Esta semana, jornais e televisões passaram diferentes versões sobre os Kennedy, mais cor-de-rosa no horário nobre e menos pela noite dentro. Escrevia-se no Expresso que todos nós ainda hoje nos lembramos como soubemos da morte do Presidente. Eu frequentava então o colégio do Sagrado Coração de Maria, uma ordem religiosa de origem irlandesa. Com uma enorme e inesperada solenidade, alguém entrou na sala para nos dizer que tinham assassinado o presidente católico e irlandês ... dos EUA. As aulas foram interrompidas e o resto do dia foi passado na capela. Depois, percebi a razão de tanto luto.
Quando assassinaram Bob Kennedy, já estudava em Coimbra. Tinha assistido na véspera ao ballet moderno de Maurice Béjart. Nesse dia, o espectáculo era em Lisboa, creio que no Coliseu. A meio, o coreógrafo entrou no palco e pediu silêncio para Bob em nome da democracia, contra os fascismos ou qualquer coisa parecida (versões diferentes circularam nos dias seguintes em como era próprio da altura). Nessa mesma noite, a PIDE levou-o ao aeroporto. Muito mais tarde, em 1989, nas comemorações da Revolução Francesa, assisti no Grand Palais, em Paris, a um magnífico bailado concebido pelo mesmo coreógrafo especialmente para essa ocasião. No final, as minhas palmas juntaram-se às de tantos outros. Mas eram mais fortes. Na verdade, com atraso, aproveitei para lhe agradecer aquele gesto de coragem com que em nome de um dos Kennedy uma noite se tinha juntado a nós, inventando a sua Liberdade.
Maria Manuel Leitão Marques