No País Relativo Filipe Nunes exprime a sua discordância com a ideia de um consenso interpartidário sobre as finanças públicas, formulada numa representação subscrita por individualidades de várias orientações políticas - entre as quais me conto, como antigo membro da malograda ECORDEP -, as quais, no seguimento da recente mensagem presidencial à AR, vieram desafiar os dois principais partidos para um entendimento básico «sobre um princípio de disciplina financeira e sobre as metodologias que a assegurem, independentemente dos governos de cada momento».
Filipe Nunes não está sozinho nesta atitude negativa, pelo contrário. Aparentemente os círculos dirigentes do PS também reagiram com frieza e sem entusiasmo à ideia, embora com importantes nuances (vejam-se por exemplo as opiniões de João Cravinho e de Luís Nazaré, aliás anteriores ao referido documento). Mas já foi bom que se tenham apressado a ouvir os autores do manifesto, o que foi uma atitude inteligente, evitando uma posição de rejeição liminar, que só daria trunfos ao Governo.
Por minha parte, penso que o PS deveria assumir deliberadamnentre essa ideia. Primeiro, porque o documento, ao sublinhar as dificuldades estruturais das finanças públicas, isenta em certa medida o PS da acusação que lhe tem sido feita de ter sido o principal responsável pela má situação financeira do País. Segundo, porque ele não pretende reduzir as diferenças de política financeira entre os partidos, nem comprometer o PS com as políticas do Governo, antes salvaguarda expressamente essa autonomia. Terceiro, porque o PS poderia colocar na mesa das discussões alguns pontos-chave sob um ponto de vista de esquerda, designadamente em matéria de luta contra a fraude e a evasão fiscal (por exemplo, o acesso do fisco aos dados bancários). Quarto, porque o PS não deve perder esta oportunidade para afirmar um compromisso claro com a ideia de disciplina e bom governo financeiro. A meu ver, o pior que lhe poderia suceder, depois de uma experiência governativa caracterizada por demasiado laxismo financeiro, de que saiu muito mal ferido, seria insistir em dar a impressão de reincidência nessa orientação.
Se não quer permanecer durante muito tempo apenas como força de oposição e de protesto e se quer ter possibilidades de poder realizar as suas propostas políticas, um partido com vocação de governo não pode deixar de superar convictamente a má fama de desplicência e de irresponsabilidade financeira que vai tradicionalmente associada aos governos de esquerda.
Vital Moreira