quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Pentágono abandona acusações contra presos de Guantanamo

Binhyam Mohamed

O Pentágono anunciou ontem ter abandonado acusações de conspiração e apoio logístico a actividades terroristas contra cinco prisioneiros detidos em Guantánamo.
Dados sobre a chegada a Guantánamo destes cinco indivíduos constam do relatório da ONG de advogados "Reprieve" de 28.1.2008 - relatório liminarmente rejeitado pelo governo português, mas que foi considerado relevante pela PGR para a investigação sobre os chamados "voos da CIA", que prossegue.
Por sua vez, estas revelações da "Reprieve" baseiam-se no cruzamento dos dados obtidos de fontes militares americanas com a lista, elaborada pela NAV, de voos de e para Guantánamo com passagem por Portugal (lista que eu consegui obter, mas não através do governo, apesar de reiterados pedidos que lhe dirigi em nome do PE).
Nessa lista estão identificados os voos que deverão ter transferido ilegalmente estes cinco homens (entre, decerto, muitos mais) para Guantánamo, autorizados a passar por território português:
1 - Binhyam Mohamed, cidadão etíope residente no Reino Unido, foi preso no Paquistão a 10 de Abril de 2002 e transferido, segundo dados oficiais americanos comunicados aos advogados, para Guantánamo onde chegou a 19 ou a 20 de Setembro de 2004.
No dia 19 de Setembro de 2004 sobrevoou o espaço aéreo português, com destino a Guantánamo, um avião militar americano tipo C-17, com a matrícula RCH948y, proveniente da base americana de Incirlik (Turquia).
No dia 20 de Setembro de 2004, aterrou nas Lajes um avião militar americano tipo C-17, com a matrícula RCH947 e com destino a Guantánamo.
2 - Noor Uthman Muammaed, cidadão sudanês, foi preso no Paquistão e transferido - segundo dados oficiais americanos comunicados aos advogados - para Guantánamo, onde chegou a 5 de Agosto de 2002.
Nesse dia, sobrevoou o espaço aéreo português, com destino a Guantánamo, um avião militar americano tipo C-17, com a matrícula RCH233y, proveniente da base americana de Incirlik (Turquia).
3 - Sufyian Barhoumi, cidadão argelino, foi preso no Paquistão no dia 28 de Março de 2002 e transferido para Guantanamo - segundo dados oficiais americanos comunicados aos advogados - onde chegou a 18 de Junho de 2002.
Nesse dia, sobrevoou o espaço aéreo português, com destino a Guantánamo, um avião militar americano tipo C-17, com a matrícula RCH796y, proveniente da base militar americana de Incirlik (Turquia).
4 - Ghassan Abdullah Al Sharbi, cidadão saudita, foi preso no Paquistão no dia 28 de Marco de 2002 e transferido - segundo dados oficiais americanos comunicados aos advogados - para Guantánamo, onde chegou a 14 de Junho de 2002.
Nesse dia, sobrevoou o espaço aéreo português, com destino a Guantánamo, um avião militar americano tipo C-17, com a matrícula RCH793y e proveniente da base militar de Incirlik (Turquia).
5 - Jabran Said Al Qahtani, cidadão saudita, foi preso a 2 de Marco de 2002 e transferido - segundo dados oficiais americanos comunicados aos advogados - para Guantánamo, onde chegou a 5 de Agosto de 2002.
Nesse dia, sobrevoou o espaço aéreo português, com destino a Guantánamo, um avião militar americano tipo C-17, com a matrícula RCH233y e proveniente da base americana de Incirlik (Turquia).
Estes voos militares só podem ter passado por território nacional com autorização do MNE, transmitida através de Nota diplomática, depois de consultado o MDN.
Os arquivos do MNE e do MDN têm de ter a documentação de processamento das autorizações destes voos.
Da consulta dessa documentação resultará qual foi a justificação invocada para aqueles voos para Guantanamo:
- se "fornecimento de apoio logístico" ( como sucedeu em Espanha, segundo recentemente revelou o respectivo Ministério da Defesa, relativamente pelo menos a dois voos militares americanos em que se confirmou que, afinal, seguiam prisioneiros);
- se "transporte de prisioneiros".
Isto é: dá para verificar se as autoridades portuguesas tinham ou não conhecimento da real finalidade e conteúdo dos voos. Ou se foram enganadas pelos aliados americanos.
Persistindo o governo português em nada revelar desta documentação e nada esclarecer, convida a temer o pior.