Desde que, com 18 anos, comecei a minha vida em Lisboa, descobri um pormenor insólito nos dias de regresso à ilha Terceira, onde nasci. Deparo-me, volta e meia, com caras familiares que não deviam estar ali. Sem que nada o faça prever, súbito, encontro um amigo ao virar da esquina, descendo a rua principal de Angra do Heroísmo, a passear de carro, à saída de um restaurante.
Mas esse amigo não pode falar comigo. Não me conhece. Nunca me viu.
Porque quando regresso à ilha, invariavelmente, entre os amigos de antigamente descubro os rostos das pessoas queridas da minha vida nova. Sósias, apenas. Como se o Criador tivesse feito toda a humanidade a partir de um lote reduzido de moldes - e nos fossemos repetindo, com ligeiras variações.
Por isso creio que a Terceira é a ilha dos fantasmas. Bons fantasmas, hologramas efémeros de pessoas vivas, irradiações dos afectos. E faz todo o sentido que escolham o meio do Atlântico para aparecer - ou não se diz que aqui foi, outrora, a Atlântida?