sábado, 4 de março de 2017

Corporativismo +


1. Neste manifesto público da Ordem dos Médicos e a Ordem dos Médicos Dentistas, em que se reclama a redução das taxas e contribuições pagas à Entidade Reguladora da Saúde, não está em causa a justeza da reclamação em si mesma, aliás baseada num relatório do Tribunal de Contas, mas sim a competência das referidas ordens profissionais para a assumirem como sua.
De facto, a ERS não regula nem cobra taxas e contribuições aos médicos, mas sim aos estabelecimentos de saúde públicos e privados (incluindo os consultórios e clínicas), pertençam ou não a médicos. Ora, as ordens profissionais são organismos oficiais que só podem dedicar-se às suas tarefas oficiais de representação e de regulação das respetivas profissões, onde não se conta a defesa dos interesses dos estabelecimentos de que os seus membros eventualmente sejam donos.
As ordens da saúde representam o "interesse geral" das respetivas profissões e não os interesses económicos setoriais de quem têm consultórios, clínicas ou outros estabelecimentos de saúde, que são uma minoria.

2. No corporativismo do Estado Novo é que os interesses económicos eram representados por organismos oficiais unicitários ("sindicatos nacionais" e "grémios"), mas nem aí as ordens podiam funcionar como sucedâneos dos "grémios" na representação dos interesses económicos dos seus membros "estabelecidos". Era o que faltava que assumissem tais funções na atual ordem liberal-democrática!
Hoje a representação e a defesa dos interesses dos estabelecimentos de saúde, quaisquer que sejam os seus titulares, só podem estar a cargo de associações livres dos respetivos interessados, tal como qualquer outra atividade económica, sendo questões totalmente alheias às ordens profissionais, que não podem usar os seus poderes e meios públicos para funções estranhas ao seu objeto legal.
Vai sendo tempo de o Governo deixar de contemporizar com estas situações de flagrante ilegalidade e de dizer claramente às ordens profissionais que não podem continuar a invadir impunemente terrenos que não são seus e que existem instrumentos políticos e judiciais bastantes para fazer prevalecer a "legalidade democrática".