[Fonte: aqui]
1. O preceito do art. 183º do Código Penal, que manda punir com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa não inferior a 120 dias o crime de difamação cometido por meio da comunicação social, acaba de ser julgado incompatível com a CEDH pelo TEDH, no que se refere à punição com pena de prisão. Assim decorre de uma recente decisão do Tribunal, que considerou desproporcionada, e por isso lesiva da liberdade de imprensa, uma decisão judicial italiana que condenou a prisão um jornalista que acusara falsamente de aborto forçado várias pessoas (incluindo pais, ginecologista e um juiz de família), acrescentando que todos deveriam ser punidos com a pena de morte pelo alegado crime. Além da difamação, estava em causa também a invasão da privacidade da mulher em questão.
O Estado italiano acabou condenado a indemnizar o jornalista por causa da tal condenação judicial!
2. Discordo mais uma vez do TEDH, quando opta por uma proteção fundamentalista dos jornalistas, quando não está a defesa da liberdade de imprensa contra o poder político (em que a proteção deve ser máxima), mas sim em casos de difamação contra terceiros.
Tradicionalmente, o Tribunal tinha firmado jurisprudência no sentido de uma tendencial imunidade jornalística pela alegada difamação de políticos ou outras personalidades públicas. Nesta decisão, aliás com precedentes, vai mais longe, decretando que tais crimes não podem dar lugar a pena de prisão, mesmo que os difamados sejam pessoas comuns, falsamente acusadas de um crime infamante (um aborto forçado).
Isto quer dizer que, se o mesmo crime for cometido à volta da mesa de um café, pode ser punido com pena de prisão, mas que, se for cometido através da imprensa, portanto com muito maior impacto e mais intensa lesão da honra dos lesados, só pode ser punido com pena de multa. Não faz sentido este privilégio!
3. A liberdade de imprensa protege tanto a liberdade de opinião como a liberdade de informação, mas esta não inclui a liberdade de divulgar, salvo de boa fé, factos falsos lesivos da honra de terceiros. Além disso, como todas as liberdades, a liberdade de imprensa, mesmo quando protegida, pode ter de ser objeto de compressão quando conflitue com outros direitos ou liberdades fundamentais de terceiros.
A radical proteção da liberdade de imprensa traduz-se na óbvia desproteção das vítimas do seu abuso.