Vale a pena ler o artigo «Watching Lebanon» de Seymour M. Hersh, na última edição da revista «THE NEW YORKER» (datada de 21 de Agosto). Procurarei resumi-lo:
O autor recorda a passividade da Administração Bush nos primeiros dias depois do rapto de dois soldados israelitas pelo Hezbollaah a 12 de Julho, que ofereceu a Israel ensejo para a brutal guerra de retaliação sobre o Líbano, sublinhando que, de facto, os EUA estavam desde há meses envolvidos no planeamento de um ataque de Israel contra o Líbano, considerado por Telavive como inevitável face aos sucessivos ataques provocatórios que o Hezbollah vinha lançando contra Israel. Não apenas porque, na perpectiva de Washington, arrasar o Hezbollah seria bom para a segurança de Israel e para reforçar o governo do Líbano, mas porque o Presidente Bush e o Vice-Presidente Dick Cheney estavam convencidos de que uma campanha de bombardeamento aéreo contra o complexo subterrâneo do Hezbollah serviria como ensaio para um ataque «pre-emptivo» americano contra as instalações nucleares iranianas, em boa parte também subterrâneas.
Já desde a primavera, segundo o articulista, que as Forças Aéreas americana e israelita começaram a desenvolver planos para um ataque demolidor contra as instalações nucleares iranianas. (Um ataque que muitos especialistas políticos e militares consideram uma loucura pelo elevado número de civis que vitimaria e pelas imprevisíveis e incontroláveis consequências - e foi justamente por designar tal cenário como de «nuts» que Jack Straw foi despedido por Tony Blair, por pressões da Administração Bush, revelou a imprensa britânica recentemente).
O plano israelita para o Líbano seria idêntico ao que os EUA planeiam para o Irão: intenso bombardeamento a partir do ar de instalações nucleares, incluindo infraestruturas civis. O Vice-Presidente Cheney e Elliott Abrams, Conselheiro-Adjunto da Segurança Nacional, seriam entusiastas desta dupla operação. E os EUA teriam dado a entender a Israel «se têm de atacar, estaremos convosco. Mas façam-no mais cedo: quando mais esperarem, menos tempo teremos nós para avaliar e planear para o Irão, antes de Bush sair da presidência».
Hersh cita Richard Armitage, que foi Secretário de Estado Adjunto no primeiro mandato de Bush, considerando que a campanha de Israel no Líbano, dadas as inesperadas dificuldades e criticismo geral que enfrentou, pode, no fim de contas, servir como aviso à Casa Branca sobre o Irão: «Se as mais poderosas forças militares na região - as israelitas - não conseguem pacificar um país como o Líbano, com uma população de 4 milhões, terá de se pensar cuidadosamente antes de aplicar a mesma receita ao Irão, que tem muito mais profundidade estratégica e uma população de 70 milhões». Sobre o Líbano, Armitage observou que «A única coisa que o bombardeamento alcançou até agora foi unir a população contra os israelitas».
Hersh cita um europeu : «Os israelitas foram apanhados numa armadilha. Há anos que acham que podem resolver os problemas sendo implacáveis. Mas agora, com o martírio islâmico, as coisas mudaram e eles precisam de respostas diferentes. Como amedrontar gente que anseia pelo martírio?». E cita também um perito irano-americano: «Se os EUA atacarem as instalações iranianas podem acabar por transformar Ahmadinejad noutro Nasrallah - em estrela rock da rua árabe».
Mas, sublinha Hersh, segundo fontes no Pentágono, a informação sobre o Hezbollah e o Irão está a ser manipulada pela Casa Branca como em 2002 e 2003, vendendo a mentira de que o Iraque tinha armas de destruição maciça. «A grande queixa agora na comunidade dos serviços de informação é que todo o material importante é enviado directamente para o topo, por insistência da Casa Branca, e sem ser analisado ou mal o sendo». «Isto é horrível e viola regras de segurança; mas se te queixas, estás despedido...»revela uma fonte. «Cheney é quem controla isto».
A resistência do Hezbollah e a sua capacidade de continuar a lançar «rockets» contra o norte de Israel apesar de estar sob bombardeamento constante, deveria ser considerada um sério revés para quem queira usar a força contra o Irão. E contra quem sustente que o bombardeamento do Irão criará dissensão interna e revolta. Mas fontes de Hersh próximas das chefias militares previram que a Administração faria uma avaliação muito mais positiva do que deveria da campanha israelita no Líbano: «Nem pensar que Rumsfeld e Cheney venham a tirar a conclusão certa do que se passou no Líbano». «Quando o fumo desaparecer, eles virão dizer que foi um sucesso, e vão retirar daí reforço para o plano de atacar o Irão».
Ontem, contra toda a evidência e a polémica instalada até em Israel, o próprio Presidente Bush, apesar dos esgares de desconforto, já veio proclamar a «derrota» do Hezbollah.