Primeiro, numa economia de mercado, a única maneira de travar a inflação é por via da redução da procura agregada, elevando o custo do crédito para empresas e consumidores. O facto de, em grande parte, mas não exclusivamente, a inflação ser devida à subida do preço de bens importados, como a energia, não altera esse princípio: o seu preço também baixa com redução da procura.
Segundo, o BCE tem um mandato constitucional prioritário de assegurar a estabilidade dos preços, mantendo a inflação à volta de 2%, e as suas únicas armas são a subida das taxas de juro de referência e a restrição da oferta monetária. Aliás, nas economias desenvolvidas sujeitas e inflação elevada, o BCE foi o banco central que menos subiu os juros, tendo começado demasiado tarde.
Por conseguinte, não se pode dizer que o BCE esteja a atuar à margem do seu mandato ou a abusar dele.
2. A inflação elevada, neste momento perto dos 10% na UE (cinco vezes o valor de referência!), constitui o maior vírus numa eonomia de mercado: reduz o valor de salários e pensões, degrada as poupanças e desafia a propensão para poupar, desequilibra as relações entre devedores e credores, desvaloriza externamente a moeda, questiona a segurança dos contratos e a confiança na vida económica. Um flagelo.
Além de se deverem abster de criticar infundadamente o BCE, para efeitos de consumo político interno (a velha tática de imputar às instituiçoes da União o que corre mal internamente), os governos da zona euro deveriam também abster-se de políticas orçamentais incompatíveis com a luta contra a inflação, nomeadamente a subsidiação universal, direta ou indireta (por via de redução fiscal), de bens e serviços sujeitos a pressão inflacionista, como a energia.
Como tenho defendido deste o início (por exemplo, AQUI, AQUI e AQUI), os apoios sociais ao custo de vida devem limitar-se aos produtos essenciais e destinar-se somente aos setores sociais mais vulneráveis - o que, porém, não tem sido o caso.
Alimentar a procura e a inflação por via orçamental, contrariando a política monetária restritiva do BCE, apenas contribui para tornar esta mais dura e mais duradoura.
3. Outra lição que importa tirar é que, pelo menos em fases de política monetária restritiva, não pode haver margem para políticas orçamentais expansionistas a nível nacional, como se está a verificar em alguns Estados-membros, a começar pela Alemanha e pela Espanha, aproveitando a suspensão das regras orçamentais da União sobre os limites ao défice orçamental e à dívida pública, assim como sobre ajudas públicas.
Embora a França também tenha enveredado por um limite oficial à subida dos preços da energia (mas financiado por um imposto extra sobre as companhias energéticas), o ministro da Economia francês tem razão, quando afirma, criticando implicitamente o enorme pacote orçamental alemão, que «uma política monetária única não pode coabitar com políticas orçamentais nacionais divergentes».