sexta-feira, 8 de dezembro de 2023

Alma mater (3): Uma afronta gratuita

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1. Sendo uma universidade pública, e por isso obrigada a respeitar o princípio constitucional da separação entre o Estado e a religião - que obviamente proíbe as instituições públicas de praticar ou apoiar atos religiosos -, a Universidade de Coimbra persiste, porém, em afrontá-lo todos os anos, ao organizar oficialmente duas missas, uma pela "padroeira", em 8 de dezembro, e outra pela dia solene da Universidade, a 22 de fevereiro.

Ora, tal como o Estado, a UC só pode ser neutra em matéria religiosa, não podendo adotar nem privilegiar qualquer religião.

2. Além de um inaceitável abuso de poder, estes atos religiosos oficiais associam indevidamente toda a comunidade académica a essa reiterada violação da neutralidade religiosa do Estado, afrontando não somente os professores, investigadores, funcionários e estudantes que não são crentes católicos, mas também todos aqueles que, independentemente da sua crença, ou falta dela, não querem ver a sua universidade identificada com nenhuma religião.

A poucos anos do cinquentenário do 25 de Abril de 1974 e da Constituição de 1976, que restaurou o princípio republicano da laicidade do Estado - que o "Estado Novo" reduzira a nada -, é inadmíssivel que a UC continue a colocar-se ostensivamente à margem da Constituição da República.

Adenda
Neste meu prefácio a um recente livro sobre o tema, onde o caso da UC é obviamente referido, enuncio as principais implicações da separação constitucional entre o Estado e a religião.

Adenda 2
Um amigo, a quem remeti este post, com um amargo comentário de que «qualquer dia, anuncio publicamente a minha renúncia à condição de antigo estudante e de professor jubilado da UC», respondeu-me assim: «Não pode fazê-lo; o seu Reitor, em vez de ficar incomodado, rejubilaria ver-se livre de si; é como antigo estudante e como professor jubilado que o seu combate por uma UC laica conta mais.» Tem razão!