Enquanto na Grã-Bretanha o relatório Hutton - que ilibou Blair e censurou a BBC no caso da alegada manipulação governamental de informações sobre o Iraque - não cessa de ser questionado na imprensa, da esquerda à direita, pelas suas limitações e incongruências, em Portugal não falta quem se escandalize com essa natural controvérsia. O director do "Expresso" usa o editorial do semanário para declarar que a contestação do relatório assume uma «enorme gravidade» e que «a recusa das conclusões da Justiça representará o regresso ao vale-tudo: à lei da selva».
J. A. Saraiva é naturalmente livre de proclamar a sua fé nas conclusões do contestado relatório. O que não pode é invocar para ele, por duas vezes, a autoridade da "Justiça" (com jota grande e tudo). De facto, o inquérito não é um procedimento judicial nem o relatório é uma sentença. Meter aqui a justiça constitui uma inaceitável confusão. A Justiça não é para aqui chamada. O facto de Blair ter escolhido um juiz aposentado para efectuar o inquérito (para explorar a sua credibilidade) não lhe confere natureza judicial. E pelos vistos, não foi o juiz Hutton [na imagem] que emprestou o pretendido crédito ao relatório, antes foi ele que saiu desacreditado.
Por isso, qualificar de «intelectualmente desonesta» a contestação do referido relatório é, para dizer o menos, uma atitude despropositada (Saraiva diria "pouco honesta").
Vital Moreira