1. Houve quem me censurasse pelo meu anterior post sobre a Geringonça, por causa da omissão dos méritos do Governo no bom desempenho económico e financeiro do País. Mas é uma acusação infundada: primeiro, não era isso que estava em causa; segundo, várias vezes os destaquei ao longo destes anos.
O que sustento é que, em geral, tais méritos não existem por causa da Geringonça, mas apesar dela.
2. Vejamos os principais méritos.
O primeiro grande mérito foi a preservação da linha de rigor orçamental, cumprindo e até superando as metas de consolidação orçamental acordadas com Bruxelas (salvo quanto ao défice estrutural), depois de um primeiro aviso sério da Comissão Europeia, aquando da rejeição do draft do primeiro orçamento (2016), embora beneficiando depois de um crescimento económico na União Europeia superior ao esperado. Essa opção decisiva deu confiança aos mercados e às agências de rating, o que ajudou a descer os custos do financiamento público.
O segundo grande mérito foi não pôr em causa, no essencial, as principais reformas adotadas pelo anterior Governo durante o período de assistência financeira externa (aliás previstas no respetivo programa, negociado pelo PS), nomeadamente quanto às relações laborais, ao arrendamento urbano, às falência e recuperação de empresas, à "lei dos compromissos", ao setor empresarial do Estado, à reorganização dos tribunais, etc..
O terceiro grande mérito (last but not the least), foi a resoluta política de saneamento do setor financeiro, incluindo a decisiva recapitalização da Caixa, corrigindo porventura o pior fator remanescente de desconfiança externa em relação à solidez da retoma económica e das finanças públicas portuguesas.
Com exceção do último, tratou-se no fundamental de não mudar de rumo e não desperdiçar o que tinha sido atingido com tanto sacrifício.
3. Ora, é fácil verificar que, com exceção da recapitalização da Caixa, todas essas opções centrais do Governo do PS, que foram capitais para o seu êxito, foram tomadas e postas em execução contra a oposição dos parceiros da Geringonça, que repetidamente condenaram a preferência pela redução do défice em vez do aumento da despesa pública, propuseram reiteradamente a reversão das referidas reformas e se demarcaram das medidas de saneamento do setor bancário, salvo a Caixa (por ser pública).
Por conseguinte, os inegáveis méritos do Governo foram conseguidos apesar dos parceiros da Geringonça, e quase sempre contra eles.