segunda-feira, 2 de outubro de 2006

Correio dos leitores: Ordens profissionais

«"[a figura do Provedor de Arquitectura]...tornada obrigatória por lei"
Acho muito bem que seja obrigatória por lei, mas somente se esse Provedor estiver na dependência direta e unicamente do Estado. As Ordens atualmente existentes devem ser destituídas das suas competências legais; não se deve dar-lhes ainda mais competências públicas do que as que atualmente têm - indevidamente. As Ordens, como figuras dotadas de poderes públicos, são resquícios do corporativismo salazarista, que urge eliminar - no sentido de as tornar simples associações privadas de profissionais.
Instituir por lei um Provedor de Arquitetura dependente da Ordem dos Arquitetos é um erro. As funções públicas só podem estar sob a autoridade do Estado. Não sob a autoridade de Ordens.»

Luís Lavoura

Comentário
Independentemente da opinião que possamos ter sobre as ordens como organismos oficias de auto-regulação profissional -- e a minha é bem crítica, como bem se sabe... --, a verdade é que elas existem e não consta que vão desaparecer. Por isso, a criação de uma provedor dos utentes é uma clara vantagem, podendo atenuar a desprotecção daqueles perante os abusos ou erros profissionais.
Por outro lado, as ordens profissionais não são o único caso de exercício de poderes públicos por entidades exteriores ao Estado -- longe disso. A questão não está propriamente aí...

Mais um muro

O Congresso dos Estados Unidos aprovou a construção de um muro na fronteira com o México, na extensão de 1200 Km, para impedir a imigração clandestina. Se pudesse, provavelmente também a Europa edificaria um muro no Mediterrâneo e à volta das Canárias para conter a imigração do Magreb.
Um dia, os países desenvolvidos descobrirão que estão a enclausurar-se a si mesmos...

domingo, 1 de outubro de 2006

Mais um pouco de seriedade política, pf

Será que o Presidente do PSD não sabe a distinção entre impostos, por um lado, e as taxas e contribuições que (como as da segurança social) são destinadas a custear benefícios específicos e pessoais de quem as paga? Se, por hipótese, o Governo decidisse aumentar as propinas do ensino superior, isso também seria um aumento de "impostos"?
Dito isto, é fácil ver que o Governo bem poderia ter escapado a esta crítica demagógica, tornando a ADSE facultativa, de modo a pagar e beneficiar apenas quem quer.

Regresso

João Vasconcelos Costa voltou à blogosfera. Ainda bem!

sábado, 30 de setembro de 2006

Boa ideia

A Ordem dos Arquitectos criou a figura do Provedor da Arquitectura, para permitir aos cidadãos fazer queixas em matéria de arquitectura, incluindo contra os arquitectos, tendo poder de iniciativa disciplinar, entre outros.
É uma ideia merecedora de aplauso. Deveria ser adoptada por outras ordens, e, inclusive, tornada obrigatória por lei.

Laicidade

Os Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC) vão homenagear o seu "padroeiro", S. Jerónimo, incluindo uma missa nas respectivas cerimónias. Nada haveria a observar, se tal cerimónia religiosa fosse promovida e organizada por uma associação ou comissão do pessoal católico do estabelecimento. Mas como iniciativa e responsabilidade oficial do próprio hospital, trata-se de uma clara violação do princípio da laicidade do Estado.
Os serviços públicos não têm religião nem podem promover cerimónias religiosas.

Correio dos leitores: ADSE

«"Em vez de extinguir a ADSE, como se impunha (...)"
Não necessariamente.
O que se impõe é dar às pessoas - funcionários públicos ou não - o direito de terem um sistema de saúde mais ou menos abrangente -, desde que paguem os respetivos custos.
No mínimo, deveria ser dado aos funcionários públicos o direito de não terem a cobertura da ADSE - e, então, de deixarem de pagar a respetiva taxa.
Não percebo porque é que o Estado obriga os funcionários públicos a terem um sistema de saúde mais abrangente do que os demais, e a pagarem uma taxa correspondente. Os funcionários deveriam ser lives de dispensarem a ADSE, e ficarem apenas com o SNS geral.(...)»

Luís Lavoura

sexta-feira, 29 de setembro de 2006

Ainda a ADSE

«O ministro das Finanças defendeu hoje que é injusto serem todos os portugueses a pagar o sistema de saúde especial dos funcionários públicos (ADSE), que em 2005 registou um défice de 763 milhões de euros. "Têm que ser os utentes deste sistema a contribuírem para a sua viabilidade", disse Fernando Teixeira dos Santos».
O Ministro em toda a razão, como aqui já se explicou. Há quem esteja habituado a serem os outros a pagar as suas regalias próprias. Só há mais duas coisas: (i) não sendo extinta (como defendo),a ADSE deveria ser facultativa, não fazendo sentido (mesmo em termos constitucionais...) que uma pessoa seja obrigada a subscrever um sistema complementar de cuidados de saúde, para além do SNS; (ii) a ADSE deveria estar aberta a todo o pessoal do sector público administrativo, incluindo os trabalhadores com contrato de trabalho, e não somente aos funcionários, pois não se justifica (mesmo em termos constitucionais...) tal discriminação.

Mais eucaliptos

A Serra de Ossa, no interior alentejano (na imagem: o encantador Convento de S. Paulo, hoje transformado em hotel) constitui o exemplo mais evidente do crime ambiental e paisagístico que é eucaliptização extensiva, ao serviço das celuloses. O fogo devastou a serra no Verão passado (cinco mil hectares ardidos), incluindo as plantações industriais de eucaliptos.
O Público de hoje informa que há um plano oficial para a recuperação florestal da Serra. Infelizmente, aposto que no final terá ainda mais eucaliptos. Com apoio oficial...

Um pouco mais de seriedade, pf

Lê-se no Diário de Notícias de hoje:
«O Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado (STE) diz-se "siderado" com a proposta do Governo [e aumentar a taxa para a ADSE], que constitui "uma forma de discriminação em relação aos restantes cidadãos, já que estes pagam 11% e os funcionários públicos passarão a pagar 11,5%".»
Trata-se, porém, de uma pura e grosseira tentativa de mistificação. Os trabalhadores do regime geral descontam 11% só para a segurança social, enquanto os funcionários públicos gozam dos mesmos benefícios (até mais favoráveis), descontando somente 10% para a CGA. Portanto, quem é privilegiado são os funcionários. Além disso, é certo, eles descontam a taxa para a ADSE --, mas para beneficarem de regalias especiais nos cuidados de saúde, de que os demais trabalhadores não gozam e que custam ao orçamento muito mais do que o valor do desconto.
Duplo privilégio, portanto! Quando é que certos sindicatos resolvem ser sérios e responsáveis?

Remendos

Pelos vistos, o Governo está a perder vigor reformista. Em vez de extinguir a ADSE -- o regime de saúde privativo dos funcionários públicos --, como se impunha, limita-se a elevar a taxa a cargo dos beneficiários, para atenuar os encargos orçamentais que tal regalia envolve. Remendos...

quinta-feira, 28 de setembro de 2006

DARFUR - o que se espera mais para agir?

"O governo de Omar Bashir é o principal responsável pela estratégia genocida contra a população de Darfur. A União Europeia não pode continuar a iludir-se sobre isso. A Comissão, o Conselho e os membros europeus do Conselho de Segurança das Nações Unidas têm de confrontar, de imediato, o Sudão com uma missão militar da ONU na região do Darfur sob o mandato robusto nos termos do capítulo VII da Carta. Não podem tolerar mais desculpas e adiamentos.
Os governantes do Sudão têm de ser punidos se insistirem em travar a acção da comunidade internacional no Darfur. É urgente determinar já o congelamento de contas bancárias e impedir as viagens internacionais de governantes sudaneses e outros indivíduos já identificados pelo Tribunal Penal Internacional como principais responsáveis das atrocidades.
Se a China e a Rússia continuarem a arrastar os pés relativamente a um embargo contra Cartum, a União Europeia deve juntar-se aos Estados Unidos e declarar o embargo comercial, em especial sobre armas e petróleo, e um congelamento total das transacções financeiras do governo sudanês.
São precisas também medidas militares urgentes. Uma no fly zone sobre Darfur pode ser operada a partir do Leste do Chade para impedir os voos da força aérea sudanesa que atacam a população de Darfur - como eu e outras deputadas verificámos em Setembro de 2004, perto de El Fashir.
É preciso enviar já uma força multinacional para o Leste do Chade para proteger os refugiados, para preparar a própria força da ONU no Darfur, para controlar a fronteira entre o Chade e o Sudão e para restabelecer alguma estabilidade regional.
Estabilidade regional que, de resto, está também ameaçada com a escalada na Somália em virtude da intervenção etíope instigada pela administração Bush, com o desastroso resultado de reforçar os tribunais islâmicos em Mogadíscio.
Finalmente, a União Europeia não pode continuar silenciosa sobre o papel da China, da Rússia e da Liga Árabe no apoio à estratégia genocida de Cartum. Depois de ter sido consagrado na ONU o princípio da responsabilidade de proteger, Moscovo, Pequim e as capitais árabes cobrem-se de vergonha ao procurarem fazer esquecer as lições do Ruanda, da Bósnia e do Congo no Darfur contra uma população muçulmana que está a ser massacrada por muçulmanos."

Intervenção minha, ontem, no Plenário do Parlamento Europeu

Carta de agentes da CIA, FBI, Dep.Defesa e Dep. Estado sobre uso de Tortura

Letter From Intelligence and Military Professionals on Use of Torture
Tuesday 26 September 2006

United States Senate
Committee on the Judiciary
224 Dirksen Senate Office Building
Washington, DC 20510

The Honorable Arlen Specter, Chairman
The Honorable Patrick J. Leahy, Ranking Democratic Member

Dear Senators:

We write as experienced intelligence and military officers who have served in the frontlines in waging war against communism and Islamic extremism. We fully support the need for proactive operations to identify and disrupt those individuals and organizations who wish to harm our country or its people. We also recognize that intelligence operations, unlike law enforcement initiatives, enjoy more flexibility and less scrutiny, but at the same time must continue to be guided by applicable US law.

We are very concerned that the proposals now before the Congress, concerning how to handle detainees suspected of terrorist activities, run the risk of squandering the greatest resource our country enjoys in fighting the dictators and extremists who want to destroy us?our commitment as a nation to the rule of law and the protection of divinely granted human rights.

Apart from the moral considerations, we believe it is important that the Congress send a clear message that torture is not an effective or useful tactic. As noted recently by the head of Army Intelligence, Lt. Gen. John Kimmons:

No good intelligence is going to come from abusive practices. I think history tells us that. I think the empirical evidence of the last five years, hard years, tells us that.
Our nation was created in response to the abuses visited on our ancestors by the King of England, who claimed the right to enter their homes, to levy taxes at whim, and to jail those perceived as a threat without allowing them to be confronted by their accusers. Now, 230 years later, we find our own President claiming the right to put people in detention centers without legal recourse and to employ interrogation methods that, by any reasonable legal standard, are categorized as torture.

We ask that the Senate lead the way in upholding the principles set forth in the Declaration of Independence and affirmed in the Geneva Conventions regarding the rights of individuals and the obligations of governing authorities towards those in their power. We believe it is important to combat the hatred and vitriol espoused by Islamic extremists, but not at the expense of being viewed as a nation who justifies or excuses torture and incarceration without recourse to a judicial procedure.

The US has been in the forefront of the human rights campaign throughout the 20th century, led by Theodore Roosevelt and Woodrow Wilson. The end of World War II and the horrors of the Holocaust inspired the United States to take the lead in making the case that human rights were universal, not parochial. Until recently the policy of our country was that all people, not just citizens of the United States, were entitled to these protections. It is important that the world understand that we remain committed to these principles. In fighting our enemies we must wage this battle in harmony with the traditional values of our society that were enshrined in the opening clause of the Declaration of Independence, "We hold these truths to be self-evident...."

Respectfully yours,

CIA Officers:
Milton Bearden, Directorate of Operations
Ray Close, Directorate of Operations
Vincent Cannistraro, Directorate of Operations
Philip Giraldi, Directorate of Operations
James Marcinkowski, Directorate of Operations
Melissa Mahle, Directorate of Operations
Paul Pillar, Directorate of Intelligence
David MacMichael, Directorate of Intelligence
Melvin Goodman, Directorate of Intelligence
Ray McGovern, Directorate of Intelligence
Mary O. McCarthy, DCI professional staff

US Military and Department of Defense:
W. Patrick Lang, (Colonel, US Army retired, Director Defense Humint Services, retired)
A. D. Ackels, (Colonel, US Army, retired)
Karen Kwiatkowski, (Lt. Colonel, USAF, retired)

US Department of State:
Thomas R. Maertens, Deputy Coordinator, Office of Counter Terrorism, US Department of State
Larry C Johnson, Office of Counter Terrorism, US Department of State

Federal Bureau of Investigation:
Christopher Whitcomb, Hostage Rescue Team

quarta-feira, 27 de setembro de 2006

Impeach Bush and Cheney!

e já agora... divirtam-se.

Ah ganda Clinton!

Corram a ver!

Afinal, os acusadores são os responsáveis

Ao contrário dos apóstolos que pregam a superioridade da iniciativa e da gestão privada e que consideram o Estado radicalmente incompetente para gerir empresas e serviços públicos (saúde, educação, etc.), as análises de instituições internacionais credenciadas lá vêm revelar que um dos problemas da economia nacional está na incompetência dos empresários e gestores privados.
Uma semana depois do conclave do Beato do "Compromisso Portugal", que reuniu a fina flor dos empresários e gestores privados e declarou guerra ao Estado e à gestão pública, os seus "gurus" e protagonistas bem podem "limpar as mãos à parede"...

terça-feira, 26 de setembro de 2006

Bom senso

Tenho manifestado várias vezes as minhas objecções à privatização das empresas públicas gestoras de infra-estruturas. Por três razões: (i) pela importância das mesmas infra-estruturas para a segurança económica nacional e para o próprio funcionamento regular da concorrência no respectivo sector; (ii) porque se trata de "monopólios naturais", por definição fora do mercado e da concorrência; (iii) por respeito pela garantia constitucional do sector público.
Por isso, considero sensata a decisão do Governo de, embora privatizando parte do capital da REN (Rede Energética Nacional) -- que é a gestora das redes de transporte da electricidade e do gás natural -- manter o controlo público da empresa. Do mal, o menos...

segunda-feira, 25 de setembro de 2006

Troca de papéis

Lendo o manifesto eleitoral do Conselheiro Noronha do Nascimento (candidato a Presidente do STJ), recheado de reivindicações de natureza económico-profissional, ocorre perguntar se o autor se esqueceu de que desta vez não é candidato a presidente do sindicato dos juízes...

Macrocefalia

Com a recente integração do ISCTE no Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), este órgão de coordenação das universidades públicas -- a que se soma a Universidade Católica, não se sabe porquê... -- passou a ter nada menos do que seis instituições sedeadas em Lisboa (ou seja, mais de um terço do total do país, incluido as dos Açores e da Madeira), o que mostra bem o grau de concentração do ensino universitário na capital.
Em contrapartida, três dos distritos adjacentes a Lisboa (Leiria, Santarém e Setúbel) não têm nenhuma universidade pública, não fossem retirar o mercado a Lisboa...

Santa concorrência!

Para a preparação do meu artigo de amanhã no Público fui ler os documentos do "Compromisso Portugal". No texto-base encontrei esta pérola (entre muitas outras):
«Uma sã e equilibrada concorrência nos vários mercados e actividades (...) não permite a concentração excessiva de riqueza em poucas mãos, limitando o desequilíbrio entre os mais ricos e os mais pobres».
Já se sabia que a concorrência é um mecanismo essencial da eficência económica numa economia de mercado. Ficamos agora a saber que também tem efeitos virtuosos sobre a igualdade social. Deve ser por isso que a desigualdade de riqueza é tão pequena nos Estados Unidos!

sexta-feira, 22 de setembro de 2006

Combater o terrorismo

Como é que se pode pensar que se combate o terrorismo descendo a métodos abjectos, a métodos usados pelos próprios terroristas?
Como é que se não vê que se fica com a legitimidade moral e política estilhaçada pelo recurso a métodos absolutamente ilegais e moralmente indefensáveis?
Como é que vão ser credíveis quaisquer julgamentos de suspeitos de terrorismo que tenham estado anos "desaparecidos" nas cadeias secretas do Sr. Bush?
Como é que vão ser justas quaisquer condenações de suspeitos de terrorismo na base de confissões extraídas sob tortura e na base de provas ou testemunhos que ninguém pode conhecer?
Nós queremos, exigimos, julgamentos e punições exemplares para os suspeitos de terrorismo. Mas isso significa que em tribunal se prova, sem sombra de dúvida, que são terroristas ou cúmplices de terroristas. Significa que a justiça tem de ser vista como fazendo Justiça.
A Administração Bush desde há cinco anos prendeu milhares de pessoas suspeitas de terrorismo, incluindo alguns suspeitos de implicação no 11 de Setembro de 2001. Muitas poderão ter sido mortas. Só uma foi levada a julgamento - Zacarias Moussaoui, que nada tinha a ver com o 11/9.
Em contrapartida, em Espanha os suspeitos do 11 de Março de 2004 vão em breve começar a ser julgados. E o facto de estarem detidos, com todas as garantias de processo legal, não vai minimamente impedir que se faça justiça. Antes pelo contrário: essas garantias de legalidade são condição essencial para que se veja que se faz Justiça.
A Administração Bush tem ainda neste momento centenas de suspeitos de terrorismo em várias prisões, 450 só em Guantanamo.
Já libertou várias, que estiveram "desaparecidas" durante anos nessas prisões secretas e foram interrogadas e brutalmente torturadas pela CIA e serviços estrangeiros congéneres (líbios, sirios, egipcios, marroquinos e outros igualmente "idóneos") ; mas afinal, nenhuma acusação se confirmou. Muitas dessas vítimas da CIA são as principais fontes da Comissão de Inquérito do PE sobre as prisões e voos da CIA (outras fontes são... agentes da CIA).
O cristão-renascido Bush está sempre a falar do mal. Mas, na verdade, a sua Administração ainda não fez o mal todo. À nossa civilização ocidental e ao que a Humanidade inteira aprendeu e construiu desde a II Guerra Mundial.
O pior é o que está para vir: os julgamentos em tribunais militares que a Administração Bush prepara poderão abalar o que resta em matéria de respeito pelo direito internacional e direitos humanos. O que resta de Justiça. O que resta de decência. O que resta de humanidade.

CIA recusou operar prisões secretas

Há dias escrevi aqui que a verdadeira razão por que George Bush tinha admitido a existência das prisões secretas da CIA era a pressão ... da própria CIA (vide post «prisões secretas da CIA II - julgamentos-farsa» de 16/9)
Ontem o "Financial Times" revelava mais: os agentes da CIA recusavam mesmo continuar a operar as prisões secretas (http://www.ft.com/cms/s/57e68ed8-48da-11db-a996-0000779e2340.html)e continuar a interrogar os suspeitos.
Tudo por receio de serem criminalmente responsabilizados pela tortura e tratamentos degradantes infligidos, em resultado da decisão do Supremo Tribunal Federal de Junho que considerou tais práticas e a detenção secreta dos suspeitos como violação da Convenção de Genebra sobre prisioneiros de guerra (e logo violação do direito americano e do direito internacional).
O FT cita John Negroponte, director da CIA:"... there's been precious little activity of that kind for a number of months now, and certainly since the Supreme Court decision." ("tem havido muito pouca actividade dessa desde há alguns meses, e por certo desde a decisão do Supremo Tribunal")
E John Bellinger, conselheiro jurídico do Departamento de Estado, é citado afirmando que tem havido "very little operational activity" (muito pouca actividade operacional) de interrogatório da CIA desde a aprovação Dezembro passado de uma lei proposta pelo Senador John McCain proibindo a tortura e o tratamento desumano dos prisioneiros.
Ambas declarações só resultam em confirmar que até há esses poucos meses aquela "actividade operacional" da CIA ia vendo em popa: isto é, o sequestro, o desaparecimento forçado, o cárcere privado, a tortura, os interrogatórios com tratamentos humilhantes e degradantes....
Tudo métodos dignos da mais abjecta ditadura, da Argentina de Videla, do Chile de Pinochet. Do Gulag soviético às prisões secretas de Suharto, passando pelas salas de tortura da PIDE.

quinta-feira, 21 de setembro de 2006

Precipitações

Em Portugal, Cabo Verde, Timor Leste estreleja-se pela indigitação do ex-Presidente de Cabo Verde, Dr. Mascarenhas Monteiro, para Representante Especial do Secretário Geral do ONU em Timor Leste, em substituição do japonês Hasegawa.
Já chovem felicitações sobre o indigitado!
Mas atenção! Em matéria de nomeações internacionais - e não só - convem nunca deitar foguetes antes da festa...

Desatino

Pelos vistos, o meu artigo sobre as finanças das regiões autónomas causou forte abalo na Madeira, como se pode ver nestas desatinadas diatribes do próprio A. J. Jardim e de um seu apaniguado, na folha oficiosa do governo madeirense. O estilo das duas peças é o habitual: nem um facto desmentido, nem um argumento contrariado. Apenas as costumeiras proclamações anticontinentais, a habitual falsificação das opiniões alheias e o usual insulto pessoal.
Que gente desta me ataque, deixa-me indiferente (para não dizer satisfeito). Mas é pena que prosas deste jaez (incluindo a ostensiva ameaça separatista de Jardim) não sejam conhecidas no resto do País.

Os "cubanos" que paguem a crise!

Está já disponível na Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público sobre a questão das finanças das regiões autónomas.
Aproveitei também para disponibilizar o artigo da semana passada, sobre os "acordos de regime", que por esquecimento ficou por colocar no mesmo sítio.

Furtivamente

Sou dos que pensam que o actual sistema de financiamento do SNS, quase exclusivamente dependente do orçamento do Estado, dificilmente aguentará durante muito tempo o impacto do crescimento das despesas de saúde acima do crescimento do PIB e da despesa pública. Torna-se por isso necessário abrir quanto antes um debate político sobre o assunto, que aliás está anunciado com a próxima divulgação do relatório do grupo de peritos nomeado pelo Ministro da Saúde para estudar o problema e propor soluções.
Por isso, antes desse debate, parecem-me desaconselháveis inovações parcelares "ad hoc" que alterem o sistema existente, como sucede com a recente declaração ministerial sobre a possibilidade de estender as "taxas moderadoras" aos internamentos hospitalares e às cirurgias de ambulatório, casos até agora isentos de qualquer taxa. É evidente, porém, que se não trata propriamente de taxas "moderadoras", visto que esses cuidados de saúde não dependem em geral da vontade dos utentes, mas sim de taxas em sentido estrito, destinadas a fazer participar os utentes na cobertura financeira dos referidos gastos de saúde (co-pagamentos), ainda que em pequena medida e com muitas isenções (o que torna essas taxas relativamente "palatáveis" sob o ponto de vista da equidade social no acesso aos cuidados de saúde).
Poderá revelar-se obrigatório ir assumidamente por aí, para assegurar a sustentabilidade financeira do SNS. No entanto, uma tal mudança paradigmática -- e é disso que se trata -- não deveria ser feita assim, de forma furtiva, sem abordar decididamente a questão de fundo, como se se tratasse somente de estender uma solução já existente a situações da mesma natureza. O que não é, manifestamente, o caso.

Adenda: É evidente que a nova "taxa moderadora" não é um «novo imposto», como disparatadamente acusa o PSD.

Preconceitos ideológicos

No seu afã fundamentalista contra a presença do Estado na economia, o "Compromisso Portugal" veio defender a privatização imediata de um conjunto heteróclito de empresas públicas (ou com participação pública), onde não se vê nenhum critério nem justificação coerente, misturando empresas gestoras de "monopólios naturais" (como as infra-estruturas de transportes), com empresas em sectores recém-abertos à concorrência (como a EDP, aliás já maioritariamente privada) e empresas de serviço público em sectores ainda fora do mercado, com crónicos problemas estruturais (como a CP).
Mas, no fundo, são uns moderados: "esqueceram-se", por exemplo, da CGD e das Águas de Portugal. Devem ficar para a próxima edição do conclave dos gestores...

quarta-feira, 20 de setembro de 2006

Comitivas faraónicas

Eu também não compreendo e, sobretudo, não me conformo, com o gasto de dinheiros públicos, a parolice e falta de profissionalismo das enormes comitivas que é usual acompanharem os PRs e PMs portugueses em visitas de Estado, oficiais e outras que tais ao estrangeiro.
Não são só os ministros - são amigos, conhecidos, empresários, desportistas, artistas, intelectuais, deputados, políticos, equilibristas etc..., que - além das comitivas técnicas (do cabeleireiro para as Senhoras, ao médicos, dos seguranças e aos responsáveis pelas bagagens...) - não vão, em regra, realmente fazer nada de útil e com consequências. Servem talvez para habilitar o PR ou PM do momento a pagar facturas diversas (incluindo de apoio eleitoral)... Ah, e para dar dores de cabeça ao Protocolo de Estado, que não tem - nunca teve e hoje ainda menos - pessoal suficiente para enquadrar o grupo excursionista.
E o pior é a imagem pacóvia e a atitude abusiva que assim se projecta do país.
Sei do que falo. Trabalhei em Belém e participei na organização de dezenas de visitas presidenciais em Portugal e ao estrangeiro.
Em qualquer sociedade civilizada um PR não leva consigo - e, logo, não impõe ao país anfitrião - mais do que 15-20 pessoas como comitiva oficial. E um PM não viaja com mais de 10-12 pessoas. Os que abusam de acompanhantes técnicos (como os Presidentes americanos, que trazem centenas de seguranças etc....), nem pensar impingi-los aos anfitriões, seja para os sentarem em banquetes, arranjarem-lhes carros ou pagar hotéis...
A minha crítica não é especialmente dirigida ao Presidente Cavaco Silva, que possivelmente até julga que «esmaga» Espanha com o cortejo faraónico que o acompanha.
É que, se há 20 anos já era rídiculo e embaraçante, hoje é muito, muito mais... Além do que se gasta ao erário público.

Um pouco mais de seriedade, por favor

Parecem-me francamente precipitadas e infundadas as conclusões retiradas do estudo sobre o impacto económico das auto-estradas SCUT. Para começar, nunca ninguém impugnou o impacto positivo de tais auto-estradas (como de quaisquer outras). Por isso, em grande parte o estudo "chove no molhado". O que se questionou foi o facto de elas serem gratuitas para os beneficiários, sendo pagas pelo orçamento do Estado. Portanto, o que era preciso justificar não eram as auto-estradas em si mesmas, mas sim o regime SCUT.
Para justificar o regime SCUT era preciso demonstrar três coisas: (i) que o impacto desssas auto-estradas seria substancialmente menos positivo se fossem pagas pelos utentes (por efeito de uma diminuição considerável da sua utilização); (ii) que essa eventual diminuição do impacto positivo não seria pelo menos compensada pelos avultados investimentos que o Estado poderia fazer com o dinheirto com que tem de pagar as SCUT nos próximos 25 anos; (iii) que essas auto-estradas beneficiam sobretudo as regiões mais desfavorecidas, pelo menos em comparação com as regiões servidas por auto-estradas pagas pelos utentes.
Ora, tanto quanto me foi dado ver, nenhum destes pontos resulta provado em tal estudo...