terça-feira, 12 de outubro de 2010

Eleição de Portugal para o Conselho de Segurança

Vibrei.
Por Portugal!
Pela auto-estima nacional, tão mais necessária em tempos de dura crise!
Pelos governos do PS, um que lançou e outro que retomou e levou por diante o projecto da candidatura.
Pela diplomacia portuguesa, que é tão boa como as melhores, quando lhe são dadas condições para trabalhar (não falo dos meios, que raramente teve nas ultimas décadas...).
Pelos meus muitos amigos e colegas que se empenharam nesta candidatura no MNE em Lisboa, nas embaixadas e missões pelo mundo fora e na Missão junto da ONU em Nova Iorque - e obviamente destaco o embaixador José Filipe Morais Cabral, á frente da equipa no terreno em Nova Iorque. Porque aí é que tudo verdadeiramente se decide, na base de relações pessoais - quantas Notas Verbais das chancelarias não valem os papéis onde estão escritas, quantas delegações não recebem instruções e quantas não as cumprem?
Vibrei e revivi a alegria que senti num dia de vitória idêntica, em Outubro de 1996, em Nova Iorque, quando fomos pela segunda vez eleitos para o CSNU.
E aí estremeci - lembrei-me da experiência profissionalmente exaltante, pessoalmente gratificante, mas politicamente muitas vezes frustrante que vivi nos dois anos seguintes, como membro da nossa Delegação ao Conselho de Segurança.
Pesou-me a carga da responsabilidade, da tremenda responsabilidade que vai recair sobre o nosso país e sobre quem terá de dar a cara por ele no CSNU, na procura de resolução para os conflitos mais sangrentos no mundo, no inevitavel alinhamento por uma ou outra parte do conflito (e alinha-se sempre, mesmo quando nos abstemos...).
Em 1996 ganhamos porque tinhamos um concorrente fraco (a Austrália tinha como embaixador em NY um arrogante e execrado Butler) e apareciamos como mais dialogantes e abertos que os rivais. Então, como hoje, também recebemos muitos votos de regimes muito pouco recomendáveis (sem eles não se ganha, é a realidade..). Mas não tinhamos prometido nada, não sugeriramos disponibilidade para fazer fretes a quem quer que fosse.
Então tínhamos uma causa que nos obrigava à defesa consequente dos principios da Carta das Nações Unidas, do Direito Internacional e dos Direitos Humanos em particular: Timor Leste. E é indubitável que o nosso papel no CSNU em 1997/98, a influência que aí ganháramos, nos ajudou a conseguir o que haviamos de querer e alcançar para Timor Leste em 1999: o referendo e a entrada da ONU (UNAMET) e, mais tarde, a da INTERFET e depois da UNTAET.
Em 2011/2012, Timor Leste felizmente já lá vai à sua vida, sem precisar de advogado na ONU.
O que nos vai agora obrigar a ser coerentes e consistentes na defesa da Carta das Nações Unidas, da Paz, do Direito Internacional, dos Direitos Humanos, quando tivermos de tomar posição diante de um conflito que envolva antagonismo entre países com quem mantenhamos relações políticas ou económicas significativas, quando tivermos de alinhar por uns ou por outros, como acontece todos os dias no CSNU?
É que o mais fácil é mandar principios e lei às urtigas (ainda por cima sem grande articulação europeia, no estado em que está a UE, que continua sem representação no CSNU apesar do Tratado de Lisboa). Não esqueçamos como em 2003 deixamos facilmente Durão Barroso desviar-nos do direito internacional, tornando Portugal anfitrião da Cimeira da guerra dita "preventiva" e alinhando-nos com a agressão ilegal ao Iraque.
A diplomacia conta - e a nossa, em geral, percebe a importância decisiva da lei e dos princípios, sobretudo para quem não é grande potência.
Mas o comando político é que determina.
E agora, sem a jangada de Timor Leste a chamar-nos à pedra e com a jangada de pedra europeia à deriva, o comando político da nossa diplomacia vai ser posto à prova todos os dias no CSNU, a partir de 1 de Janeiro de 2011.
Convém ficarmos atentos.