sábado, 11 de março de 2006

Discurso presidencial (4)

Um dos pontos mais controversos do discurso presidencial é seguramente o que diz respeito à estabilidade política, que parecia um dos pontos adquiridos do pensamento político de Cavaco Silva. Introduzindo algumas nuances assaz equívocas, o novo inquilino de Belém negou à estabilidade política um valor em si mesma (reduzindo-a ao estatuto de "condição") e falou numa indefinida noção de "estabilidade dinâmica", em contraponto com uma indesejada "estabilidade estática".
Ora, numa democracia consolidada, a estabilidade política é um valor em si mesma, sem prejuízo de ocasionalmente poder ter de ceder perante valores mais altos, como o regular funcionamento das instituições ou a dignidade do poder político.
Com esta inesperada tergiversação acerca da própria valia da estabilidade política, o Presidente introduziu, ele mesmo, um óbvio factor de instabilidade, que não pode deixar de ter sido deliberado. Somente um "lip service" prestado aos seus mais impacientes apoiantes à direita, ou também um aviso à navegação governativa?

Discurso presidencial (3)

À tradicional expressão de "Presidente de todos os portugueses" (em relação à qual somente os abencerragens da monarquia se podem sentir desconfortáveis), o novo Presidente acrescentou a ideia de "Presidente de Portugal inteiro", o que é uma feliz fórmula para sublinhar a unidade e a coesão social e territorial do País, sem discriminações nem exclusões sociais ou territoriais.

Discurso presidencial (2)

O principal equívoco na concepção presidencial de Cavaco Silva é o de que o Presidente tem o poder e o dever de se associar ao Governo (ou de chamar o Governo a associar-se a si) na prossecução em comum de certos objectivos políticos, aliás muito vastos. Daí a ideia inovadora de "cooperação estratégica" e de "trabalho em comum".
Ora, essa concepção não se afigura facilmente compatível com duas ideias que são básicas no desenho constitucional da figura e do papel presidencial. Primeiro, a função essencial do Presidente é a de moderador, árbitro e fiscal do funcionamento das instituições e da actividade governativa; segundo, o Presidente não é politicamente reponsável perante ninguém, diferentemente do Governo, que é responsável perante o Parlamento, na base do seu programa de governo. Daí que, em vez de uma associação ou intromissão na área governativa, o PR deve resguardar-se e manter um prudente distanciamento em relação ao Governo.
No momento em que um Governo possa queixar-se com razão de que não pode levar a cabo o seu programa de governo por efeito de indevida interferência presidencial, ou de que se vê forçado a cumprir uma agenda política diferente da sua, então dificilmente se pode sustentar que está a ser observada a separação de poderes, que é a chave da democracia constitucional.

Discurso presidencial

Sem prejuízo do que fica dito no post anterior, o primeiro discurso do novo Presidente da República, em geral bem construído e bem escrito, contém muitas mensagens que não poderiam ser mais certeiras nem mais oportunas. Entre elas destaco especialmente duas: a necessidade de atalhar a corrupção e a chamada de atenção para a responsabilidade individual e social na resolução dos problemas colectivos, em vez de em tudo apelar para o Estado.

Intervencionismo presidencial

Bem pode o Governo assobiar para o ar (que é, aliás, o mais inteligente, nas circunstâncias...). Mas o discurso da posse do novo Presidente da República não anuncia uma vida fácil nas relações do Governo com Belém. Quando o PR assume uma inequívoca agenda governativa -- e, para além de vários avisos à governação, o seu discurso é essencialmente um programa político de incidência governativa, mesmo se em boa parte coincidente com o do actual Governo --, as hipóteses de intervencionismo presidencial só podem crescer.

quinta-feira, 9 de março de 2006

segunda-feira, 6 de março de 2006

Por atacado

Se tivesse de classificar o desempenho presidencial de Jorge Sampaio, dar-lhe-ia uma nota elevada, pela seriedade, empenho, sensibilidade e equilíbrio com que exerceu o seu mandato. Mas esta corrida contra-relógio para condecorar meio mundo à última da hora não acrescenta nada ao seu currículo presidencial, nem honra os agraciados. Pelo contrário.

Motivos de preocupação

Na sua primeira entrevista desde a eleição, curiosamente dada a um jornal de direita espanhol, o novo Presidente da República defende duas posições que nem por não serem inesperadas são menos controversas: uma, relativa à "constituição europeia", que ele considera insusceptível de ser "ressuscitada" (embora se refira ao momento presente); outra, relativa à centralização do País, que seria uma prova da sua unidade e homogeneidade.

Cerimónia de estadão

Segundo a imprensa são 2000 (dois mil) os convidados para a cerimónia festiva do dia da tomada de posse do Presidente eleito, Cavaco Silva. O mínimo que se pode dizer é que o novo Presidente não quer que haja motivos para que o início do seu mandato possa passar despercebido.

sexta-feira, 3 de março de 2006

Receios infundados

Subitamente, há quem tenha descoberto que a nova entidade reguladora dos média, aprovada pelo PS e pelo PSD, possa vir a ser um instrumento de controlo político da informação e dos jornalistas. Mas a insinuação não faz sentido. Os fins da ERC são os previstos na Constituição, aliás muito semelhantes aos da sua predecessora, a AACS. Os meios de inspecção que a lei agora coloca à sua disposição só podem ser usados ao serviço dos referidos fins, sob pena de ilegalidade. Trata-se de um príncípio elementar de direito administrativo num Estado de Direito. Há acusações que, de tão graves, deveriam ser melhor fundamentadas.

O ataque ao Estado social

O Prof. João Cardoso Rosas mostrava ontem na sua coluna do Diário Económico por que é que o discurso ultraliberal contra o Estado social não procede.
Tem razão em especial quando recorda que o Estado social europeu é fruto de um compromisso entre a esquerda e a democracia cristã, não sendo um produto exclusivo da primeira. Já não tem toda a razão no caso português, quando sugere igual contribuição da esquerda e da direita. Basta recordar duas importantes peças do nosso Estado social: (i) o serviço nacional de saúde, criado por um governo PS, que um governo da AD tentou revogar em 1983 (tentativa abortada pelo Tribunal Constitucional); (ii) o rendimento mínimo garantido, criado por um governo PS com a oposição do PSD e do CDS. Isto para não falar de muitos dos actuais traços do sistema de segurança social e dos direitos dos trabalhadores.

quinta-feira, 2 de março de 2006

Descentralização e território

Segundo a notícia de ontem no Diário Económico, o Governo decidiu que as associações de municípios para fins de descentralização de novos poderes públicos terão como circunscrição territorial as NUT III, desde há muito estabelecidas (28 no território do Continente). Resta saber se uma associação pode ou não abarcar mais do que uma NUT III.
Fica assim traçado finalmente o destino das "áreas metropolitanas" e "comunidades intermunicipais" criadas no Governo Durão Barroso, cuja principal característica era a liberdade de agregação municipal, sem ser obrigatório sequer respeitar os limites das NUT II, muito menos as NUT III, para além de se preverem diferentes tipos de associações conforme a sua população e o número de municípios envolvidos. A nova reforma é muito mais "cartesiana" e homogénea. Uma escolha bem mais racional.

Sem utentes não há serviços

Não são somente as escolas que vão sendo tornadas dispensáveis por falta de "clientes" em certas regiões do país. Naturalmente isso também sucede com as maternidades. Nada melhor do que um estudo técnico para legitimir as decisões políticas que de outro modo seriam imediatamente contestáveis. Estamos a dar-nos conta tardiamente de que a baixa demográfica e a concentração urbana implicam um ordenamento da rede dos serviços públicos (escolas, serviços de saúde, tribunais, etc.).

quarta-feira, 1 de março de 2006

Incoerência

A razão invocada pelo PSD para não discutir a reforma do sistema eleitoral para a AR é inteiramente inconvincente. É evidente que reformas dessas só se fazem bem longe de eleições.
Pela mesma razão será que o PSD vai vetar indefinidamente o agendamento de todas as reformas políticas que dependam do seu voto? Mas não é Marques Mendes que tem andado a reclamar um "pacto de regime" com o PS sobre a justiça e outras matérias essencialmente políticas? Onde pára a coerência?

A invasão

Os mortos são agora às centenas por semana, o perigo de guerra civil religiosa nunca foi tão grande, a unidade do país corre cada vez mais riscos, as condições de vida continuam a degradar-se. É este o Iraque que, três anos depois, a ocupação norte-americana gerou. A ideia de uma democracia iraquiana é tão mirífica quão falso era o pretexto das armas de destruição maciça que "justificou" a invasão.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2006

Bibliotecas pagas, já!

O CDS-PP acha que nenhum serviço público deve ser gratuito, a começar pelo SNS. Assim, devem começar a ser pagos os seguintes serviços e equipamentos públicos, actualmente gratuitos: escolas do ensino básico, bibliotecas públicas, parques públicos, serviço de bombeiros, ruas e praças, etc. Quem quer serviços, paga-os!

Azul a Cores, até 12 de Março no Trindade


Obrigatório. Reservas e infos aqui.

Uma vergonha

Segundo os dados agora divulgados pela União Interparlamentar acerca da percentagem de mulheres nos parlamentos nacionais, Portugal ocupa o 43º lugar, com pouco mais de 20% de deputadas, a par do Paquistão, um país muçulmano. Uma vergonha, que o pior exemplo do Reino Unido, da França e da Itália (para não falar nos Estados Unidos) em pouco diminui!
Para quando a implemetação legislativa do preceito constitucional que obriga a tomar medidas de promoção da igualdade entre homens e mulheres no acesso a cargos políticos?

Envelhecimento

As projecções neste relatório sobre o envelhecimento da população da UE não podem ser mais explícitas quanto ao seu impacto no aumento exponencial das despesas de saúde, de segurança social e de cuidados continuados nas próximas décadas. Não basta por isso aumentar a idade de reforma e contrariar as reformas antecipadas, embora isso seja incontornável. É necessário também rever o cálculo das pensões de reforma e repensar os meios de financiamento dos cuidados de saúde e dos cuidados continuados.
É perante relatórios e alertas como deste que as resistências que foram movidas no ano passado entre nós contra o aumento da idade de reforma no sector público e contra a eliminação dos regimes especiais de segurança social e da saúde soam particularmente irresponáveis.

Correio dos leitores: Processo casa Pia

«Parece que qualquer coisa que apareça que possa vir a fazer alguma luz sobre o que está por detrás do "processo Casa Pia" vai parar às mãos da justiça (ou "justiça") para não mais de lá sair, e salvaguardar que se possa vir a saber qualquer coisa que possa comprometer alguém.
Agora foi este "raid" às instalações do jornal "24 horas", para subtrair (digo, apreender...) algo que possa ter elementos comprometedores. Há quase 2 anos foi aquela decisão vergonhosa do tribunal cível de Lisboa, que deferiu, com um despacho inenarrável, uma providência cautelar que impediu o jornal "O Independente" de publicar o conteúdo das cassetes alegadamente furtadas da redacção do "Correio da Manhã", mas que depois foram lá apreendidas por outro tribunal, nunca mais se sabendo o que foi feito delas?
Não seria altura de alguém perguntar o que se passa? Por que razão a "justiça" é tão lesta em retirar da circulação tudo o que possa ter a ver com aquele caso? Que haverá a esconder de tão comprometedor? Será que havia mesmo uma cabala por detrás daquilo, com alvos bem definidos? (...) Perguntas que, acredito, grande parte da opinião pública gostaria de ver respondid... verá?»

Carlos Brighton

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2006

Estrada larga

O Governo espanhol movimenta-se para tentar impedir o sucesso da oferta de compra da E-On alemã sobre a Endesa. O Governo francês acaba de promover a fusão da Gaz de France, pública, com a Suez, privada, ostensivamente para atalhar preventivamente a uma prevista OPA da ENEL italiana sobre a segunda.
Por essa Europa fora, apesar do "mercado interno", a energia continua a ser uma questão de Estado, com os governos a tentarem preservar um espaço de decisão nacional nessa matéria. Em Portugal, porém, o Governo decidiu vender mais uma fatia da EDP, tornando-a mais vulnerável a uma compra estrangeira, e iniciar a privatização da própria REN, detentora das redes de electricidade e de gás natural. A necessidade de realizar fundos para combater o défice orçamental vale tudo?

O teste de Alhandra

Estando agora cientificamente confirmado que a co-incineração é um método inteiramente fiável de eliminação de resíduos industriais perigosos (RIP) e que todas as cimenteiras portuguesas estão em condições de proceder a essa eliminação, então o Governo deve empenhar-se imediatamente em desencadear o processo na cimenteira de Alhandra, que aliás é a que fica mais perto dos principais centros industriais produtores de RIP (com as inerentes poupanças no transporte), pondo fim ao selectivismo politicamente motivado que levou inicialmente a escolher Souselas (Coimbra) e Maceira (Leiria), depois substituída pelo Outão (Setúbel), poupando sempre a cimenteira de Lisboa.
É um teste de credibilidade e de isenção política.

Obscenidade

É quase obscena a generalizada (louvem-se algumas excepções) tentativa de "compreensão" e de quase desculpa do horrendo e cobarde crime cometido por 14 jovens, assassinando a pontapé, à pedrada e a golpes de sevícias sexuais um pobre, desabrigado e desamparado travesti no Porto. Até o Ministério Públivo se absteve de os acusar pelo crime de homicídio, como se os autores não tivessem ao menos conciência de que ao abandoná-lo, como o fizeram depois das selvagens agressões, lhe iam causar a morte.
Há duas perguntas que ficam no ar: a leniência dos média seria a mesma, se a vítima não fosse um travesti? e também seria a mesma, se os autores não estivessem a cargo de uma instituição da igreja católica?

Correio dos leitores: Ainda a flçoresta

«(...) O aparecimento dos povoamentos puros de pinheiro manso no interior do Alentejo e do Algarve ficou a dever-se à grande adesão aos programas de apoio à florestação, financiados pela UE, por parte produtores florestais privados. Esses povoamentos jovens de pinheiro manso já estão a produzir os referidos bens indirectos com o melhoramento das características dos solos "esqueléticos" por acção da mineralização da "caruma" (que é lenta e por isso também tem um efeito de protecção física do solo e aumenta a taxa de infiltração por diminuir a velocidade de escorrimento da água) que ao aumentar os teores em matéria orgânica no solo, aumenta a sua capacidade de armazenamento de água e a sua fertilidade. As condições ecológicas criadas permitem agora a regeneração natural das quercíneas (sobreiro ou azinheira) sob coberto, cujas sementes estão a ser disseminadas pelas aves silvestres (pombos bravos, gaios, etc.) e mamíferos (javalis, etc.) que começaram a utilizar estas áreas como abrigo. Basta agora definir os objectivos estratégicos para estas áreas e adequar a gestão dos povoamentos de forma a atingir esses objectivos. A minha proposta (baseada no conhecimento do terreno) vai no sentido de iniciar um programa de desbastes visando a conversão dos pinhais em azinhais ou sobreirais sem no entanto alterar o grau de cobertura da área de projecção horizontal das copas (para manter a protecção dos solos que são muito sensíveis). Assim, utiliza-se o pinheiro como espécie precursora e a prazo (de 20 a 50 anos) obtém-se a unidade ecológica funcional adequada com as valias do uso múltiplo referidas pelo leitor Pedro Bravo. Até lá, devido às melhores condições, é esperado que os melhores arbustos melíferos vão ocupando gradualmente o seu lugar permitindo a apicultura.(...)»
Nuno de Almeida Ribeiro

domingo, 26 de fevereiro de 2006

Ainda irão?

Já está na ABA DA CAUSA o meu artigo, sob o título acima, a propósito do actual braço-de ferro com o Irão, que foi publicado na última edição do COURRIER INTERNACIONAL (24.2.06).

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2006

A palavra dos outros: a negação do holocausto

«It is hard to see what the Austrian court's sentence [contra David Irving] can add to that. Keeping Mr Irving in jail at most may stop him going to a conference that Mr Ahmadinejad is convening to ?rewrite and revise? the history of the holocaust. But against that small plus are two big minuses. One is that the sentence makes Mr Irving look a martyr. The other is that it makes the West look hypocritical: all too willing to bruise Muslim feelings, while protecting Jewish ones by law.
Laws against holocaust denial (which 14 countries have) were never a good idea. The best defence against neo-Nazis is reason and ridicule, not the criminal law. But at a time when the western world is battling to defend free speech against religious zealotry, they look particularly indefensible. It is punishment enough for Mr Irving that he has lost his professional credibility. He should not lose his liberty too.»

(The Economist, 23 Fevereiro de 2006)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2006

Convicção serena

Da bancada da "sala do senado" do palácio de São Bento, durante uma audição promovida pelo grupo parlamentar do PS sobre a "escola a tempo inteiro", oiço e observo a serena demonstração de competência e convicção da Ministra da Educação, Maria de Lourdes Rodrigues. Impressionante!

Contar os custos

O Ministro das Finanças admitiu que os serviços públicos possam vir a ser obrigados a pagar rendas pelos espaços ocupados. Trata-se de uma medida que já estava incluída no programa de racionalização da despesa pública da ECORDEP (2002). Há dois argumentos a favor desta solução: (i) tornar mais transparentes os custos dos serviços públicos; (ii) incentiver à racionalização da ocupação dos espaços.
Mais um passo positivo na boa gestão financeira do sector público administrativo.

Portucaliptal (2)

Mais papel, mais celulose, mais eucaliptos em Portugal. O Governo aplaude e apoia com um pacote de ajudas de Estado de quase 200 milhões de euros.
Os que, como eu, alimentavam alguma ilusão de que Portugal poderia alguma vez deixar de ser o eucaliptal da Europa podem perder toda a esperança. A fealdade e a monotonia da nossa paisagem rural vai agravar-se. Pobre país!

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2006

Correio dos leitores: "Porteucaliptal"

«(...) A florestação pode não ser uma virtude e os incultos podem ter um potencial económico não negligenciável. Senão vejamos. Falo em proveito próprio, é certo. Mas o interesse colectivo também parte de muitos interesses individuais. No interior do Alentejo e do Algarve, em Mértola e Alcoutim, o Estado tem enterrado fortunas, a subsidiar a plantação de pinhais mansos, em solos esqueléticos, num clima sequíssimo. Naquela aridez está a nascer o pinhal do interior alentejano. Não produz um pinhão, não produz madeira que se aproveite, apenas lenha reles e caruma boa para semear inçêndios no estio alentejano. Para isso sacrificaram-se os matagais, aonde se produzia o mel de rosmaninho, sem favor um dos melhores do mundo. Mel esse que tem uma Denominação de Origem Protegida, agora ameaçada de extinção por falta de pastagem para o produzir. Para além do mel, que também é uma riqueza de Portugal, o mato produz lenha, essências, ervas aromáticas e é a base de uma economia de recolecção, ela mesma agonizante, que inclui os espargos bravos, os cogumelos, as túberas, a aguardente de medronho. Património gastronómico do Alentejo. O mato é compatível com a caça e até com o pastoreio. É fonte de biodiversidade.
Estão por fazer as contas ao que se perdeu com a aventura de fazer desta região árida um pinhal. Impõe-se agora começar a pensar em reparar o estrago. Se tem havido dinheiro para gastar assim, mal gasto, é preciso que ele apareça para reimplantar matos de qualidade, onde os havia e deixou de haver, plantar alecrim, rosmaninho, medronheiro. Ordenar a limpeza da floresta, de modo a que o mato seja compatível com o combate e prevenção do fogo - é mais combustivel o pinhal do que o matagal - e compatibilizar os vários interesses, tornando o matagal uma alternativa de futuro economicamente apetecivel e sustentável.»

Pedro Bravo