O primeiro parlamento nacional a discutir o relatório do Parlamento Europeu sobre os chamados "voos da CIA" não foi europeu, mas sim americano. Com efeito, uma delegação do PE esteve na semana passada na Comissão de Negócios Estrangeiros da câmara baixa do Congresso americano para participar numa audição pública sobre o tema "Entregas extraordinárias na política anti-terrorista dos EUA: o impacto nas relações transatlânticas."
No primeiro painel, a delegação do PE apresentou as conclusões principais do relatório final da sua Comissão Temporária sobre a alegada Utilização pela CIA de Países Europeus para o Transporte e a Detenção Ilegal de Prisioneiros. Seguiu-se um animado debate sobre as consequências da estratégia de luta contra o terrorismo da Administração Bush para a segurança global e para as relações com os aliados europeus.
No segundo painel, Julianne Smith, investigadora do reputado think tank americano CSIS e Michael Scheuer, antigo líder da unidade 'Bin Laden' da CIA, debateram os mesmos temas com os congressistas.
Todo o exercício demonstra que as mais altas instâncias políticas americanas levam a sério o trabalho do PE nesta área. E que, ao contrário do que nos é vendido por alguns serviçais deste lado do Atlântico, as críticas às políticas irresponsáveis e contra-producentes da Administração Bush na área da luta contra o terrorismo nada têm de anti-americano, antes pelo contrário.
Mas esta iniciativa do Congresso revela muito mais do que apenas vontade da nova maioria Democrata em promover um processo de introspecção sobre o desastre da política externa americana nos últimos 6 anos: expõe o silêncio ensurdecedor dos governos (e dos parlamentos) europeus em relação à colaboração de responsáveis deste lado do Atlântico com os aspectos mais abjectos das políticas e práticas bushianas.
Neste contexto, aqui fica a tradução de um diálogo ilustrativo entre o Representante Rohrabacher (Republicano da Califórnia) e Michael Scheuer, antigo agente da CIA, retirada da segunda parte das actas:
"REP. ROHRABACHER:(...) O senhor está a dizer que quando as pessoas foram apanhadas e transferidas para outros países, isso foi sempre feito em consulta, cooperação e sob controlo de governos estrangeiros onde o incidente ocorreu. Está correcto?
SR. SCHEUER: (...) Qualquer operação na Europa foi feita com o apoio conhecedor e a aprovação dos serviços de segurança europeus envolvidos".
Restam dúvidas?