sexta-feira, 15 de abril de 2005

Os espanhóis e outros medos

Brrr...

Correio dos leitores: Censura na RDP

«No passado dia 03 de Abril, como aliás acontece todos os domingos, tinha a telefonia ligada na Antena 1 para ouvir o programa "O Amor é", de Júlio Machado Vaz. Mas para minha grande surpresa e espanto, o programa que fora gravado na quarta-feira anterior, não foi emitido, e sem que fosse dada nenhuma explicação aos ouvintes.
(...) Alguém decidiu que, no dia seguinte ao da morte do papa, estava fora de questão dar tempo de antena a um tal Júlio Machado Vaz, um sujeito que se ocupa de um tema tão pecaminoso e diabólico como a sexualidade e, como se isso não bastasse, ainda tem o imperdoável defeito de ser um incorrigível livre pensador que não se coíbe de criticar publicamente a santa e madre Igreja.
O que se passou no dia 03 de Abril é de uma extrema gravidade, por configurar um acto censório de todo inadmissível e intolerável num Estado de Direito Democrático, ainda para mais num órgão de comunicação social pertencente ao Estado, Estado esse que tem a obrigação constitucionalmente consagrada de zelar pela garantia de isenção e de liberdade de expressão nos órgãos sob a sua tutela. Volvidos 31 anos sobre o 25 de Abril de 1974, que devolveu as liberdades essenciais aos portugueses, nunca imaginei que um distinto cidadão como Machado Vaz viesse a ser vítima da mordaça da censura. Machado Vaz não pede licença a ninguém para exprimir as suas ideias, atitude que muito aprecio e admiro e, por isso, tem toda a minha solidariedade sempre que for atingido por qualquer medida censória sejam quais forem as circunstâncias e as razões invocadas. (...)»

(Isabel Silva, Lisboa)

Adenda:
Este edificante episódio de subserviência vaticana da rádio pública encontra-se corroborado pelo próprio Júlio Machado Vaz no seu blogue Murcon. É grave demais para passar sem protesto. A Alta Autoridade, entretida com o "affair" Lusomundo, esteve distraída?

quinta-feira, 14 de abril de 2005

A Europa e um outro Timor: o Sahara Ocidental

No início de Março integrei uma delegação de parlamentares europeus que se alojaram nas tendas de familias refugiadas nos campos de Tindouf, no sul da Argélia, realizando como são incrivelmente básicas, durissimas, as condições de sobrevivência ali, no «hamada» - o deserto dos desertos. Mas nós ficamos quatro dias apenas, enquanto os refugiados e refugiadas ficaram lá, sem horizonte de saída.
A delegação constatou como era urgente que a UE reforçasse a ajuda humanitária, por estar iminente a ruptura do aprovisionamento alimentar. Felizmente a Comissão já lá enviou, entretanto, uma missão da ECHO para reavaliar as necessidades. Espero que ela resulte não apenas num aumento substancial da ajuda, que, há mais de 30 anos, é a principal fonte de subsistência dos cerca de 180.000 refugiados, mas também em agilizar o seu encaminhamento, respaldando a extraordinária organização das autoridades e do Crescente Vermelho sarauis e também aproveitando mais as ONGs europeias activas localmente.
Mas, na realidade, é premente trabalhar na UE para nos libertar de continuar, por muitos mais anos, a sentir a obrigação de acorrer às mais elementares necessidades dos saharauis - que, com grande dignidade, demonstram saber trabalhar e sustentar-se na maior penúria e nas mais inóspitas condições (e nesta resistência o papel das mulheres saharaouis merece especial admiração). Porque a verdade é que a ajuda humanitária seria dispensável, se os refugiados e as autoridades da RASD pudessem livremente regressar e retomar o controlo do seu território, ilegalmente ocupado por Marrocos.
A UE não pode resignar-se a continuar, através da ajuda aos refugiados, a apaziguar a má-consciencia da comunidade internacional e de alguns dos seus Estados-membros com particulares responsabilidades no processo obstruído de descolonização do Sahara Ocidental, em grosseira violação do direito internacional e dos direitos humanos em especial, incluindo o direito à auto-determinação do povo saharaui.
A UE tem de pressionar a urgência de uma solução política no processo que decorre sob a égide das Nações Unidas, desde o cessar-fogo acordado em 1991 e que deveria ter passado por um referendo a todos os saharauis, inicialmente previsto para Janeiro de 1992 e bloqueado desde então por Marrocos, com recurso aos mais irrazoáveis expedientes. Marrocos recusou sucessivamente todas as mais que contemporizadoras propostas feitas pelo Representante Especial do Secretário-Geral, o americano Sr. James Baker, levando-o inclusivamente a demitir-se em Junho de 2004, ao ver mais uma vez Rabat inviabilizar o chamado «Plano Baker». Plano que prevê um referendo com todos os saharauis e colonos marroquinos (!!!) no Sahara Ocidental , depois de mais alguns anos de ocupação. Plano que, apesar de tudo, a direcção política saharaui aceitou, na procura esforçada de uma solução para o conflito, apesar da tremenda dificuldade em explicar ao seu povo que a comunidade internacional o fazia sujeitar-se ainda a mais entorses aos seus mais inalienáveis direitos.
Os Estados-membros da UE não podem continuar a ignorar a questão política de fundo. Aqueles que têm assento no Conselho de Segurança têm de assumir as suas especiais responsabilidades, designadamente quando aí for, no final deste mês, apreciada a questão da renovação do mandato da MINURSO e da reactivação do processo com a eventual designação de um novo Representante Especial do SGNU.
A questão política de fundo diz directamente respeito à Europa e não apenas na vertente das responsabilidades históricas: estão em causa interesses europeus. Por um lado, o Sahara Ocidental poderia ser um importante fornecedor da Europa, se os seus fabulosos recursos naturais, em petróleo, fosfatos, pescas e outros pudessem ser legitimamente e sustentavelmente explorados. O que, obviamente, não acontece sob a ocupação ilegal marroquina, persistindo o conflito - como demonstra o recente abandono do território por parte de companhias petrolíferas estrangeiras que tentavam a prospecção.
Por outro lado, a própria segurança europeia está em causa - o Sahara Ocidental fica aqui ao lado e hoje já temos a obrigação de perceber os mecanismos de que se alimenta o terrorismo internacional. Pois, que incitamento se transmite as jovens gerações de saharauis, refugiados em Tindouf ou resistindo no Sahara ocupado, senão atirá-los para os braços dos radicais fundamentalistas, se a UE, os EUA, o mundo árabe e o resto da comunidade internacional lhes retiram o horizonte da resolução do conflito e os condenam ao desespero dos impotentes diante da injustiça, da violência, da humilhação e da destituição?
Se quer realmente ajudar o vizinho Marrocos, a UE precisa de fazer compreender a Rabat, urgentemente, que é também e sobretudo do interesse marroquino pôr fim ao conflito e à ocupação ilegal do Sahara Ocidental. Porque Marrocos poderá beneficiar extraordinariamente da boa-vizinhança e cooperação com uma RASD livre e soberana, tal como hoje a grande Indonésia beneficia com as excelentes relações que estabeleceu com a pequena República de Timor-Leste. E porque assim Marrocos (onde os focos de contaminação terrorista existem e já por várias vezes actuaram, desgraçadamente) estará também a remover adicionais fontes de ameaças à segurança do próprio povo e do Estado marroquino.

(Uma versão encurtada deste texto constituiu a minha intervenção hoje, em debate sobre o Sahara Ocidental, no Plenário do PE).

O interesse geral

Quem ainda tinha dúvidas sobre a mudança de estilo e de atitude governativa, seguramente as perdeu com a primeira entrevista televisiva de Sócrates, marcada pela clareza, a prudência e a determinação.
Não faltou sequer uma oportuna resposta directa aos pequenos assomos de reacção corporativa contra as primeiras medidas do Governo, por exemplo na liberalização da venda de medicamentos e no encurtamento das férias judiciais. Ficaram a saber, sem margem para equívocos, que os interesses de grupo não podem prevalecer sobre o interesse geral e que essas mudanças são mesmo para valer. Ainda bem!

A questão coimbrã

Em Coimbra lavra uma guerra de sondagens no PS a propósito das próximas eleições autárquicas. Nos paços do município, Carlos Encarnação só tem motivos para sorrir do contencioso no campo adversário...

Uma escola de ensino superior em cada município

O Presidente da República vetou os diplomas relativos a duas escolas de ensino superior (uma no Fundão e outra em Óbidos) que o governo de Santana Lopes tinha criado já depois da sua demissão. Durasse ele mais e ainda teríamos a criação da universidade de Arrobas-de-Cima...

Local ou nacional?

Subida dos preços dos transportes públicos. Simples actualização, tendo em conta a inflação e a subida do preço dos combustíveis. Mantém-se por isso o habitual e substancial défice, que o orçamento do Estado terá de cobrir.
Trata-se em geral de transportes públicos urbanos de Lisboa, portanto de âmbito local ou metropolitano. Mas por que é que há-de ser o Estado a suportar o défice de serviços públicos locais, que deveriam ser de responsabilidade municipal ou intermunicipal? Que sentido faz ser um ministro a lidar com os preços de transportes públicos locais?

quarta-feira, 13 de abril de 2005

Europa - politica externa e de segurança

A Estratégia Europeia de Segurança desafia-nos a reflectir sobre o papel da União na governação mundial. Os relatórios dos Srs. Brock e Kuhne dão uma excelente contribuição para responder ao desafio.
Para serem eficazes e coerentes, as Políticas Externa e de Defesa e Segurança europeias têm de colocar o cidadão no centro, promovendo os direitos humanos, o direito internacional e humanitário e o multilateralismo nas relações internacionais. Isto é, têm de ancorar-se no conceito de Segurança Humana, como sublinha o relatório Kuhne, na linha do importante relatório de Barcelona sobre a 'Doutrina de Segurança Humana' .
Isto é tanto mais relevante quanto a luta contra a proliferação de armas de destruição maciça e contra o terrorismo terão de continuar a ser as preocupações prioritárias da Europa em matéria de segurança.
Temos de integrar estas preocupações em todas as dimensões das relações externas da União, designadamente na Nova Política de Vizinhança. E nesta perspectiva, a União precisa de ter assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, como hoje reconheceram o Sr. Brock e a Comissária Ferrero-Waldner.
A União deve trabalhar para o fortalecimento e universalização dos tratados de não-proliferação e de destruição de arsenais nucleares e para um controlo mais apertado das exportações de material nuclear e de armamento em geral.
A União precisa também de assegurar uma estreita concertação do plano de acção europeu de combate ao terrorismo com as políticas Externa e de Segurança e Defesa. Num esforço integrado com a Estratégia global de combate ao terrorismo, recentemente enunciada por Kofi Annan.
Isto implica cumprir os compromissos de desenvolvimento assumidos pelos governos europeus na Declaração do Milénio: a pobreza e a injustiça são terrenos férteis para o terrorismo.
Para uma Política de Segurança e Defesa que se traduza em mais independência estratégica da Europa, com mais capacidades e mais integração dos meios de defesa e um verdadeiro mercado interno, precisamos que a Agência Europeia de Defesa informe os debates sobre políticas de aquisição, desenvolvimento e investigação de equipamento. Cabe aos Estados-membros dar condições de funcionamento a esta nova Agência.
As próximas perspectivas financeiras devem demonstrar que os nossos governos se empenham na Estratégia Europeia de Segurança, pois o sucesso dela depende, em grande medida, dos recursos postos à sua disposição na União.
Na semana passada em Sarajevo eu estive, tal como o Sr. Von Wogau e outros parlamentares, com o General britânico orgulhoso de comandar a EUFOR, dispensando até insígnias nacionais. Mais me convenci de que, se há 15 anos tivesse já Política Externa comum e Política de Segurança e Defesa, a Europa poderia ter evitado ou travado mais cedo a guerra na ex-Jugoslávia. Hoje, a importante missão ALTHEA na Bósnia-Herzegovina é prova de que a Europa é capaz e de que, com os meios adequados, a União pode e deve assumir mais responsabilidade na segurança europeia e global.

(Intervenção no Plenário do PE, debate sobre PESC e PESD, 13.4.2005)

O alerta de um «sage»

«Um não à Constituição, como parece querer, segundo sondagens recentes, a maioria dos franceses, faria correr à União um tremendo risco de desintegração. Não seria apenas uma paragem. Seria um imenso recuo, que só podem desejar aqueles que sempre sonharam com uma Europa que fosse um mero espaço de livre câmbio, um mercado único alargado e competitivo, mas nada mais do que isso. Seria o fim da Europa política, social e com uma entranhada cultura ecológica. Pior do que isso: seria o fim da União como «potência mundial» capaz de equilibrar as relações euro-americanas e de resistir às pretensões do hegemonismo imperial, que vê a ONU como um empecilho. Os "falcões" que aconselham Bush, seguramente, agradeciam!»
(Mário Soares, A Capital)

terça-feira, 12 de abril de 2005

Correio dos leitores: Mudar de fornecedor de Internet

«Sim!... Pode haver casos em que consiga resolver o problema em dois meses.
Mas se tiver uma ligação sapo conte com bastante mais tempo. Gozam - positivamente - com a pessoa. Escrevem-se cartas, perde-se uma infinidade de tempo ao telefone, usam estratagemas dilatórios (do tipo, passar as chamadas uns para os outros, fazendo uns o papel dos compreensivos, outros o de ignorantes e outros o de que vão tratar já do assunto), fazem tudo e mais alguma coisa. Pense em quatro meses, para não desesperar a meio.»

Henrique George

Correio dos leitores: As demoras da PT

«O seu post [sobre a burocracia no ADSL] demonstra muito desconhecimento, o que é normal, pois não é a sua área. Para quem trabalha num operador concorrente da PT é o dia a dia... A PT recusa os processos como quer e quando quer, sem dar cavaco. Muitas vezes, o processo é recusado, voltamos a enviar tal e qual como na primeira vez e passa. E é preciso recordar que a PT tem 19 dias para responder. Se ao fim de 19 disser que há um erro - e não tem que dar grandes justificações - ganha mais 19 dias.
Depois da PT dar o OK, o processo é rápido... mas PT e rápido são duas palavras que não fazem sentido na mesma frase.»

Pedro Sousa

Correio dos leitores: Coutada da PT

«(...) O mercado das telecomunicações continua a ser uma coutada da PT, não tenhamos ilusões. Que qualidade de serviço e que eficiência se pode esperar de uma empresa, quando se trata de perder um seu cliente e ajudar a passá-lo para a concorrência???
Neste mercado, e especialmente no que diz respeito à Internet passam-se anomalias de tal forma estranhas, que sendo tornadas públicas, com alguma visibilidade, elas dariam a volta ao estômago a muito bom consumidor...
Outro caso dramático em que eu sou ainda alvo do estado da situação é o facto da minha área de residência (na periferia de Lisboa, a menos de 20Kms) não possuir concorrência à PT com meios próprios (o cobre é da PT Comunicações, e o cabo é da TVCabo). E o mais grave, no meu entender, é que pelo facto de a empresa de cabo que trabalha na minha zona pertencer ao grupo PT, ela própria é obrigada a NÃO disponibilizar serviço de voz sobre IP, da mesma forma que a Cabovisão e outras empresas concorrentes o fazem, mas em outras zonas geográficas. Ou seja, a oferta integrada de Canais TV, Internet e Voz é pura e simplesmente inexistente.......
Sinceramente, muito me agradaria assistir a uma ANACOM/ICP/whatever forte, que efectivamente regulasse o mercado, imprimindo condições de concorrência nos ainda imensos buracos negros que a PT vai explorando. Infelizmente o que tenho assistido é precisamente o contrário. Tenho visto precisamente o contrário, accionistas da PT a «mandar calar» a Anacom, ou o seu presidente. (...)»

Carlos Queirós

2 Mb/s?

Será que vamos mesmo dispor de ligações ADSL a 2 Mb/s sem aumento de preço, como pretende a PT? Ou será que a salvaguarda dos direitos dos concorrentes com necessidades especiais falará mais forte? Eis um caso típico - tal como o da pretensão do operador histórico em incluir na assinatura chamadas gratuitas ao fim-de-semana - de potencial dissonância entre os interesses (imediatos) dos consumidores e os dos operadores alternativos. Não está fácil a vida dos agentes de mercado, reguladores incluídos.

Livro de reclamações

Eis o que fiquei a saber se quiser mudar de fornecedor de Internet:
«Quanto tempo demora a activação do Serviço xxx ADSL xxx?
A activação é um serviço prestado pela PT ao xxx e pode demorar até 2 meses, após a data de recepção da documentação por si enviada e posterior validação:
Contrato assinado
Cópia do BI
Denúncia do contrato PT assinado pelo titular da linha telefónica.»
Ora aí está: até dois meses de demora! E pensar que estamos a tratar com empresas privadas de ponta! Julgávamos nós que só havia a burocracia pública!

segunda-feira, 11 de abril de 2005

Conhecer o passado autoritário

Ensinam os especialistas sobre transição democrática que uma das diferenças entre os processos de democratização por ruptura, como a portuguesa, e os de democratização por evolução pactuada, como a espanhola, é o modo de lidar com o passado autoritário, havendo em regra investigação, depuração ("lustration") e punição dos responsáveis no primeiro caso, e esquecimento do passado e amnistia geral dos culpados no segundo. Por isso entre nós houve um "livro negro do fascismo", enquanto a pertença à antiga polícia política da ditadura foi considerada crime, havendo mesmo uma disposição expressa da Constituição sobre o assunto.
Eis senão quando se fica a saber que uma loja maçónica -- que depois da revolução ocupou as antigas instalações do Grémio Lusitano que a Legião Portuguesa tinha feito suas -- reteve em segredo durante estas três décadas uma lista oficial de milhares de funcionários e informadores da PIDE-DGS. Nunca é tarde para surpresas na história das revoluções!

Alta velocidade

Era certo e sabido. As nossas elites intelectuais aguardavam ansiosamente a constituição da primeira task force governamental para cravarem um ferro comprido no lombo do governo. Com o desdém que o trabalho colectivo lhes merece (porque não conhecem a forma de funcionar dos japoneses, dos americanos ou dos alemães) e a reputação ultra-dialogante dos executivos socialistas, a constituição de um grupo de trabalho para reanálise do projecto TGV caiu-lhes que nem ginjas.

Bem sei que as memórias de hoje são voláteis e que o povo vibrante reclama por mais acção e menos reflexão. Mas haja decência e bom-senso. O projecto TGV esteve literalmente parado durante quase três anos, à pala da obsessão orçamental e da opção populista de Durão Barroso ("sem hospitais, não haverá TGV"), enquanto nuestros hermanos prosseguiam a alta velocidade no desenvolvimento do seu projecto, indiferentes às hesitações lusitanas.

Durante o breve consulado de Santana Lopes, António Mexia entendeu por bem dar mostras de algum dinamismo sobre a matéria e patrocinou um estudo à la minute sobre a ligação Lisboa-Porto, do qual resultou uma solução ladina. À boa maneira portuguesa, do género nem carne nem peixe, os autores do estudo propunham uma mistura de alta com média velocidade, numa fórmula bi-bitola que só a irrequietude avançada de Mexia conseguia atingir. Sobre as restantes implicações do projecto - minudências como o ritmo de avanço do traçado, a localização das plataformas inter-viárias, a terceira travessia do Tejo ou o novo aeroporto -, pouco mais que menções genéricas.

Ai, estes complacentes socialistas que se propõem perder três meses a estudar um assunto que tanto avançou nos últimos três anos!

Vantagens da democracia representativa

Em eleições directas, Marques Mendes teria ganho a liderança do PSD a Menezes? Ou a Santana Lopes?

Penetralho

algumas surpresas na direcção de Marques Mendes. A "nova direita" toma posições dentro da "social-democracia"?
(Corrigido)

Taxas de IVA e justiça social

Reiterando uma opinião já várias vezes expressa por si mesmo, o economista Miguel Beleza manifesta de novo a sua preocupação com a situação financeira e volta a defender que a contenção do défice orçamental exige o aumento da receita fiscal (não bastando a acção do lado da despesa), preconizando desde logo a abolição das taxas reduzidas do IVA, as quais beneficiam certos produtos (alimentação, medicamentos, etc.) independentemente do nível rendimento de quem os consome.
É evidente que isso traria uma considerável receita fiscal adicional, dado o grande volume das despesas sociais nesses produtos. O problema está em que tais despesas pesam relativamente mais nos baixos rendimentos, pelo que a uniformização do IVA, subindo as taxas mais baixas, afectaria mais severamente a situação dos menos abonados e redundaria num agravamento da regressividade implícita nos impostos indirectos. Como o próprio M. Beleza admite, uma tal mudança tornaria necessária uma compensação financeira em benefício pelo menos dos mais pobres, dando com uma mão o que se tirou com a outra. Ainda assim, para além da inerente simplificação fiscal do IVA, o saldo financeiro da uniformização de taxas poderia ser muito favorável para as contas públicas.
É de duvidar, porém, que o Governo vá trilhar essa via, dados os seus efeitos sociais negativos. Resta saber onde poderá ir buscar mais receitas...

domingo, 10 de abril de 2005

Livro de reclamações

À saída de Coimbra, no sentido sul, existem indicações rodoviárias anunciando a direcção de Tomar, juntamente com a indicação "IC 3". Afinal, a tal via rápida só aparece 75 Km depois, já às portas da cidade dos Templários; até lá é uma velha estrada estreita e congestionada, quase permanentemente entre povoações, com limite de velocidade 50 Km hora. Uma verdadeira fraude, a tal indicação rodoviária. Quanto à IC 3, tudo indica que ela vai continuar a ser durante muito tempo uma simples miragem para incautos. Em vez de construir as estradas que faltam, o Governo prefere continuar a gastar milhões para manter as SCUT gratuitas...

Venha o próximo

O novo líder do PSD sai claramente enfraquecido do Congresso, onde as coisas lhe correram mal, sem conseguir agarrar o Partido, terminando com uma votação muito abaixo do esperado, e saindo sob permanente ameaça dos fantasmas de Santana Lopes, que deixou saber que vai continuar "por aí", e do grupo de António Borges, que não escondeu a sua vontade de vir a assumir a liderança no futuro. Um líder de transição e a prazo, portanto.

Correio dos leitores: Separação de poderes

«Também a mim me chocaram um pouco as palavras dirigidas ao governo pelo Sr Presidente do STJ na sua tomada de posse. Não só pelo tom com que parecem ter sido proferidas, mas especialmente porque me suscitou uma dúvida específica: não estará o Presidente do STJ no limiar de uma violação ao princípio constitucional da separação de poderes? Isto porque se o princípio da separação de poderes impede elementos do Executivo de intervirem em actos do foro judicial, que legitimidade têm elementos do Sistema Judicial de intervirem, enquanto tais (e não enquanto meros cidadãos), em decisões governamentais? Seria bom que os juizes portugueses se preocupassem mais com a aplicação das leis vigentes, e menos com a aplicabilidade de leis eventuais.»
(A. Santos Campos)

sábado, 9 de abril de 2005

Crítica e desconhecimento

Na sua crítica de hoje ao Ministro da Saúde, a propósito da mudança da forma jurídica dos hospitais-empresa, J. Manuel Fernandes, em editorial do Público (disponível online só para assinantes), reincide nos erros que ontem já aqui foram assinalados ao Diário Económico, e insiste também na ideia de que o ministro teria admitido a participação de capital privado nos novos "hospitais EPE" (entes públicos empresariais) resultantes da transformação dos actuais "hospitais SA".
Ora, essa suposta hipótese, já devidamente desmentida pelo ministro, era totalmente inverosímil -- pois excluída pela própria natureza dos EPE --, pelo que não podia ter sido acriticamente admitida por qualquer jornal responsável.

Grande gabador, pouco fazedor

Saiba porquê na Aba da Causa

sexta-feira, 8 de abril de 2005

Pequenos grandes passos

Entre as medidas ontem anunciadas pelo Ministério da Saúde conta-se a fusão dos respectivos serviços sociais com os da Presidência do Conselho de Ministros. E por que não fundir todos os serviços sociais dos diferentes ministérios num único organismo (como sugeriu a ECORDEP em 2001)?
Além de permitir uma uniformização de regimes, pondo fim a alguns privilégios indevidos de alguns ministérios (por exemplo, do Ministério da Justiça), haveria várias outras vantagens. O que se não pouparia, por exemplo, em gastos de administração e gestão, na racionalização dos meios disponíveis e no melhor aproveitamento das capacidades instaladas?

Um bom teste

Na sua tomada de posse o novo presidente do Supremo Tribunal de Justiça condenou o projecto de redução das férias judiciais e ameaçou o Governo de estar a "comprar uma guerra". Uma tal linguagem e atitude, mais próprias de dirigente sindical do que de presidente do STJ, constituem um claro desafio à autoridade do Governo . Trata-se portanto de uma excelente prova de fogo para a vontade política do Ministro da Justiça e do Primeiro-Ministro na sua anunciada determinação de acabar com privilégiuos e combater os grupos de interesse corporativos. Um teste de firmeza: fraquejar aqui seria uma receita para perder todas as batalhas subsequentes.

Criticar por criticar

Criticando a transformação dos "hospitais SA" em "hospitais EPE", o editorial de hoje do Diário Económico comete duas incorrecções incompreensíveis.
Primeiro, afirma que foi o próprio Correio de Campos que criou o primeiro hospital SA, na sua anterior passagem pela pasta da saúde. Mas tal não é verdade. Foi ele, sim, quem preconizou a empresarialização dos hospitais públicos, mas no formato EPE, a que agora regressa.
Segundo, sustenta-se que o pessoal dos hospitais EPE se rege pelo Direito Administrativo, diferentemente do pessoal dos hospitais SA, que se rege pelo Código do Trabalho. Também não é assim, pois não existe nenhuma diferença quanto a esse ponto entre as duas figuras que as empresas públicas podem revestir. O que vale nas relações de emprego é o contrato de trabalho em ambos os casos.
Pode-se naturalmente duvidar da necessidade da mudança da actual forma jurídica dos hospitais-empresa. Mas por vezes a vontade de criticar por criticar dá asneira.

Delivering the goods

O Governo Sócrates começa a dar conta do seu programa de governo. Acaba de ser aprovada a proposta de lei para a limitação do tempo de exercício consecutivo de mandatos executivos, com um máximo de 12 anos. A proposta abrange todos chefes dos órgãos políticos executivos, desde os presidentes de junta de freguesia até ao primeiro-ministro. Mas deixa de fora os demais membros de tais órgãos (por exemplo, vereadores ou ministros) e, na falta de norma em contrário, o tempo só começará a contar a partir da nova lei (por isso, em termos jurídicos, diferentemente do que alguns concluíram inadvertidamente, Alberto João Jardim ainda terá mais 12 anos disponíveis, se não tiver vergonha nenhuma...). Mesmo assim, um grande passo na melhoria das regras democráticas entre nós.

Crassa ignorância

Segundo o seu "testamento", o papa João Paulo II terá considerado em certa altura a hipótese de renunciar. Recorreu a uma frase bíblica (cântico de Simeão), que reza assim: «Nunc dimittis servum tuum, Domine (...) in pace»Agora, Senhor, deixa partir este teu servo em paz»]. Pois um ignorante locutor de uma televisão nacional traduziu essa frase por «Nunca te demitas»! É evidente, não é? "Nunc" só poderia significar "nunca"! Pois não é verdade que o Português veio do Latim!?

Homenagem

Alocução de Raimundo Narciso na homenagem a José Barros Moura. Uma justa evocação.