças israelitas.
Ao lado pais, avós e irmãos, aos ais e soluços, rebuscavam os escombros, à procura do que pudessem salvar dos seus pertences.
Ela acabava de chegar da escola. Limpinha, arranjadinha, doce e sorridente, apesar de desgraça que caíra sobre a família.
A UNICEF dera-lhe uma pasta nova, disse-me, pondo-a à frente, para a fotografia. E a UNRWA uma tenda, mais além, para todos...
Tenho pensado nela todas as noites, ao saber das últimas noticias sobre a progressão da guerra contra Gaza e o seu povo humilhado, oprimido e aprisionado. Contra mulheres, como a mãe e a avó dela, e contra crianças como ela, indefesas, inocentes. Que não podem fugir, porque de Gaza não há por onde escapar. E já foram mortas centenas, nos últimos dias.
Viverá ainda? Tiritará de fome, sede, frio e terror nalgum esconderijo ou jaz sob os destroços de algum prédio? Vai sobreviver mais esta guerra atroz? E vai poder voltar a sorrir? Ou vai desesperar e vegetar para se vingar, arrastando quem puder num último sacrificio?
Como é que a segurança de Israel se reforça aterrorizando e assassinando crianças como ela?

sábado, 10 de janeiro de 2009

Concordo

"A esquerda dos interesses".

Demitam-se, pois

Segundo o DN, os conselhos directivos que discordam da avaliação de desempenho dos professores admitem apresentar a demissão.
É justamente o que devem fazer, se acham que a sua discordância não lhes permite cumprir as obrigações que a lei e as orientações da tutela lhe impõem e por cujo leal cumprimento são responsáveis (sob pena de ilícito disciplinar). O que é inadmissível é que, em vez de cumprirem as suas obrigações funcionais, se prevaleçam dos seus cargos para promover o incumprimento da lei.

Calendário eleitoral (2)

Independentemente da sua racionalidade política, ou falta dela, uma eventual antecipação das eleições parlamentares, designadamente para as fazer coincidir com as eleições europeias, em Junho, dependeria sempre da decisão do Presidente da República, pois além de lhe caber o poder de marcar as eleições, a antecipação pressupõe uma prévia dissolução parlamentar, que só ele pode decretar, como órgão de regulação e supervisão do sistema político (não cabendo tal poder ao Governo, como sucede nos sistemas parlamentares típicos).
Tratando-se de uma "dissolução de conveniência" (por não ter a ver com nenhuma crise institucional ou política), não é nada provável que o Presidente esteja disponível para ela, sem fortes argumentos políticos a seu favor e sem um largo consenso partidário nesse sentido, o que não parece ser o caso.
Excluída essa possibilidade, tudo indica que o calendário eleitoral não irá ser alterado, a não ser que inesperadamente o Governo venha a ter um forte motivo para apresentar a sua demissão e provocar eleições antecipadas, como esteve aparentemente em vias de suceder, caso tivesse sido aprovada a suspensão da avaliação de desempenho dos professores...

Calendário eleitoral

Não é propriamente uma surpresa a notícia de hoje do Expresso segundo a qual o Presidente da República prefere a realização simultânea das próximas eleições parlamentares e autárquicas, contrariando a preferência pública do Governo pela sua descoincidência.
Mais relevante é a conclusão de que muito provavelmente assim sucederá, pois a última palavra cabe a Cavaco Silva. Embora pertença ao Governo o poder de marcar a data das eleições locais, a verdade é que incumbe ao Presidente o poder marcar a data das eleições parlamentares, tendo este legalmente mais tempo para o fazer do que aquele, pelo que Belém pode sempre escolher a mesma data que tiver sido decidida pelo Governo.

"A revolução exangue"

Já importei para a Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, sobre os cinquenta anos da revolução cubana.

Correcção

Em relação a esta reclamação, informam-me que o serviço de apoio da TMN está disponível directamente, via voz, depois de passada a mensagem gravada de conteúdo informativo. Aqui fica a correcção, embora preferisse que a tal longa e equívoca mensagem gravada fosse dispensada.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Boa ideia

«Merkel sugere criação de conselho económico mundial».
Acho uma boa ideia. Uma economia global carece de um governo global. E também concordo que esse novo organismo fique integrado nas Nações Unidas.
Aditamento
A chancelerina alemã falava no Colóquio "Novo Mundo, Novo Capitalismo", que está a decorrer em Paris este fim-de-semana, por iniciativa de Sarkozy. A seguir com atenção as comunicações e conclusões.

Centenário republicano

O centenário da instauração da República aproxima-se e começam a aparecer os primeiros eventos a recordá-lo. Ontem tive o privilégio de participar em Coimbra numa tertúlia sobre o tema, organizada pelo Teatrão (parabéns à Inês!), juntamente com António Arnaut, J. J. Gomes Canotilho e Reis Torgal. A meu ver, valeu a pena a conversa, que suscitou numerosas perguntas das muitas pessoas presentes.

Clarificando

A resposta de Paulo Pedroso ao meu comentário sobre a discussão antecipada de eventuais coligações de governo em caso de vitória eleitoral do PS sem maioria parlamentar encerra a controvérsia (ainda que a "contre-coeur" da sua parte).
Só desejo precisar que na minha perspectiva não se trata de "esconder o jogo", mas sim de não o jogar antes do momento certo, ou seja, antes das eleições, que até podem dispensá-lo. A minha tese é que antecipar a questão não ajuda nem a evitá-la nem a solucioná-la, se tal for necessário.
Aditamento
Sobre este tema ver também este post do Deputado Osvaldo Castro, que integra o grupo encarregado de preparar o projecto de moção a apresentar por Sócrates ao próximo Congresso.

Descrédito

O PSD volta a atacar o investimento público como forma de responder à crise, continuando a advogar a baixa de impostos (sem porém discriminar quais), no que aliás se limita a secundar o CDS.
Ora, se é irresponsável rejeitar o investimento público, única forma de compensar a baixa do investimento privado e o consequente aumento do desemprego, mais irresponsável ainda é, nas actuais circunstâncias, advogar uma baixa geral de impostos (para além das baixas selectivas que já foram aprovadas), pois é evidente que a inerente perda de receita fiscal prejudicaria a capacidade do Estado para ajudar a economia e as empresas em dificuldades e para apoiar as principais vítimas da recessão, ou seja, os que perdem o emprego.
Se não se quiser fazer disparar o défice orçamental e o endividamento público (e os respectivos encargos futuros), não se pode ter ao mesmo tempo aumento da despesa pública e baixa de impostos. Além disso, nas actuais circunstâncias de recessão e de falta de confiança na economia, uma baixa de impostos não teria nenhum efeito estimulador nem sobre a procura nem sobre o investimento.
Aparentemente, o PSD já desistiu de se preocupar em apresentar-se como alternativa credível de governo, limitando-se a disputar com o CDS o eleitorado mais conservador...

Oportunismo

Como é que o PSD, que diz ser a favor da avaliação de desempenho dos professores, acaba por defender a suspensão da mesma avaliação, reeditando iniciativas da extrema-direita e da extrema-esquerda, sem nunca ter apresentado nenhuma alternativa ao processo em curso? Como é que um partido que pretende voltar a governar pode incorrer em tamanha manifestação do mais chilro oportunismo, tentando disputar com o PCP e com o BE os protestos dos professores que não querem a avaliação? Quem é que pode acreditar que o PSD, se voltasse ao Governo, não renunciaria a qualquer avaliação, só para não enfrentar o oposição dos interessados?

quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Sem piedade, em Gaza

É evidente que Israel não pretende somente destruir as instalações lança-rockets nem apenas anular a capacidade militar do Hamas, aliás comprovadamente reduzida, mas também erradicar a sua capacidade política, arrasando as suas instituições e liquidando fisicamente os seus militantes e dirigentes. Só isso pode explicar a extensão das operações, sem cuidar dos pesados "danos colaterais" em perda de vidas humanas, de instalações colectivas e de casas, incluindo actos de extrema crueldade e insensibilidade, como o bombardeamento e destruição de uma escola das Nações Unidas, onde se tinham refugiado muitos civis comuns, de que resultou a morte de dezenas deles, incluindo muitas crianças.
É de supor que, se se limitasse à destruição dos recursos militares do Hamas, a acção israelita não causaria nenhuma comoção internacional, fora os habituais círculos extremistas árabes. Mas a razia impiedosa e a sanha destruidora que Telaviv está a impor em Gaza, causando uma situação humanitária insustentável, não pode ser justificada à luz de nenhuma racionalidade política, salvo a da punição colectiva dos habitantes de Gaza pelo apoio político dado ao Hamas e a aniquilação das próprias condições de vida do território.
Por mais justificável que seja a guerra contra o Hamas, nada pode legitimar o sofrimento indiscriminado imposto a uma população inteira, vítima de todas as injustiças deste mundo, do qual só podem nascer mais apoios para o radicalismo islâmico e mais ódio e raiva colectiva contra o invasor.

O neoliberal de Praga

Num militante manifesto neoliberal, hoje publicado no Financial Times, o Presidente da República Checa (falando em nome do governo do País, vá-se lá saber porquê...) veio defender, entre outras, coisas assim:
"The best thing to do now would be temporarily to weaken, if not repeal, various labour, environmental, social, health and other “standards”, because they block rational human activity more than anything else."
É evidente que, para além da sua insensatez, esta insólita "proposta" exigiria a suspensão da maior parte da legislação comunitária, além de ser manifestamente incompatível com os Tratados, em todas as áreas citadas.
E ainda há quem conteste o fim das presidências rotativas da UE, no Tratado de Lisboa! O que vale é que a presidência checa só dura 6 meses...

quarta-feira, 7 de janeiro de 2009

Dar o flanco

«Rejeição de acordos com o CDS é garantia que esquerda do PS quer receber do secretário-geral, mesmo que seja dada em privado» -- diz hoje o Público (link para assinantes).
Como é bom de ver, face ao que tenho escrito sobre o assunto (por exemplo, aqui e aqui), acho contraproducente qualquer compromisso prévio, público ou privado, sobre fórmulas de governo pós-eleitorais que desfoque o PS do seu primeiro objectivo, que é renovar a maioria. Só depois das eleições, caso esse objectivo não seja alcançado, é que deve colocar-se na agenda a questão de eventuais alianças de governo --, se não for preferível governar em minoria!
De resto, excluir à partida um certo partido (qualquer que ele seja) tem duas desvantagens: (i) admite explicitamente que o referido objectivo pode não ser alcançado, o que o enfraquece; (ii) admite implicitamente que não há objecções a alianças com qualquer dos demais partidos, nomeadamente uma coligação com o PSD (o que exporia o PS a ser flagelado pelo PCP e pelo BE, pondo em causa a sua votação à esquerda) ou com um desses partidos da extema-esquerda (o que o exporia ao ataque do PSD e do CDS, debilitanto o seu apoio eleitoral ao centro).
Por isso, não vejo que vantagem pode ter o PS em dar o flanco nessa matéria antes das eleições. Entendo mesmo que essa questão devia ser declarada matéria interdita...

Imunidade

O líder do sindicato da Fenprof veio hoje asseverar que os professores podiam incumprir à vontade as obrigações relativas à avaliação, sem qualquer receio de sanções disciplinares ("Não há nenhuma sanção disciplinar que lhes possa ser aplicada, nem a eles nem aos presidentes dos Conselhos Executivos" -- declarou ele ao DN).
Ficamos assim a saber de mais um privilégio desconhecido dos professores entre os servidores públicos - a imunidade disciplinar! É preciso desfaçatez!

Um pouco mais de seriedade, sff

Há poucas semanas, quando Sócrates afirmou que, apesar da crise económica, muitos portugueses iriam ter mais rendimento disponível em 2009, dada a queda da inflação e das taxas de juro, foi "zurzido" por inúmeros comentadores, apesar da evidência da argumentação (como aqui várias vezes se mostrou, por exemplo, aqui e aqui).
Foi preciso que o Governador do Banco de Portugal viesse ontem confirmar o óbvio, para que dois jornais de referência -- o Público e o Jornal de Negócios -- viessem colocar essa notícia em manchete, nas edições de hoje, como se de uma novidade se tratasse.
E os tais comentadores, vão eles retractar-se?!

Livro de reclamações

Tendo necessidade de assistência do meu prestador de serviços de telemóvel (a TMN), fui surpreendido com a descoberta de que o serviço de apoio aos clientes deixou de ser feito directamente, via voz, passando a estar disponível por meio de... SMS. Segunda surpresa, ao fim de quatro SMS e respectiva resposta descobri que o meu problema não cabia em nenhum dos itens do menu disponibilizado, pelo que tive de desistir. Resta-me deslocar-me a uma loja de assistência do operador (imaginem que eu estava no estrangeiro...).
Trata-se de um situação inadmissível sob o ponto de vista da protecção dos direitos dos utentes, que nem o regulador das telecomunicações (a ANACOM), nem as associações de defesa dos consumidores, podem passar sem censura. Primeiro, a obrigatoriedade de recurso ao SMS exclui do serviço de apoio todos os utentes iletrados ou não familiarizados com essa função. Segundo, não é simplesmente exigível que uma pessoa desperdice o seu precioso tempo em SMS sucessivos, para descobrir no final que de nada lhe serve.
A PT desconsidera os seus clientes. Felizmente, há alternativas. Há tempos rescindi o contrato de telefonia fixa, em protesto pela cobrança de serviços não solicitados. Parece-me, agora, que também tenho de procurar outro fornecedor de serviço de telefonia móvel. Se algum responsável da TMN ler este post, peço que tome boa nota.

Oposições (2)

Em plena recessão, não é muito menos despropositado insistir (como faz o CDS-PP) em redução de impostos (para além da redução do IRC e de outras medidas de alívio fiscal das empresas que já foram tomadas).
Quem tem rendimentos tributáveis já beneficia da grande baixa da inflação para aumentar o seu rendimento disponível. Sob pena de disparo do défice orçamental, diminuir impostos reduziria, sim, a capacidade financeira do Estado para actuar onde importa, ou seja, aumentar o investimento público, apoiar empresas em dificuldades e limitar o crescimento do desemprego.

Oposições

Quando se confirma uma recessão económica a sério, com duradoura contracção da actividade económica, redução do investimento, empresas em dificuldades e aumento do desemprego, vir reivindicar aumentos de salários e de pensões (como faz o BE), revela bem a demagogia e a irresponsabilidade política da esquerda radical.
Quem tem salários e pensões até sai beneficiado desta crise, visto que os respectivos aumentos superam significativamente a inflação, que vai ficar muito aquém do previsto. Além disso, aumentar os salários implicaria aumentar os custos das empresas, agravando as suas dificuldades e, portanto, gerando mais desemprego. Ora, o aumento do desemprego é que é o verdadeiro flagelo das crises económicas.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Notícias da crise

A previsão da recessão apresentada pelo Banco de Portugal para o corrente ano (entre -0,7% e -0,8%) ultrapassa a dos analistas, desenhando um quadro económico mais grave do que o esperado, embora não seja propriamente uma surpresa, tendo em conta as previsões bem mais negras da recessão dos nossos principais parceiros comerciais europeus, nomeadamente a Espanha, a Alemanha e a Grã-Bretanha, o que deve arrasar as nossas exportações (efeito que no caso britânico é agravado pela baixa da libra).
Aditamento
Com esta previsão de decréscimo do PIB, aumenta a pressão sobre o défice orçamental, que dificilmente poderá ser mantido nos canónicos 3%, por efeito da inevitável diminuição da receita fiscal e do aumento da despesa pública (para antecipar investimentos públicos, apoiar o investimento privado e conter o aumento do desemprego até onde for possível). Importa saber que resposta vai ter esta nova situação nas opções do PEC para 2009 e na inevitável revisão do orçamento para este ano.

Mercado único, regulador único

Defendo há muito (por último aqui) a tese de que o mercado único europeu, a começar pelo sector financeiro, reclama a existência de reguladores "federais" a nível da UE, com poderes efectivos (e não apenas poderes de recomendação), sem prejuízo da subsistência dos reguladores nacionais.
Vejo por isso com satisfação a notícia de que um vice-governador do BCE, Lucas Papademos, defendeu a existência de uma autoridade europeia de supervisão bancária, a nível da zona euro (que no seu entender seria o próprio BCE), cujas decisões seriam implementadas pelas autoridades de supervisão nacionais. Parece-me uma solução bem mais eficiente do que os actuais "comités europeus de supervisores", com funções informais de coordenação geral, e os "colégios de supervisores nacionais", para a coordenação da supervisão dos grupos financeiros transfronteiriços, há tempos encorajados pelo Conselho de Ministros da UE.

A revolução exangue

«Quase vinte anos depois da queda do comunismo soviético na Europa e da deriva capitalista da China, Cuba só agora, depois da saída de Fidel Castro, parece encarar o dilema entre a manutenção do status quo, insustentável a prazo, ou a adopção de reformas económicas e sociais, que podem permitir sair das dificuldades, mas que correm o risco de desencadear uma liberalização económica e política sem retorno, que ponha em causa os próprios alicerces do regime. As pequenas mudanças anunciadas por Raul Castro podem indicar a escolha da segunda via, mas a timidez das mesmas e a demora na sua implementação podem significar que enquanto Fidel Castro for vivo nada de substancial se alterará. Entretanto, apesar do balão de oxigénio da ajuda da Venezuela de Chávez, a situação pode degradar-se para além do suportável.»
Do meu artigo de hoje no Público, sobre os 50 anos da revolução cubana (link para assinantes).
Aditamento
Para uma descrição do desastre cubano, ver este artigo do El País, expressivamente intitulado "El naufragio cubano".
Aditamento 2
Sintomaticamente, a esquerda comunista entre nós, que por vezes aponta Cuba como exemplo de regime socialista bem sucedido, limitou-se a um registo de circunstância do meio século da revolução...
Aditamento 3
E os dogmas colectivistas começam a ceder: segundo o Público de hoje, «Raúl Castro autoriza os cubanos a construírem as suas próprias casas» (link para assinantes).

Aposta eleitoral

Na sua entrevista, José Sócrates anunciou formalmente a sua aposta na renovação da maioria absoluta nas eleições parlamentares do próximo Outono, tendo-se também negado a especular sobre cenários governativos alternativos, caso não obtenha esse objectivo.
Sempre defendi que o PS não devia elaborar sobre outra perspectiva que não essa. Entrar em especulações sobre o "day after" em caso de vitória sem maioria significaria enfraquecer à partida a possibilidade de alcançar o principal objectivo e lançaria o PS numa luta interna de posições sobre eventuais alianças pós-eleitorais. Importava atalhar desde já ao desenvolvimento de tais cenários.