quinta-feira, 26 de maio de 2022

Eleições (5): Adicionar a representação do território?

1. Nesta conferência sobre reforma do sistema eleitoral foi apresentado um estudo para a hipótese de, seguindo o exemplo norueguês, repartir o número de deputados pelos círculos eleitorais, tendo em conta não somente o número de eleitores, como hoje sucede, mas também a respetiva dimensão territorial -, o que permitiria beneficiar os círculos de baixa densidade populacional, como, por exemplo, Beja e Bragança, à custa dos de maior densidade, como Lisboa e Porto.

Por mais generosa que a ideia pareça, entendo que ela não tem pés para andar entre nós. 

2. São as seguintes as principais objeções:

   - a teoria do "governo representativo" e do parlamento nasceu para representar os cidadãos e não os territórios, como sucedia nas Cortes do Antigo regime;

   -  a CRP define a AR como "assembleia representativa de todos os cidadãos portgueses», não falando em territórios;

   - um dos princípios essenciais das eleições democráticas é o da igualdade de voto, o que seria contrariado ao dar-se aos cidadãos daqueles círculos o direito de eleger mais deputados do que os que lhes cabem em função do número de eleitores;

   - a CRP é explícita ao determinar que a repartição dos deputados pelos círculos eleitorais é feita exclusivamente em função do número de eleitores;

  - se se quer dar representação política própria aos territórios, a solução clássica é a instituição de uma segunda câmara no parlamento para esse efeito, como sucede nos Estados federais e em vários Estados unitários.

Em conclusão, uma tal solução iria contra os princípios da democracia representativa.

Adenda
A idea de "discriminação positiva" dos círculos eleitorais do interior foi há algum tempo avançada pelo então líder do PSD, Rui Rio, mas não se chegou a conhecer a sua formulação concreta. Todavia, parece que ela assentava em dar à partida dois deputados a cada círculo e repartir os demais proporcionalmente ao número de eleitores, como sucede em Espanha. Mas também esta ideia carece de cabimento constitucional.

Adenda 2
Uma pequena reforma que poderia melhorar a distribuição territorial dos deputados, embora marginalmente, consistiria em abandonar o método de Hondt na repartição dos deputados pelos círculos eleitorais, que a Constituição não impõe e que favorece os grandes círculos, substituindo-o por outro método mais amigo dos pequenos circulos.