segunda-feira, 29 de março de 2004

Desatino

Em mais uma das suas afamadas crónicas políticas do Expresso, o seu director José António Saraiva defende, com a perspicácia e a profundidade analítica a que nos habituou, a seguinte tese: ao opor-se à “guerra contra o terrorismo” de Bush, a esquerda acaba por se colocar ao lado do terrorismo; por isso, a proposta de negociação feita por Mário Soares é o corolário lógico dessa posição. De permeio, omitindo as generalizadas críticas que Soares recebeu da esquerda, AJS chega a escrever coisas como esta: «E, por muito que custe escrever, os terroristas estão do lado dos que combatem Bush, sendo objectivamente seus aliados».
Há um ano silogismos destes já eram sonsos ecos servis da maniqueísta proclamação do próprio Bush, segundo o qual ou se estava com ele (inclusive na ilegítima invasão do Iraque) ou com os terroristas, o que, como se sabe, colocou "ao lado destes" as Nações Unidas, a França e a Alemanha, Koffi Annan e o Papa, por exemplo, bem como a maior parte da opinião pública mundial. Nunca os terroristas pensaram possuir tantos "apoios". Passado um ano, porém, quando se sabe que a guerra no Iraque só enfraqueceu a luta contra o terrorismo e se saldou mesmo num favor prestado ao terrorismo islâmico, e quando a Europa, no seguimento dos atentados de 11 de Março em Madrid, define a sua própria estratégia alternativa contra o terrorismo, face ao falhanço da estratégia guerreira de Bush, os ditos requentados de AJS só podem relevar de um raciocínio desatinado.
Por muito que custe escrever, com inimigos destes o terrorismo internacional não precisa de aliados...