segunda-feira, 2 de outubro de 2017

Divórcio



1. É evidente que o intentado referendo catalão era inconstitucional e que foi convocado sem o mínimo respeito pelas mais elementares regras da democracia parlamentar, o que lhe retira legitimidade. É também óbvio que os líderes do separatismo catalão revelaram um intolerável sectarismo demagógico e provocatório das instituições, o que lhes retira capacidade de mobilização de simpatias externas.
Mas o facto de o Governo de Madrid ter precisado de recorrer à violência policial em larga escala para travar o desafio de Barcelona só vai provocar profundas feridas na relação entre o Estado e a Comunidade Autónoma, alienando ainda mais uma parte substancial dos catalães. A demonstração de "músculo" repressivo de Madrid só pode gerar mais independentistas "enragés".
O divórcio pretendido pelo Governo catalão não pode ser por mútuo consentimento nem oficialmente declarado de forma unilateral, mas não se vê como é que, depois da jornada de 1/10 e da clivagem que ela revelou, a coesão política de Espanha possa ser restabelecida. O separatismo catalão não tem solução pacífica no quadro do atual Estado espanhol. Muito provavelmente, a Espanha não vai voltar a ser a mesma.

2. Regresso a uma tese que várias vezes defendi ao longo dos anos. Numa comunidade política plurinacional sujeita a tensões centrífugas, como a Espanha, o melhor modo de manter a coesão do Estado e respeitar a pluralidade nacional não é o Estado unitário (mesmo com "comunidades autónomas") imposto pela força, mas sim o federalismo. A Bélgica e a Bósnia-Herzegovina são bons exemplos recentes.
Infelizmente, em Espanha, a solução federal, há muito defendida pelo PSOE, foi reiteradamente rejeitada pela direita do PP e pela cultura dominante do centralismo castelhano. Agora, tudo indica que já é tarde para uma solução federal. Mas ainda vale a pena tentar.