quarta-feira, 22 de abril de 2020

Pandemia (11): E se refletíssemos sobre o voto eletrónico?

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1. Não é nada provável que a pandemia desapareça antes de haver vacina, que não se anuncia para breve. Ora, não se afigura ser conveniente realizar eleições com votação presencial antes disso, pelos riscos em que podem incorrer pessoas mais vulneráveis ao contágio (idosos, doentes), pelos inevitáveis ajuntamentos que ocorrem nas assembleias de voto, o que pode causar elevada abstenção nesses grupos.
Nessas circunstâncias, a alternativa a um possível adiamento das eleições para data indeterminada, prorrogando os mandatos cessantes, com a insegurança democrática que isso pode gerar, poderia ser a votação à distância para quem o desejar, seja por via postal, seja, preferencialmente  por via eletrónica (salvo nas eleições presidenciais, em que a Constituição exclui tais soluções no território nacional).

2. Sabem-se os argumentos contra uma tal solução, decorrentes da possível violação do segredo do voto em larga escala, da possibilidade de pressões de terceiras pessoas ou de compra de votos, assim como o risco para a integridade do processo eleitoral  (fraude ou atraso no voto postal, interferência externa no processo informático, etc.).
Em condições normais, essas objeções tendem para a rejeição da votação não presencial, salvo nas situações em que este pode ser difícil, como sucede entre nós com o voto dos cidadãos no estrangeiro, justificando o recurso ao voto postal, em vigor. A verdade, entretanto, é que há muitos países onde o voto eletrónico é utilizado sem grandes problemas (por exemplo, Estónia e vários estados federados dos Estados Unidos), seja em certas condições, seja como faculdade geral. Aliás, recentemente realizaram-se eleições por voto eletrónico numa entidade pública nacional, a Ordem dos Advogados.
Vale a pena, por isso, equacionar as hipóteses do e-voting, por ser user-friendly e ficar mais barato.

3. Há muita literatura disponível sobre o assunto e sobre as experiências existentes, e também já existe uma recomendação do Conselho da Europa sobre o voto eletrónico, o que quer dizer que ele não é proscrito pela organização europeia de defesa dos direitos humanos, da democracia e do Estado de direito.
Por isso, penso que a AR deveria solicitar à CNE um relatório sobre o assunto ou nomear uma comissão técnica para informar sobre ele, quanto aos aspetos técnicos e jurídicos. Just in case. Um legislador prudente deve saber as alternativas de que pode dispor.