terça-feira, 13 de janeiro de 2004

Serviço público ou mercantilização?

1. Uma carta
Ainda a propósito da reforma dos hospitais públiccos, recebi o seguinte comentário de um leitor:

«Li atentamente a sua nota "o espírito do serviço público"; concordo no essencial com a sua reflexão. No entanto, a actual "reforma dos hospitais" tem como principais objectivos: criar condições para que os Hospitais SA aumentem o seu capital inicial à custa do seu património (terrenos, instalações), permitindo-lhes recorrer a empréstimos bancários para colmatar as dívidas contraídas e assim ajudando o governo de uma forma habilidosa a manter o défice; que os Hospitais SA vão buscar novos financiamentos aos seguros e subsistemas, criando utentes de 1.ª e de 2ª.
Basta conhecer os contratos programa para perceber que os Hospitais SA são penalizados se ultrapassarem a produção contratada para os utentes do SNS, tendo uma folga para contratar doentes dos subsistemas e seguradoras. O que está em causa é a mercantilização do sistema e não o espírito do serviço público.»
[Rui Lourenço]

2. E a minha resposta
Obrigada pelo seu comentário. É pelas razões que invoca e por outras, ainda mais graves, que podem surgir, que me parece que a discussão é importante e que a regulação, acompanhamento e avaliação, públicas e transparentes, são indispensáveis (ver o Editorial de Amílcar Correia no "Público" - A vocação dos hospitais).
Não sou contra os novos métodos de gestão dos hospitais, se eles melhorarem o serviço público prestado (e para isso é indispensável conservar o espírito de serviço público, referido por Dahrendorf). Mas qualquer reforma não pode também esquecer um pressuposto básico: o de que os recursos financeiros para qualquer serviço público (saúde, justiça, educação) não são ilimitados, devendo ser usados da forma mais eficiente. Por isso, verifiquei com agrado que a experiência pioneira do Hospital de Santa Maria da Feira tinha tido resultados positivos. É cedo para tirar conclusões sobre o pacote dos hospitais SA, mas não para estar atento ao que está a acontecer. Vejo, com agrado, que esse é o seu caso
Maria Manuel Leitão Marques