Durante anos desejei ser actor devido às cenas de choro. Sim, sou tão lamechas quanto isso. Nunca a "suspension of misbelief" funcionou tão bem comigo como nas cenas em que um actor/actriz, em grande plano, deixava rolar uma lágrima por todo o rosto. Emocionava-me a história, a comoção da personagem, o caminho que a lágrima escolhia entre nervos e pele e que nenhum realizador alguma vez poderia encenar.
Só há poucos anos me falaram dos truques dos actores: o colírio, o fumo do cigarro para os olhos se irritarem, não pestanejar durante muito tempo, uma técnica muscular facial qualquer que só uns raros dominam. E estragaram-me a vida. Prejudicaram-me a escuridão sagrada das salas de cinema. Interromperam-me a "suspension" para me pôr a pensar.
Desaparece assim a maior percentagem da convicção que dedicava a interromper a minha vida, com prazer, para me imaginar na pele da personagem comovida.
Como um ilusionista alcoolizado que, por estar fora de si, partilhasse connosco o segredo dos seus truques - destruiu-se a magia.
Resta-me apenas o caminho que as lágrimas inventadas para aquele momento continuam a percorrer de forma aleatória, a esperança de que existam actores ainda tão ingénuos quanto eu em relação aos truques supracitados, e uma cada vez menor percentagem de sonho. Uma bem menor vontade de vir algum dia a ser actor. E tenho pena. Consigo chorar.