Os nossos rejeicionistas da constituição europeia acham dignos de invocação alguns dos golpes de baixa argumentação dos partidários do "não" franceses destinados a provar a alegada natureza "neoliberal" do tratado constitucional, como perguntar quantas vezes o tratado constitucional utiliza, ou não, certas palavras, que no seu entender estão a mais ("mercado", "concorrência", etc.) ou a menos ("laicidade", "fraternidade", etc.).
Mas, para ser honesto, o argumento deveria: (i) primeiro, comparar com a utilização das mesmas palavras nos tratados em vigor (que continuarão em vigor se a constituição for chumbada); (ii) segundo, verificar a frequência de outras palavras igualmente relevantes para o seu argumento, como por exemplo, "social", "solidariedade", "igualdade", "justiça", "coesão", "democracia" e "democrático", "direitos humanos", "direitos fundamentais", etc. e comparar com a sua frequência nos tratados vigentes.
Assim, seria curioso apurar que, por exemplo, enquanto a palavra "mercado" aparece 64 vezes no corpo do tratado, o termo "social/sociais" surge 139 vezes, mais do dobro. Para uma constituição "neoliberal" e "anti-social" não está mau, pois não?
Já agora um teste para os rejeicionistas: na expressão "economia social de mercado", uma inovação do tratado (art. I-3º, 3), por que é que "mercado" conta e "social" não?