Conheciam-se as conexões entre o futebol e a política, mas era inimaginável que elas atingissem níveis tão estratosféricos como aconteceu esta semana. Depois das vitórias de Portugal sobre a Espanha e a Inglaterra, passou-se a proclamar que «o céu é o limite». O clima de euforia que se vive no país por causa de uma selecção lançada já à conquista do título de campeão europeu terá convencido Durão Barroso a imitá-la e correr para o «céu é o limite» que lhe ofereciam: o cargo de presidente da Comissão Europeia. E que melhor oportunidade para o ainda primeiro-ministro sair da cena doméstica do que aproveitar a festa do futebol? Se formos campeões, tudo se aceita, até o inverosímil: um Governo chefiado pelo vencedor do nosso prémio José Mourinho: Pedro Santana Lopes. Já viram a pontaria do Causa Nossa?
Menos pontaria tive eu, quando aqui escrevi há quatro dias: «Depois de tanto ter criticado Guterres por fuga às responsabilidades quando este se demitiu na sequência das autárquicas, com que cara Durão Barroso faria as malas a caminho de Bruxelas após ter sofrido o estrondoso revés de 13 de Junho? E quem ocuparia o seu lugar? Santana Lopes? Ferreira Leite? Marques Mendes? Arnaut? Morais Sarmento ? Entramos no domínio do mais improvável surrealismo político.»
Improvável? De modo nenhum, como se comprova. Barroso foge de um governo irremodelável e Santana foge do túnel do Marquês e do parque Mayer. Só falta Jardim fugir da Madeira e candidatar-se a Belém ou, pelo menos, ser ministro da Defesa de Santana Lopes. Com tantos fugitivos e tanto circo, Portugal entrou de facto no domínio do surrealismo puro.
Vicente Jorge Silva