Entre Sócrates e Alegre prefiro, certamente, Alegre. Alegre é o que é, mostra o que é e o que sempre foi, não disfarça. Sócrates é um camaleão do oportunismo político, que pesca à direita os apoios do aparelho do PS e à esquerda a caução ideológica junto de figuras tão improváveis como Sérgio Sousa Pinto e António Reis.
Prefiro mil vezes o romantismo «démodé» mas genuíno de Alegre ao novo-riquismo «modernista» e empertigado de Sócrates. Mesmo quando nos irrita com os seus ares de aristocrata «blasé» e eterno diletante da política, Alegre tem uma espessura como personagem que o distingue da inconsistência robotizada de Sócrates (a sua recente entrevista à revista do «Expresso» é, a esse respeito, exemplar).
Evidentemente, Sócrates programou-se (ou foi programado) para ganhar, enquanto Alegre parece assumir (mesmo quando pretende o inverso) a pose romântica do lutador destinado a perder, mas com honra, uma batalha simbólica. Além disso, Alegre representa, «malgré-lui», um PS arcaico e saudosista que, apesar das proclamações em contrário, tem notória dificuldade em ultrapassar o mero terreno ideológico ou a condição mítica de representante das classes oprimidas ou marginalizadas pelo neo-liberalismo.
A síntese entre rigor económico e defesa dos direitos sociais implica uma reavaliação do papel do Estado e, em particular, do Estado-Providência, de modo a garantir a sustentabilidade das áreas fundamentais do serviço público. E, para isso, não basta apenas uma atitude defensiva de protesto ou inconformidade face aos abusos neo-liberais. É indispensável uma atitude ofensiva que mobilize as energias dos sectores mais dinâmicos da sociedade e não só a revolta ou o ressentimento dos que se sentem excluídos. Se a esquerda democrática não conseguir responder a este desafio, só lhe resta ser absorvida pela lógica neo-liberal (como aconteceu com Blair) ou fixar-se num estéril saudosismo doutrinário divorciado do real.
Vicente Jorge Silva