sábado, 29 de novembro de 2003

O bicho

Como amanhã é domingo, dia de sorteio, tinha pensado deambular sobre os nossos possíveis adversários na primeira fase do Euro 2004, as nossas chances, o sentimento geral dos adeptos, o espanto dos estrangeiros perante a proeza dos dez estádios e outras coisas mais. Depois de uma semana frustrante para o ego político-desportivo lusitano, vergado pelo Rei de Espanha, parecia-me o tema ideal para descontrair os espíritos neste início de época natalícia. Mas o texto do meu colega Luís Osório (LO) reabriu um dos meus temas dilectos - teoria e praxis do serviço público de televisão. Não posso resistir-lhe.

É bom saber que ainda há quem se preocupe com a sorte da televisão e encontre tempo para reflectir sobre o modo como esse conceito nebuloso de "serviço público televisivo" se deve e pode exprimir. Louvo o empenhamento, a seriedade e a bondade de todos os que participaram no grupo de trabalho convidado pelo Governo a pronunciar-se sobre a matéria. Revejo-me intelectualmente nas suas matrizes de pressupostos e de propósitos, do mesmo modo que comungo a maioria das suas preocupações de ordem ética e civilizacional, mas há muito tempo que deixei de ter ilusões quanto às fórmulas concretas. Partilho da enorme desilusão de LO quanto à actual programação da RTP 1. Que pobreza, que semelhanças com a mediocridade dos canais generalistas privados! E o que dizer da RTP 2, em fase meramente vegetativa, à espera de um modelo quimérico de exploração pela "sociedade civil"? Aposto o meu mealheiro em como redundará num flop estrondoso.

Já devíamos ter percebido que não há outra solução realista a não ser a concentração da presença pública num só canal de referência - sem preocupações rascas, sem futebol de clubes, sem sitcoms miseráveis, sem publicidade doentia, sem populismo informativo, ainda que sem audiências de dois dígitos. O conceito de RTP 1 como referência de serviço público está completamente falido e a insistência na "bi-polaridade" só fará perder mais tempo e dinheiro aos contribuintes. Privatize-se o bicho.

PS - A propósito de estádios, para quem gostar de emoções verdadeiramente fortes aconselho uma visita ao site http://www.bjghw.gov.cn/forNationalStadium/indexeng.asp e percorra os fantásticos recintos que os chineses vão construir para os Jogos Olímpicos de 2008. Já fez o exercício? O que pensa agora dos estádios do Euro 2004?

Luís Nazaré