sábado, 14 de dezembro de 2024

Sim, mas...(14): Contrariar a "endogamia académica"

1. Julgo ser de apoiar o propósito governamental de combater a "endogamia académica", ou seja, o facto de as faculdades tenderem a recrutar exclusivamente os seus doutorados para as suas carreiras docentes, fenómeno expressivo entre nós (como mostra um recente relatório oficial) e que em algumas faculdades - entre as quais a minha alma mater, a FDUC - atinge o limite, não havendo professores que tenham obtido o doutoramento fora delas. 

De facto, é fácil ver que, além de cancelar a mobilidade académica, a reserva de recrutamento de docentes ou investigadores "dentro de casa" corre o risco de enquistamento corporativo e de fechamento a novas correntes teóricas e pedagógicas vindas de fora, incluindo do estrangeiro.

2. Duvido, porém, que a proibição de recrutamento dos próprios doutorados durante três anos seja a melhor solução: por um lado, pode ser excessiva, por privar as escolas de aproveitarem os seus melhores doutorados, logo enquanto professores (ou investigadores) auxiliares; por outro lado, pode ser insuficiente, por permitir a continuação da "reserva de escola" nos concursos subsequentes (professor associado e catedrático ou investigador principal e cordenador), ou seja, no resto da carreira.

Por isso, talvez a melhor solução esteja em alterar as regras de concurso e de formação dos júris, de modo a contrariar a preferência dominante pelos candidatos de dentro da escola, que inibe à partida a candidatura de concorrentes externos, tornando a carreira mais competitiva e permitindo às melhores escolas recrutar os melhores docentes e investigadores. 

Adenda
Um leitor (por sinal, professor numa faculdade com elevado nível de inbreeding) objeta que a mobilidade forçada pode prejudicar um valor importante, que é a «diferenciação de identidade académica própria das escolas, como sucede no campo do ensino do Direito entre a "escola de Coimbra" e a "escola de Lisboa"». Compreendo o argumento, mas não vejo que a entrada de alguns  professores de elevada qualidade doutorados em outras universidades possa pôr em sério risco essa identidade. O mais provável, pelo contrário, é que, tratando-se de uma forte e prestigiada identidade de escola, os professores vindos de fora tendam a integrar-se nesse espírito