sexta-feira, 2 de abril de 2004

O “efeito francês”

Lendo hoje a entrevista dada ao Diário Económico pelo novo vice-presidente da bancada parlamentar do PSD, Miguel Frasquilho, que também teve responsabilidades na elaboração do programa do actual Governo, percebe-se bem por que é o nervosismo se apossou das hostes governamentais e por que é o Primeiro-Ministro se dedicou subitamente a trocar o discurso pessimista que utilizou durante dois anos sobre a situação económico-financeira por um discurso artificialmente optimista, falando de uma “retoma” económica ao virar da esquina e anunciando mesmo um aumento dos rendimentos reais já no próximo ano. É que, afinal, as perspectivas são tudo menos fagueiras nessa frente. Frasquilho declara que as eleições parlamentares de 2006 podem ser disputadas num clima em que ainda se não farão sentir os efeitos da esperada retoma.
Ora, se for esse o caso, então pode bem repetir-se o recente exemplo francês, com um eleitorado fortemente castigado pelas reformas sociais restritivas em ambiente de depressão ou estagnação económica a punir severamente o governo. Mais do que o “efeito espanhol” de que falou J. Pacheco Pereira – em Espanha as questões económico-sociais favoreciam o governo –, o espectro que pode assolar doravante os espíritos da coligação governamental é claramente o “efeito francês”.
A ser assim, a sorte do Governo pode já não estar nas suas mãos. Por um lado, não pode recuar nas reformas encetadas (seria pior a emenda que o soneto), como se prepara para fazer o novo governo francês depois do "cartão amarelo" da pesada derrota nas eleições regionais; por outro lado, já não pode estar seguro de que a inversão do ciclo económico venha a tempo de o salvar do descontentamento social.

Vital Moreira