segunda-feira, 1 de julho de 2024

Campos Elíseos (15): O erro de Macron

1. Não, não me refiro à convocação de eleições antecipadas depois do desastre eleitoral das eleições europeias. Penso que o Presidente não tinha alternativa senão a clarificação política, mesmo com o forte risco de nova vitória da direita radical: maior risco haveria em manter um governo moribundo, dando azo a uma provável moção de censura das oposições e uma quase certa vitória de Le Pen nas presidenciais de 2027 (a que Macron já não pode concorrer), seguida da dissolução parlamentar e de eleições em que a União Nacional obteria muito provavelmente uma maioria absoluta. Ou seja, Eliseu e Matignon nas suas mãos.

Assim, mesmo que a direita radical venha agora a constituir governo, sozinha ou em coligação com os Republicanos, o sistema semipresidencialista francês, em caso de "cohabitação", obriga a uma partilha das tarefas governativas e confere ao PR amplos poderes que limitam fortemente a liberdade de ação do governo. Além de presidir ao Conselho de Ministros, o PR nomeia certos titulares de elevados cargos públicos e tem a seu cargo a política externa, incluindo a política europeia (cabendo-lhe representar o país no Conselho Europeu). 

Do mal, o menos!

2. O erro de Macron vem desde a origem e consistiu em pensar que o sistema eleitoral francês - maioritário a duas voltas - podia sustentar duradouramente uma maioria parlamentar e um governo de centro, "nem-de-direita-nem-de-esquerda".

Ora, se os sistemas eleitorais maioritários em geral tendem a sub-representar os partidos do centro e a favorecer a bipolarização direita-esquerda, como mostra a história política britânica, tal tendência é muito mais acentuada no sistema francês, o qual na segunda volta (ou logo na primeira, como agora...) conduz à agregação de votos à esquerda e à direita, em prejuízo dos partidos centristas. De resto, a bipolarização política foi o principal desiderato do sistema eleitoral inventado pelo "gaullismo" em 1958.

Estas eleições apenas anteciparam o fim do "macronismo", que a maioria relativa de 2022 já havia enfraquecido irremediavelmente e que, de qualquer modo, não passaria de 2027. Produto conjuntural de circunstâncias políticas excecionais, em 2017, o "macronismo" não podia fugir à "lei de bronze" dos sistemas eleitorais maioritários.