quarta-feira, 5 de janeiro de 2005

Sumatra, tsunamis e incontactáveis

Tenho recebido diversas mensagens acerca do meu post Ondas mediáticas (ver abaixo). Não transcrevo pela sua extensão, mas destaco os textos e os argumentos de Adeodato Pinto, Carlos Cristino, José Mendes Pires, Rui Tavares Guedes e O Ateu Católico. Todos defendem a primazia, em bom português, de "Samatra" sobre "Sumatra" e a diferença conceptual entre maremoto e tsunami. Dizem-me ainda que os manuais escolares terão consagrado a acepção de abalo sísmico submarino para a palavra maremoto e que só o termo tsunami define com exactidão a causa directa da tragédia. Suspeito que esta é uma daquelas discussões onde nunca se chegará a uma conclusão, tal a disparidade de registos e interpretações, quer históricas quer linguísticas. Aqui vão, porém, os meus argumentos:

a) O nome original da ilha de Sumatra é Swarna Dwipa, o que, em sânscrito, significa "ilha do ouro" (devido à exploração de minas auríferas). Entre as diferentes comunidades de origem hindu e budista que se estabeleceram na ilha, a da cidade portuária de Samudra ("oceano" em sânscrito), acabou por dominar a ponta noroeste (a região de Aceh) entre os séculos XI e XIV e viu o seu nome generalizar-se a toda a ilha. É a partir daqui que as opiniões se dividem sobre a autoria e as razões do regresso à antiga fonia "su". Segundo algumas fontes, terá sido Marco Pólo, por volta de 1292, o primeiro ocidental a grafar "Sumatra" nas suas notas de viagem. Segundo outras, foi o viajante marroquino Ibn Battuta, em meados do século XIV, o autor da mudança. Tudo isto ocorreu, como é bom de ver, muito antes da chegada dos portugueses à Indonésia. Por mais que possa custar ao nosso orgulho, nenhuma fonte histórica credível atribui a origem da actual designação da ilha aos nossos navegantes nem a troca do "sa" pelo "su" (ou vice-versa) a uma eventual corruptela do português para o inglês. Certo é que o primeiro nome da ilha em alfabeto latino foi Sumatra. Posto isto, fico como a Enciclopédia Verbo - ambas as grafias são admissíveis;

b) Sobre o maremoto, descontada a minha ignorância acerca dos conteúdos dos manuais escolares pós-modernos, cito as definições dos meus dois dicionários preferidos: no de Cândido de Figueiredo, da Bertrand, maremoto significa simplesmente "tremor do mar"; para o dicionário da língua portuguesa da Academia das Ciências é uma "alteração violenta das águas do mar causada por oscilações sísmicas do solo submarino". Se isto não é um tsunami (que, em japonês, significa simplesmente "onda de praia"), que diabo é um tsunami?

c) Para Rui Tavares Guedes, a distinção entre desaparecidos e incontactáveis é perfeitamente justificável: "os incontactáveis não são necessariamente desaparecidos, embora todos os desaparecidos estejam incontactáveis". Continuo sem perceber, mas admito que o defeito seja só meu.