sexta-feira, 13 de junho de 2008

O referendo irlandês

A esta hora ainda não se sabe o resultado do referendo irlandês. Mas a anémica participação eleitoral parece dar vantagem aos eurocépticos. Se ganhar o NÃO, ninguém sabe muito bem o que vai acontecer: mas uma coisa é certa, os avanços que o Tratado de Lisboa prevê para a vida política de 500 milhões de cidadãos europeus não podem ser neutralizados - de um dia para o outro - por um referendo em que apenas 40% dos eleitores num país com 4.2 milhões de habitantes se dignaram a ir votar.
Em 2001 o eleitorado irlandês também começou por dizer NÃO ao Tratado de Nice. Em Junho desse ano 35% do eleitorado votou, dos quais 50% contra Nice e 46% a favor. E sem Nice não tinha havido alargamento da União em 2004... Mas em Outubro de 2002, em novo referendo, a participação eleitoral subiu para quase 50% e os eleitores mudaram completamente de ideias: 63% votaram SIM a Nice.
Não digo que se volte a repetir o referendo se ganhar o NÃO desta vez. Mas não se pode deixar um resultado negativo na Irlanda varrer as 18 ratificações do Tratado que já se registaram.

Uma pequena nota sobre a campanha do NÃO na Irlanda. O único partido com representação parlamentar a opor-se ao Tratado foi o Sinn Fein. Mas não lutou sozinho. Foi ajudado por... John Bolton, antigo Embaixador dos EUA nas Nações Unidas e Undersecretary of State para a Não-proliferação e Segurança Internacional de Bush nos anos decisivos entre 2001 e 2005. Em intervenções públicas na Irlanda, o neocon Bolton disse que não percebia "porque é que as pessoas deviam voluntariamente dar mais poder aos burocratas [em Bruxelas]". Mas a passagem mais reveladora é a seguinte: "temo que [o Tratado] enfraqueça a NATO. Porque, se a União Europeia tiver as suas próprias capacidades militares... as pessoas diriam que se os europeus podem tratar da sua própria defesa, já não precisam da NATO."
É claro que o Tratado de Lisboa não enfraquece a NATO, mas estas palavras são bem reveladoras: para gente da laia de Bolton, a NATO não serve para a verdadeira concertação transatlântica em questões de segurança - como a invasão do Iraque e o plano de instalar um sistema de defesa anti-míssil na Europa tão bem demonstraram - mas antes como baluarte contra quaisquer tentativas europeias de desenvolver os rudimentos de autonomia estratégica.

Com Sinn Fein e John Bolton juntos do lado do NÃO, esperemos que ganhe o SIM!