sábado, 4 de agosto de 2007

Imagens estivais


O veto (3)

No seu editorial de hoje no Público, José Manuel Fernandes insiste em contestar o regime de disciplina profissional previsto no novo Estatuto do Jornalista (que o veto presidencial não contesta em si mesmo), afirmando que se trata de um regime insólito, na medida em que dá força de lei aos deveres deontológicos da profissão e institui sanções para a sua violação.
Não tem razão, porém. O mesmo sucede na generalidade das profissões reguladas, nomeadamente as organizadas em ordens profisionais, que também estabelecem esquemas oficiais de (auto-)disciplna profissional, incluindo sanções pela violação de deveres deontológicos, que têm força de lei. O facto de o código deontológico da Ordem dos Médicos continuar a considerar o aborto como falta deontológica grave em todas as circunstâncias só quer dizer que essa norma é ilegal (como procurei provar em artigo no Público, há alguns meses).

O veto (2)

Os partidos da oposição e os grupos profissionais que se opuseram à lei saudaram todos o veto presidencial do Esatuto do Jornalista.
A meu ver, sem razão o fazem, pois o PR ficou longe de lhes dar razão. Não põe em causa a quebra do sigilo das fontes (mas somente os termos relativamente indefinidos em que o diploma a admite), não questiona de modo algum a alegada violação dos direitos de autor dos jornalistas, não impugna também o novo regime de disciplina profisional, porventura a grande inovação da lei (discordando somente da medida das sanções previstas).

O veto

O Presidente da República resolveu vetar o Estatuto do Jornalista. Nada a objectar quanto ao veto em si mesmo, considerando o objecto do diploma e as controvérsias que suscitou.
No entanto, analisadas as razões do veto presidencial (com as quais estou em geral de acordo...), verifica-se que estão em causa pontos relativamente secundários da lei, sem põr em causa a sua filosofia e as suas principais inovações. A questão que se coloca é a de saber se o Presidente deve "gastar" vetos para efeitos de "microcontrolo legislativo", quando a sua discordância é de pequena ou média intensidade, sobretudo se isso pode ser lido como uma satisfação dada aos grupos contestários da lei (que chegaram a organizar uma manifestação junto ao Palácio de Belém), com os riscos de precedente que isso pode criar.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

É pena! (2)

Na mesma entrevista Fernando Teixeira Santos exclui também a hipótese de extinção da ADSE, argumentando que se trata de um «subsistema de saúde importante para a função pública».
Por minha parte, continuo a pensar que a ADSE não se justifica tal como está. Primeiro, não faz sentido que, sustentando o Estado o SNS como "serviço universal", mantenha depois um subsistema de saúde privativo para os seus funcionários. Segundo, não se compreende que os contribuintes paguem cumulativamente o SNS para toda a gente e um subsistema próprio dos funcionários públicos.
Resta esperar que o Governo assegure a "(auto)sustentabilidade financeira" da ADSE, como promete o Ministro das Finanças, o que só pode ser alcançado com o aumento das contribuições. Tal como sucede no sector privado, devem ser os beneficiários a sustentar financeiramene os subsistemas de saúde de que usufruem. É uma questão de equidade social e fiscal.

É pena!

Perguntado pelo Diário Económico sobre se está a considerar reduzir as deduções fiscais com despesas de saúde, o ministro das Finanças declarou que «essa matéria não está sobre a mesa [e que] não há intenção de mudar nada».
É pena, como já escrevi várias vezes. Primeiro, as referidas deduções ficais representam uma pesada despesa orçamental. Segundo, elas beneficiam sobretudo as camadas socias mais abastadas, que recorrem a serviços de saúde privados. Terceiro, elas disrtorcem a proporcionalidade do IRS a favor de quem mais ganha. Quarto, elas constituem um meio de "opting out" furtivo do SNS. Quinto, a redução ou eliminação dessas deduções permitiria baixar as taxas de IRS sem perda de receita fiscal
O mesmo se diga aliás das deduções relativas às despesas de educação.
Não é compreensível esse conservadorismo fiscal de um Governo socialista. Cada vez mais, a política fiscal é um dos padrões decisivos da distinção entre a esquerda e a direita.

Dar-se ao respeito

«PSD: Marques Mendes quer que o partido "se dê ao respeito». como é que Marques Mendes pode pedir isso ao Partido, depois de ele próprio não se dar ao respeito como líder, como mostrou a sua humilhante vassalagem a A. J. Jardim na Madeira!?

Um (?) País, dois sistemas

Quando, em 1984, foi aprovada a lei de despenalização parcial do aborto, encarregando os serviços públicos de saúde de os efectuar, a Madeira não se recusou a cumprir a lei, nem se queixou de falta de meios financeiros, pois não?
E quando, por essa mesma época, foram criadas as taxas moderadoras na Saúde, a Madeira não se recusou a cobrá-las, nem se queixou de a República lhe estar a proporcionar receitas não previstas no orçamento regional, pois não?
Duplicidades!

Demagogia

O poderoso lobby de Alcochete a que a CIP dá cobertura (mas cuja composição continua secreta) mantém-se muito activo nos media ("meios" não lhe faltam...). E agora com o rebuçado da Portela+Alcochete Até onde irá a demogagia "científica"?

Finalmente

«ONU aprovou força militar para Darfur». Sem tanta demora, quantos milhares de refugiados e de mortos se poderiam ter evitado?

Antonioni (1912-2007)

Entre as razões para bem-dizer os prodigiosos anos 60 conta-se seguramente a fruição de filmes como O Grito, A Aventura, O Deserto Vermelho, Blow-Up. Obrigado, Antonioni!

terça-feira, 31 de julho de 2007

Ao que se desce...

Marques Mendes a qualificar A. J. Jardim como o "nosso grande líder"!?
Jardim merece ser promovido por Marques Mendes a presidente honorário vitalício do PSD...

Correio da Causa: Campo de tiro de Alcochete

«(...) O país tem na região de Santa Margarida um extenso campo militar a cargo do Exército. Se bem que a opinião definitiva deva competir à Força Aérea, afirmo, sob pena de não ter percebido nada da função militar durante 36 anos, que o futuro CT [campo de tiro] poderá perfeitamente ficar no Campo Militar de Sta Margarida – terrenos do Estado. Ainda que eventualmente alargados.
Com vantagens óbvias para os vários ramos militares, nomeadamente a dos exercícios conjuntos e de fogos reais.
Não esteja o MDN atento às FA no seu conjunto, e a uma parcimoniosa gestão do OE, natural será que a Força Aérea, dali, da mudança do CTA, queira retirar os máximos dividendos. Quando queremos, arranjamos justificações para tudo.
Acaba de acontecer, com a futura base aérea (civil) de Ponte de Sôr. Por «incompatibilidades» militares, diz-se, em conviver com os meios aéreos de combate a incêndios florestais em Tancos na antiga BA3! Asneira pura e simples.
Manda o PM, ou valem os negócios do MAI?
Da hipótese de o futuro CT da Força Aérea ir para Santa Margarida, só faltaria vir o Exército a dizer que não, que não era compatível com o seu uso pelas forças terrestres – falta de espaço/tempo, por ex! Quando queremos...»

José B. M.

Que autoridade lhes assiste?

Numa operação de razia política, o ministro Bagão Félix (governo Durão Barroso) demitiu de uma assentada todos os dirigentes distritais da segurança social. A justiça determinou agora o direito à indemnização dos "saneados", com base em (discutível) falta de fundamentação das demissões.
Entretanto, os autores da façanha e seus correligionários continuam a debitar bitaites de moralidade política sobre as supostas perseguições políticas alheias. Assim se faz política entre nós...

Dilema

O face mais hedionda do terrorismo é a execução de reféns como instrumento de chantagem política. E o dilema político nunca tem uma resposta simples: ceder à chantagem e salvar os reféns, ou optar pela intransigência, deixando-os morrer?

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Nada a objectar...

...ao pedido de fiscalização preventiva da constitucionalidade da lei que alarga o acesso do Fisco aos dados bancários dos contribuintes que impugnem decisões da administração tributária, dada a delicadeza da questão.
De resto, ao pedir a fiscalização preventiva o Presidente não tem de estar convencido da inconstitucionalidade, nem sequer ter dúvidas sobre ela. Basta entender que é conveniente o esclarecimento antecipado das dúvidas que tenham sido suscitadas acerca da conformidade constitucional da norma em causa, como foi o caso. Por isso mesmo, ainda que o TC não se venha a pronunciar pela inconstitucionalidade, isso nunca pode ser considerado uma derrota do Presidente, como por vezes erradamente se diz.

Ai Timor!

Parece que Xanana Gusmão vai mesmo ser nomeado primeiro-ministro do novo governo de Timor...

Propagandistas

O comentador José António Lima, habitual porta-voz jornalístico das posições do PSD, antes no Expresso e agora no Sol, acha que eu sou um "propagandista" da actual maioria.
Para infirmar o dislate malévolo, basta recordar que só nas últimas semanas manifestei aqui no Causa Nossa a minha discordância com as seguintes medidas governamentais: processo disciplinar da DREN, demissão da directora do centro de saúde de Vieira do Minho, processo-crime de Sócrates contra um blogger, isenção de taxas moderadoras nas IVG, anúncio de uma nova privatização da REN, a demora na instalação de portagens nas SCUT, etc. É, pois, evidente a minha condição de "propagandista" do Governo!
Há propagandistas oficiosos que vêem os outros à sua medida...

Adenda
Quanto à pretérita "ortodoxia comunista" que o mesmo JAL me atribui, dá para rir, sendo por demais conhecida a história da minha prolongada relação de conflitualidade com a orientação oficial do PCP, antes de sair, vai para duas décadas.
Assim se faz comentário político "independente" entre nós!

domingo, 29 de julho de 2007

Estado social

Há situações de carência social que não podem permanecer assim.
A "nova geração de políticas sociais" de que o Governo Sócrates se reclama, tem de virar-se para as consequências do envelhecimento da população e da quebra das condições tradicionais que permitiam às famílias tratar dos seus idosos.

sábado, 28 de julho de 2007

Um País (?), dois sistemas (7)

O Presidente da República não há meio de acertar o seu discurso na questão da recusa madeirense de cumprir a lei do aborto. Depois do despropositado comentário sobre o "recurso aos tribunais" por parte dos interessados, veio agora apelar a um "diálogo" entre as duas partes, como se o Governo da República tivesse algo a negociar (porventura, pagando?) com os fora-da-lei do governo regional.
Custa assim tanto condenar sem ambages a atitude das autoridades regionais e afirmar solenemente que nenhuma lei da República pode deixar de ser cumprida em todo o território nacional, ponto parágrafo!?

Um País (?), dois sistemas (6)

«Os 230 mil euros que o Governo regional terá de despender para fazer cumprir a nova lei do aborto representam 7,7 por cento dos três milhões de euros que a região vai poupar com a redução do número de deputados e um quarto do valor concedido ao clube organizador do Rali da Madeira - uma prova com direito a tolerância de ponto para os funcionários da administração regional.» (Publico de hoje).
É evidente que o argumento das despesas, aliás impertinente, é um simples pretexto.

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Metas numéricas

O Ministro das Finanças e da Administração Pública anuncia a redução de 4 000 funcionários no 1º semestre deste ano, em virtude de um recrutamento inferior ao número de saídas (por aposentação, sobretudo). É um resultado assinalável. Mas se o Governo quer alcançar a sua anunciada meta de 75 000 funcionários a menos na legislatura, o ritmo de redução é claramente insuficiente (8 semestres vezes 4000 daria 32 000, menos de metade da referida meta).
Quando se apontam metas numéricas, convém ficar pelo menos próximo delas...

Assimetrias

Numa matéria com evidentes implicações políticas, uma corporação profissional (a Ordem dos Notários) "atira-se" ao Governo brandindo o parecer de um jurisconsulto de esquerda, apoiante daquele. O Governo replica exibindo os pareceres de três jurisconsultos de direita, opositores do mesmo.
Não há nada no mundo sem a sua racionalidade, mesmo que por vezes não seja evidente à primeira vista...

"Discriminação positiva"

Que importa que os dois partidos da direita somem somente 35% das intenções de voto. Em compensação representam o dobro no conjunto dos comentadores dos media.
É a lógica da justiça social (que, aliás a direita abomina): dar mais a quem menos tem...

Um (?) País, dois sistemas (5)

A questão não está em saber que o Estado não deve pagar à Madeira para cumprir a lei do aborto -, o que, além de desprovido de base legal, seria um precedente que Jardim agradeceria. A questão está em fazer ver a Jardim o dinheiro do Estado que ele pode perder, se a não cumprir --, nomeadamente investimentos do Estado nas regiões, incluindo em projectos regionais.
Uma vez que a única coisa que parece mover o chefe do governo regional é o dinheiro, então que o Estado use a sério o argumento do dinheiro!

Um (?) País, dois sistemas (4)

Há quem argumente que, uma vez que o cumprimento da lei do aborto acarreta despesas para os serviços regionais de saúde, a Madeira não tem obrigação de os suportar. Errado!
Antes de mais, mesmo calculadas por cima, as previsíveis despesas seriam despiciendas para o orçamento dos serviços regionais de saúde, provavelmente menos de 0,1% (e não os inimagináveis 7/8% de que fala o Diário de Notícias, por manifesto erro de cálculo). Por isso, os Açores não levantaram nenhum problema de ordem financeira para executarem a lei.
Depois, as Regiões autónomas têm obrigação de cumprir as leis da República através dos seus serviços, mesmo que haja eventuais custos adicionais. Acontece com a IVG como pode ocorrer com qualquer outra obrigação que venha a ser legalmente estabelecida (por exemplo, uma eventual vacina obrigatória contra o cancro do colo do útero). Trata-se de um ónus da autonomia regional. É para isso que as Regiões autónomas gozam de total autonomia financeira, dispondo de todos os impostos nelas cobrados (além das transferências do orçamento do Estado) e nem sequer contribuindo para as despesas gerais da República, que só o Continente paga.
De resto, o mesmo sucede com as demais áreas onde os serviços públicos foram regionalizados (quase todos), como por exemplo a educação. Assim, quando o ensino secundário se tornar obrigatório, é evidente que as Regiões terão de arcar com os respectivos custos, sem poderem invocar esse facto como argumento para não cumprirem tal obrigação, ou para os custos serem financiados pela República.

quinta-feira, 26 de julho de 2007

Heróis cívicos

Um dos efeitos colaterais mais nocivos do disparatado processo disciplinar da DREN por injúria ao Primeiro-Ministro -- processo que a Ministra teve o bom senso de mandar arquivar -- foi transformar em vítima de "perseguição política" um daqueles "professores-aparatchik" que, mediante requisições ou destacamentos de favor partidário, deixaram as escolas e o ensino para se alojarem em confortáveis sinecuras nas direcções regionais e noutros serviços do Ministério da Educação.
Assim se fazem "heróis cívicos" entre nós!

Um País (?), dois sistemas (3)

Julgo que nunca, desde o estabelecimento dos órgãos de poder regional na Madeira, houve uma advertência tão forte como a que ontem, na sua entrevista à SIC, José Sócrates dirigiu ao chefe do governo regional da Madeira, acerca do cumprimento da "lei do aborto".
Agora as coisas estão claras: a autoridade legislativa da República tem de prevalecer em todo o território nacional. Admitir que as autoridades regionais se pudessem furtar, em ostensivo acto de recusa, a essa regra constitucional básica, seria a própria noção do Estado a soçobrar.

"Em busca da Direita perdida"

Já está disponível na Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe.