Mas, bem vistas as coisas, a questão não é tão inocente como isso. A simples admissão, sem escândalo público, de que o Estado ou os municípios possam assumir responsabilidades na construção de uma catedral (ou templo de qualquer religião) testemunha a degradação do respeito pelo princípio da separação entre o Estado e as igrejas no nosso país. De facto, os templos e demais edifícios religiosos devem ser um assunto das respectivas igrejas. Não compete ao Estado nem aos municípios nenhum papel nesse âmbito, salvo as comuns funções municipais em matéria urbanística. Não se imiscua portanto o presidente da CML em assunto estranho às atribuições municipais.
Já bastam as violações correntes do princípio da separação (exibição oficial de símbolos religiosos nas escolas públicas, cerimónias religiosas encomendados por organismos oficiais, ensino religioso a cargo e a expensas do Estado, lugar protocolar especial dos dignitários da Igreja Católica, etc., etc.). Só nos faltava que os poderes públicos se encarregassem de construir igrejas. A poucos anos do centenário da implantação da República, corremos o risco de o celebrar sobre os escombros de uma das suas mais eminentes conquistas civilizacionais.
Vital Moreira