sábado, 8 de janeiro de 2005

Estabilidade e proporcionalidade

Na conversa da SIC Notícias o Presidente da República apoiou a ideia de mexer no sistema eleitoral, de modo a facilitar a obtenção de maiorias parlamentares absolutas (ou seja, mais de metade dos deputados), mas sem prejudicar a proporcionalidade. Ora essas duas ideias são por princípio contraditórias. As maiorias parlamentares monopartidárias (são elas que o Presidente pretende favorecer) só podem ser facilitadas à custa de menos proporcionalidade. A relação entre as duas coisas está há muito estabelecida.
Actualmente, para se obter uma maioria parlamentar é necessário algo como 45% dos votos, conferindo já um "majoração" significativa ao partido vencedor. A maneira mais simples de tornar menos exigente a maioria absoluta -- ou seja, possibilitar a sua obtenção com menor percentagem de votos --, consiste em diminuir o número médio de deputados por círculo eleitoral, o que se consegue por dois modos: (i) diminuição do número total de deputados e/ou (ii) aumento do número de círculos eleitorais, fraccionando os actuais. Aliás, nenhuma dessas alterações necessita de revisão constitucional, podendo ser feita por via de lei, embora aprovada por maioria de 2/3.
Em qualquer caso, se se baixar muito o liminar da maioria absoluta -- aumentando o fosso entre a proporção de deputados alcançados e a proporção de votos obtida --, será que podemos continuar a dizer que o sistema ainda é proporcional e que a Constituição ainda está a ser respeitada? E independentemente da questão constitucional será politicamente justo diminuir desproporcionadamente a representação dos partidos menos votados ou até reduzir o leque de forças políticas com representação parlamentar, em homengem à obtenção de maiorias absolutas?