quarta-feira, 8 de outubro de 2008

Proteger Durão Barroso

“Governo diz que quis proteger Durão Barroso nos voos da CIA”, escreve o DN, citando o MENE ontem na AR.
Pois! Eu não diria melhor... Só hesito entre o que acrescentaria: “E ele bem precisa!“ ou então ”E não só, e não só!...”
Confesso que ao receber notícia das declarações do MENE, a minha primeira reaçcão foi uma risada incrédula. Depois, como socialista, acabrunhei!

Enfrentando a tempestade

A escolha da crise financeira para tema do debate parlamentar desta semana constitui uma jogada ousada e certeira de Sócrates. Respondendo claramente ao desafio de Cavaco Silva no discurso do 5 de Outubro, o primeiro-ministro avança de frente para as dificuldades.
Sócrates deve anunciar o abrandamento (ou mesmo o recuo) nas metas da consolidação orçamental, invocando a margem de manobra que o sucesso da disciplina financeira até agora proporciona às finanças públicas; deve concretizar as medidas para assegurar a estabilidade do sistema bancário e financeiro nacional e a segurança dos depósitos; deve enunciar as medidas de reforço da regulação financeira, no seguimento do anúncio já feito pelo Ministro das Finanças; e por último, se houver almofada financeira, deve anunciar medidas adicionais para aliviar o estrangulamento financeiro das famílias e das empresas, bem como atenuar as dificuldades que a crise traz às camadas mais vulneráveis da população.
Uma excelente oportunidade do primeiro-ministro para demonstrar a tese de que com ele o barco do País tem um timoneiro à altura da tempestade.

I - Voos da CIA: Espanha investiga.

Segundo o jornal “El Pais” de ontem, o Ministério da Defesa de Espanha confirmou às autoridades judiciais espanholas que continuam a investigar o caso dos chamados "Voos da CIA", que:
1. 13 voos da Força Aérea dos EUA, com origem ou destino em Guantanamo, obtiveram autorização de escala em Espanha entre os anos de 2002 e 2007.
2. 13 outros voos da FA dos EUA, com a mesma origem ou destino e no mesmo período, foram autorizados a sobrevoar território espanhol.
3. Em dois casos, o Ministério da Defesa reconhece que os aviões transportavam prisioneiros provenientes de Guantanamo. Apesar do transporte de prisioneiros desrespeitar o Convénio bilateral EUA/Espanha ao abrigo do qual os voos da FA EUA foram autorizados e apesar de os voos serem justificados como destinando-se a "fornecer apoio logístico".
As investigações judiciais espanholas incidem sobre o transporte de prisioneiros para Guantanamo e para as prisões "secretas" admitidas pelo Presidente Bush. Não apenas através dos chamados "voos da CIA" (ou seja, em aviões civis privados), mas também através de voos militares e de Estado.
Os dois voos militares transportando prisioneiros confirmados pelo Ministério da Defesa de Espanha foram autorizados a passar por Portugal, tendo mesmo um deles aterrado nas Lajes.

II - Espanha investiga com base em lista da NAV

As investigações de voos militares americanos autorizados por Espanha foram despoletadas com base em dados retirados da lista de voos de e para Guantanamo elaborada pela entidade controladora do tráfego aéreo portuguesa NAV. Lista de que eu fiz entrega à Comissão de Inquérito do PE e que vem referenciada no seu relatório final (uma lista sonegada dos elementos facultados pelo governo à AR e ao PE, mas que eu consegui obter). Lista que mostrava que vários voos militares autorizados a sobrevoar território português, com destino ou origem em Guantanamo, se destinavam ou provinham de aeroportos espanhois.
Essa lista da NAV é o primeiro documento que identifica voos militares e de Estado, de e para Guantanamo, indiciando que o transporte dos prisioneiros para para aquela e outras prisões não terá sido feito apenas através de "voos da CIA" (isto é, em aviões civis privados que os governos, mais ou menos ligeiramente, argumentavam desconhecer), mas de facto, e sobretudo, através de voos militares, que tinham de ser autorizados politicamente pelos governos europeus. No caso português, essa autorização requer Nota Verbal do MNE, ouvido o Ministério da Defesa.
Essa lista da NAV é importante para os advogados de defesa dos presos, como os advogados mobilizados pela ONG REPRIEVE: cruzando os dados desta lista com outros fornecidos pelas autoridades militares americanas sobre as datas de transferência dos presos para Guantanamo, podem tentar estabelecer as condições de transporte (que se sabe envolver tratamento degradante), pessoal envolvido na detenção, interrogatório e tortura, e outros elementos relevantes para a defesa do preso que consegue ir a julgamento, mesmo nos tribunais cangurus criados pela Administração Bush (as chamadas “Comissões Militares”).
A lista da NAV é também peça relevante para se apurar o fundamento das suspeitas de que voos militares e civis americanos autorizados por Portugal, Espanha e outros países europeus possam ter servido para transportar prisioneiros para Guantanamo e outras "prisões secretas". E para se poder determinar se as autoridades portuguesas sabiam – ou estavam a ser enganadas pelos seus aliados americanos, eventualmente a coberto também de “apoio logistico” sobre a utilização desses voos para transportar prisioneiros. E para apurar responsabilidades políticas, e eventualmente criminais, de quem em Portugal, Espanha e noutros países europeus autorizou esses voos, colaborando - consciente ou inconscientemente - no sequestro, detenção ilegal e tortura de prisioneiros.

III - Madrid e Londres reconhecem. Lisboa ainda nega...

As revelações espanholas de agora vêm no mesmo sentido de admissões feitas pelo governo britânico, há uns meses, de que outros voos constantes da mesma lista da NAV - logo, autorizados a sobrevoar e aterrar em Portugal - também levavam prisioneiros.
Factos que as autoridades portuguesas sempre negaram liminarmente, sem no entanto facultar a consulta da documentação respeitante às autorizações de sobrevoo ou aterragem ou ainda as listas de equipagens e passageiros que deve ter obtido para autorizar politicamente aqueles voos. Documentação que nunca foi também facultada - pelo Governo ou pela PGR - aos advogados de presos de Guantanamo que especificamente a requereram.
As admissões espanholas e britânicas vêm confirmar suspeitas que eu e outras pessoas formámos a partir da investigação levada a cabo pelo PE – de que prisioneiros ilegalmente detidos, torturados e mantidos à margem da lei e de processo judicial justo, tivessem transitado para Guantanamo e outras prisões ditas “secretas” através de Portugal e com colaboração de autoridades portuguesas.
Vêm também corroborar testemunhos que eu e jornalistas portugueses recolhemos de terem sido vistos prisioneiros agrilhoados a sair de aviões militares americanos na Base das Lajes.
Se são um, quatro, trinta ou setecentos prisioneiros, pouco importa: são pessoas vítimas de graves violações de direitos humanos.
São, na maior parte dos casos, inocentes que foram até já ilibados de suspeitas e libertados pelos EUA, sem qualquer julgamento, depois de anos de prisão e tortura – e só de Guantanamo já foram libertados mais de 500 presos!
Serão também, em cerca de uma centena de casos, indivíduos sobre os quais recaiem fundadas suspeitas de actividades terroristas – individuos que mereciam julgamento e punição exemplares e que porventura a eles vão escapar, graças à detenção ilegal e à tortura a que foram submetidos em Guantanamo e nas prisões «secretas».

IV - Espanha expõe. Portugal abafa, mas vai aprendendo...

Em Portugal há um inquérito judicial em curso, sobre o transporte ilegal de prisioneiros, originado pelas participações que eu e o jornalista Rui Costa Pinto fizemos à PGR em Janeiro de 2007.
Os dois procuradores que iniciaram a investigação já foram entretanto ... à vida... deles. Alguma coisa se escreveu já sobre as razões do seu abandono, mas só mais tarde se deverá perceber porquê, quando houver acesso ao processo de inquérito.
E tudo indica que teremos mesmo de aguardar pelo fim do inquérito da PGR - que prossegue (e até dá jeito a algumas pessoas que tudo continue abafado sob o manto do segredo de justiça) para saber mais alguma coisa e designadamente se os elementos que os procuradores terão pedido ao MNE, MDN e outros ministérios - como fizeram os seus colegas espanhóis - terão tido resposta cooperante.
E, no entanto, há tanta coisa que podia facilmente esclarecer-se, se o MNE e o MDN dessem - a advogados dos presos, a parlamentares interessados,como eu, e a jornalistas - acesso à documentação que não podem deixar de ter em arquivo sobre o processamento das autorizações de voos militares e de Estado constantes das listas da NAV.
Tanto mais que o MNE e o MDN já aprenderam alguma coisinha com a investigação do PE e a subsequente entrega do assunto à PGR: a lista da NAV por mim facultada ao PE cobre o período de 2002 a finais de Junho de 2006 e inclui 17 autorizações de aterragem em aeroportos nacionais; a lista da NAV que o Deputado Jorge Machado, do PC, obteve do MOPTC há uns meses, demonstra que as autorizações de sobrevoo para aviões destinados ou provenientes de Guantanamo prosseguiram até ao final de 2007. Mas também demonstra que - curiosa e cuidadosamente - não se registaram mais autorizações de aterragem....

terça-feira, 7 de outubro de 2008

O défice de 2009

Depois da abertura do Ecofin há dias, o Governador do Banco de Portugal lançou hoje a "deixa" para um abrandamento do ritmo da consolidação orçamental.
É de admitir que o Governo aproveite essa abertura, sem porém prescindir de alguma redução adicional do défice orçamental (a não ser que as perspectivas económicas e financeiras sejam realmente más). Sabendo-se que o PEC de 2005 apontava para um défice de 1,5% no próximo ano, e que este ano ele deve descer para os previstos 2,2%, resta saber em que ponto do intervalo se quedará a meta de 2009. Se é permitido um palpite, apontaria para 1,9%...
Dentro de dias se saberá.

Habitações municipais (2)

É louvável o solidariedade de amigos e admiradores para com algumas figuras públicas denunciadas por beneficiarem ou terem beneficiado da atribuição de habitações pelo município de Lisboa, nas condições relatadas pela imprensa.
Todavia, mesmo os amigos e admiradores deveriam saber reconhecer e existência de situações de favor, quando elas são indesmentíveis. E no caso da esquerda, ainda menos se torna compreensível a indulgência ou complacência com tais situações.

Habitações municipais

Sobre este meu post, acerca dos arrendamentos do Município de Lisboa, pergunta Luís Novais Tito por que é que os municípios não podem possuir e gerir um património habitacional, participando no mercado de arrendamento.
A resposta é simples: porque, a meu ver (salvo melhor opinião), a lei não o permite e porque, independentemente disso, não vejo nenhuma justificação para a intervenção dos municípios em actividades comerciais alheias aos seus fins públicos. Ao contrário dos particulares, as entidades públicas (salvo o Estado) só podem fazer o que a lei lhes consente. Ora, fora do âmbito da habitação social, a lei das atribuições das autarquias locais não permite a intervenção dos municípios no mercado habitacional, seja mediante arrendamento, seja na construção e venda de habitações (salvo os programas de habitação a preços controlados). De facto, a lei não abre aos municípios a faculdade de se dedicarem, nem directa nem indirectamente, a actividades estritamente mercantis.
Os municípios não podem arrendar casas, pelo mesmo motivo que não podem arrendar escritórios, lojas ou armazéns, ou alugar automóveis ou equipamentos. Por isso, quando recebam habitações, por herança, contrapartida urbanística ou outra via, e não precisarem delas para outro destino, devem pura a simplesmente aliená-las.
Nesta perspectiva, mesmo que não houvesse o inaceitável regime de favor agora conhecido, considero a gestão municipal de um património habitacional (fora das situações assinaladas) como legalmente infundada e politicamente descabida.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Mais uma prova da "destruição do Estado social" em Portugal

«(...) 18 mil vagas em 400 novas creches».
O PCP e o BE ainda não deram conta de mais este infame golpe contra o Estado social, às mãos do neoliberalíssimo governo Sócrates...

Antologia do anedotário político

«MEP diz-se disponível para integrar governo».

Raciocínio

Num artigo no Expresso de sábado passado, o vice-presidente do PSD, Paulo Mota Pinto, acusa o PS de procurar vantagem eleitoral no proposto fim do voto correspondência nos círculos eleitorais do exterior. Mas não produz um único argumento para provar a acusação.
Pode haver argumentos de peso contra o fim do voto por correspondência, nomeadamente a diminuição da participação eleitoral. Mas não existe nenhum argumento racional que sugira que isso favorece um dos partidos. Pelo contrário, nada prova que a mudança não seja eleitoralmente neutra.
Decididamente, os cargos de direcção partidária são inimigos da lógica...

Bastou um mês...

...para este meu receio sobre o estado do Sporting se confirmar. Decididamente, Paulo "Peseiro" Bento não está à altura da responsabilidade do clube...

sábado, 4 de outubro de 2008

O Kosovo e a UEFA

Já pouco entendo sobre a malha caótica das razões independentistas e anti-independentistas deste nosso continente. Incapaz de hierarquizar os factores racionais determinantes (a história, a economia, a religião, o tempo, as guerras, os costumes, os facts of life), passei a conduzir-me pela emoção, que sempre é melhor do que a indiferença. Gosto destes, mas não daqueles, pronto.

Razão mesmo teve a UEFA ao passar de 16 para 24 o número de países participantes na fase final dos campeonatos europeus. Com o que aí vem (umas dezenas de países mais), o que vai faltar é calendário para as fases eliminatórias.

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Oportunismo político

O PCP propõe o aumento das deduções de despesas de saúde, educação, etc. em IRS. É evidente, porém, que essa medida iria favorecer especialmente os titulares de mais altos rendimentos, que são quem mais despesas dessas faz, em geral no sector privado (escolas e clínicas privadas), pelo que tal aumento da dedução seria além do mais um incentivo à fuga do SNS e da escola pública.
Os beneficiários e a direita política agradecem certamente a prestimosa e inesperada ajuda do PCP. Mistérios que o oportunismo político tece...

Reconhecer a independência do Kosovo - VII

Esta tarde, atravessando a ponte de Mitrovica.

Esta manhã, no Mosteiro sérvio de Zociste (protegido pelas forças da K-FOR), com o Padre Stefan (a 5 km de Rahovec/Orahovac)

Portugal não deve tardar mais a reconhecer a independência do Kosovo.
É a conclusão que trago reforçada ao fim de um dia a visitar enclaves sérvios no território kosovar, incluindo a parte norte de Mitrovica e de conversar com responsáveis locais, albaneses, sérvios e internacionais.
Impressionou-me particularmente a qualidade política do Presidente da Câmara de Mitrovica, Bajram Rexhepi,e dos seus esforços para, mesmo informalmente, manter contacto e procurar trabalhar conjuntamente com os responsáveis da parte norte da zona que obedecem a Belgrado.
Impressionou-me também a articulação inteligente de Oliver Ivanovic, o Secretário de Estado do Ministério Sérvio para o "Kosovo e Metohija", que terminantemente recusa a possibilidade de partição da parte norte do Kosovo, onde a maioria da população é étnicamente sérvia (50.000 pessoas, disse). Uma possibilidade volta e meia acenada por Belgrado. Uma possibilidade rejeitada por quem é sérvio do Kosovo (como Ivanovic), por que sabe que isso significaria inviabilizar todos os outros enclaves sérvios em território kosovar (onde vivem ainda mais sérvios do Kosovo do que na região a norte de Mitrovica).
O último estratagema a que se agarram as autoridades sérvias aqui, parece destinado a inflectir-lhes mais dano que vantagem. A Belgrado, mas sobretudo à população sérvia que vive a norte de Mitrovica - onde não há lei nem ordem, onde imperam contrabandistas e a criminalidade organizada, segundo reconheceu Ivanovic. Esse último estratagema visa impedir o posicionamento da europeia EULEX a norte de Mitrovica; em vez dela, as autoridades sérvias querem agora que fique a UNMIK, a missão das Nações Unidas, agarrando-se ao detalhe formal de que ela opera ainda no quadro da resolução 1244, que para Belgrado pressupõe a soberania sérvia. Sim, ironicamente estamos a falar da UNMIK, aquela mesma missão que os sérvios se fartaram vilipendiar e chegaram a atacar (dramaticamente em Mitrovica em 2004).
Ao mesmo tempo a Sérvia dá sinais contraditórios, de acomodação à realidade: Ivanovic admitiu que o reconhecimento da "independência" da Ossétia do Sul e da Abkhazia por Moscovo tinha representado um duro golpe para a sustentação internacional da posição sérvia sobre o Kosovo.
Outro sinal positivo é o que resulta de, por acordo entre a UNMIK e Belgrado, ter recentemente reaberto, com juízes e procuradores internacionais, o Tribunal de Mitrovica, situado na zona norte (aquele que foi fechado pelas reacções violentas sérvias de 17 de Março de 2008 e que depois os soldados portugueses da K-FOR estiveram a guardar durante meses).
E, mais importante ainda, a partir de hoje passarão a ser cobradas taxas aos passantes das fronteiras terrestres entre o Kosovo e a Sérvia. Isto foi acordado entre Belgrado e a UNMIK e a justificação de Ivanovic é que Belgrado estava a perder muito mais dinheiro para o seu orçamento do que o Kosovo, lucrando na realidade os contrabandistas.
Seja qual for a justificação, passar a cobrar impostos fronteiriços é uma primeira forma de reconhecimento por parte da Sérvia de que o Kosovo independente é uma realidade.


Portucaliptal

Há para aí uma praga que está a devastar a floresta de pinheiro bravo. Má selecção, esta. Não será possível mudar a preferência xilófaga para os eucaliptos?

Secessões

Já era de admirar que, divergindo das grandes potências que promoveram a separação e a independência do Kosovo, o Governo português mantivesse tanto tempo uma posição independente nessa questão, que pelos vistos agora vai terminar.
Todavia, se a questão é o reconhecimento de uma situação de facto, então o Governo deve também reconhecer, entre outras, a separação da Ossétia do Sul, que não é mais ilegítima do que a do Kosovo e que aliás até tem mais credenciais, desde logo maior antiguidade. Inversamente, a Rússia, depois de ter reconhecido a independência da Ossétia do Sul, não tem nenhuma legimidade para criticar o reconhecimento do Kosovo.
Haja moralidade, de ambos os lados...

Biden-Palin: um bom debate

Enganei-me!
O debate entre Biden e Palin não ficou, afinal, nos anais da comédia. Foi animado e correcto.
Nenhum dos candidatos se prestou a escorregadelas, nenhum cometeu erros que ficassem na memória ou determinassem uma alteração de posições das suas candidaturas.
Sarah Palin soube preparar-se para o exame e foi eficaz na defesa das suas posições, ainda que muito da sua sabedoria - em especial sobre política externa - possa ter sido colada com cuspo. Sobre ela incidiam expectativas muito baixas - e nesse sentido a sua prestação surpreendeu pela positiva. Mesmo para quem, como eu, detesta e repudia as ideias e posições que ela sustenta.
Joe Biden foi claro, incisivo e, inteligentemente, jamais se permitiu um deslize chistoso ou paternalista relativamente à sua opositora. Não admira que as sondagens o dêm como claro vencedor do debate.

Os inquilinos da CML

Para além da questão do necessário fundamento legal, não vejo nenhum fundamento nem moralidade política em um município disponibilizar casas para arrendamento a particulares, fora das atribuições em matéria de habitação social, como sucede no caso de Lisboa.
Por isso, independentemente do favoritismo na escolha dos beneficiários e do tratamento de favor quanto às rendas, trata-se desde logo de uma situação inaceitável, por estar fora das atribuições do município. O município deve, pura e simplesmente, acabar com essa situação, mesmo em relação aos casos existentes, já que ninguém deve poder invocar direitos nem interesses legítimos em situações de favor.

Mais uma prova do "neoliberalismo da UE"

«Bruxelas propõe licença de maternidade de 18 semanas».
A UE não se cansa de dar razão às acusações da esquerda anti-europeísta...

O debate Biden-Palin

Estão a adivinhar: tanto postanço sobre o Kosovo também tem a ver com o fazer horas e manter-me acordada para o debate/embate Biden-Palin (que aqui em Pristina é uma hora mais tarde que em Lisboa).
Não que preveja que este debate venha a alterar os dados da campanha que, espero, virá a dar a vitória a Obama.
Mas cheira-me que é daqueles que pode ficar na história, mesmo sem dar vantagem ou enterrar nenhuma das candidaturas. Na história da comédia, claro!

Reconhecer a independência do Kosovo - I

Estou em Pristina, integrada numa delegação da Subcomissão de Segurança e Defesa do PE que vem ver como está evoluir a situação no Kosovo e como está a actuar a EULEX – a maior missão civil da Política Europeia de Segurança e Defesa, suposta posicionar cerca de 2.000 elementos no Kosovo.
E, por coincidência, fui durante o dia recebendo telefonemas de jornalistas portugueses que não me sabiam aqui, mas queriam justamente conversar sobre o Kosovo.
Tudo porque se anuncia o próximo reconhecimento da independência do Kosovo por Portugal.
Finalmente!
A quem me falou fui dizendo o que penso, resultante de impressões com que fiquei de minha visita em Fevereiro último (dias antes da declaração de independência) - vd post aqui escrevi a 8.2.2008.
Impressões que estou a reforçar através dos contactos nestes dias com responsáveis da EULEX, da KFOR, da UNMIK, ministros do governo kosovar e representantes das ONGs e media locais. Na capital e não só. Amanhã e depois visitaremos enclaves de maioria sérvia. E amanhã também terei contacto com as forças portuguesas na KFOR e responsáveis portugueses na UNMIK.

Reconhecer a independência do Kosovo - II

E o que penso é que Portugal já devia ter reconhecido a independência do Kosovo no final da nossa última presidência da UE, quando o grosso dos outros países europeus reconheceu.
Porque a independência do Kosovo era, face à comunidade internacional, inevitável (mais, atrevo-me a dizer, do que a de Timor Leste) e irreversível: é um “fact of life”, goste-se ou não, concorde-se ou não..
E mais: é-o por responsabilidade da Europa, por acção e omissão.
Por mais que uns tantos insistam em culpar os americanos - as responsabilidades dos EUA ficam com eles e ninguém as pode negar.
Mas quem mandou os europeus alinhar com os EUA acriticamente, ainda por cima num território claramente europeu, aceitando até responsabilidades na UNMIK (a reconstrução e viabilização económica do território) que não foram minimamente cumpridas (e por isso o Kosovo vive hoje da economia paralela e da criminalidade organizada)?

Reconhecer a independência do Kosovo - III

Ao que sei, Portugal não reconheceu antes a independência do Kosovo por uma razão principal: porque o Presidente da República Cavaco Silva não quis.
Por causa daqueless medos difusos, de quem não percebe bem muito o mundo em que vivemos (”ai que os nossos soldados na KFOR, “tadinhos”, podem ser atacados!....”). Ou por razões aparentemente lógicas, históricas e legalmente fundamentadas, invocando o que seja: principios, precaução, bom senso e solidariedade (com os “nuestros hermanos”, com a Sérvia, etc...)
E Portugal não reconheceu então, também, por uma razão acessória: o governo PS não quis comprar (mais) uma guerrazita com o PR.
Compreende-se, tanto mais que, de facto, não faziamos grande diferença para o Kosovo, para a UE e para o exterior, tão discretinhos conseguiramos tornar-nos no final da nossa presidência da UE...
Como não fazemos agora diferença nenhuma, se de repente, “out of the blue”, desgarradamente, sem explicarmos o que mudou, reconhecermos a independência do Kosovo (só confirmaremos até, porventura, a nossa irrelevância...)

Reconhecer a independência do Kosovo - IV

Sugeri a quem me ligou que apurasse junto do Governo e Belém o que havia de repente mudado para a posição nacional ser agora revista.
Pelo meu lado, admito que a Geórgia tivesse pavlovianamente alterado os sentimentos primários de Belém, sobretudo tendo em conta que o PR em Nova Iorque, na semana passada, privilegiara subitamente contactos com líderes de países balcânicos.
Para mim, a cena do reconhecimento das “independências” da Ossétia do Sul e da Abkazia pela Russia só mostra que Moscovo não estava a falar a sério quando ameaçava com as penas do inferno para quem reconhecesse o «precedente» da independência do Kosovo. De facto, só confirma o que eu previ em Fevereiro passado: que os russos nunca seriam mais papistas que o Papa (a Sérvia) a espadeirar pelo Kosovo... Como se tem visto, a Sérvia agita-se perfunctoriamente no TIJ e na ONU, mas nada de lançar uma guerra contra Pristina (nem sequer os fornecimentos de energia eléctrica cortou), para não comprometer, inteligentemente, um futuro europeu para si e para os restantes estados balcãs, Kosovo incluído....
A verdade é que se quis retaliar efectivamente retaliar contra o «precedente» do Kosovo, Moscovo não fez mais mais do que dar tiros no seu próprio pé: abriu assim a “caixa de Pandora” dos separatismos internos que não lhe faltam....
Para mim, o pretexto do “perigoso precedente” também acenado a pretexto da Espanha, Grécia, Chipre e outros países europeus que tardam em reconhecer a independência do Kosovo, também se volta contra quem o invoca: eu, por exemplo, se fosse castelhana empenhava-me era em enfatizar as diferenças entre o Kosovo e o País Basco e a Catalunha e em arguir que o Kosovo não constitui precedente nenhum para essas regiões autónomas....

Reconhecer a indepenência do Kosovo - V

Pelo meu lado ainda, rejeitei, chocada, a tese avançada por um dos meus interlocutores jornalistas de que esta súbita reviravolta portuguesa se devesse à necessidade de grangear mais apoios para a candidatura ao Conselho de Segurança da ONU nas eleições a ter lugar em 2010.
Essa razão, de tão rasteira que é, nem me atrevo eu a imputar ao Presidente Cavaco Silva.
Por que carga de água razões de fundo e respeitáveis, ainda que enganadas nas premissas, haveriam agora de ser mandadas às urtigas pelo oportunismo de promover uma presença efémera Portugal no CSNU?
Uma presença que de pouco vale, realmente, para o prestígio e influência internacional do país (diz quem lá esteve em 97/98, trabalhou para lá estarmos e se desunhou e divertiu à brava por lá estarmos).
De facto, ter assento no CSNU só expõe negativamente os países que não têm política externa coerente e consistente em todos os azimutes...
Nem chego ao ponto de fazer aquela pertinente e embaraçosa pergunta que António Guterres nos fazia, ao diplomatas que se esmifravam para pôr Portugal no CSNU em 1996, para provar que a relevância de estar no CSNU era afinal ...irrelevante : “Ora, diga-me lá: que países estão actualmente no CSNU além dos P5?"

Reconhecer a independência do Kosovo - VI

A minha posição é hoje, como já era em Fevereiro último, a de que Portugal deve reconhecer a independência do Kosovo e frizar que é um caso sui generis, do qual ninguém deve extrapolar precedente nenhum.
- Porque o povo kosovar, massivamente, em sucessivas eleições, disse querer a separacão da Sérvia, entidade que o massacrou e oprimiu.
- Porque é um «fact of life» que a Europa ajudou a criar, quando fez adoptar no CSNU a resolução 1244, que já admitia um estatuto futuro, separado da Sérvia, para o Kosovo - por isso posto, e deixado durante oito anos, sob protectorado da ONU.
- Porque a Europa tem a responsabilidade e a capacidade de viabilizar um Kosovo democrático e auto-sustentável economicamente (com base nos recursos humanos, minerais e outros que o Kosovo tem, mas não estão aproveitados). E a Europa tem também o dever e interesse próprio de não deixar que se consolide uma economia assente na criminalidade organizada no meio do´continente europeu.
- Porque Portugal tem o dever e o interesse de participar na construção de um Kosovo democrático e auto-sustentável e de contribuir para a integração europeia de toda a região balcãnica, Sérvia incluida – a melhor maneira de afastar o espectro da guerra. E isso não se faz apenas através dos contigentes de soldados que temos – e bem – na KFOR. Faz-se, far-se-á sobretudo, através da EULEX. E não reconhecendo a independência do Kosovo, Portugal tenderá a pôr-se de fora da EULEX – para onde devia em especial mandar mulheres (em cumprimento da resolução 1325 do CSNU). Mulheres que tem em abundância nas profissões e com as experiências mais necessárias e requisitadas pela EULEX - polícias, juízes, procuradores, juristas.....
Em resumo: sou pelo reconhecimento. Quanto antes. Julgo é que, para sermos credíveis, convem explicar o que mudou agora relativamente ao que nos impediu de reconhecer antes. Ou seja, as razões substantivas por que mudou a posição portuguesa.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Via CTT e os equívocos de Pacheco Pereira

Na habitual saga contra tudo o que possa ser pensado e realizado sem a sua bênção tecnológica, Pacheco Pereira tem-se referido inúmeras vezes, de modo enganoso, ao serviço Via CTT. Aqui vão alguns esclarecimentos úteis sobre a matéria:

1 Ao contrário do que Pacheco Pereira tem repetidamente afirmado, o Via CTT nunca pretendeu “dar um e-mail a cada português”; isso seria, aliás, completamente absurdo, na medida em que o mercado oferece inúmeras soluções gratuitas para hospedagem electrónica; não é por aí que a info-exclusão se reduz nem o negócio dos CTT floresce;

2 O Via CTT pretende sim alocar a cada cidadão português uma caixa postal electrónica onde, à semelhança do correio físico, cada um pode receber e processar toda a sua correspondência transaccional (facturas, extractos, avisos e outros registos de tipo B2C e A2C) num só recipiente digital, unicamente alimentado pelos CTT – seguro, gratuito, universal e cómodo, como nenhum outro;

3 Ao contrário do que Pacheco Pereira supõe, a introdução do Via CTT, em 2006, pouco teve que ver com desígnios propagandísticos do Governo, antes constituindo um movimento estratégico por parte dos Correios – a um tempo, de ataque e de defesa perante a ameaça das plataformas digitais; o Governo limitou-se a apoiar, sem quaisquer custos para o orçamento de Estado, o seu lançamento público, enquadrando-o na matriz de concessão do serviço postal;

4 O investimento realizado no serviço Via CTT foi exíguo – na ordem do milhão de euros em custos directos de produção, fora as despesas de processamento e armazenagem, proporcionais ao número de clientes –, inteiramente auto-financiado e substancialmente inferior ao que a generalidade das grandes empresas já torraram nas suas plataformas digitais proprietárias;

5 A adesão dos consumidores ao Via CTT tem progredido lentamente (como em todas as suas concorrentes), não pela falta de atributos ou de utilidade do serviço, mas antes por razões bem mais prosaicas: desconhecimento, iliteracia informática, indiferença ou, muito simplesmente, indisponibilidade para romper com o correio físico (a razão mais poderosa);

6 Todos os portugueses são perfeitamente livres de aderir, gratuitamente, ao serviço Via CTT, se assim o desejarem e na modalidade que desejarem; há capacidade para dez milhões (o que é muito diferente da falácia pueril do “e-mail para todos os portugueses”); mas nada os obriga nem os constrange, nem sequer as efabulações de Pacheco Pereira.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Barroso faz-se de lucas: os EUA que travem a crise!

Só cá faltava mais esta demonstração do carácter do Dr. Durão Barroso.
O Presidente que há quatro anos está à frente da Comissão Europeia e, qual avestruz de cabeça enterrada na areia (vd meu post de 22.9 "CE - avestruz de cabeca enterrada no ... casino"), não a fez mexer nem um dedinho – apesar de instado/a há mais de um ano pelo Parlamento Europeu e, pelo menos, pela Senhora Merkel - para regular, supervisar, disciplinar o funcionamento da banca europeia e os produtos e métodos altamente “tóxicos” em que esta negociava e lhe grangeavam lucros faraónicos (sobretudo para os gestores de topo).
Pois o Dr. Durão Barroso, que tem estado caladinho desde que esta crise financeira global estalou, veio agora finalmente dar um ar de sua graca: não para reconhecer responsabilidades e prometer acção reparadora e disciplinadora a nível europeu (e não apenas de cada Estado Membro individualmente), relativamente os agentes e mercados financeiros.
Não, nada disso – o Presidente Barroso veio admoestar os EUA para resolverem sem demora a crise financeira mundial que criaram.
A lata é inesgotável! Já a vimos no Dr. Barroso a propósito da invasão do Iraque, de Guantanamo, da tortura e das prisões secretas: primeiro atira-se de cabeça, irreprimivel e acriticamente, atrás da mais reaccionária e demente Administração americana. Depois, quando as coisas ostensivamente dão para o torto, faz de lucas, nada era com ele: a responsabilidade é de outros, a eles cabe apanhar os cacos!....
Ninguém evidentemente contesta que cabem aos EUA, desde as teses da era Reagan, principais responsabilidades pela crise financeira global que agora estoirou.
Mas na Europa os principais reponsáveis políticos e económicos, aqueles que foram governo (incluindo gente que se dizia socialista) e foram atrás das teses neo-liberais que pregavam contra o Estado, a favor da desregulação e praticavam a supervisão ficcionada, não podem agora tirar o cavalinho da chuva e mandar as culpas só para os americanos.
Se há desregulação, comportamentos gananciosos aventureiros e criminosos da banca e de fundos de investimento europeus, a culpa não é dos americanos – mas sim dos governantes e reguladores europeus que desregularam ou deixaram desregular e que afrouxaram a supervisão, incentivando o abuso e o excesso.
O Dr. Durão Barroso, por exemplo, não só foi Primeiro Ministro de Portugal num período de privatização por tuta-e-meia de bens, serviços e empresas públicas (as OGMA, por exemplo), e de vê-se-te-avias para a desregulação e para o relaxamento da supervisao. Há quatro anos que é Presidente da Comissão Europeia e nada fez para antecipar e prevenir os perigos da ganância e da roda livre no mundo da banca e das finanças europeias e mundiais, para travar o processo de desregulação a nível europeu, para afastar as ameaças resultantes do descontrole e opacidade de “private equities”, “hedge funds”, “sovereign funds” e dos famigerados “off-shores”.
Estão enganados aqueles que pensam que o Dr. Barroso e outros com idênticas ou ainda mais responsabilidades vão escapar sem que lhes sejam pedidas contas na Europa. Além das que têm de ser pedidas aos governos que continuarem inertes a ver a crise afundar a economia europeia.