1. Uma carta
De um leitor (Rui Silva) recebi uma carta a contestar o meu post sobre o predomínio de políticos-comentadores de direita na televisão. Diz ele no essencial:
«(...) Como deve calcular, discordo consigo. Ou melhor, o seu relato dos factos é correcto: de facto, a maioria dos comentadores "high profile" são de direita. A sua interpretação (que está apenas implicita...) é que não é. Para analisarmos este problema temos de nos perguntar: que tipo de comentadores é que os "media" desejam?Comentadores que se limitam a repetir as "party lines" ou comentadores com um pensamento e uma acção autónoma das dos partidos? Vozes "engagées" (corrija-me o francês!) ou vozes autonómas e independentes?
É óbvio que os "media" (com razão ou sem ela) preferem os segundos pelo brilho, pela originalidade e pela independência das suas posições.
Se observar os comentadores de direita que enumerou vê que quase todos eles (Marcello Rebelo de Sousa, José Pacheco Pereira e Pedro Santana Lopes) têm, goste-se ou não delas, opiniões e acções que divergem muitas vezes das do partido a que pertencem. Hoje em dia, observamos que este espírito de independência está à direita.
(...) Por outro lado, há um problema de promoção pessoal. As pessoas da esquerda que se promovam melhor nos media, ora essa!
PS. Já agora, o Miguel Sousa Tavares em que lado o põe? Na esquerda ou na direita?»
2. Resposta
Para mim é evidente que no caso do Flashback, para além da sua indicutível qualidade pessoal, os três protagonistas estão lá primordialmente para representar qualificadamente três diferentes perspectivas políticas, correspondentes a outras tantas áreas políticas, e por isso mesmo são todos agentes políticos (aliás, o VLX foi preencher a vaga de um anterior representante do PP). Ora, considerando que o arco político nacional não compreende somente essas três áreas, existe, portanto, uma deliberada exclusão dos pontos de vista à esquerda do PS. Isto para além do desequilíbrio a favor da direita (2 contra 1).
O mesmo se passa com os políticos-comentadores televisivos (aliás um fenómeno sem muito paralelo noutros países, onde predominam os debates pluripartidários). Eles estão lá enquanto agentes representativos de certas áreas politicas, e por isso existe igualmente um manifesto desequilíbrio a favor do PSD. O alegado "mercado dos comentadores" - são os "melhores" - não chega para justificar esta preferência das estações privadas. Mesmo quando alguns destes comentadores divergem da orientação partidária, essa divergência tem somente a ver com o melhor modo de prosseguir os interesses partidários, não significando por isso independência partidária. Por outro lado, não é possível acreditar que na esquerda não existe ninguém com suficiente gabarito para o efeito. Aliás, recordo que nos debates dominicais entre Santana Lopes e José Sócrates na RTP 1, que o primeiro abandonou para ir a solo para a SIC, não me consta que o segundo ficasse a perder (para dizer o menos...).
De resto, existe um dever político e ético de pluralismo político da televisão - que é um mercado limitado, com licença pública -, que neste aspecto a televisão não está a respeitar.
Não mencionei o Miguel Sousa Tavares, simplesmente por que ele é um jornalista profissional, sem actividade política e sem filiação partidária conhecida, pelo que não pertence ao mesmo "campeonato" dos políticos-comentadores.
Vital Moreira