domingo, 9 de fevereiro de 2025

Eleições presidenciais 2026 (8): Um privilégio inconstitucional

1. No anúncio da sua candidatura às eleições presidenciais, Marques Mendes informou ter entregado ao PSD o seu cartão de filiado, no entendimento de que o cargo presidencial é independente dos partidos, e como um compromissso, se for eleito, de uma «magistratura de isenção, independência e imparcialidade».

Concordo inteiramente com a decisão e com esse entendimento, sendo essa mesmo a primeira obrigação dos interessados, no meu catálogo de obrigações dos candidatos presidenciais, que explanei AQUI.

2. Todavia, entendo que isso não basta, e que os candidatos de origem partidária devem também prescindir da organização e financiamento das suas campanhas eleitorais pelos partidos que os apoiam. De facto, a lei eleitoral estabelece que a campanha eleitoral pode ser organizada pelos próprios candidatos e seus proponentes, mas também pelos partidos que apoiem a sua candidatura, e a lei do financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais admite o financiamento partidário.

Ora, como já escrevi há alguns anos num texto académico (AQUI), considero que essa possibilidade não é conforme com a Constituição, não somente por ser incompatível com a referida separação entre eleições presidenciais e partidos políticos, mas também por violação do princípio da igualdade entre as candidaturas, conferindo aos candidatos que usufruam da organização e do financiamento das suas campanhas pelos seus partidos uma enorme, e iníqua, vantagem sobre os demais.  

3. Parece-me evidente que uma coisa é o apoio político externo dos partidos, outra coisa é o apoio logístico e material na própria campanha eleitoral, apropriando-se dos candidatos.

Não tenho dúvidas: se fosse o candidato Gouveia e Melo, não hesitaria em impugnar as candidaturas que beneficiassem desse privilégio... 

Adenda
Um leitor objeta que «todos os candidatos, mesmo os que não têm origem partidária, podem vir a obter apoio de um ou mais partidos, incluindo na organização e financiamento da sua campanha», pelo que não vê onde está a discriminação. Discordo, em absoluto: 1º - mesmo quando não tenham origem partidária, os candidatos têm todo o direito de rejeitar o apoio de partidos, para assim assegurar a sua independência;  2º - os diferentes partidos não têm as mesmas capacidades logísticas e fianceiras; 3º - sobretudo, a organização e o financiamento partidário da campanha eleitoral traduz-se necessariamente na "captura" partidária da candidatura e na criação de uma dívida do candidato perante o(s) partido(s) financiadores, que depois vai ser cobrada a Belém, se ele for eleito.

Adenda 2
Um leitor aplaude esta minha «descoberta (...), que vai livrar o país da invasão de praças e rotundas por uma chusma de cartazes e de paineis de propaganda eleitoral». Assim espero!