1. É lamentável ver um ex-ministro e vários deputados socialistas a juntarem-se a deputados do Bloco e do PCP para, contrariando a recente recomendação da OCDE, reivindicarem, mais uma vez, a abolição das propinas no ensino superior público, que, aliás, têm um valor hoje muito baixo, depois das reduções no tempo da "Geringonça".
A abolição das propinas seria, antes de mais, uma solução socialmente injusta. Por um lado, embora o ensino superior tenha uma "externalidade" pública positiva - o aumento do nível tecnológico do País, que deve ser paga pela coletividade -, a sua frequência é acima de tudo um investimento pessoal num melhor futuro profissional, devendo, portanto, ser maioritariamente pago pelos seus beneficiários, de acordo com o princípio beneficiário-pagador. Por outro lado, estando longe de ser de acesso universal - dada a grande percentagem dos que o não frequentam -, não é aceitável que o ensino superior público seja pago por todos, incluindo por aqueles que não chegam lá ou que têm de frequentar o ensino superior privado, por falta de vagas nas escolas públicas.
Tal como, por exemplo, as antigas autoestradas SCUT, o ensino superior gratuito é o contrário do socialismo: é fazer pagar por toda a coletividade o privilégio de uma parte dela.
2. Política de esquerda no ensino superior é, por um lado, aumentar a oferta pública e a sua qualidade, para reduzir a dependência dos estudantes menos abastados em relação ao ensino privado, obviamente dispendioso e, por um lado, multiplicar as bolsas de estudo e o apoio ao alojamento estudantil para os estudantes oriundos de meios economicamente mais carenciados, atenuando as desigualdades sociais.
Ora, além de reduzir a autonomia financeira das universidades, a abolição das propinas só iria diminuir os recursos públicos para aqueles dois objetivos, tornando o ensino superior público refém da dificuldades orçamentais do Estado, agravando o crónico subfinanciamento do ensino superior público e frustrando uma aposta mais determinada na promoção da igualdade de oportunidades.
Os resultados da benesse do ensino superior gratuito não seriam propriamente socialistas, no sentido nobre da palavra. Pelo contrário!