1. Fui surpreendido com
esta informação de que a ADSE, o seguro de saúde oficial dos funcionários públicos
(lato sensu), também pode cobrir os professores do ensino básico e secundário privado e cooperativo,
o que estaria explicitamente referido na página oficial da ADSE. Sucede que não consegui encontrar a norma legal necessária para dar cobertura a essa solução (pois, sendo a ADSE uma entidade administrativa, ela só pode fazer aquilo que a lei prevê). Mas, mesmo que tal norma legal efetivamente exista, não vejo
como é que o estabelecimento de uma prerrogativa privativa a uma certa profissão pode ser considerado compatível com o princípio constitucional da igualdade e da não-discriminação (CRP, art. 13º).
2. Além disso, se, como tenho argumentado desde há muitos anos, existe uma incompatibilidade de partida entre a filosofia da ADSE e a do SNS, tal incompatibilidade torna-se ainda mais gritante, se a primeira for aberta a privados, deixando de obedecer a qualquer critério quanto aos seus beneficiários e ampliando o volume de pessoas que usufruem de um subsistema público de saúde paralelo ao SNS.
Aliás, não faria qualquer sentido que, enquanto exalta o seu compromisso com um SNS universal, igual e tendencialmente gratuito na prestação dos cuidados de saúde, um governo do PS alargasse a trabalhadores privados a cobertura da ADSE, a qual, não por acaso, é um modelo de prestação de cuidados de saúde justamente defendido por muitos adversários do SNS, e como alternativa a este.
Uma óbvia contradição!
Adenda
Um leitor argumenta que quanto mais gente houver na ADSE, a contribuir com 3,5% do seu salário (mais os copagamentos de cada ato) para pagar cuidados de saúde no setor privado, menos pressão haverá na procura do SNS, que é financiado pelo orçamento e pelos impostos gerais, pelo que, «no fundo, os ministros das Finanças e da Saúde devem saudar esse alargamento da ADSE». Não é hipótese verosímil, tratando-se de um Governo do PS, mas é caso para dizer, como Sancho Pança: "não acredito em bruxas, pero que las hay, las hay"...