1. Em Coimbra, como mostram as imagens (pirateadas do FB de Rui Pato), um grupo privado de saúde lançou uma campanha publicitária (outdoors) com o retrato das suas "estrelas" médicas e o slogan "Eu estou aqui!" (ou seja, na tal instituição).
Nada a objetar, obviamente, à publicidade comercial no mercado de saúde privado, se não fosse, porém, o caso de alguns dos protagonistas nesta campanha de imagem serem conhecidos diretores de serviços nos Hospitais da UC, ou seja, do SNS, ao qual devem a sua formação e o seu prestígio profissional, estando, portanto, a utilizar o seu cargo público para publicitar a sua empresa privada concorrente.
Trata-se, antes de mais, de uma operação de baixa concorrência desleal, que nenhuma companhia privada admitiria. Parece óbvio que nenhum deles o poderia fazer, sob pena de despedimento com justa causa, se se tratasse de acumulação entre dois grupos privados. Porque é que é diferente, quando se trata de acumulação com o serviço público?
2. Há muito que defendo que há um manifesto conflito de interesses na acumulação de cargos de direção de serviços públicos e em instituições privadas concorrentes, especialmente no SNS e sobretudo na mesma cidade (facilitando a fagocitação de utentes e a parasitação de recursos públicos em benefício dos privados), e que tal acumulação não deveria ser permitida, a troco de uma adequada remuneração adicional pela exclusividade.
Em qualquer caso, acrescentar à controversa acumulação de cargos de direção a publicidade do emprego privado, prevalecendo-se do renome alcançado no público, constitui uma escandalosa falta de pudor profissional em termos de ética do serviço público, que integra o núcleo duro da ética republicana (que não vale somente para os políticos).
Tenho, aliás, defendido que os funcionários públicos em geral deveriam subscrever, na tomada de posse, uma declaração de princípios de ética do serviço público (integridade, zelo profissional, assiduidade, defesa do património público, serviço aos utentes, etc.) e de fidelidade ao serviço público.
Não deixa de ser estranho que nem o SNS nem a Ordem dos Médicos tenham até agora reagido à insólita situação em Coimbra.